Através de emissão eletrônica feita pelo SERPRO, a Receita Federal tem remetido Autos de Infração para os contribuintes brasileiros, oriundos de revisão da conta corrente fiscal no confronto com as informações prestadas através das DCTFs.
Nas hipóteses em que o contribuinte, por exemplo, tenha recolhido integralmente o tributo, porém com atraso, até mesmo de um único dia, sem a aplicação correta dos acréscimos legais (pequenas diferenças de cálculo, por exemplo), a repartição tem aplicado a multa de 75% sobre o valor total do tributo, mesmo constatando que o mesmo encontra-se recolhido.
Não restam dúvidas de que em casos como este, o tributo foi auto-declarado pelo contribuinte antes do início de qualquer procedimento administrativo ou ação fiscal por parte das autoridades administrativas da Receita Federal, e assim o mesmo sujeita-se exclusivamente à multa de mora prevista na legislação de regência, que no caso não é de 0,33 ao dia, não excedendo ao percentual de 20% sobre o valor do tributo. Tal entendimento ainda beneficia integralmente o erário público, pois se o contribuinte acionar o Poder Judiciário poderá ter a dispensa total das multas de mora mediante a aplicação do dispositivo de denúncia espontânea inserido no art. 138 do Código Tributário Nacional, que assim diz:
"Art. 138 - A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração.
Parágrafo único: Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração."
Quanto à aplicação do dispositivo acima, ressaltamos a resp. sentença proferida pelo eminente Juiz Federal da 22.ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais, no processo n.º 2000.38.00.030626-2 patrocinado pelo nosso escritório, em que o mesmo ao após uma percuciente análise da matéria colocada em discussão, na esteira das decisões pacificadas pelo Superior Tribunal de Justiça acabou por entender que, " não havendo procedimento administrativo em curso contra o contribuinte pelo não recolhimento do tributo, mesmo no caso de deferimento do pedido de parcelamento, configurada está a denúncia espontânea, que exclui a responsabilidade do contribuinte pela infração, afastando a imposição da multa moratória... Com efeito, o Código Tributário Nacional não faz distinção entre multa punitiva e multa moratória... De conseguinte, ocorrendo denúncia espontânea, acompanhada do recolhimento do tributo, com juros e correção monetária, nenhuma penalidade poderá ser imposta nem tampouco exigida do contribuinte anteriormente inadimplente. Portanto, excluem-se, na denúncia espontânea, tanto as multas de mora, as punitivas, como as multas isoladas".
Finalizando, o eminente Juiz assim está redigiu o dispositivo da sentença: "Isto posto, julgo procedente o pedido, para declarar a inexigibilidade de multa moratória sobre os débitos espontaneamente denunciados e quitados pela Autora, objeto desta ação, nos termos do art. 138 do CTN, e para condenar a Ré à restituição dos valores recolhidos indevidamente a este título, corrigidos monetariamente pelos mesmos índices adotados pela Ré na cobrança de seus créditos e juros de mora a partir da citação, nos termos do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional."
Mas, mesmo não considerando as pacíficas decisões do Superior Tribunal de Justiça que somente são aplicadas aos casos concretos em que os contribuintes ajuizaram ações próprias para se verem livres da imposição das multas, inclusive nos casos de parcelamento, percebe-se que a Receita Federal, contrariando a legislação de regência, vem dando uma interpretação exclusivamente literal aos novos dispositivos inseridos no ordenamento jurídico pátrio, especificamente no que toca à aplicação da multa de ofício equivalente a 75% do valor do tributo.
O Regulamento do Imposto de Renda aprovado pelo Dec. 3.000/99, em pleno vigor, determina em seu art. 909 que:
"A pessoa física ou jurídica submetida à ação fiscal poderá pagar, até o vigésimo dia subseqüente à data do recebimento do termo de início da fiscalização, o imposto já declarado, de que for sujeito passivo como contribuinte ou responsável, com os acréscimos legais aplicáveis nos casos de procedimento espontâneo (Lei n
º9.430, de 1996, art. 47, e Lei nº9.532, de 1997, art. 70, II)."
Resta, portanto evidente que o contribuinte tem o prazo de até 20 dias após o início de qualquer procedimento administrativo ou ação fiscal para pagar os débitos relativos aos tributos declarados, recolhendo assim apenas a multa de mora prevista na lei.
No caso das autuações oriundas das diferenças encontradas nas verificações das DCTF´s, as repartições fiscais da Receita Federal, sem prévio aviso, e conseqüentemente sem dar ao contribuinte a oportunidade de exercer o seu legítimo direito de recolher as diferenças dos tributos apenas com a multa de mora, têm emitido os Autos de Infração eletronicamente e remetido aos contribuintes já com a aplicação da multa de ofício, absolutamente confiscatória, equivalente a 75% do valor do tributo.
Até mesmo nas hipóteses em que resta comprovado o recolhimento do tributo, mas com um pequeno atraso, ao invés de se fazer a imputação de pagamento, retirando-se parte do principal e atribuindo os valores a título de acréscimos legais, o que evidenciaria apenas um pequeno remanescente do valor principal, a sanha arrecadadora dos órgãos fiscalizadores federais os tem compelido a agirem com despropósito e exacerbadamente no sentido de já se aplicar a multa de 75% sobre o valor integral do tributo, mesmo estando este totalmente pago.
No cruzamento dos dados das Declarações de Débitos e Créditos Federais - DCTFs, como está ocorrendo agora nos casos dos processamentos das declarações do ano de 1997, pode-se constatar verdadeiros absurdos, como por exemplo: Verifica-se que o contribuinte recolheu a importância de R$ 100 mil reais a título de quaisquer tributos federais, com um dia de atraso e sem o correspondente pagamento dos encargos de mora. Se considerarmos a complexidade da legislação, aliada à multiplicidade de prazos para os diversos tributos e a outros dados conjunturais, veremos ser perfeitamente possível e até mesmo justificável que determinado contribuinte se encontre numa situação real como esta que hipoteticamente colocamos aos nossos leitores.
Pois bem, conforme já era de notório conhecimento, para casos como este, a Secretaria da Receita Federal utilizava-se de software próprio e fazia o denominado"cálculo de imputação proporcional",reduzindo-se o valor pago como tributo, e atribuindo-se as parcelas correspondentes aos acréscimos legais previstos na legislação de regência.Tal prática encontra amparo no artigo 47 da Lei n.o 9.430/96 com a redação dada pela Lei n.º 9.532/97.Assim,na recomposição da conta corrente fiscal, restava demonstrado que o contribuinte havia recolhido o tributo a menos. Considerando-se que conforme a legislação aplicável, a multa de mora por um dia de atraso é de 0,33%, o pagamento seria processado como sendo o principal de R$ 99.671,08 e a multa de 0,33% no valor de R$328,91. Como conseqüência o contribuinte recebia uma notificação complementar de lançamento do valor principal de R$328,91, mais os acréscimos legais até a data fixada para o pagamento da notificação. Não havia pois, prejuízo para nenhuma das partes.
A situação, entretanto, se modificou completamente e a Receita Federal vem aplicando as multas de ofício correspondentes a 75% do valor total do recolhimento, mesmo que este tenha sido efetivado com apenas um dia de atraso. Desta forma, o contribuinte receberá um Auto de Infração, sem prévio aviso, com a aplicação da multa isolada de R$75.000,00, que correspondente exatamente a 22.802,59% do valor não recolhido no prazo, ou seja, pago com atraso de um dia apenas, fundamentando-se numa interpretação equivocada e isolada do 44, inciso I da mesma Lei nº 9.430/96.
Resta cristalino e sem sombra de dúvidas que inexiste qualquer relação lógica de causa e efeito, considerando-se os valores absolutos aplicados a título punição em relação ao pretenso ato ilícito, materializando-se por conseguinte um verdadeiro confisco sobre o patrimônio do contribuinte, subtraindo do mesmo o seu direito garantido no próprio Regulamento do Imposto de Renda, de pagar a diferença com os encargos de mora previstos para os recolhimentos espontâneos, e tudo isto sem se falar ainda em seu direito de recolher sem nenhuma penalidade, se considerados os preceitos do art. 138 do Código Tributário Nacional, já consagrados pelo Superior Tribunal de Justiça.
O julgamento das impugnações aos feitos fiscais é de competência inicial das Delegacias Especializadas de Julgamento da Receita Federal, e, em segunda instância do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, em Brasília - DF, onde esperamos que mais este absurdo seja rechaçado pelo colegiado, evitando-se assim as demoradas discussões judiciais, que certamente poderão resultar em maiores custos para a Nação Brasileira, seja, pelo emperramento da já assoberbada máquina judicial, seja pela possibilidade de sucumbência em que será a União Federal condenada na hipótese de cancelamento de tais absurdas, ilegais e inconseqüentes multas, nas condições em que atualmente aplicadas.