As instituições financeiras são responsáveis por fraudes e delitos praticadas por terceiros contra o consumidor?

12/09/2014 às 17:25
Leia nesta página:

Quer saber quem é o responsável por fraudes e delitos praticados por terceiros contra o consumidor, como por exemplo: uso indevido de cheques; saque indevido; abertura de conta por terceiros roubo ou furto em agência bancária, etc.

Antes de enfrentarmos o mérito da questão é importante esclarecer a abrangência do Código de Defesa do Consumidor no âmbito inserto das instituições financeiras, já que estamos a tratar de sua responsabilidade em face das fraudes e delitos praticados por terceiros contra o consumidor, este considerado a parte mais fraca da relação jurídica de consumo.

Posto isso, a lei 8.078 de 11 de setembro de 1990, o famigerado Código de Defesa do Consumidor é uma lei principiológica aplicável a toda relação de consumo independente da área do direito de sua incidência, simplesmente configura-se pela reunião de sujeitos (fornecedor e consumidor) e objetos (produtos e serviços), sendo que a definição destes elementos o próprio código se encarregou de defini-los em seus artigos 2º e 3º.

Assim, de acordo com o artigo 3º e parágrafo 2º do Código de Defesa do Consumidor, as instituições financeiras compõem como fornecedores o polo ativo da relação jurídica de consumo, contudo, em que pese o esforço e a clareza do legislador a abrangência do Código ainda foi alvo de resistência pelas instituições financeiras o que resultou no entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça na Súmula 297.

Em suma, atualmente, não há dúvida de que a lei consumerista aplica-se às instituições financeiras, o que torna plausível a responsabilidade objetiva engendrada na teoria do risco do empreendimento, de sua própria atividade pelos serviços prestados a seus clientes consumidores.

Inobstante a responsabilidade objetiva e seu ônus probatório inserido na sistemática processual e material das relações de consumo, a instituição financeira pode elidir tal responsabilidade se provar uma das excludentes de sua responsabilidade, eximindo-se quando demonstrar que o defeito no serviço prestado não existiu, ou que houve culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro a ensejar o rompimento do nexo de causalidade.

Neste diapasão, saber quem responderá civilmente por um ato lesivo ao consumidor é de fundamental importância, porque ratifica a segurança e a expectativa legítima esperada pelo consumidor, que muitas vezes está à mercê de atos fraudulentos e delituosos, como por exemplo: uso indevido de cheques por terceiros; saque indevido em conta corrente; abertura de conta por terceiros em nome do consumidor; roubo ou furto em agência bancária; contratação de empréstimo por terceiro em nome do consumidor, cartão de crédito clonado, entre outros.

De tal sorte, se a responsabilidade das instituições financeiras é objetiva na perspectiva da legislação consumerista, comprovado o dano e o nexo de causalidade pelo consumidor, podemos afirmar que as instituições financeiras respondem pelas fraudes e delitos praticados por terceiros, pois desenvolve uma atividade de risco devido à exploração da atividade econômica e, sobretudo, dentro das estratégias do negócio há clara dimensão dos custos, benefícios, bem como a ciência de que assume os riscos do empreendimento, cumulando o binômio: sorte e fracasso.

Neste ínterim, com base nas demandas submetidas à apreciação do Poder Judiciário e sob a égide do princípio da ampla defesa e do contraditório, não podemos simplesmente responder que sim à pergunta que nos foi colocada, na medida em que a mesma lei consumerista prevê hipóteses de exclusão da responsabilidade do fornecedor pela quebra do nexo de causalidade, oportunizando, neste ponto, uma única alternativa fundada na culpa de terceiro, pois como o consumidor não tem culpa, nem a instituição financeira é culpada, recordando que na responsabilidade objetiva não se discute a culpa, a única alternativa é de que ela seja de terceiro.

Agora, o auge da questão passa a ser: quando a culpa é de terceiro? Para respondermos a questão é imperioso relembrar a dicção da súmula 479 do STJ, ipsis litteris:

“As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”.

Curiosamente, a súmula 479 não responde diretamente quando a culpa é de terceiro, neste caso, precisamos de uma luz, lembrando-se do caso fortuito e da força maior, institutos que não foram previstos na lei consumerista, mas que nos remetem de certa forma à culpa de terceiro, ou melhor, ao fato de terceiro, já que não estamos analisando a sua culpa e sim o fato que o terceiro provocou para quebra do nexo de causalidade, este, equiparável ao caso fortuito (imprevisível) e que nos lembra da força maior (inevitável), sendo o primeiro, caso fortuito, dividido em duas espécies interno e externo.

Porquanto, tomadas as considerações podemos afirmar que as instituições financeiras só não respondem quando o fato de terceiro for equiparável ao fortuito externo, entendido como o evento, devidamente provado, que não tenha ligação com o risco de seu negócio, evento estranho a sua atividade empresarial, capaz de romper o nexo de causalidade com o dano experimentado pelo consumidor, caso contrário, entende-se que o risco social pertence ao seu negócio, ou seja, fortuito interno de responsabilidade da instituição financeira.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Felipe Oliveira de Jesus

Advogado com atuação nas áreas do direito do consumidor, direito contratual (contratos típicos e atípicos), direito civil (indenização, execução e cobrança), direito trabalhista e previdenciário.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos