Num país como o Brasil é impossível governar sem transigir. Desde que a CF/88 entrou em vigor nenhum presidente brasileiro conseguiu maioria absoluta no Senado e na Câmara dos Deputados. Todos os ex-presidentes brasileiros dos últimos vinte e cinco anos, com apenas duas vergonhosas exceções, tiveram que negociar muito para construir bancadas majoritárias e foram obrigados a ceder algo à oposição quando desejaram aprovar projetos que dependiam de maioria absoluta dos votos no Congresso. Fernando Collor tentou se impor e acabou impedido de governar. FHC comprou a aprovação da Emenda Constitucional que permitiu sua reeleição.
Marina Silva provavelmente disputará o segundo turno contra Dilma Rousseff. Não é certa a eleição e posse da aventureira do PSB, mas isto infelizmente ainda não pode ser descartado. A eleição de Marina Silva deveria estar provocando indignação na imprensa e no mercado. E no entanto os barões da mídia e os banqueiros não escondem sua preferência por ela. Qual a razão desta estranha escolha que foi feita pelos donos do poder e herdeiros da casa grande?
O desempenho da economia brasileira não é excelente, mas é melhor do que a de muitos países europeus. Bancos e empresas de comunicação tem auferido lucros consideráveis nos últimos 12 anos. Portanto, não é o vil metal que motiva o apoio dos setores privilegiados à candidatura de Marina Silva. O que os banqueiros e os jornalistas realmente desejam? A resposta pode ser encontrada no perfil psicológico de Marina Silva.
Há alguns dias, confrontada no Twitter pelo pastor Malafia, a candidata do PSB imediatamente deixou de apoiar o casamento gay. Depois ela arrumou uma desculpa esfarrapada para justificar a mudança no seu programa de governo. Hoje, apesar de gozar de uma situação confortável nas pesquisas e de desfrutar o apoio da imprensa, Marina Silva reclamou que está sendo caluniada pelos militantes do PT na internet.
Marina Silva revela ter um perfil psicológico incompatível com o cargo que disputa. Ela é incapaz de aceitar crítica de seus adversários, mas se submete automática e voluntariamente às demandas de seus apoiadores. Se for eleita, a candidata do PSB tenderá a privilegiar as demandas de sua minúscula bancada de pastores e serviçais dos banqueiros. Em razão de sua fé e submissão à autoridade de líderes evangélicos intolerantes e barulhentos como Malafaia, Marina terá muito mais dificuldade que Dilma Rousseff para negociar com adversários caso seja eleita.
É provável que Marina Silva não consiga uma maioria parlamentar sólida que permita a ela governar com tranquilidade. Isolada no Congresso Nacional, a presidenta do PSB tentará contornar as dificuldades políticas e partidárias se apoiando cada vez mais nas Igrejas Evangélicas (Garotinho fez isto no Rio de Janeiro levando o Estado à beira do caos). A previsível reação de Marina Silva ao isolamento criará dois problemas gravíssimos.
O aparelhamento do Estado por evangélicos despertará o ciúme e a reação da Igreja Católica, que sempre teve grande influência no Brasil. Quando perder disputas no Congresso Nacional, Marina Silva recorrerá ao STF, que nem sempre poderá atender as demandas ajuizadas por ela. A principal missão do STF é cumprir e fazer cumprir os princípios constitucionais, inclusive aqueles que são odiados pelos evangélicos. O próprio Congresso Nacional e a CNBB certamente recorrerão ao STF contra os eventuais arroubos autoritários de Marina Silva inspirados na sua religião.
A eleição de Marina Silva, portanto, representa um grave perigo para a paz pública. Ela começará seu governo acreditando que tem muita força, mas seu poder será limitado em razão de sua incapacidade de construir uma maioria no Congresso Nacional prejudicando os interesses do gueto parlamentar evangélico a que parece querer ficar confinada. Em pouco tempo a nova presidenta ficará paralisada e verá seus sonhos escorrerem pelo ralo quando o STF começar a revogar seus decretos. As turbulências institucionais, os conflitos entre os três poderes e o clima de guerra entre evangélicos e católicos provocados por Marina Silva podem levar o Brasil à beira do caos. Presumo que seja exatamente por este motivo que alguns dos arquitetos financeiros e midiáticos de Marina Silva demonstrem tanto fervor por sua candidatura.
Ao menor sinal de grave instabilidade política, como fizeram no passado, os donos do poder e herdeiros da casa grande apelarão para um rompimento institucional que liberte o país tanto de Marina Silva quanto da oposição. Resumindo: Marina Silva é apenas um tampão que será colocado no Palácio do Planalto com a finalidade de provocar uma explosão controlada por terceiros em prejuízo do povo brasileiro.
Dilma Rousseff soube frear as demandas dos seus apoiadores e negociar com seus adversários. Isto explica porque seu governo não ficou paralisado no Congresso Nacional, conseguiu preservar e ampliar programas sociais e realizou obras de infra-estrutura importantes que permitirão ao país crescer mais e melhor na próxima década. Várias vezes o governo do PT foi confrontado no STF, mas quase sempre a oposição amargou derrotas jurídicas avassaladoras. Se for reeleita, Dilma Rousseff não realizará todos os sonhos dos brasileiros, mas certamente não provocará nem instabilidades políticas nem os pesadelos autoritários associados aos conflitos e fracassos previsíveis de um governo Marina Silva.