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Intimações judiciais por via eletrônica:

riscos e alternativas

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Resumo:


  • A introdução de tecnologias no processo judicial pode agilizar procedimentos, mas deve ser feita com cautela para não violar garantias constitucionais como o contraditório.

  • É fundamental que a transição do papel para o meio digital em processos judiciais mantenha a segurança e evite riscos, sendo a "substituição segura" um conceito chave para avaliar a eficácia e os perigos do uso da tecnologia na justiça.

  • As intimações processuais, um ato essencial de comunicação no processo, apresentam desafios quando consideradas para execução por meios eletrônicos, devendo-se buscar formas que garantam a ciência efetiva do ato pelo destinatário e isonomia no tratamento das partes.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

5.Uma alternativa: fácil, barata e mais segura

A alternativa mais adequada, se aplicarmos o princípio da equivalência instrumental, seria reproduzir em meio eletrônico a intimação pelo Diário Oficial. Como apresentado a seguir, um sistema assim reúne a experiência consolidada nas intimações pela imprensa, com as vantagens do meio eletrônico; a via digital vai justamente servir para reduzir custos, tempo e esforços hoje despendidos com a intimação pela imprensa. Além disso, esta forma estaria imune aos riscos, supra apontados, a que está sujeita a intimação por e-mail, sendo, pois, mais segura. E, certamente, será muito mais barata e de fácil implantação do que a intimação por correio eletrônico.

Como se fariam, então, as intimações?

Proponho que se reproduza o modelo de intimações via imprensa oficial, apenas substituindo o meio papel pelo meio eletrônico. Isto é, o Judiciário providenciaria um "jornal" eletrônico diário, assinado digitalmente por algum juiz ou funcionário responsável pelo expediente, dando-lhe a mais ampla publicidade.

Este modelo de intimação, por primeiro, seria extremamente fácil de implementar. Do ponto de vista técnico, os softwares necessários para implementar esse tipo de tarefa podem ser obtidos a custo zero. Seriam necessários tão somente um editor de textos que produza arquivos no formato desejado e um programa de criptografia que gere assinaturas digitais. Há programas livres de ambas as categorias, que podem funcionar até em computadores hoje obsoletos.

Produzido e assinado o arquivo com as intimações, o que pode ser feito em qualquer computador pessoal, bastaria dar-lhe a público, sem qualquer necessidade de conferir se os advogados destinatários receberam ou não a mensagem. Se o Judiciário local não tiver um servidor web onde disponibilizar o arquivo para download, bastaria distribuí-lo entre os muitos provedores, inclusive os da OAB e associações de advogados, que fariam a retransmissão. Até provedores comerciais certamente se interessariam em disponibilizar cópias, a fim de alavancar as visitas diárias aos seus portais. Afinal, uma vez que o arquivo esteja assinado digitalmente, já não importa saber onde o encontramos disponível, pois a assinatura garante a sua proveniência.

Deste modo, apesar de o Judiciário ter de distribuir a todos os advogados um arquivo muito maior do que a intimação que seria individualmente dirigida a cada um deles, esta tarefa pode ser repartida por toda a web e certamente não faltaria onde disponibilizar o arquivo para download. Assim, diminui-se radicalmente a exigência de um potente servidor e boa largura de banda, que seriam necessários para despachar as dezenas de milhares de intimações pelo e-mail.

Eventualmente, a depender de um exame mais minucioso, pode-se pensar em partir o "jornal" eletrônico por regiões geográficas, ou por fóruns, ou grupo de varas (p.ex., as varas cíveis da capital), a fim de diminuir o tamanho os arquivos, evitando circulação inútil de bits pela Internet. Se o advogado só atua na Capital, ou em dada região do Estado, ou só perante as varas cíveis, de família, ou criminais, ser-lhe-ia necessário baixar apenas o arquivo correspondente. Esta definição dependeria da verificação do tamanho, em bytes, destes arquivos.

Um dado relevante seria a definição do formato em que estas "publicações" serão produzidas. Primeiramente, caso seja feita a opção por arquivos que contenham formatação, deve-se utilizar formatos abertos, que possam ser lidos em qualquer sistema operacional, com softwares variados. Como sugestão, pode-se utilizar o formato HTML, ou o moderno XML, que começa a ganhar espaço. Talvez, entretanto, o uso de texto puro, sem formatação, seja mais adequado, a fim de possibilitar arquivos de tamanho mais reduzido. O arquivo poderia ser assinado com programas abertos, como o GnuPG [33]; compactando-se o "jornal" e sua respectiva assinatura em um único arquivo ZIP, para facilitar a distribuição. E a implementação disso custaria muito pouco, em termos de recursos materiais e humanos.

O mais importante, porém, é que um sistema assim poderia propiciar resultados muito melhores do que os obtidos com a publicação no Diário Oficial, sem que se corra os riscos da intimação pelo correio eletrônico. Aproveitaríamos toda a experiência que a praxe, a doutrina e a jurisprudência armazenaram ao longo do século. Sem grandes transtornos, retiraríamos os inconvenientes da publicação em jornal.

A primeira grande vantagem a observar é a redução de tempo e custo. A substituição do papel por bits geraria uma enorme economia para o Estado, sem se falar na repercussão ecológica em prol de toda a sociedade. E o tempo para a publicação seria ainda mais diminuto, ganhando-se o intervalo entre o envio, impressão e posterior distribuição: uma vez pronta a relação de intimações, basta assinar o arquivo e disponibilizá-lo online.

De outro lado, comparativamente com a intimação pelo correio eletrônico, vê-se que está sendo dada a mais ampla publicidade às intimações, o que evita os riscos acima apontados, de perda, extravio ou interceptação dolosa das intimações que são enviadas uma única vez para o destinatário. O advogado poderia contar com a segurança de encontrar suas intimações em diversos locais, ou com a facilidade de ter alguém para ler e destacar todas as publicações para si.

E, se todas as intimações são publicadas em um arquivo diário, único para o foro (ou para uma região, ou para grupos de varas, como viesse a ser definido), isso permite demonstrar a não-intimação: se não for encontrada ali, no arquivo eletrônico do dia em questão, a intimação indubitavelmente não foi efetivada!

Outra vantagem desta alternativa é que ela reduz inclusive os problemas de exclusão digital, já que ao simplesmente substituir o meio papel por intimações eletrônicas públicas, o advogado que eventualmente não tiver intimidade com o computador, ou não tiver condições financeiras para adquirir um, poderá continuar a utilizar serviços terceirizados de "recortes", ou poderia ler as publicações nas Salas de Advogados. E, com isso, a intimação eletrônica pode ser feita de forma idêntica a todos e não somente aos advogados cadastrados.

Do ponto de vista da correção da intimação eletrônica, seria necessário exigir-se a precisão na grafia dos nomes dos advogados, pois, nos termos do voto do Min. Humberto Gomes de Barros, acima citado, a "leitura" de publicações assim será feita por mecanismos de busca, e não visualmente, num trabalho que doutrina e jurisprudência não relutam em dizer "tediosa e pouco instrutiva" [34]. Evidentemente, conforme o Judiciário for informatizando suas rotinas, as chances de erros na grafia das intimações tendem a diminuir consideravelmente, vez que não serão os nomes datilografados a cada nova publicação, mas fornecidos uma única vez, para a ficha eletrônica do processo, de onde serão transpostos para todas as intimações daquela causa.

Enfim, se o uso da informática pode produzir grandes benefícios para a administração da Justiça, não podemos perder de vista as garantias das partes, notadamente as garantias de ter ciência de todos os atos do processo e de tratamento isonômico. Intimações presumidas, portanto, devem ser feitas segundo critérios razoáveis que assegurem que o advogado terá ciência do ato, evitando-se formas que possam acarretar erro ou suscitar questões processuais paralelas, que podem dificultar o acesso à justiça.

O processo já produz questões processuais em excesso. Devemos, ao modernizá-lo, procurar diminuir os incidentes e velar para que não apenas os mudemos de lugar, proliferando outros tipos de incidentes. O tempo e os recursos da Justiça são muito escassos, de modo que, o quanto possível, devem ser dedicados a encontrar o direito material que as partes têm, fazendo justiça no caso concreto; e não para discutir o próprio processo.


Bibliografia

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VERDE, Giovanni. Profili del Processo Civile, Napoli, Jovene Editore, 1999.


Notas

1. Secrets & Lies - Digital Security in a Networked World, p. xii.

2. Estudo sobre a Efetividade do Processo Civil., tese apresentada ao Depto. de Direito Processual da FD-USP.

3. Modificação introduzida pela Lei nº 8.710/93.

4. Modificação introduzida pela Lei nº 8.952/94.

5. Lei nº 8.245/91, art. 58, IV.

6. Arts. 205, 207 e 208 do CPC.

7. v. Estudo sobre a Efetividade do Processo Civil, p. 95.

8. Três momentos da informatização processual podem ser destacados: a) a informatização das rotinas internas de acompanhamento processual; b) a disponibilização online de atos processuais; c) a prática de atos processuais. Mesmo em se tratando da prática, de atos processuais, seria mais natural iniciar-se pelos atos postulatórios e decisórios, das partes e do juiz.. A respeito do tema, v. MARCACINI, Direito e Informática: uma abordagem jurídica sobre a criptografia, cap. IV, e BRUGHALETTA, Internet per giuristi. cap. 12.

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9. DINAMARCO, Instituições de Direito Processual Civil, v. III, p. 429.

10. Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, p. 82.

11. GRECO FILHO, Direito Processual Civil Brasileiro, 2º vol., p. 37.

12. SIDOU, Processo Civil Comparado, p. 171

13. VERDE, Profili del Processo Civile, vol. 1, pp. 296-306.

14. AZEVEDO, O Direito de Ser Citado, p. 135.

15. Idem, ibidem, p. 266, 267.

16. Idem, ibidem, p. 282.

17. Dispunha o Reg. 737, em seu artigo 45, §2º: "Que os editos sejam afixados nos lugares públicos e publicados, pelos jornais, onde os houver, certificando o oficial no primeiro caso, e juntando-se no segundo aos respectivos autos o jornal ou publica-forma do anuncio".

18. Código Processual Civil e Comercial de São Paulo, art. 197. Nota-se, no texto, a indistinção entre citação e intimação, segundo a concepção atual.

19. Cód. de São Paulo, art. 198. Reitere-se a observação da nota anterior.

20. Cód. de São Paulo, art. 198, § único.

21. Cód. de São Paulo, art. 194, II.

22. Alteração feita pela Lei nº 4.094/62.

23. V. neste sentido, PONTES DE MIRANDA, Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo III, p. 326, e MONIZ DE ARAGÃO, Comentários ao Código de Processo Civil, v. II, p. 232.

24. Curso de Direito Processual Civil, pp. 342/354. V. também ARRUDA ALVIN, Manual de Direito Processual Civil, vol. 2, pp. 279/286.

25. "EMENTA: Processual — Advogado — Intimação — Erro na grafia do nome — Nulidade (CPC, art. 236, § 1º ). — A intimação mediante publicação em jornais (CPC, art. 236) é modo inseguro e perigoso de comunicação processual. Urge cercá-lo de todas as garantias possíveis. — As cautelas recomendadas pelo § 1º do art. 236 devem ser observadas, ao pé da letra. — É nula a intimação, se na publicação o nome do advogado figurou com a primeira letra trocada" (RSTJ 68/372)

Diante da enorme propriedade, bem como a íntima relação com o tema aqui tratado, merece ser transcrito o voto completo do Min. Humberto Gomes de Barros, relator do referido Recurso Especial:

"A publicação na imprensa constitui método extremamente imperfeito e perigoso de comunicação processual. Tanto, que todos os figurantes das atividades forenses — na medida em que disponham de capacidade para influir na produção legislativa — fogem dela. Com efeito, o Ministério Público, a Defensoria Pública e o Estado, reservam-se o direito de receber pessoalmente as intimações.

"A comunicação processual através da imprensa é reservada ao advogado liberal.

"Este, a cada dia é obrigado a procurar seu nome, perdido como agulha no palheiro, entre milhares de publicações, espalhadas nas centenas de páginas dos Diários Oficiais.

"Se o método é inseguro, urge cercá-lo de todas as garantias possíveis. Tanto mais, quando se leva em conta a circunstância de que a inobservância das cautelas prejudica, não apenas o advogado, mas a parte, sua constituinte.

"Para que isto ocorra, é necessário que se tome ao pé da letra o preceito contido no § 1º do art. 236, nestes termos:

"‘É indispensável, sob pena de nulidade, que das publicações constem os nomes das partes e de seus advogados.’

"Desnecessário registrar que ao se referir a ‘nome’, a Lei se refere ao nome correto. Nome erradamente grafado não é nome.

"Se, na época em que se editou o CPC, a preocupação com o nome já existia, hoje ela cresce em importância.

"É que, atualmente, o volume dos jornais e o número de publicações nele contidas torna impossível a leitura direta. A tarefa passou a ser confiada a computadores, que lêem as páginas dos diários oficiais, nelas detectando o nome do causídico.

"A leitura pelo computador traz alguma segurança.

"No entanto, para que ela tenha eficácia, é necessário que os nomes estejam corretamente escritos.

"Sabemos todos que, embora constitua precioso auxiliar da atividade humana, o computador carece de discernimento. Para ele, a troca de uma letra conduz a novo vocábulo, bem diferente daquele a ser procurado.

"A troca é tanto mais importante, quando o erro ocorre na primeira letra do vocábulo. É que a seleção dos termos se faz na ordem seqüencial dos caracteres. Para o computador, o vocábulo Humberto nada tem a ver com a palavra Umberto. Se está programado para localizar "Humberto" e lançar o termo na relação da letra "H", ele, simplesmente, ignorará a palavra defeituosa. Dirá, a final, que "Humberto" não foi intimado.

"Na hipótese, o advogado da parte intimada chama-se Wanderlei. Na intimação malsinada, indicou-se como advogado da parte, alguém chamado Vanderlei.

"Diz o acórdão, que a troca não gerou prejuízo, porque "o patrono do recorrente era perfeitamente identificável." (fl. 32)

"Semelhante assertiva, talvez fosse correta, há vários anos — quando inda era possível o acompanhamento direto das publicações. Hoje, depois de o socorro ao computador haver-se tornado essencial, a troca da primeira letra praticamente impossibilita a identificação do patrono.

"Diante de erro bem menos comprometedor que este, a Segunda Turma deste Tribunal, conduzida pelo e. Ministro Américo Luz, declarou imprestável publicação que, referindo-se ao Advogado João Ferreira da Silva Júnior, intimou João Ferreira da Silva. Isto ocorreu no julgamento do REsp 4.052.

"Dou provimento ao recurso."

26. RSTJ 13/421.

27. RJTJESP 107/343. No mesmo sentido: RJTJESP 128/208.

28. FUX, ob. cit, p. 353 (v., também, ementário à p. 347).

29. GRINOVER, Os princípios constitucionais e o Código de Processo Civil, p. 93.

30. Conforme artigo 4º, que é referido no parágrafo 2º, do artigo 5º, que assim dispõe: "Decorridos cinco dias do envio de que trata o ‘caput’ deste artigo sem confirmação de recebimento, a publicação far-se-á na forma prevista no art. 4º".

31. A multiplicação das bases é, inclusive, prevista no §3º do artigo 2º do anteprojeto.

32. Neste sentido caminha o projeto de implantação da Infraestrutura de Chaves Públicas da OAB, com o qual tenho tido a honra e oportunidade de colaborar junto à Comissão de Informática da OAB-SP: propiciar ao advogado meios de ser identificado como tal em meio eletrônico, mediante certificados digitais expedidos pela própria Ordem. Aliás, é oportuno salientar que, da experiência obtida até o momento com este projeto de certificação, posso afirmar que o ponto mais delicado e sensível é justamente a identificação do advogado, seja na hora de atribuir-lhe o primeiro certificado, seja na hora de aceitar a revogação do certificado e o pedido de outro em seu lugar; ou seja, o ponto mais delicado do sistema envolve justamente aquilo que o projeto da AJUFE está propondo que seja realizado pelo Judiciário, no âmbito de cada uma das Justiças, o que se mostraria uma tarefa hercúlea e desnecessária.

33. Disponível em http://www.gnupg.org, trata-se de um "clone" do conhecido programa de criptografia Pretty Good Privacy, ou PGP, de código aberto e distribuído sob a licença GPL.

34. FUX, Curso de Direito Processual Civil, p. 343.

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Sobre o autor
Augusto Tavares Rosa Marcacini

vice-presidente da Comissão Especial de Informática Jurídica da OAB-SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. Intimações judiciais por via eletrônica:: riscos e alternativas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 59, 1 out. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3229. Acesso em: 25 dez. 2024.

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