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A lei geral do processo administrativo: Lei n° 9.784/99

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01/10/2002 às 00:00
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1. INTRODUÇÃO

Com a publicação da Lei n° 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, é que veio se dispor sobre preceitos basilares para o processo administrativo na esfera da Administração Pública Federal, direta e indireta, visando à proteção dos direitos dos administrados e a melhor execução dos fins da Administração Pública. A sua vigência foi imediata, seguindo-se à publicação em 1º. de fevereiro de 1999.

Até há pouco tempo não existia no Brasil legislação que tratasse do procedimento administrativo e que regulasse os atos produzidos no âmbito da Administração Pública.

A Lei n° 9.784/1999 encontra paralelo no Direito Comparado no Código do Procedimento Administrativo Português (Decreto-Lei nº. 6/96, de 31 de janeiro de 1996), que lhe antecede, mas cabe o registro, ainda, da Lei Complementar nº 33, de 26 de dezembro de 1996, que trata do Código de Organização e de Procedimento da Administração Pública do Estado de Sergipe. Esta Lei passou muito tempo olvidada, não sendo alvo, pelo que se sabe, de nenhum estudo doutrinário acerca da matéria. Cabe registro, também, a publicação da Lei paulista n° 10.177, de 30 de dezembro de 1998, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública no Estado de São Paulo, e precedeu o diploma federal em cerca de trinta dias.

Esse diploma federal, a Lei Geral do Processo Administrativo, como passou a ser chamada a Lei nº 9.784/1999, é alvo de especial importância, uma vez que tem influência nos mais variados procedimentos administrativos hodiernamente regulados em leis especiais de aplicação mais ou menos restrita, a exemplo do Regime Jurídico Único (RJU), em suas disposições relativas ao procedimento administrativo disciplinar; do processo administrativo fiscal (PAF), sistematizando o procedimento de consulta fiscal e defesa do contribuinte; dos dispositivos sobre recursos administrativos previstos pela Lei de licitações; do Código Nacional de Trânsito, quando trata das sanções e penalidades administrativas a que estão sujeitos os condutores de veículos automotores, para mencionar alguns.


2. ALCANCE E OBJETIVOS DA LEI GERAL DO PROCESSO ADMINISTRATIVO.

O Alcance e os objetivos da lei em foco estão muito bem delineados logo no seu art. 1º, Capítulo I, das Disposições Gerais.

Art. 1º. Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração.

§ 1º. Os preceitos desta Lei também se aplicam aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário da União, quando no desempenho de função administrativa.

§ 2º. Para os fins desta Lei, consideram-se:

I - órgão - a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração direta e da estrutura da Administração indireta;

II - entidade - a unidade de atuação dotada de personalidade jurídica;

III - autoridade - o servidor ou agente público dotado de poder de decisão.

Como se vê, ao estabelecer normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, o diploma em estudo preceitua que o seu primordial objetivo é de oferecer proteção dos direitos dos administrados e o melhor cumprimento dos fins da Administração. Essa norma contém a previsão de seu aproveitamento, também, no domínio dos Poderes Legislativo e Judiciário da União, quando estes venham a desempenhar a função administrativa. Assim é de se prever a considerável autoridade e repercussão que terá a Lei 9.784/99, consistindo, genuinamente, em Lei Geral do Processo Administrativo.

O Dispositivo legal supra transcrito faz, nos seus incisos I a III, do seu §2°, a conceituação d93º que sejam órgão, entidade e autoridade.

Como órgão ela conceitua como sendo a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração direta e da estrutura da Administração indireta; como entidade a unidade de atuação dotada de personalidade jurídica; e, por fim, autoridade como sendo o servidor ou agente público dotado de poder de decisão.


3. PRINCÍPIOS E CRITÉRIOS DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO.

A doutrina existente até há pouco tempo sobre processo administrativo e administração pública enumerava, com ligeiras mutações, os seguintes princípios que lhes são aplicáveis: legalidade, informalidade, moralidade, publicidade e eficiência, além dos princípios da ampla defesa e contraditório[1]. A Lei 9.784/1999 adicionou ao rol já conhecido outros princípios, a saber: finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

São vários, então, os princípios elencados pela Lei Geral do Processo Administrativo apresentados no seu art. 2º.

Art. 2º. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

I - atuação conforme a lei e o Direito;

II - atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei;

III - objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades;

IV - atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé;

V - divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição;

VI - adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público;

VII - indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;

VIII - observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados;

IX - adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados;

X - garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio;

XI - proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei;

XII - impulsão, de oficio, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados;

XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação.

Preceitua o caput do artigo supra transcrito, como se vê, que a Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. Embora não expressamente citados na lei, a administração também deve obediência aos princípios da publicidade, da oficialidade, do informalismo e da impessoalidade. No entanto, este trabalho tecerá comentários somente sobre os explicitamente citados no art. 2º do referido diploma legal.

Embora tenha trazido para o seu texto boa parte dos princípios que regem a administração pública do mundo civilizado, o legislador teria trazido uma melhor contribuição se não tivesse esquecido de elencar, no meio deles, o princípio da celeridade, não obstante figurar na lei vários outros dispositivos a referência aos prazos que deverão ser cumpridos pelo administrador e administrado.

Por seu turno, o parágrafo único do mesmo dispositivo legal, enumera exaustivamente os critérios a serem observados no âmbito da administração pública. Não se deve olvidar, contudo, que muitos desses critérios já estão implicitamente contidos naqueles princípios que norteiam a administração pública.

3.1 Principio da Legalidade.

O art. 37, caput, da Constituição pátria, preceitua que um dos princípios norteadores da Administração é o da Legalidade, sob pena de o administrador público ser responsabilizado por esta violação. A eficácia de todo desempenho da administração pública tem dependência da Lei, não há liberdade ou vontade pessoal do administrador[2] o que importa é a obediência aos ditames e regras previstas no direito positivo, por isso que, referir-se ao princípio da legalidade é mencionar o total condicionamento do administrador à pretensão da Lei.

O insigne mestre administrativista HELY LOPES MEIRELLES[3], ao discorrer sobre o que significa o princípio da legalidade, leciona que "o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e às exigências do bem-comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso". A força de toda atividade administrativa, assim, estaria dependente ao atendimento da lei, não possuindo, como se disse, nenhuma liberdade nem vontade pessoal do administrador público, posto ser de ordem pública a lei administrativa.

O controle dos atos da Administração Pública é uma exigência do princípio da legalidade, nos precisos termos do art. 5º, II, da Magna Carta pátria.

Isso já tinha merecido atenção especial do conspícuo MIGUEL SEABRA FAGUNDES nos idos dos anos 1950[4]. Segundo ele "todas as atividades da Administração Pública são limitadas pela subordinação à ordem jurídica, ou seja, à legalidade.

O procedimento administrativo não tem existência jurídica se lhe falta, como fonte primária, um texto de lei. Mas não basta que tenha sempre por fonte a lei. É preciso, ainda, que se exerça segundo a orientação dela e dentro os limites nela traçados"

A Lei Geral do Processo Administrativo determina que o administrador aja conforme a Lei e o Direito, devendo a interpretação da norma administrativa ser da forma que garanta o atendimento ao cidadão, como se observa do preceituado no seu art. 2º, parágrafo único, I e XIII.

3.2 Princípio da Finalidade.

A finalidade do ato é seu intento finalístico. Todo ato administrativo procura obter uma finalidade de interesse da administração pública.

Tem-se que o princípio da finalidade exige que o ato seja praticado sempre com finalidade pública. O administrador fica impedido de procurar outro fim ou de praticá-lo em seu próprio interesse ou em interesse de terceiros.

Este princípio, o da finalidade, proíbe que o ato administrativo venha a ser praticado sem interesse público ou conveniência para a administração, mirando exclusivamente a atender interesses privados, por favoritismo ou acossamento dos agentes da administração pública. O administrador, ao agir contra este princípio, estará revelando o seu desvio de conduta, o que virá a constituir-se numa das modalidades de abuso de poder.

3.3 Princípio da Motivação.

O art. 93, IX da CF/88 prevê que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. Na lei sob exame, esse mesmo princípio é consagrado ao estabelecer ela, no seu art. 2º, VII, bem como no seu capítulo XII, que a decisão do administrador deverá ter a indicação dos pressupostos de fato e de direito que a determinarem, bem como os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, em qualquer uma das hipóteses do seu art. 50, I-VII.

Pela apreciação da motivação dos atos emanados da administração pública é que se tem o controle de legalidade para averiguar se o ato do administrador foi praticado ressaltando-se os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a partir da avaliação do nexo de causalidade entre os motivos e o resultado do ato respectivo.

O princípio da motivação é um direito implícito do cidadão e dimana da democratização dos valores regulados pela Constituição Federal. Ato administrativo, sem motivação, afronta o poder discricionário, enveredando nas raias do arbítrio.

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3.4 Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade.

A despeito de não constar no caput do Art. 37 da Constituição Federal, o princípio da razoabilidade ou da proporcionalidade possui registro na Constituição Federal[5], merecendo rica doutrina sobre o assunto e robusta jurisprudência.

Os princípios constitucionais da Administração Pública não poderiam ficar encapsulados apenas no Art. 37 do Texto Fundamental, porque a atual Carta de 1988 trouxe à tona numerosos dispositivos que resguardam a sociedade em múltiplos capítulos e artigos, incumbindo ao intérprete investigar o abarcamento de determinado conceito, conjuminando-os entre si, para não permanecer reprimido em uma mera leitura de um artigo avulso, sem descobrir a ampla aspiração constitucional.

O princípio da razoabilidade exprime a relação de congruidade entre o fato e desempenho concreto da administração pública. O princípio da razoabilidade é encontrado na Constituição Federal, precisamente no seu art. 1º, em que é preceituado que a "República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito elenca a nação como Estado Democrático de Direito".

Segundo ensinamento de ELIMAR SZANIAWSKI[6], "este princípio encontra seu substrato em disposições legais referentes ao estado de necessidade, interferindo na definição de ameaça ilícita. A ameaça ilícita não é, na realidade, antijurídica, desde que para a obtenção de um fim não proibido, a ameaça consistir em uma ação em si mesma, conforme o Direito, mas não for o meio adequado para a obtenção desse fim".

Nos tempos hodiernos, abraçar então a tendência de revalorizar o Estado de Direito sob o ângulo dos direitos fundamentais, ganha proeminência a cláusula do due process of law. Berço do "princípio da razoabilidade" é na cláusula do devido processo legal que a supremacia da Constituição tem procurado se ancorar.

Leciona HUMBERTO THEODORO JÚNIOR[7], que "é no princípio da razoabilidade que cada vez mais se busca identificar o limite da lei, que haverá de balizar o terreno onde deverá atuar a interpretação judicial. Assim, embora não se possa recusar ao juiz uma atividade criativa, para individualizar a norma genérica da lei, é imperativa sua submissão à ordem jurídica".

Na lei sob comento, o princípio da razoabilidade é encontrado no art. 2º, parágrafo único, VI, ao estabelecer que nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público.

3.5 Princípio da Moralidade.

O princípio da moralidade administrativa está implantada na Carta Magna como um princípio fundamental a ser acatado pela Administração Pública.

São desmesurados os desdobramentos da moralidade administrativa por atingir de modo central o aspecto axiológico das ações concretas desenvolvidas pelos agentes públicos.

No art. 5º, LXXIII, da Constituição pátria vigente[8], há a previsão de anulação de todo e qualquer ato administrativo que tenha sido praticado sob o vício da imoralidade, por intermédio de ação popular.

Para TUPINAMBÁ MIGUEL CASTRO DE NASCIMENTO[9], é complexa, a extração da expressão constitucional do significado do princípio da moralidade na administração pública. Leciona o insigne mestre que "entre as formas abarcadas pela moralidade administrativa está a probidade administrativa, que consiste na obrigação de agir com honestidade na Administração Pública. Contudo, a moralidade administrativa abrange uma orientação comportamental que não se restringe exclusivamente ao campo da honestidade. E esta é a dificuldade na abordagem do tema, que não tem sido enfrentado pela doutrina nacional como assunto de preferência".

Não se deve olvidar, também, de ressaltar o pensamento do conspícuo magistrado JOSÉ AUGUSTO DELGADO[10], para quem "o princípio da moralidade administrativa não deve acolher posicionamentos doutrinários que limitem a sua extensão.

Assim, imoral é o ato administrativo que não respeita o conjunto de solenidades indispensáveis para a sua exteriorização; quando foge da oportunidade ou da conveniência de natureza pública; quando abusa no seu proceder e fere direitos subjetivos públicos ou privados; quando a ação é maliciosa, imprudente, mesmo que somente no futuro uma dessas feições se tornem reais".

3.6 Princípio da Ampla Defesa e do Contraditório.

Como uma das manifestações da cláusula do due process of law, em sentido processual, exige-se a observância do contraditório e da ampla defesa[11], de que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Entende-se como ampla defesa a total possibilidade do cidadão, nos moldes assegurados por lei, de efetivar a defesa quando venha a ser acusado de qualquer violação da lei, seja ela penal ou administrativa. Na expressão se contém o direito de ser assistido por um experto, de contraditar a acusação, de produzir provas, de exigir a demonstração do fato, dentre outros direitos.

A eminente mestra MARIA HELENA DINIZ[12], nos ensina o seguinte sobre o que seja ampla defesa e contraditório:

"AMPLA DEFESA. 1. Direito administrativo. Direito concedido a todos os funcionários e particulares envolvidos em algum inquérito ou processo administrativos, fundado no princípio constitucional de que ninguém pode ser condenado sem ser ouvido. 2. Direito processual. Direito assegurado a todos aqueles que estão implicados num processo, admitindo-se o contraditório, ou seja, dando possibilidade à produção de provas.

CONTRADITÓRIO 1. Lógica jurídica. a) Inconsistente ou incompatível; b) o que contém contradição. 2. Direito constitucional e direito processual. a) Princípio da audiência bilateral, que rege o processo, pois o órgão judicante não pode decidir uma questão ou pretensão sem que seja ouvida a pane contra a qual foi proposta, resguardando dessa forma a paridade dos litigantes nos atos processuais, visto que, mesmo nos casos excepcionais em que a lei possibilita a pronunciação judicial inaudita altera parte, haverá oportunidade de defesa daquele contra quem a pretensão se dirige; b) depoimento testemunhal que contém contradição; c) garantia constitucional que assegura a todo aquele que for demandado em juízo o direito de defesa da acusação e de proteção de seu direito."

Na lição de NELSON NERY JÚNIOR[13], "por contraditório deve-se entender, de um lado, a necessidade de dar-se conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo às partes; e de outro, a possibilidade de as partes reagirem aos atos que lhe sejam favoráveis. Os contendores têm direito de deduzir suas pretensões e defesas, realizarem as provas que requereram para demonstrar a existência de seu direito, em suma, direito de serem ouvidos paritariamente no processo em todos os seus termos"

Esse princípio encontra-se presente em diversos dispositivos da Lei Geral do Processo Administrativo, explicita e implicitamente[14].

3.7 Princípio da Segurança Jurídica.

A segurança jurídica exerce o papel que torna viável a efetivação real dos fundamentos e desígnios permanentes do Estado Democrático de Direito em que se constitui a nação brasileira, com isso viabilizando a harmonia das relações cotidianas mediante conhecimento antecipado e reflexivo dos atos e dos fatos e efeitos deles advindos, bem como propiciando a concepção da consciência constitucional.

Para CÁRMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA[15], "a segurança jurídica pode ser considerada como a certeza do individuo na correta aplicação dos valores e princípios de justiça absorvidos pelo sistema de direito adotado em determinada sociedade".

NEYTON FANTINI JÚNIOR[16], no entanto, ao tecer comentários sobre a projeção constitucional da segurança jurídica e sua interpretação constitucional, ao enumerar os seis principais pontos norteadores da segurança jurídica na Constituição Federal, nos ensina que "à luz de interpretação sistemática, permite-se condensar princípios inseridos no ordenamento constitucional e nele projetados, permeando-lhe de juridicidade, para a necessária compreensão e a realização factual dos fundamentos e dos objetivos do Estado Democrático de Direito, sintetizando-os, por assim dizer, em seis pontos cardeais:

a) devido processo legal, materializador da garantia de que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV);

b) inafastabilidade do controle jurisdicional, concretizador da garantia de que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (CF, art. 5º, XXXV);

c) preservação do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da autoridade da coisa julgada frente a legislação superveniente, garantia assecuratória da estabilidade das relações sociais, mediante projeção prática do conhecimento antecipado e reflexivo dos atos, fatos e conseqüências por eles desencadeadas, à luz do critério de previsibilidade (CF, art. 5º, XXXVI);

d) valorização do trabalho humano, livre iniciativa e função social da propriedade como fundamentos da ordem econômica, concretizando garantia do exercício regular de direitos e assegurando eliminação de práticas abusivas tendentes à sua neutralização ou ao seu desvirtuamento (CF, art. 170);

e) limitação do poder de tributar, mediante vinculação à legalidade estrita, proibição expressa de utilização de efeito confiscatório do tributo e incondicionais observância e respeito à capacidade contributiva, materializando a garantia de que o poder de tributar não engloba o poder de destruir (CF, art. 150);

f) submissão dos Poderes Públicos às pautas de atuação funcional materializadas nos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, aos quais agregam-se, por decorrência implícita, os princípios da razoabilidade, proporcionalidade e motivação dos atos, todos assecuratórios de que em todos os níveis e setores da Administração Pública haverá governo das leis e não governo dos homens, marcado pela transparência e adequação entre os meios e os fins (CF, art. 37)".

Por assim, então, a segurança jurídica tem, no processo administrativo, por escopo primordial a garantia da certeza da aplicação justa da lei, conforme os ditames jurídicos de direito, evitando que sejam desconstituídos, sem justificativa plausível, os atos ou situações jurídicas, ainda que tenha ocorrido alguma inadequação com o texto legal no decorrer de sua constituição.

Na Lei Geral do Processo Administrativo, o princípio da segurança jurídica é ressaltado em duas ocasiões: no art. 2°, XIII[17] e no art. 55[18].

3.8 Princípio do Interesse Público.

Sob a ótica do renomado mestre CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO[19], o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, "é da essência de qualquer Estado, de qualquer sociedade juridicamente organizada com fins políticos", compondo o componente que o qualifica e que lhe dá a identidade própria.

Quando a lei sob comento determina a observância do critério do "atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competência, salvo autorização em lei", no art. 2º, II, está estabelecendo, verdadeiramente, dois norteamentos diferentes: uma que interessa diretamente à finalidade do ato administrativo, que se confunde com o interesse público, dito aí "interesse geral"; outro, que trata de um princípio, como o da irrenunciabilidade da competência do órgão, que é objeto de dispositivo específico (artigo 11), ao lado da inalienabilidade ou indelegabilidade de poderes, salvo quando expressamente autorizado.

O critério de objetividade no atendimento do interesse público previsto na aludida lei[20] encontra-se vinculado à vedação da promoção pessoal de agentes ou autoridades. A objetividade no atendimento do interesse é atributo do princípio do interesse público dos atos administrativos, enquanto à vedação da promoção pessoal de agentes ou autoridades públicos respeite ao princípio da impessoalidade e ao da finalidade dos atos.

O interesse público é o relacionado à sociedade como um todo e somente ele pode ser legitimamente objetivado, vez que é o interesse que a lei consagra e entrega à incumbência do Estado como representante da sociedade.

3.9 Princípio da Eficiência.

Os princípios constitucionais que norteiam a Administração Pública foram acolhidos pela Emenda Constitucional n° 19/1998, com o acrescentamento do princípio da eficiência, pelo qual se busca reduzir os gastos públicos, acolhendo, em mais larga medida, aos princípios da economicidade e legitimidade dos gastos públicos.

Pelo princípio da eficiência, nos termos da Constituição Federal, fica o administrador público obrigado a operar como dirigente, como empresário, objetivando retirar de seus recursos que sejam disponíveis o máximo do que deles pode ser alcançado, implicando, necessariamente, na formação de um novo cenário para os gestores da coisa pública.

No entendimento de CÁRMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA[21], "não se poderia afastar princípios como este, na atividade administrativa do Estado. Sendo base do Estado, não seria pensável nele haver uma Administração Pública autoritária?.

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Sobre o autor
José Olindo Gil Barbosa

juiz de Direito, titular da Comarca de Angical do Piauí (PI), pós-graduado em Direito Processual

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARBOSA, José Olindo Gil. A lei geral do processo administrativo: Lei n° 9.784/99. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. -274, 1 out. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3242. Acesso em: 22 nov. 2024.

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