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A validade do inquérito policial militar (IPM) nos crimes dolosos contra a vida praticados por militar em serviço

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6 PODER DE INVESTIGAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

É notório que a Constituição Federal de 1988 estabelece em seu art. 144, § 4º, a competência da Polícia Civil para apuração das infrações penais e exercício das funções de Polícia Judiciária, exceto no que se refere aos crimes militares.

Todavia, essa atribuição não é exclusiva, conforme demonstra o art. 4º, parágrafo único, do Código de Processo Penal (CPP), ao dispor que a competência da Polícia Judiciária (Polícia Civil e Polícia Federal), não exclui a de outras autoridades administrativas, como a Militar e o Ministério Público.

Igualmente é notório que o art. 129, inciso I, da Constituição Federal de 1988, atribuiu ao Ministério Público a titularidade privativa para promover a ação penal pública, cabendo ainda ao Parquet exercer o controle externo da atividade policial e determinar a instauração de diligências investigatórias e inquéritos policiais, inclusive militares (art. 129, incisos VII e VIII da Carta Magna, respectivamente).

Assim, se o Ministério Público é o titular da ação penal pública e pode determinar a instauração de investigações, pode ele próprio também pode realizar a investigação criminal, com fundamento na teoria dos poderes implícitos.

Insta ressaltar que o Supremo Tribunal Federal (STF) em diversos julgados se manifestou pela possibilidade de investigação por parte do Ministério Público, notadamente no caso de crimes praticados por policiais.

Por exemplo, no Habeas Corpus nº 91.661 a Suprema Corte afirmou que o Parquet pode buscar elementos para formação de sua opinio deliciti sem que isso retire atribuições da Polícia Judiciária. In verbis:

HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. FALTA DE JUSTA CAUSA. EXISTÊNCIA DE SUPORTE PROBATÓRIO MÍNIMO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. POSSIBLIDADE DE INVESTIGAÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. DELITOS PRATICADOS POR POLICIAIS. ORDEM DENEGADA. 1. A presente impetração visa o trancamento de ação penal movida em face dos pacientes, sob a alegação de falta de justa causa e de ilicitude da denúncia por estar amparada em depoimentos colhidos pelo Ministério Público. [...] 5. É perfeitamente possível que o órgão do Ministério Público promova a colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade de determinado delito. Tal conclusão não significa retirar da Polícia Judiciária as atribuições previstas constitucionalmente, mas apenas harmonizar as normas constitucionais (arts. 129 e 144) de modo a compatibilizá-las para permitir não apenas a correta e regular apuração dos fatos supostamente delituosos, mas também a formação da opinio delicti. 6. O art. 129, inciso I, da Constituição Federal, atribui ao parquet a privatividade na promoção da ação penal pública. Do seu turno, o Código de Processo Penal estabelece que o inquérito policial é dispensável, já que o Ministério Público pode embasar seu pedido em peças de informação que concretizem justa causa para a denúncia. 7. Ora, é princípio basilar da hermenêutica constitucional o dos "poderes implícitos", segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios. Se a atividade fim - promoção da ação penal pública - foi outorgada ao parquet em foro de privatividade, não se concebe como não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que "peças de informação" embasem a denúncia. 8. Cabe ressaltar, que, no presente caso, os delitos descritos na denúncia teriam sido praticados por policiais, o que, também, justifica a colheita dos depoimentos das vítimas pelo Ministério Público. 9. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus. (grifo nosso)

Aliás, é de se realçar que recentemente, no ano de 2013, foi rejeitada no Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 37/2011 que atribuía exclusividade à Polícia Civil e à Polícia Federal para exercerem a apuração de infrações penais, restringido a atuação do Ministério Público, após grande rejeição popular ao projeto, ocasião em que ocorreram diversos protestos e passeatas por todo o país.

Essa atribuição investigativa do Ministério Público reforça a argumentação de que a atividade investigativa não é exclusiva das Polícias Civil e Federal, mas que pode ser exercida pelas Corporações Militares na elucidação dos crimes militares, por meio de Inquérito Policial Militar (IPM).


7 SUGESTÃO PARA RESOLUÇÃO DO PROBLEMA

Percebe-se que está muito bem fundamentada a constitucionalidade e a legalidade da apuração de crimes dolosos contra a vida praticados por Militar em serviço contra vítima civil realizada por meio de Inquérito Policial Militar (IPM).

Todavia, seria pouco viável a sustentação de que os crimes dolosos contra a vida praticados por Militar contra vítima civil sejam investigados exclusivamente por parte da Polícia Judiciária Militar.

Por outro lado, o Militar não pode ser submetido a dois processos investigativos pelo mesmo fato, conforme já explanado.

Assim, a abertura de 02 Inquéritos (um pela Polícia Civil e outra pela Corporação Militar) deve ser uma exceção, e não a regra, como ocorre atualmente.

Somente no caso da inércia ou da comprovada ineficiência e parcialidade da Polícia Judiciária Militar deve a Polícia Civil ser acionada, a qual deve atuar apenas de forma subsidiária.

Sucede que atualmente a Polícia Civil, em regra, sempre instaura um Inquérito Policial para apuração de delitos dolosos contra a vida praticados por Militar em serviço contra vítima civil, mesmo que o Inquérito Policial Militar esteja com seu andamento regular, o que faz com que o Militar envolvido seja obrigado a prestar informações em dois procedimentos administrativos para apuração do mesmo fato.

O correto seria que a atuação da Polícia Civil somente fosse deflagrada na hipótese de inércia, parcialidade ou ineficácia da autoridade Militar.

Para isso, a atuação da Polícia Judiciária deveria ser requerida pelo Ministério Público, o qual possui como função institucional o controle externo da atividade policial, podendo requisitar novas diligências à autoridade Militar ou requerer a instauração de Inquérito Policial à Polícia Civil, nos termos do art. 129, VII e VIII, da Constituição Federal de 1988, respectivamente.

Desta forma, ousa-se sugerir uma possível solução para o impasse: que o Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.164, pendente de julgamento, faça a edição de súmula vinculante, nos termos do art. 103-A da Constituição Federal de 1988 e da Lei nº 11.417/2006, para padronizar a atuação da Administração Pública, especialmente, das Forças Armadas, da Polícia Federal, das Polícias Civis e das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, pacificando a controvérsia entre as Polícias, os doutrinadores e a jurisprudência.

Desta feita, o Pretório Excelso poderá esclarecer de forma definitiva se o Militar pode ou não responder a 02 Inquéritos e a quem cabe a investigação, se à Corporação Militar ou se à Polícia Civil (ou Federal).

Além disso, pode o Supremo Tribunal Federal (STF) nessa eventual súmula vinculante condicionar a investigação por parte da Polícia Civil somente na hipótese de inércia ou ineficiência comprovada da Polícia Judiciária Militar, mediante requisição do Ministério Público para instauração de Inquérito Policial.


8 CONCLUSÃO

Após a análise dos princípios do direito sobre o tema, bem como o posicionamento de alguns doutrinadores, além do estudo de algumas jurisprudências, é possível a conclusão de que a apuração de crime doloso contra a vida praticado por Militar em serviço contra civil por meio de Inquérito Policial Militar (IPM) é totalmente válida e constitucional, uma vez que a Emenda Constitucional nº 45/2004 e a Lei nº 9.299/96 apenas alteraram a competência para julgamento dos citados delitos.

A apuração deve ser realizada por meio de Inquérito Policial Militar (IPM), com a autoridade Militar encaminhando os autos à Justiça comum, caso seja constatada a ocorrência de crime doloso contra a vida de civil, conforme determina o art. 82, § 2º do Código de Processo Penal Militar (CPPM), dispositivo julgado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1494.

Insta ressaltar que a submissão do Militar a uma dupla investigação pelo mesmo fato, por meio do Inquérito Policial (IP) e do Inquérito Policial Militar (IPM), configura inequívoco bis in idem, o que é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio e por Tratados Internacionais de Direitos Humanos.

Assim, se ousa sugerir ao Supremo Tribunal Federal (STF) que no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.164, pendente de julgamento, faça a edição de súmula vinculante, nos termos do art. 103-A da Constituição Federal de 1988 e da Lei nº 11.417/2006, para padronizar a atuação da Administração Pública, especialmente, das Forças Armadas, da Polícia Federal, das Polícias Civis e das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, pacificando a controvérsia entre as Polícias, os doutrinadores e a jurisprudência.

Desta feita, o Pretório Excelso poderá esclarecer de forma definitiva se o Militar pode ou não responder a 02 Inquéritos e a quem cabe a investigação, se à Corporação Militar ou se à Polícia Civil (ou Federal).

Além disso, pode o Supremo Tribunal Federal (STF) nessa eventual súmula vinculante condicionar a investigação por parte da Polícia Civil somente na hipótese de inércia ou ineficiência comprovada da Polícia Judiciária Militar, mediante requisição do Ministério Público para instauração de Inquérito Policial.


9 REFERÊNCIAS

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BARROS, Carlos Alberto Martins de. A inconstitucionalidade da Lei 9.299, de 7 de agosto de 1996, e sua influência na Justiça Militar da União. Âmbito Jurídico, Rio Grande do Sul. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13485>. Acesso em: 31 mai. 2014.

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Sobre o autor
Robledo Moraes Peres de Almeida

Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Piauí. Foi Oficial da Polícia Militar do Espírito Santo (PMES) por 15 anos, ocupando atualmente o Posto de Capitão PM da Reserva Não Remunerada. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Graduado pela Escola de Formação de Oficiais da PMES. Pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera Uniderp/Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (LFG). Pós-graduado em Direito Público pela Universidade Anhanguera Uniderp/Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (LFG). Pós-graduado em Gestão, Educação e Segurança de Trânsito pela Faculdade Cândido Mendes. Membro Titular da Associação Colombiana de Direito Processual Constitucional. Finalista da categoria Obra Técnica do X Prêmio Denatran de Educação no Trânsito, promovido pelo Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) no ano 2010. Aprovado no Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Aprovado nos concursos públicos para os cargos de: a) Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Piauí; b) Promotor de Justiça do Ministério Público do Tocantins; c) Defensor Público da Defensoria Pública do Espírito Santo; d) Oficial de Justiça Avaliador Federal do Tribunal Regional Federal da Segunda Região (TRF-2)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Robledo Moraes Peres. A validade do inquérito policial militar (IPM) nos crimes dolosos contra a vida praticados por militar em serviço. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4114, 6 out. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/32588. Acesso em: 22 dez. 2024.

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