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Moeda falsa e outros crimes

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20/04/2015 às 14:28
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IX – PETRECHOS PARA FALSIFICAÇÃO

Art. 291 - Fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.

A objetividade jurídica envolve o exame da fé pública com relação à autenticidade da moeda. Aqui os fatos que são incriminados envolvem o perigo de falsificação, onde se criminalizam atos preparatórios dos crimes de falsificação da moeda.

Sujeito ativo é qualquer pessoa e o sujeito passivo é a coletividade, o Estado pelo risco que oferece à fé pública e a possibilidade de falsificação da moeda pelo sujeito que vem a fabricar,  guardar os petrechos.

São condutas típicas:

  1. Fabricar: produzir, manufaturar, construir, criar, montar;
  2. Adquirir: obter de qualquer forma, seja de proveniência licita ou não;
  3. Fornecer: entregar, proporcionar, abastecer, doar, vender;
  4. Possuir: ter um bem ou a posse material da coisa;
  5. Guardar: ter consigo, a sua disposição, conservar, proteger coisa de outrem.

O objeto material é o petrecho para a fabricação da moeda, envolvendo: maquinismo (conjunto de peças ou mesmo uma maquina), aparelho (conjunto de mecanismos, engenho, utensílio para uso), instrumento (objeto mais simples que o aparelho e que serve de agente mecânico para execução de qualquer trabalho). Num item estão: placas, moldes, cunhos, clichês, lâminas, modelos, fotografias e mecanismos, matérias-primas, reativos, todos destinados à fabricação da moeda, desde que seja inequívoco o destino do maquinismo, aparelho ou instrumento que seja destinado à esse serviço, não deixando de existir o crime “se os objetos adquiridos ou detidos são autênticos ou tenham sido subtraídos de repartição pública incumbida do fabrico da moeda”, como ensinou Nelson Hungria (obra citada, pág. 231).

Exige-se o dolo genérico como elemento subjetivo do tipo.

Nos casos de posse ou guarda o crime é permanente. É possível a tentativa em qualquer das condutas.

Se o agente praticar duas condutas (fabricar e fornecer) o crime é único, uma vez se tratando do mesmo objeto material, pois haverá concurso se se tratar de coisas diversas. Mas se falsificar o agente a  a moeda falsa responde pelo crime do artigo 289 do CP, ficando o outro crime absorvido pelo mais grave.

A competência para instruir e julgar o crime, tendo em vista o interesse da União Federal, é da Justiça Federal.


X – EMISSÃO DE TITULO AO PORTADOR SEM PERMISSÃO LEGAL

Art. 292 - Emitir, sem permissão legal, nota, bilhete, ficha, vale ou título que contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Trata-se de crime de menor potencial ofensivo, permitindo a concessão do benefício da transação penal, previsto no artigo 76 da Lei 9.099/95.

A incriminação surgiu com o Decreto 117 – A, de 15 de setembro de 1893, que foi reproduzida pelo artigo 404 da chamada Consolidação das Leis Penais.

A objetividade jurídica é a fé pública.

Sujeito ativo é aquele que emite o título ao portador, sem permissão legal, sabendo-se que a emissão compreende dois atos: subscritar e depois emitir. Em regra o que subscrita, ao preencher os dizeres do titulo, é aquele que o emite. Mas poderá haver hipótese de duas pessoas diversas, uma a subscritar e outra a emitir propriamente, respondendo ambas pelo crime, se cientes de que a  conduta se fazia sem permissão legal. Mas se um deles tivesse, todavia, intenção de conservar o titulo, guardando-o sem introduzi-lo na circulação, somente o outro responderá pelo crime, com concluiu Paulo José da Costa (obra citada, pág. 354).

A conduta em discussão no tipo envolve emitir título ao portador.

Ensina-nos Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de direito civil, volume III, 1975, Rio de Janeiro, Forense, pág. 487) que título ao portador é aquele que traduz a obrigação de prestar, e é dirigido a um credor anônimo. Trata-se de um setor ponderável da vida econômica, razão pela qual a matéria foi tratada pelo Código Penal. O legislador italiano, Código Civil de 1942, elaborou uma dogmática unitária, em decorrência natural da unificação do direito obrigacional. Sabido é que o traço fundamental do titulo ao portador é a exigibilidade da prestação por qualquer pessoa que o detenha, salvo o caso de desapossamento injusto, em que o devedor será judicialmente intimado a que não pague o capital ou o interesse. Não é mero instrumento probatório, porém documento constitutivo da obrigação, como não é o simples reconhecimento de uma dívida, mas um título obrigatório em si mesmo. Ainda da lição de Caio Mário da Silva Pereira (obra citada, pág. 489), tem-se  como corolários desse princípio: que ela se transmite por simples tradição manual, sem declaração do favorecido originário, e sem qualquer comum comunicação ou notificação ao subscritor ou emissor; que o emitente libera-se pagando a qualquer detentor, ainda que não autorizado a dele dispor, e mesmo que tenha sido o título posto em circulação contra a vontade do devedor; que o emissor não pode opor a quem lhe reclama a solutio qualquer defesa senão a que se baseia na ineficácia do próprio título, ou em direito pessoal oponível ao portador, dispensando este de justificar o seu direito, salvo se estiver de má-fé, mas, como se não presume esta, deverá ser provada, como no caso de apropriação indébita ou furto do titulo; o devedor não é obrigado a pagar senão contra a entrega do próprio título; extraviado ou destruído este, deverá ser promovida a sua nulidade pela via regular, processualmente, à luz do Código de Processo Civil.

A posição doutrinária é de que títulos como letras de câmbio, cheques, notas promissórias, poderão ser livremente emitidos sem atentarem contra o dispositivo exposto. Ainda não se configura o tipo penal se há emissão de vales íntimos, começo de prova por escrito, e ainda os chamados vales de caixa, usados para comprovar uma retirada de dinheiro, adiantamento ou mesmo empréstimo rápido, que não se destinam a circulação indiscriminada.

O titulo ao portador se transmite por simples tradição manual, sem autorização especial de quem primeiro  o tenha aceito, sem endosso, por isso mesmo o subscritor é obrigado não em relação a um credor determinado, mas em relação ao portador, seja quem for, como ensinou Clóvis Beviláqua (Direito das obrigações, 1945, pág. 194).

Sendo assim o objeto material do crime é a nota, bilhete, ficha, vale ou titulo contendo promessa de pagamento em dinheiro ao portador. Trata-se de norma penal em branco.

Consuma-se o crime quando o titulo ao portador é introduzido na circulação, ou seja, quando o agente o entrega ou o envia ao tomador.

O elemento subjetivo do tipo é o dolo genérico.


XI -         AQUISIÇÃO OU USO DE TITULO NÃO PERMITIDO

Parágrafo único - Quem recebe ou utiliza como dinheiro qualquer dos documentos referidos neste artigo incorre na pena de detenção, de quinze dias a três meses, ou multa.

O parágrafo único do artigo 292 do CP incrimina a conduta do tomador do titulo, daquele que o recebe, ou quem utiliza o mesmo como dinheiro.

O tipo penal requer o dolo, sempre que o agente tem ciência de que não há permissão legal para a circulação do titulo. Quando o tomador estiver de boa-fé, não há dolo na aquisição do título irregular. Para Mirabete (obra citada, pág. 195), será responsabilizado, porém, se, após tomar conhecimento da ilegalidade, utilizar o titulo, ao transferir ou caucionar.


XII – CRIMES ESPECIAIS

A legislação extravagante, Lei nº 7.492/86, em seus artigos 2º, 7º e 16º apresenta tipos penais envolvendo crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, aplicando-se o princípio da especialidade,  senão vejamos:

Art. 2º Imprimir, reproduzir ou, de qualquer modo, fabricar ou pôr em circulação, sem autorização escrita da sociedade emissora, certificado, cautela ou outro documento representativo de título ou valor mobiliário:

        Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.

Art. 7º Emitir, oferecer ou negociar, de qualquer modo, títulos ou valores mobiliários:

        I - falsos ou falsificados;

        II - sem registro prévio de emissão junto à autoridade competente, em condições divergentes das constantes do registro ou irregularmente registrados;

        III - sem lastro ou garantia suficientes, nos termos da legislação;

        IV - sem autorização prévia da autoridade competente, quando legalmente exigida:

        Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.

Art. 16. Fazer operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração (Vetado) falsa, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio:

        Pena - Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Voltemo-nos para o crime do artigo 2º da Lei nº  7.492/86.

O tipo penal  em discussão incrimina a impressão, a reprodução ou a fabricação de qualquer documento representativo de titulo ou valor mobiliário. Da mesma forma, pune-se igualmente aquele que colocar ou puser em circulação o documento ilegítimo, produzido por outrem.

Sujeito ativo é o proprietário da gráfica que imprimir bem como aquele que puser em circulação os títulos referidos no artigo. O sujeito passivo são os investidores, prejudicados com o titulo ilegítimo, bem como o Estado, lesado com essa conduta ilícita.

O fabrico far-se-á com a impressão, reprodução ou por qualquer outro modo similar de que venha o agente a servir-se.

Poderão ser utilizados além da reprodução, processos reprográficos, fotográficos ou outros similares.

O delito é material e instantâneo, podendo haver hipótese de tentativa.

O artigo 7º da Lei 7.492/86 apresenta um crime material que tem iter criminis fracionável, possibilitando a tentativa.

Assim se apresenta o tipo penal em discussão.

Já com a edição da Lei nº  4.728/1965, com a redação dada ao artigo 74,  tinha-se que ¨quem colocar no mercado ações de sociedade anônima ou cautelas que a representem, falsas ou falsificadas, responderá por delito de ação penal pública e será punido com penas de 1 (um) a 4 (quatro) anos de reclusão.”

Por sua vez, em seu parágrafo único, do mesmo artigo 74, tem-se que ¨incorrerá nas penas previstas naquele artigo quem falsificar ou concorrer para a falsificação ou uso indevido de assinatura autenticada mediante chancela mecânica.”

Da leitura do  artigo 72, da chamada lei que disciplinou o mercado de capitais, se tem que ¨ninguém poderá gravar ou produzir clichês, compor tipograficamente, imprimir, fazer, reproduzir ou fabricar de qualquer forma, papéis representativos, de ações ou cautelas, que os representem ou títulos negociáveis de sociedades sem autorização escrita e assinada pelos respectivos representantes legais, na quantidade autorizada”.

O artigo 73 da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, determina que ¨ninguém poderá fazer, imprimir ou fabricar ações de sociedades anônimas, ou cautelas que as representem, sem autorização escrita e assinada pela respectiva representação legal da sociedade, com firmas reconhecidas.¨

Por sinal, a teor do artigo 3º, incisos V e VIII da Lei nº  4.728/1965, compete ao Banco Central “ registrar títulos e valores mobiliários para efeito de sua negociação nas Bolsas de Valores¨e fiscalizar a observância das normas legais e regulamentares relativas à emissão, ao lançamento, à subscrição e à distribuição de títulos ou valores mobiliários colocados no mercado de capitais.”

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As ações (menor fração do capital social de uma empresa), como lecionou J. C. Sampaio de Lacerda (Manual das sociedades por ações, Suplemento, Biblioteca Jurídica Freitas Bastos, pág. 9), no regime da Lei 6.404/19976, podiam ser: com valor nominal ou sem valor nominal. Disse ele que ¨as chamadas ações sem valor nominal, a que se refere o projeto de lei sobre a sociedades por ações, não constituem novidade, uma vez que existem há muito na Bélgica nos Estados Unidos, no Canadá e no Liechtenstein”. O valor nominal de sua ação retrata uma parcela do capital social, parcela esta que constitui a contribuição do acionista na formação daquele capital. O valor nominal não se confunde com o valor da emissão. Já as ações sem valor nominal são ações sem menção de valor, porque tais ações têm, verdadeiramente, certo valor, apenas não sendo nelas mencionadas o valor  expresso em dinheiro, como acontece com as ações com valor nominal, como disse o Professor Sampaio Lacerda (artigo no Jornal do Comércio, 6 de outubro de 1976).

O crime previsto no artigo 7º da Lei dos crimes do  Colarinho Branco  é comum, uma vez que o sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa que não tem legitimidade para emitir, oferecer ou negociar o valor mobiliário, nas condições que a lei determina. Poderá ainda ser diretor, gerente, da instituição financeira, corretor ou preposto. Trata-se de um tipo aberto.

Trata-se de crime de ação múltipla: emitir, oferecer ou negociar titulo falso, sem registro, sem lastro ou sem autorização.

Título falso é o inteiramente fabricado, imitando o verdadeiro.  Título ou valor falsificado é documento verdadeiro que sofre alteração em sua essência ou forma. Por sua vez, a falsificação grosseira, perceptível por qualquer um, não faria incidir a hipótese de tal  crime, como revelam Paulo José da Costa Jr., M. Elisabeth Queijo, Charles M. Machado (Crimes do colarinho branco, São Paulo, Saraiva, 2000, pág. 91). De sorte que  faz-se mister prova pericial para identificação da falsidade.

Documento, como conceitua Júlio Fabbrini Mirabete (Manual de direito penal, volume III, 22ª edição, Atlas, pág. 212) é toda peça escrita que condense graficamente o pensamento de alguém, podendo provar um fato ou a realização de algum ato dotado de significação ou relevância jurídica. O escrito deve ser feito a mão ou por meio mecânico ou químico de reprodução de caracteres. Mas, inexiste a falsificação de documento se trata-se de simples reproduções fotográficas (xerocópias) não autenticadas que não se conceituam como documentos (RTJ 108/156). Mas, é essencial que o documento possa apresentar relevância no plano jurídico, gerando consequências no plano jurídico (RTJ 616/295). Nelson Hungria conceitua o documento como “ todo escrito especialmente destinado a servir ou eventualmente utilizável como meio de prova de fato juridicamente relevante”.

O documento, via de regra, é um papel escrito. Mas nem todo papel escrito é um documento, pois nem  todo papel tem força probante.

De toda sorte, a veracidade probatória é a objetividade jurídica desses crimes em estudo.

São requisitos do documento:

  1. Forma escrita, redigidos em língua nacional, seja a mão ou a máquina;
  2. Determinação da autoria;
  3. Conteúdo (uma manifestação de vontade, uma exposição dos fatos);
  4. Relevância jurídica

Há a falsidade material e a falsidade ideológica. Na falsidade material, o documento é falsificado  em sua essência (material). Na falsidade ideológica (intelectual), o documento é falsificado em sua substância, ou seja, em seu conteúdo ideal. 

Falsificar significa criar materialmente, fabricar, formar, contrafazer. O agente elabora, forja o escrito integralmente ou acrescenta algo a um escrito, inserindo dizeres em espaço em branco. Por sua vez, ao alterar o documento verdadeiro o sujeito ativo exclui termos, acrescenta dizeres, substitui palavras. Nos exemplos de alteração, o papel,   sobre o qual o agente trabalha, no seu mister criminoso, preexiste à sua ação e constitui documento verdadeiro, sendo objeto do agente emprestar-lhe aspecto ou sentido diferente daquele com que nasceu e, quando se trata de falsificação, o documento nasce como fruto do trabalho do agente cujo desiderato reside em dar existência a um documento fictício, como disse Sylvio do Amaral (Falsidade documental, 2ª edição, São Paulo, 1978, pág. 49 e 50). 

Manzini (obra citada, pág. 763) situava a distinção nas duas acepções que a palavra, expressão, falsidade assume: não genuína e não verdadeira. Verifica-se a falsidade material quando o documento não é genuíno. Apresenta-se a falsidade ideológica quando o documento, apesar de ser genuíno, não é verdadeiro. Na falsidade ideológica, tem-se, por exemplo, quando  alguém se declara presente ao ato, quando, na verdade, estava ausente. 

Quando um documento é genuíno? Quando o autor aparente seja o autor efetivo e quando o documento não tenha sofrido alterações.

Ora, alterações são as modificações de qualquer espécie (rasuras, acréscimos) que se imprimem ao documento autêntico, após achar-se ele definitivamente formado.

A falsidade material, que elimina a genuinidade do documento, poderá apresenta-se  como contrafação,  quando o documento, redigido por seu verdadeiro autor, padecer as modificações já referenciadas. 

Assim se o documento não for contrafeito nem alterado é genuíno. Se, embora genuíno, contiver declaração não correspondente á verdade, a falsidade será tida como ideológica.

A falsa genuinidade (autenticidade) está para a falsidade material, assim como a falsa veracidade está para a falsidade ideológica. Isso porque a falsidade material diz respeito à autoria, à data e ao local da formação do documento. A falsidade ideológica recai sobre aquilo que vem atestado no documento. A falsidade material agride a genuinidade do documento, que não é do autor real, mas aparente. Já a falsidade ideológica recai sobre a veracidade do documento, isto é, sobre o fato de este conter afirmações inverídicas.

Fala-se que as ações de sociedade comercial, dentre outros documentos, são equiparados a documentos públicos (artigo 297, § 2º do Código Penal ), dada a sua relevância nas relações entre as pessoas ou entre estas e o Estado, razão pela qual têm essa proteção.

Trata-se de um tipo doloso,  aberto, que consiste em   emitir, oferecer ou negociar  títulos ou valores mobiliários sem registro prévio de emissão junto à autoridade competente. Assim o agente deve ter consciência da falsidade, da falta de registro e da ausência de lastro ou garantia, da falta de autorização. 

Emitir é formar o documento.

Oferecer é apresentar para venda, dação ou cessão o título ou valor mobiliário.

Negociar é fazer transação comercial do título ou valor mobiliário.

Não restam dúvidas de que títulos ou valores mobiliários são objetos materiais do crime previsto no artigo 7º da Lei do Colarinho Branco.

A Lei nº  6.385, de 7 de dezembro de 1976, declarou quais os títulos que podem ser considerados como valores mobiliários e iniciou a relação, justamente, pelas ações de companhias (artigo 2º).

Estudando a matéria, Fábio Konder Comparato (Novos ensaios e pareceres de direito empresarial, Forense, pág. 17 e seguintes) faz distinção entre titulo de crédito e ainda os chamados valores mobiliários.

Disse o eminente jurista:

¨Sob o aspecto estrutural, o titulo de crédito é, sempre, um documento e esse seu indefectível substrato material determina um regime jurídico muito especial, notadamente em matéria de posse ou de literalidade das obrigações nele mencionadas (o chamado “direito cartular”). Já quanto aos valores mobiliários, o substrato documental não é indispensável: neles, nem sempre o titulo se exprime sub a forma de um documento ou papel circulante. Assim, os certificados de ações são emitidos só são emitidos depois de cumpridas as formalidades necessárias ao funcionamento legal da companhia, e as ações cujas entradas não consistirem em dinheiro somente terão emitidos os certificados respectivos depois de cumpridas as formalidades necessárias à transmissão de bens ou de realizados os créditos (Lei 6.404, art. 23). Por outro lado, as ações nominativas integralizadas conferem ao seu titular todos os direitos societários, ainda que não emitido o certificado correspondente,  pois a legitimação para o exercício desses direitos decorre, exclusivamente, da inscrição do titulo no livro de registro competente.”

Prossegue o eminente jurista  informando que  uma distinção estrutural entre os valores mobiliários e os títulos de crédito  decorre do fato de que os primeiros são sempre emitidos em série ou em massa, enquanto que os segundos comportam uma individualidade marcante.

Os valores mobiliários apresentam-se mais como res do que como créditos. São mercadorias. Os títulos de credito são instrumentos de pagamento ou de prestação, no sentido obrigacional, enquanto os segundos se apresentam como títulos de investimento ou de exercício de poder de controle empresarial. Em sendo assim, o regime protetor da circulação dos valores mobiliários será fundado na posse e na organização de um mercado público para esses títulos.

Os valores mobiliários, ademais, estão sujeitos a uma fungibilidade, que é ausente nos títulos de crédito. Uma fungibilidade que será jurídica, que se assenta na falta de individualização da coisa, que se distancia da fungibilidade econômica que se apresenta na equivalência do valor e das funções.

A interpretação que se tem do artigo 2º da Lei nº  6.385/76 nos leva a crer  que são considerados valores mobiliários os seguintes papéis: ações, bônus de subscrição, bônus do Banco Central, Certificado de Depósito a Médio ou Longo Prazo, Certificado de Depósito Bancário, Certificado de Privatização, Cédula Pignoratícia de Debêntures, Debêntures, Depósito interfinanceiro, Letra de Câmbio, Letra do Banco Central; Letra do Tesouro, Letras Financeiras dos Tesouros do Estados e Municípios, Letras do Tesouro Nacional, Letra hipotecária, Nota do Banco Central, Nota Promissória, Nota do Tesouro Nacional, obrigações da Eletrobrás, Obrigação do Fundo Nacional de Desenvolvimento, Partes Beneficiárias, Quota do Fundo Nacional de Desenvolvimento, Recibo de Depósito Bancário, Titulo da Dívida Agrária e Titulo de Desenvolvimento Econômico.

Há ainda o entendimento de que ações e debêntures (títulos de crédito representativos de empréstimo que uma companhia faz junto a terceiros e que asseguram a seus detentores direito contra a emissora nas condições constantes da escritura de emissão) são títulos representativos de capital.

Em bem lançado argumento, Nelson Hungria (razões contidas na petição inicial do HC 41.888) bem dizia que, tratando-se de um crime praticado por algum dos representantes de uma pessoa jurídica em beneficio desta, a responsabilidade não se estende automaticamente aos demais diretores.

Sobre isso Heleno Cláudio Fragoso, tratando da matéria, em Congresso realizado no Rio de Janeiro, em 1963, sob os auspícios da ¨Associação Henri Capitant¨, disse que os administradores das sociedades comerciais devem responder civil e criminalmente pelas infrações que nessa qualidade tenham cometido, mas que tal responsabilidade deve basear-se nos princípios de Direito Comum, não se podendo admitir a existência de vestígios de responsabilidade objetiva que não se coadunam com o direito moderno.

Por fim, discute-se  o artigo 16 da Lei de Crimes do Colarinho Branco, cuja conduta  já era prevista no artigo 44 da Lei nº 4.595/64.

 O certo é que compete privativamente ao Banco Central conceder autorização às instituições financeiras a fim de que possam funcionar no País, instalar ou transferir suas sedes ou dependências, inclusive no exterior, ser transformadas, fundidas, incorporadas ou encampadas e ter prorrogados os prazos para funcionamento (artigo 10, X, da Lei n 4.595/64).

A conduta descrita é fazer operar instituição financeira, sem autorização ou com declaração falsa.

Ora, fazer operar tem o sentido de fazer funcionar, agir.

O que é instituição financeira? A resposta está no artigo 17 da Lei nº 4.595/64, quando se diz que é toda pessoa jurídica ou pessoa física que tenha como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira e a custódia de valor de propriedade de terceiros. Assim a instituição financeira explora dinheiro como mercadoria, por meio de especulação no mercado financeiro.

A instituição financeira tem como atividade a coleta, a intermediação ou aplicação de recursos financeiros em moeda, próprios ou de terceiros, com ou a custódia de valor pertencente a terceiros. Para tanto, deve ser autorizada pelo Banco Central.

O crime é habitual, pois as atividades de intermediação ou aplicação de dinheiro exigem uma reiteração.

O crime é doloso, exigindo-se, como afirmam Paulo José da Costa Jr., M. Elisabeth Queijo, Charles M. Machado (Crimes do colarinho branco, São Paulo, Saraiva, 2000, pág. 114) o dolo específico, consistente no fim especial do agente de obter lucro, sabendo que a instituição não foi autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil. 

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Moeda falsa e outros crimes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4310, 20 abr. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/32719. Acesso em: 24 nov. 2024.

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