Introdução
Este trabalho tem o condão de esclarecer, alertar o consumidor, em específico, o adquirente de imóvel, sobre as cláusulas abusivas que estão alocadas nos contratos de promessa de compra e venda feitos pelas incorporadoras e construtoras. Neste diapasão, num primeiro momento se fará a abordagem das cláusulas abusivas e suas características elencadas no Código de Defesa do Consumidor. Num segundo momento será feito comentários sobre algumas cláusulas contratuais abusivas recorrentes nos contratos de promessa de compra e venda no Maranhão e os princípios do Código de Defesa do Consumidor violados por estas.
Antes de se adentrar ao cerne da questão, se faz mister, tecer breves comentários sobre as cláusulas abusivas. As cláusulas abusivas são o tema de grande relevo no Brasil, posto que se analisarmos vários contratos de promessa de compra e venda de imóvel, é muito difícil não se vislumbrar uma ou várias cláusulas abusivas, exatamente por isto é que o Código de Defesa do Consumidor, lei 8.078 de 1990, de forma expressa elencou a proibição de cláusulas abusivas, nessas banda o diploma 6º, inciso IV do CDC, prescreve: “A proteção contra a publicidade enganosa e a abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços”.
Nessa linha de pensamento os diplomas 51 a 53 do Código de Defesa do Consumidor, aduzem:
Das Cláusulas Abusivas
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;
II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código;
III - transfiram responsabilidades a terceiros;
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;
V - (Vetado);
VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor;
VII - determinem a utilização compulsória de arbitragem;
VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor;
IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor;
X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;
XI - autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor;
XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor;
XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração;
XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais;
XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;
XVI - possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias.
§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.
§ 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes.
§ 3° (Vetado).
§ 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes.
Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:
I - preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;
II - montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros;
III - acréscimos legalmente previstos;
IV - número e periodicidade das prestações;
V - soma total a pagar, com e sem financiamento.
§ 1° As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigação no seu termo não poderão ser superiores a dez por cento do valor da prestação.
§ 1° As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação. (Redação dada pela Lei nº 9.298, de 1º.8.1996)
§ 2º É assegurado ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos.
§ 3º (Vetado).
Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.
§ 1° (Vetado).
§ 2º Nos contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terá descontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao grupo.
§ 3° Os contratos de que trata o caput deste artigo serão expressos em moeda corrente nacional.
O primeiro ponto a ser esclarecido é sobre a nulidade das cláusulas abusivas, o porquê que estas são nulas de pleno direito? É interessante trazer à baila que as cláusulas abusivas são tidas como nulas porque oneram demasiadamente uma parte em detrimento da outra, desequilibram o contrato, lesam os direitos dos consumidores estampados no CDC, violam o princípio da legalidade, no caso em estudo da compra e venda de imóveis nesta capital, uma parte das cláusulas narradas nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel são nulas de pleno direito ou passíveis de contestação. De outra forma, as cláusulas abusivas são ilegais, violam tanto o Código Civil quanto o Código de Defesa do Consumidor, além da violação da nossa Carta Magna. Cabe uma observação quando o consumidor, pretenso comprador de um imóvel na planta, se dirige até o corretor de imóveis para efetivar a assinatura do contrato em tela, o corretor não explica detalhadamente as cláusulas do contrato, muito dessas cláusulas do contrato, que é praticamente o contrato de adesão, posto que pouco se discute das cláusulas entre as partes, são abusivas, ilegais, passíveis de contestação pelo promitente comprador.
Todo o rol de cláusulas abusivas acima mencionado é apenas exemplificativo, muita atenção com relação a este tema, a criatividade de quem elabora esses contratos é gigantesca, ao ponto de mascarar a abusividade das cláusulas, ou seja, pôr no contrato uma cláusula aparentemente lícita, legal, doravante quando analisa a fundo é abusiva, por isso, merece uma análise cautelosa e prudente do pretenso comprador ou de seu advogado, isto feito de preferência antes da assinatura do contrato, em caso contrário, poderá ser questionado a abusividade judicialmente.
No decorrer deste trabalho será narrado algumas cláusulas retiradas dos contratos de promessa de compra e venda de construtoras e incorporadoras nesta capital, estas tidas como nulas e passíveis de contestação ou rescisão contratual, nesta linha de pensamento serão elencadas cláusulas abusivas específicas do contrato de promessa de compra e venda do Residencial Vitória São Luís da construtora Living Panamá Empreendimento Imobiliários Ltda. No contrato em tela, em detalhe a sua cláusula 6.2.1 aduz:
“Toda(s) as parcela(s) e prestações(s) mencionada(s) na(s) alínea(s) “B e C”, do item (6.1), encontra(m) se acrescida(s) de juros de 12% (doze por cento) ao ano, calculada(s) pelo Sistema da Tabela Price, contados à partir da data prevista para o término das obras do respectivo edifício, que se caracterizará com a expedição do respectivo Auto de Conclusão (HABITE-SE).
A cláusula em questão se amolda como abusiva, por utilizar como sistema de contagem de juros, o sistema ou Tabela Price, que termos mais simples significa justamente a capitalização de juros sobre juros, ou seja, para Walter Francisco: Tabela Price é a capitalização dos juros compostos. (Matemática Financeira, São Paulo, Atlas, 1976).
A capitalização de juros sobre juros ou de juros compostos é ilegal e ilícita no Brasil, o próprio Supremo Tribunal Federal já se posicionou a despeito desta abusividade, ilicitude da Tabela Price, assim nos termos da súmula 121 do STF, descreve: “É vedada a capitalização de juros, ainda que convencionada”. Essa súmula trata exatamente da cláusula acima narrada, de outro modo, mesmo que ocorra a avença no contrato de promessa de compra e venda de imóvel de capitalização de juros está é ilegal, abusiva, ilícita. Outro grave problema é que as incorporadoras, as construtoras, os corretores de imóveis não explicam aos clientes está e outras cláusulas do contrato, assim ferindo o princípio da informação correta sobre o bem adquirido, inclusive detalhando cada parcela, cada juro, cada taxa a ser paga pelo promitente comprador, se isso não for feito é passível de rescisão contratual de plano.
Em verdade, no mais das vezes, o sistema francês é utilizado para mascarar o preço real pretendido, principalmente nos contratos de compra e venda de imóveis (Luiz Antonio Scavone Junior. Os Contratos Imobiliários e a previsão de aplicação da Tabela Price – Anatocismo. São Paulo, Revista de direito do consumidor n. 28 – Ed. Revista dos Tribunais – outubro/dezembro/1998, p. 129).
Nessa banda, cabe mencionar esses julgados dos Tribunais de Justiça, relatam:
“TJ-SP - Apelação APL 9176218802007826 SP 9176218-80.2007.8.26.0000 (TJ-SP)
Data de publicação: 07/11/2011
Ementa: EMBARGOS À EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA CONTRATO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - CAPITALIZAÇÃO IMPOSSIBILIDADE INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 121 DO STF - USO DE TABELA PRICE AFASTADO AUTORIZADO CORREÇÃO PELA TR - FORMA DE ATUALIZAÇÃO E AMORTIZAÇÃO 1 - Tratando-se de contrato firmado sob as regras do Sistema Financeiro de Habitação, é vedada a capitalização dos juros, qualquer que seja sua periodicidade;2- De acordo com recentes estudos expostos em julgados deste e de outros Tribunais, verifica-se que a evolução histórica do INPC é superior à da Taxa Referencial (TR), não sendo razoável admitir a substituição de um pelo outro justamente pelo fato de que importaria em maior oneração do consumidor.3- Aplicação da Súmula 450 do Superior Tribunal de Justiça, cujo enunciado preleciona: ?Nos contratos vinculados ao SFH, a atualização do saldo devedor antecede sua amortização pelo pagamento da prestação.?RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO afastando a incidência de juros capitalizados.
TJ-RS - Agravo de Instrumento AI 70039795737 RS (TJ-RS)
Data de publicação: 14/12/2010
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE IMÓVEL. TABELA PRICE AFASTADA. APLICAÇÃO DO SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO CRESCENTE. DESCABIMENTO. HIPÓTESE EM QUE O VALOR DA PRESTAÇÃO RESTOU MAJORADO. INCIDÊNCIA DE JUROS SIMPLES. NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO. (Agravo de Instrumento Nº 70039795737, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Otávio Augusto de Freitas Barcellos, Julgado em 03/12/2010)
TJ-RS - Agravo de Instrumento AG 70039795737 RS (TJ-RS)
Data de publicação: 14/12/2010
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE IMÓVEL. TABELA PRICE AFASTADA. APLICAÇÃO DO SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO CRESCENTE. DESCABIMENTO. HIPÓTESE EM QUE O VALOR DA PRESTAÇÃO RESTOU MAJORADO. INCIDÊNCIA DE JUROS SIMPLES. NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO. (Agravo de Instrumento Nº 70039795737, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Otávio Augusto de Freitas Barcellos, Julgado em 03/12/2010)
De forma cristalina todos os julgados acima abordados aduzem o afastamento e impossibilidade de aplicação da Tabela Price, noutras palavras por mais que esteja expressamente capitulado no contrato de promessa de compra e venda de imóvel esta Tabela é ilícita e plenamente cabível uma ação revisional ou até mesmo uma rescisão contratual por conta dessa abusividade, ilegalidade, esta cláusula fere de forma brutal o direito de informação do consumidor, causa graves danos materiais ao consumidor.
A segunda cláusula abusiva deste contrato, é na verdade um absurdo, a cláusula VIII- 2- prescreve: “O lançamento das etapas acima descritas, ocorrerão de acordo com as condições mercadológicas, por livre escolha da incorporadora e desde que tenham sido alienadas 70% (cinquenta por cento) unidades da fase anterior.
Agora note bem que na cláusula VIII-1- do mesmo contrato se observa: “A entrega das obras do Condomínio Residencial Vitória São Luís serão efetuadas em etapas distintas, sendo certo que as execuções serão totalmente desvinculadas uma da outra, e o prazo de construção de cada torre será expressamente determinado no contrato de promessa de venda e compra de cada unidade autônoma respectiva, (...) (grifo nosso)
Note bem, a contradição entre as cláusulas acima narradas, uma relata que não há vinculação entre a construção e entrega das torres, no caso 4 torres, 4 etapas da obra, e a outra simplesmente diz que só haverá o lançamento da etapa seguinte se e somente se houver condição mercadológica, por livre deliberação da incorporadora e se for vendida, alienada 70% das unidades da fase ou etapa anterior, em outros dizeres, o consumidor efetua todos os pagamentos e ainda assim pode ficar a ver navios, pode ficar sem o seu imóvel, se por acaso não for alienado o quantitativo de imóveis, unidades autônomas que a incorporadora, construtora decidiu nessa cláusula abusiva, o consumidor também ficará a mercê das condições mercadológicas do momento, é evidente que tal cláusula é nula, desproporcional, irracional, isso na verdade configura o desvio no equilíbrio do contrato, ou seja, a incorporadora simplesmente perpassa o risco da sua atividade para o consumidor, neste caso hipossuficiente e vulnerável.
Vale ainda mencionar que nos casos de contradição entre cláusulas num contrato de promessa de compra e venda de imóvel, a interpretação deve favorecer o consumidor, até porque o consumidor, neste caso, é hipossuficiente. Ademais impor condições, responsabilidades abusivas como a acima narrada é nulo de pleno direito, infelizmente cláusulas assim são de praxe no mundo imobiliário brasileiro e não ocorrem somente no Maranhão, continuam sendo utilizadas em larga escala pelas incorporadoras e construtoras por todo o Brasil.
Neste diapasão, o jurista Rizzatto Nunes leciona:
“A lei consumerista proíbe ao fornecedor IV – prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor (...) A regra inserta no inciso IV dirige-se especificamente para a situação concreta da relação existente entre fornecedor e consumidor.
E isso decorre do simples fato de que a constatação primeira da capacidade do consumidor nas relações de consumo é a de que o consumidor é vulnerável e hipossuficiente. A característica mais marcante do consumidor, como vimos, é a de que no mercado do consumo ele representa o elo fraco da relação, especialmente pelo fato de que não tem acesso às informações que compõem o processo produtivo, que gera os produtos e os serviços”. (Nunes, Luis Antonio Rizzatto. 2008)
Os consumidores nos contratos de promessa de compra de venda são hipossuficientes e vulneráveis, posto que a eles são quase que impostas as cláusulas contratuais, mas se parece um contrato de adesão, não é explicado o teor das cláusulas, boa parte delas confusas e contraditórias como acima demonstrado, chegando ao ponto de houver cláusulas obscuras e ambíguas que oneram excessivamente o consumidor o que é literalmente vedado pelo Código De Defesa do Consumidor.
Nessa linha de pensamento, vale a pena comparar duas cláusulas que são encontradas em todos os contratos de promessa de compra e venda, ambas são desproporcionais, desiguais, ilegais, são elas:
DAS PENALIDADES E DA RESCISÃO:
XIII- 1- A impontualidade do(a,s) PROMISSÁRIO(A,S) no pagamento de qualquer uma das parcelas e/ou prestações referidas neste instrumento, ou de qualquer encargo, independentemente de prévio aviso ou notificação, determinará a automática e imediata incidência de multa de 2% (dois por cento) sobre o valor corrigido “pro rata die” pelo índice de correção vigente no contrato ou outro que o substitua, além de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, contados dia a dia. (...)
DO PRAZO DE CONSTRUÇÃO
XIX-1- A conclusão das obras do CONDOMÍNIO “RESIDENCIAL VITÓRIA SÃO LUÍS” e a entrega física de suas unidades estão previstas para a data referida no item (7) do QUADRO RESUMO, com um prazo de tolerância de 180 (CENTO E OITENTA) dias, em favor do(a,s) PROMITENTE(S), ressalvados, contudo, os atrasos decorrentes de motivos de força maior, tais como guerras, greves, (...)
Ao verificar-se a primeira cláusula, está pode até parecer normal, doravante não é com exame superficial que seja o diagnóstico final de um caso, veja que na cláusula está capitaneada a expressão “qualquer encargo”, a título de exemplo os encargos calculados ou que tem incidência da Tabela Price, como já anteriormente mencionado são nulos, sequer podem ser cobrados ao consumidor, contudo, as empresas deste ramo continuam a lançar contratos de promessa de compra e venda com estas cláusulas que já foram inúmeras vezes, posição dominante na jurisprudência, decretadas como abusivas e ilegais. Ademais, ainda no que tange a primeira cláusula, será que o consumidor tem a obrigação de saber o idioma latim? Por que colocar a expressão “PRO RATA DIE” na cláusula contratual? É de bom tom relembrar que todo o seio do contrato deve ser claro, cristalino, o que não se vê neste caso, não existe razão para utilizar latim no contrato, ainda mais porque a maioria das pessoas não tem contato com o idioma latim, a maioria das pessoas não tem a técnica necessária, não são peritos em contratos desta natureza, por isso o contrato deve ser o mais claro, coerente e coeso possível.
No que toca a segunda cláusula, convém ressaltar o prazo é absurdamente desproporcional, ou seja, esta descreve que o incorporador, construtor tem uma tolerância de 180 dias após o prazo devidamente estipulado para a entrega do imóvel ao promissário, comprador. Nessa linha de raciocínio, se o promitente comprador deixar atrasar alguns dias ou um mês no pagamento das parcelas do imóvel pagará juros de mora, correção monetária, já se a construtora ou incorporadora atrasar a entrega do imóvel, entregar o imóvel após a data fixada no contrato sem a ocorrência de casos excepcionais, esta tem uma tolerância de 180 dias após o prazo de entrega efetiva, em outras palavras, a construtora pode ficar em mora com o consumidor por 180 dias, quase metade de um ano, sem pagar nada por isso, como assim? A cláusula penal só funciona para uma das partes? Essas cláusulas acima comparadas constatam o tamanho da abusividade dos contratos de promessa de compra e venda de imóvel, visto que se o comprador incorrer em mora pagará juros, correção monetária, multa de 2% já se a incorporadora incorrer em mora por até 180 dias essa não arcará com nenhum ônus, isso é um absurdo, há um desequilíbrio gigantesco nas responsabilidades entre as partes do contrato.
Em um outro contrato de promessa de compra e venda de imóvel na planta no Maranhão, a incorporadora SPE LAKE SIDE CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÃO LTDA, também se utiliza de uma cláusula de tolerância semelhante, logo abusiva, e isso se repete em outros contratos de outras incorporadoras ou construtoras nesta capital. Neste diapasão, a contrato de compra e venda de uma unidade autônoma do edifício Lake Side, cláusula quinta, prescreve:
“DAS OBRIGAÇÕES DA PROMITENTE VENDEDORA
CLÁUSULA QUINTA- A PROMITENTE VENDEDORA obriga-se a entregar a unidade ora prometida à venda, no prazo previsto de 24 (vinte e quatro) meses, sendo admitida tolerância de 180 (cento e oitenta) dias úteis, contados do dia da sua expiração (...)”.
Observe que nessa cláusula o prazo de tolerância é ainda maior, 180 dias úteis, ou seja isso configura quase sete meses, é aviltante, o tamanho do desrespeito ao consumidor, posto que se o consumidor atrasar um dia no pagamento das parcelas, incorrerá no pagamento de multa, juros e etc, enquanto a construtora inadimplente não arca com seu ônus.
DOS PRINCÍPIOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Nesta banda, cabe o comentário de alguns princípios do Código de Defesa do Consumidor que são flagrantemente violados pelas cláusulas abusivas já abordadas. Pode-se apontar alguns importantes preceitos, a título de exemplo: o princípio da boa-fé ou simplesmente boa-fé objetiva; o princípio da transparência; princípio do dever de informar; dentre outros.
O jurista Rizzatto Nunes, sobre a temática, aduz:
“Já a boa-fé objetiva, que é a que está presente no CDC, pode ser definida, grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo. Não o equilíbrio econômico, como pretendem alguns, mas o equilíbrio das posições contratuais, uma vez que, dentro do complexo de direitos e deveres das partes, em matéria de consumo, regra geral, há um desequilíbrio de forças. Entretanto, para chegar a um equilíbrio real, somente com a análise global do contrato, de uma cláusula em relação às demais, pois o que pode ser abusivo ou exagerado para um não o será para outro.
A boa-fé objetiva funciona, então, como um modelo, standard, que não depende de forma alguma da verificação de má-fé subjetiva do fornecedor ou mesmo do consumidor.
Deste modo, quando se fala em boa-fé objetiva, pensa-se em comportamento fiel, leal, na atuação de cada uma das partes contratantes a fim de garantir respeito à outra”. (Nunes. 2008)
Diante a expertise do jurista, cabe salientar que as incorporadoras nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel, não cumprem com o macroprincípio da boa-fé, é cristalino que as cláusulas já mencionadas violam de plano a boa-fé objetiva, noutros dizeres, fazer um contrato que lesa a lealdade, a honestidade, o respeito entre as partes é abuso de direito e logo merece ser rechaçado. Além disso, esses contratos causam significativas lesões ao consumidor, principalmente de ordem financeira, posto que na maioria das vezes impões cláusulas penais somente para os consumidores e não fixam punições para o incorporador ou construtor. Em conclusão, ambas as partes devem agir de boa-fé, essa é presunção relativa, note bem que na comparação entre as cláusulas se percebe uma desproporção, um desequilíbrio gigante entre as obrigações, ônus das partes contratantes.
Vale a pena lembrar, a boa-fé objetiva deve ser respeitada em todas as fases do contrato, assim sendo, as partes devem agir de boa-fé na fases: pré- contratual, no decorrer do contrato e após o contrato, ou seja, boa-fé pós-contratual, ou seja, os contratantes devem agir de boa-fé, antes, durante e após o término do contrato.
Outros importantes princípios violados por essas nefastas cláusulas são o do dever de informar e o da transparência, neste diapasão vale a pena mencionar as palavras do ilustre Rizzatto Nunes, sobre os princípios, leciona:
“(...) Com efeito, na sistemática implantada pelo CDC, o fornecedor está obrigado a prestar todas as informações acerca do produto e do serviço, suas características, qualidades, riscos, preços etc., de maneira clara e precisa, não se admitindo falhas ou omissões.
Trata-se de um dever exigido mesmo antes do início de qualquer relação. A informação passou a ser componente necessário do produto e do serviço, que não podem ser oferecidos no mercado sem ela.
O princípio da transparência, como vimos, está já previsto no caput do art. 4º, e traduz a obrigação do fornecedor dar ao consumidor a oportunidade de tomar conhecimento do conteúdo do contrato que está sendo apresentado.
Assim, da soma dos princípios, compostos de dois deveres – o da transparência e o da informação -, fica estabelecida a obrigação de o fornecedor dar cabal informação sobre seus produtos e serviços oferecidos e colocados no mercado, bem como das cláusulas contratuais por ele estipuladas”. (Nunes. 2008)
Neste contexto, cabe ao incorporador, construtor, fornecedor, explicitar de forma clara, cristalina, exata tudo relativo ao produto, bem imóvel que está colocando à venda no mercado, ou seja, deve ser obrigatoriamente descrito pelo fornecedor o preço, preço à vista, preço a prazo, incluindo o parcelamento e o quantitativo de juros pagos do montante como do juros a ser pago pelo consumidor em cada parcela, neste diapasão, o construtor deve mostrar de forma fácil, acessível ao consumidor tudo que este último arcará para adquirir seu imóvel. Outro reflexo de suma importância desses princípios, é o dever do construtor de explanar de forma tranquila e fácil todas as cláusulas, principalmente se houver ambiguidade ou omissão em algumas delas. Caso não ocorra a explicação desta forma, ou ocorra uma explicação falaciosa, ludibriante ao consumidor o fornecedor deverá ser responsabilizado.
Ainda sobre o comentário do jurista, é imperioso falar que o dever de informação também abarca quais os materiais serão usados na feitura do imóvel? Qual a qualidade deles? Neste sentido, é importante que o consumidor fique esclarecido quanto a isto, posto que no cotidiano se vislumbra vários e vários descumprimentos contratuais no que tange ao acabamento do imóvel comprado na planta, ou seja, a construtora faz uma propaganda de acabamento com um material X e entrega ao final um material Y de menor qualidade ou sequer entrega, isso configura lesão ao consumidor, propaganda enganosa e fere todo o sistema de proteção ao consumidor elencado no CDC.
Além de tudo o exposto, é importante acrescentar que o consumidor não pode assumir riscos da atividade empresarial, no caso em tela, o incorporador não pode cobrar do consumidor o risco da sua atividade, assim sendo, não pode haver cláusulas contratuais que limitem a responsabilidade civil do incorporador, isto vai de contramão à legislação atualmente vigente e não pode a empresa incorporadora ou construtora repassar ônus excessivo ao consumidor, infelizmente isto vem acontecendo com frequência nos empreendimentos em São Luís e no Maranhão como um todo, não somente com a incorporadora Living Panamá Empreendimentos, e não somente com os contratos da incorporadora Spe Lake Side Construção e incorporação Ltda, essas cláusulas abusivas são usadas nos contratos de praticamente todas as incorporadoras e construtoras.
Nessa linha de pensamento, os órgãos públicos de proteção dos direitos do consumidor, devem atuar de modo efetivo, inclusive preventivamente, realizando campanhas, informando ao consumidor dos seus direitos, ou seja, ainda temos uma atuação diminuta nesta seara dos Procons, da Promotoria do consumidor, de outros órgãos de proteção dos direitos do consumidor. Portanto, caro consumidor antes de assinar um contrato de promessa de compra e venda de imóvel vale a pena buscar consultoria de advogados ou buscar consultoria em outros órgãos de defesa dos direitos do consumidor.
CONCLUSÃO
Diante de toda a argumentação narrada sobre a existência de cláusulas abusivas nos contratos de promessa de compra e venda de imóveis no Maranhão, não resta dúvida que além de existirem são largamente utilizadas nesses contratos e se o consumidor não estiver atento arcará com um ónus excessivo e logo a empresa incorporadora cometerá enriquecimento sem causa. Vale lembrar que todas as cláusulas abordadas no trabalho já foram declaradas como abusivas pelos tribunais de justiça, inclusive pelas jurisprudências pacíficas elencadas, então não deve cumprir regras contratuais ilegais, posto que estas ferem o direito do consumidor, no caso promitente comprador do imóvel, violam todo o sistema de proteção dos direitos do consumidor criados pelo Código de Defesa do Consumidor, assim como a própria Magna Carta brasileira. Por fim, todas as cláusulas abusivas, inclusive aquelas que são mascaradas de lícitas, devem ser rechaçadas de plano, ou seja, nulas de pleno direito.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1 - Código de Defesa do Consumidor. Lei 8.078/1990.
2 - Contrato de promessa de compra e venda do empreendimento “Condomínio Residencial Vitória São Luís”, incorporadora: Living Panamá Empreendimentos Imobiliários Ltda, cláusulas: (tabela price cláusula 6.2.1; cláusula VIII-2 p. 13; XIII-1 p. 19; XIX-1- PRAZO DE CONSTRUÇÃO, P.25)
3 - Contrato de promessa de compra e venda do empreendimento “Condomínio Lake Side” nesta capital, incorporadora: SPE LAKE SIDE CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÃO LTDA. Cláusula: (Das obrigações da promitente vendedora, cláusula quinta, p. 4)
4 - Nunes, Luis Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor: com exercícios/ Rizzatto Nunes – 3. Ed. rev. atual. – São Paulo: Saraiva. P. 546. 2008.
5 - Scavone Junior, Luiz Antonio. Os Contratos Imobiliários e a previsão de aplicação da Tabela Price – Anatocismo. São Paulo, Revista de direito do consumidor n. 28 – Ed. Revista dos Tribunais – outubro/dezembro/1998, p. 129.