O sistema normativo pátrio prevê que toda pessoa é portadora de direitos e deveres. Em relação aos direitos, no entanto, há divisão entre as denominadas capacidade de direito e a capacidade de fato. A primeira é inerente de todo cidadão, surgindo com o seu nascimento com vida – ressalvados os direitos do nascituro, nos termos do artigo 2º do Código Civil. Já a capacidade de direito está relacionada com a percepção individual da pessoa.
Assim, ao nascer o sujeito automaticamente passa a ter capacidade jurídica (de direito), mas somente adquirirá a capacidade de fato quando e se adquirir condições psicológicas de discernimento suficientes para tanto. Nesse passo, a lei prevê que até os dezesseis anos de idade a pessoa é considerada absolutamente incapaz. Dos dezesseis aos dezoito anos é relativamente incapaz, podendo praticar apenas alguns atos da vida civil – observadas as hipóteses de emancipação.
Havendo a idade mínima determinada pelo legislador e o desenvolvimento mental necessário a pessoa passa a ser plenamente capaz, gozando de capacidade de fato e de direito, podendo praticar sem restrições os atos da vida civil em relação aos seus interesses pessoais e patrimoniais. A exigência dos requisitos elencados para caracterizar a capacidade plena do sujeito tem por objetivo a sua própria proteção, evitando que alguns atos eventualmente praticados nessa situação de vulnerabilidade gerem prejuízos ao seu patrimônio.
Situação corriqueira é a do adolescente com dezessete anos, relativamente incapaz, que passa a ser plenamente capaz no exato momento que completa dezoito anos, por faltar-lhe somente a exigência etária prevista pela lei (considerando sua perfeita saúde mental); a partir desse momento poderá praticar qualquer ato da vida civil, dispondo livremente de seu patrimônio. Mas importante ressaltar que a capacidade plena não é eterna, podendo ocorrer situações que tenham por consequência a perda da capacidade de fato do sujeito.
O surgimento de estado patológico, normalmente com sintomas que atingem a capacidade cognitiva do sujeito, prejudicando seu estado mental, por vezes decorrentes da idade avançada, é a situação mais comum de perda da capacidade plena pela extinção da capacidade de fato. Mas não é a única, diversas outras situações levam a isso, como por exemplo os pródigos, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos. Para que seja reconhecida a perda da capacidade de fato utiliza-se da ação declaratória de interdição, seguida da nomeação pelo juízo de um curador para o interdito.
A interdição será declarada somente após a verificação inequívoca da impossibilidade do interditando gerir sua própria vida. Depois dessa constatação, aferida por perícia médica e inspeção judicial, observada a exigência do Código Civil – artigo 1.771 – de exame pessoal pelo julgador do arguido de incapacidade, é que será proferida sentença, a qual, além da declaração de interdição, nomeará curador ao incapaz.
Importante ressaltar que a interdição pode ser total ou parcial, dependendo do grau de discernimento, ou sua falta, do interditando. Sendo total, todos os atos da sua vida civil caberão ao curador; sendo parcial, somente no que se mostra incapaz, o que será detalhado na respectiva sentença declaratória.
A sentença produzirá efeitos imediatos, não podendo mais o interdito comandar os atos de sua vida civil, nos limites da declaração judicial. Esse papel, a partir de então, passa a ser de responsabilidade do curador nomeado. Curatela, nas palavras de Caio Mário da Silva Pereira, é “o encargo cometido a alguém, para dirigir a pessoa e administrar os bens de maiores incapazes” (in Instituições de Direito Civil, 3. ed. p. 308).
Assim, curador é pessoa designada para gerir a vida civil do interdito, devendo atuar sempre com base nos interesses do interdito, administrando da melhor forma possível seus bens e negócios. Natural a preferência do cônjuge ou companheiro para exercer o encargo, seguido dos pais e descendentes. Porém, na impossibilidade desses, o juiz poderá nomear outra pessoa para o encargo.
O curador deverá sempre preservar os interesses do interdito, pois a interdição ocorre justamente para resguardar o patrimônio daquele que não possui discernimento da sua administração, por faltar-lhe capacidade para os atos da vida civil. Por isso, importante ficar claro o papel do instituto da interdição e curatela, muitas vezes confundidos pelo senso comum como algo depreciativo para o interdito com transferência de bens para o curador.
O patrimônio pessoal do incapaz, mesmo após a declaração por sentença de sua interdição, continua sendo de sua propriedade. Não há transferência ou retirada de seus bens, ocorrendo, em verdade, e tão somente, a possibilidade de outrem administrá-los. O encarregado dessa função será justamente o curador, que não terá o domínio do respectivo patrimônio, mas apenas a autorização legal de administração, podendo dele dispor no melhor interesse do interdito.
Nota-se, pelo exposto, que a verdadeira intenção do legislador ao instituir a interdição e curatela em nosso ordenamento jurídico é proteger aquela pessoa impossibilitada de exercer seus atos da vida civil. Declarando-se a incapacidade de alguém, com sua interdição e consequente nomeação de curador, estar-se-á resguardando seus próprios interesses patrimoniais. A realização de negócios jurídicos por pessoa com o discernimento prejudicado abriria margem à atuação de fraudadores que aproveitariam da condição do incapaz para tirar-lhe proveito, resultando em prejuízos quiçá irreparáveis. Assim, portanto, o instituto da interdição, ao se declarar a perda da capacidade de fato de alguém, tem como principal objetivo resguardar o patrimônio do interdito perante terceiros, confiando sua administração ao curador nomeado.