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Sucessão testamentaria:

principais características da sucessão testamentária e suas cédulas

30/11/2015 às 09:38
Leia nesta página:

No Brasil, o testamento não é usual como forma de realizar a sucessão. Seu estudo implica o confronto com inúmeros outros institutos jurídicos como o casamento, o regime de bens, a filiação etc.

Generalidades Históricas

Essa sucessão é originária do direito romano, onde a vontade do falecido é indispensável para sucessão testamentaria, também tratado como aspecto do regime geral de liberalidades. O testamento é manifestação de última vontade, a qual deverá sempre ser cumprida. Sucessão própria do direito romano, durante o período Justiniano (imperador que codificou o direito romano).

“Em Roma, a sucessão testamentária teve importância memorável devido ao fator religioso. A devolução sucessória destinava-se precipuamente a manter o culto dos ancestrais, notadamente o de mones. O principal fim do testamento era a instituição de herdeiro, precisamente para que prosseguisse ele nesse culto privado. Apesar das modificações introduzidas a partir do fim da República, conservou a sucessão testamentária considerável relevância, orientando-se, porém, por ideias novas inspiradas na transformação da família e na filosofia helênica.”[1]

Primitivamente os herdeiros testamentários eram eleitos a título universal e para sempre – “semel heres, sempre heres”. Posteriormente, torneou-se revogável, impondo-se também restrições ao instituto de testar.

Na época do período Justiniano haviam mais de 60 tipos de testamentos. Anteriormente a edição da Lei das XII Tábuas, os testamentos mais comuns eram o “in calatis comitês”, realizado em tempo de paz, o “procinctu”, feito em tempo de guerras.

Após a edição da Lei das XII Tábuas, os testamentos acima foram substituídos pelos testamentos “per aes et libram”, que consistia uma venda fictícia da sucessão, perante testemunhas, bem como o “tripetitum”, que se tratava de uma forma simplificado do testamento pretoriano.

Com o desenvolvimento do instituto do testamento, passando pelas contribuições do Direito Germânico e do Regime das Ordenações, em especial para o direito pátrio, as cédulas de testamento foram se concentrando nas seguintes modalidades atualmente:

  • Ordinários:
    • Público
    • Cerrado
    • Particular
  • Especiais:
    • Marítimo
    • Aeronáutico
    • Militar

Principais Características da Sucessão Testamentária

  • Solene – extremamente formal, devem ser observadas todas as disposições previstas em lei.
  • Revogável – último testamento revoga o anterior, podendo ser total ou parcial. As clausulas não mencionadas ou não alteradas se mantêm.

Art. 1.858 do CC. O testamento é ato personalíssimo, podendo ser mudado a qualquer tempo.

Art. 1.969. O testamento pode ser revogado pelo mesmo modo e forma como pode ser feito.

Art. 1.970. A revogação do testamento pode ser total ou parcial.

Parágrafo único. Se parcial, ou se o testamento posterior não contiver cláusula revogatória expressa, o anterior subsiste em tudo que não for contrário ao posterior.

  • Revogação Total – revoga todo testamento anterior
  • Revogação Parcial – revoga apenas parte do testamento anterior.
  • Revogação Expressa – revoga expressamente as clausulas do testamento anterior.
  • Revogação Tácita – não precisa haver revogação expressa, basta que haja uma nova destinação. O conteúdo do novo testamento se torna incompatível com anterior.
  • Ato “mortis causa” – enquanto não houver a morte o testamento não tem validade. Enquanto o testador for vivo o testamento é ato jurídico perfeito, acabado, porém ineficaz (com eficácia futura – no momento da morte)
  • Gratuito – não se admite que o testamento seja transformado em compra e venda. Não pode haver onerosidade. Entretanto, pode haver condição, desde que não seja onerosa.
  • Personalíssimo - privativo do autor da herança – realizado de mão própria, sempre representativa de uma única vontade.
  • Unilateral – aperfeiçoa-se com a manifestação de uma única vontade, ou seja, a vontade do testador. Se presta a produção de diversos efeitos.

Capacidade Ativa Testamentaria

Além dos absolutamente e dos reativamente incapazes da parte geral (art. 104 do CC), não podem testar, os que no ato da realização do testamento não tiverem pleno discernimento, conforme art. 1860 do Código Civil.

Exceção feita aos relativamente incapazes, apenas com relação aos maiores de 16 anos, que têm capacidade especial de testar. A incapacidade ou capacidade superveniente não invalida ou torna válido o testamento. É preciso ter capacidade para fazer testamento, no ato em que ele é feito. No mesmo sentido, o testamento do incapaz, não se valida com a capacidade superveniente – art. 1861 do CC. As pessoas jurídicas não têm capacidade testamentária.

Art. 1.860. Além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno discernimento.

Parágrafo único. Podem testar os maiores de dezesseis anos.


Capacidade Passiva Testamentária

Art. 1798 do CC – vivo ou concebido pode receber

Diferente da incapacidade prevista no art. 1798 do CC (incapacidade absoluta), a incapacidade de receber por testamento é relativa, podendo sumir a causa de incapacidade.

Art. 1.798. Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão.

Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:

I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão;

II - as pessoas jurídicas;

III - as pessoas jurídicas, cuja organização for determinada pelo testador sob a forma de fundação.

Não podem ser nomeados como beneficiários do testamento:

  • Escrituração a rogo (a pedido) – quem escreve testamento pelo testador não pode ser beneficiado pelo testamento.
  • Não podem ser beneficiadas as testemunhas do testamento.
  • Concubina (impedidos para casar, parentes, adoção, vitima e autor de crime) do testador casado.
  • O tabelião civil ou militar não pode ser beneficiário do testamento.

Caso haja um segundo testamento, sem a participação do relativamente incapaz, do escriturador a rogo ou da testemunha, no qual eles sejam beneficiários, desaparece a incapacidade anterior.

Caso a concubina consiga provar que houve separação de fato há mais 5 anos,  sem que o testador tenha culpa da separação, o testamento é valido.

São nulas também as disposições testamentárias em favor de pessoas não legitimadas, quando forem simuladas, sob contrato oneroso ou por meio de pessoa interposta (laranja) – ascendentes, descendentes - nem irmão, nem companheira e nem o cônjuge podem receber pelo incapaz relativamente.

A Ação de investigação de paternidade sócio-afetiva: a filiação não precisa ser biológica para afastar a ilegitimidade do art. 1801, inc.III, combinado com art. 1802, parágrafo único do CC.


Cédulas Testamentarias Ordinárias

  • Testamento Público

  1. Escrito pelo Tabelião em seu livro de notas.
  2. A escrituração é feita de acordo com as declarações do testador. O mudo está impedido de testar. O testador pode ler um rascunho ou minuta para do Tabelião.
  3. O testamento será realizado mediante a presença de 2 testemunhas, do inicio ao fim. Elas serão parte integrante na qualificação do testamento. Caso elas se ausentem por algum momento, o testamento é nulo.
  4. Após a feitura do testamento, ele será lido pelo Tabelião ao Testador e as 2 testemunhas. Essa leitura pode ser feita pelo Testador, se for requerida.
  5. Após a leitura, todos os presentes assinam o testamento. Serão 4 assinaturas: Testador, 2 testemunhas e Tabelião.

Art. 1865 do CC - Caso em que o testador não possa assinar (Ex. mão engessada) ou não souber escrever (Ex. analfabeto) - tal fato deverá ser relatado na cédula. O testador a rogo deve escolher uma testemunha para assinar por ele. Porem, se a testemunha assinar e não constar a razão da substituição do testador, o testamento é nulo.

Art. 1.865. Se o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião ou seu substituto legal assim o declarará, assinando, neste caso, pelo testador, e, a seu rogo, uma das testemunhas instrumentárias.

Caso o testador seja absolutamente surdo, quem deve fazer a leitura do testamento é o próprio testador, caso seja capaz de fazê-lo. Não sendo capaz de fazer a leitura (analfabeto), rogará, para uma 3ª pessoa (que não seja testemunha) para fazer. Deve constar na cédula o ocorrido.

Art. 1.866. O indivíduo inteiramente surdo, sabendo ler, lerá o seu testamento, e, se não o souber, designará quem o leia em seu lugar, presentes as testemunhas.

Caso o testador seja cego. Serão feitas 2 leituras, uma pelo Tabelião e outra por uma das testemunhas. Deve constar na cédula o ocorrido.

Art. 1.867. Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido, em voz alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento.

  • Testamento Cerrado (Místico/Segredo)

Art. 1868 a 1870 do CC

Requisitos:

  1. Deve ser escrito pelo testador ou por pessoa a seu pedido (pode ser escrito pelo Tabelião, mas não faz parte de seu ofício – testamento diferente do público).
  2.  Deverá ser assinada pelo testador ou por quem escreveu – pode ser feito em qualquer folha, não há cédula especifica.
  3. O testamento tem que ser aprovado pelo Tabelião.
  4. O testador acompanhado de 2 testemunhas entrega seu testamento ao tabelião para ser aprovado.
  5. Após a última palavra do testamento o Tabelião lavra o auto de aprovação, que se inicia logo após a leitura.

Auto de Aprovação: declaração de que o testador compareceu ao cartório, acompanhado de 2 testemunhas e que o testamento foi aprovado – constará no cartório apenas a cópia do auto de aprovação no livro de notas.

  1. Após a leitura o tabelião fará a leitura do auto de aprovação para as testemunhas e ao testador.
  2. Após a leitura, os presentes assinarão o auto de aprovação – Testador assina 2 vezes: ao fim do testamento e ao fim do auto de aprovação. São 4 pessoas que assinam o testamento: Tabelião, Testador e 2 Testemunhas.
  3. O Tabelião, após as assinaturas, irá cerrar e coser o testamento. Ao fim deverá entregar o testamento ao testador. Cerrar = lacrar (com cera de vela – feita pela Igreja Católica) e Coser = Costurar (com linha cotonê). Se o testamento desaparecer não haverá sucessão testamentária.

Peculiaridades da Execução do Testamento Cerrado

Com a morte do testador, o envelope deverá chegar ao Juiz lacrado e costurado. Logo após a entrega, deverá ser instaurada audiência pelo Juiz. Após, dá-se inicio a abertura do testamento.

O juiz deverá analisar o envelope para verificar se não há nenhum vicio externo (no lacre ou costura) e posteriormente analisar a cédula, verificando se não há vícios internos, sob pena de nulidade. Serão dados 2 despachos.

O Código Civil possibilita que o testamento cerrado seja em outra língua.

Art. 1.871. O testamento pode ser escrito em língua nacional ou estrangeira, pelo próprio testador, ou por outrem, a seu rogo.

Não pode testar de forma cerrada o analfabeto ou cego.

Art. 1.872. Não pode dispor de seus bens em testamento cerrado quem não saiba ou não possa ler.

Surdo-mudo pode testar cerrado apenas se escrever de próprio punho. A aprovação deverá ser pedida por escrito também de punho pelo testador surdo-mudo.

Art. 1.873. Pode fazer testamento cerrado o surdo-mudo, contanto que o escreva todo, e o assine de sua mão, e que, ao entregá-lo ao oficial público, ante as duas testemunhas, escreva, na face externa do papel ou do envoltório, que aquele é o seu testamento, cuja aprovação lhe pede.

  • Testamento Particular

Requisitos

  1. Deve ser escrito pelo proprio testador - se de proprio punho dever; conter a rubrica do testador nas folhas, e se feito por processo mecânico, não pode conter rasuras ou espaços em branco.
    • Mecânico – não pode ter par;grafo. Sempre na mesma linha até o final. Não pode ter rasuras ou espaços em branco.
    • PRÓPRIO punho – letra do testador

  2. Deve ser lido para ao menos, 3 testemunhas (diferente o numero público e do cerrado, que são necessárias apenas duas).
  3. Após a leitura, o testador assinará o testamento, que, logo a seguir, será assinado pelas testemunhas, que se qualificarão.

Execução do Testamento Particular

  1. Com a morte do testador, o testamento será publicado (com as mesmas formalidades de um Edital) para citar os herdeiros legítimos.
  2. Será realizada audiência de confirmação, quando serão ouvidas pelo menos 3 testemunhas, por mais que hajam mais testemunhas no testamento. Se as 3 testemunhas forem contestes (confirmarem) em audiência e afirmarem todos os requisitos, o testamento será valido. Caso contrário, o testamento é anulado. As testemunhas tem que pelo menos confirmar a leitura do testamento, bem como as assinaturas das testemunhas e do testador.

Art. 1.878. Se as testemunhas forem contestes sobre o fato da disposição, ou, ao menos, sobre a sua leitura perante elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas, assim como a do testador, o testamento será confirmado.

Se faltar testemunhas por morte, é permitido ao juiz, em caráter subjetivo, confirmar o testamento, desde que pelo menos uma testemunha sobrevivente, confirme o testamento. É aconselhado que as testemunhas sejam sempre mais jovens que o testador. Quanto mais testemunhas para confirmar o testamento será melhor.

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Parágrafo único. Se faltarem testemunhas, por morte ou ausência, e se pelo menos uma delas o reconhecer, o testamento poderá ser confirmado, se, a critério do juiz, houver prova suficiente de sua veracidade

O testamento particular, de próprio punho, sem testemunhas, desde que justificado no testamento, pode ser confirmado pelo juiz.

Art. 1.879. Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas, poderá ser confirmado, a critério do juiz.

O testamento particular pode ser escrito em qualquer língua, desde que as testemunhas entendam o testamento, durante a leitura.

  • Codicilo

Testamento em miniatura que abrange disposição de vontade reduzida, simples, com conteúdo restrito. Os assuntos são taxativos em lei.

Apenas disposições especiais:

  • Disposições sobre seu enterro podem conter no codicilo. Ex. cremado, embalsamado e etc.
  • Dispor sobre esmolas de pouca monta a certas e determinadas pessoas ou a beneficiários inominados de um específico local. Ex. de pouco valor ou pouca importância econômica a critério da sociedade. R$ 100,00 ou 200,00 nunca superior que meio salário mínimo. Não leva em consideração a capacidade patrimonial pessoal.
  • Disposição de roupas, móveis e joias de pouco valor.

O codicilo é autônomo. Pode preceder ou não outro testamento.

Art. 1.882. Os atos a que se refere o artigo antecedente, salvo direito de terceiro, valerão como codicilos, deixe ou não testamento o autor.

Pode haver a substituição de testamenteiro, não envolvendo valores ou benefícios.

Art. 1.883. Pelo modo estabelecido no art. 1.881, poder-se-ão nomear ou substituir testamenteiros.

Os atos previstos no artigo anterior revogam atos iguais. Codicilo revoga codicilo. Somente atos iguais, revogam atos iguais. Única exceção com relação ao testamenteiro.

Art. 1.884. Os atos previstos nos artigos antecedentes revogam-se por atos iguais, e consideram-se revogados, se, havendo testamento posterior, de qualquer natureza, este os não confirmar ou modificar.


Considerações Finais

O presente artigo tem a intenção de apresentar, de forma sucinta, as principais características da sucessão testamentária, bem como as cédulas ordinárias, com a finalidade de auxiliar os estudantes e interessados na matéria de sucessões.

O testamento apesar de não ser a forma mais usual de se realizar a sucessão no Brasil, se trata de matéria de extremo relevo para o Direito Civil Brasileiro, trazendo a luz inúmeras questões correlacionadas com outros ramos do direito, tais como o casamento, o regime de bens, a filiação, entre outros temas.


Bibliografia

BARROS, Whashington Monteiro. Curso de Direito Civil. São Paulo: Editora Saraiva.

CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito das Sucessões. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil II. 15ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Lumem Júris. 2009.

CATEB, Salomão de Araújo. Direito das Sucessões. 3ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, Volume 6: Direito das Sucessões. 17ª Edição. São Paulo. Saraiva, 2003.

GOMES, Orlando. Sucessões. 4ª Edição

RODRIGUES, Silvo. Direito das Sucessões. 23ª Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.


Nota

[1] GOMES, ORLANDO, Sucessões. Editora Forense. 4ª Edição Pg. 90.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORRÊA, Ananias. Sucessão testamentaria:: principais características da sucessão testamentária e suas cédulas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4534, 30 nov. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33571. Acesso em: 24 nov. 2024.

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