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Exclusão sucessória por indignidade

09/06/2015 às 11:11
Leia nesta página:

O indigno não deixa de ter a qualidade de herdeiro, mas deixa de ter a de sucessor.

Com a morte do autor da herança, a saisine se encarrega de transmiti-la imediatamente aos herdeiros.  Para isso, estes precisam ter capacidade ou legitimação sucessória e não serem excluídos da sucessão.

Diferentemente da capacidade civil, a aptidão sucessória consiste na idoneidade específica que o herdeiro tem para aceitar a herança ou exercer direitos de sucessor dos bens deixados pelo de cujus. Será considerada a capacidade existente ao tempo da abertura da sucessão, e vigorará a lei do tempo desta abertura.

Aqui será tratado das pessoas dadas como indignas, as quais têm capacidade civil, porém não têm a capacidade sucessória, não tendo eficácia a sua aceitação da herança. Essas pessoas, por sua culpa, perderão o direito de herdar. Assim, o indigno não deixa de ter a qualidade de herdeiro, mas deixa de ter a de sucessor.

Quando a afronta ocorre entre pessoas que têm vínculo familiar ou mesmo afetivo, sendo um herdeiro do outro, a lei procura punir aquele que deu causa em relação às questões patrimoniais. Seu quinhão hereditário transmitirá aos seus descendentes.

O reconhecimento da indignidade se dá depois da morte do autor da herança. Trata-se de uma pena civil, não dependendo de ação condenatória na esfera penal. Acarreta na privação do direito de receber os bens deixados pelo morto, enumeradas as situações, taxativamente, no artigo 1814 do Código Civil, quais sejam, o cometimento de atentados tidos como reprováveis contra a vida, a honra e a liberdade.

Não se permite o pedido de suspensão do processo até que termine eventual ação penal, pois uma independe da outra. No entanto, havendo condenação penal, desnecessária a propositura da ação de conhecimento de indignidade, visto que a sentença penal condenatória transitada em julgado é titulo executivo judicial.

A exclusão do herdeiro por indignidade não ocorre por sua vontade, mas sim por imposição judicial. Alcança os herdeiros legítimos, necessários, facultativos, testamentários e legatários.

Consoante o referido artigo, serão dados como indignos:

  •  “Os que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente”.

A doutrina entende que, apesar de ser um rol taxativo, sua interpretação não pode ser tão limitativa. Justifica-se para termos de inclusão outros delitos contra a vida, como o induzimento ao suicídio, a eutanásia e o infanticídio, pois se equiparam ao homicídio.

Faz-se necessário provar a ocorrência do delito, porém tal prova não depende, como dito, de condenação penal, visto que o inciso não fala em crime de homicídio, mas apenas fala em matar. Entretanto, se, em sede criminal, o indivíduo for absolvido por inexistência do fato ou por causa excludente de ilicitude, o juízo cível deverá também absolvê-lo (art. 935 CC). Mas, se a absolvição ocorrer por falta de provas, este juízo não estará condicionado àquele.

Não incorrerá na indignidade o cometimento de homicídio culposo por imprudência, negligência ou imperícia, pois a vontade é elementar de sua caracterização. Também não incidirá se tratar de autor inimputável, ocorrendo causas de extinção de punibilidade.

  • “que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro”;

Os crimes contra a honra são os previstos nos artigos 138, 139 e 140 do Código Penal - calúnia, difamação e injúria, respectivamente.

Interpretando o artigo, podemos dizer que não necessita ser o crime de calúnia, e sim acusação caluniosa, e, portanto, não necessita de condenação criminal.

Como adverte Giselda Hironaka, a lei exige que fato imputado caluniosamente seja crime, e não que a denúncia tenha origem no juízo criminal.

Mesmo que o autor da herança já esteja morto, o sujeito pode ainda incorrer no artigo, caracterizando o crime de calúnia contra os mortos (138, §2º, do CP).

Não são englobados aqui os descendentes e nem os ascendentes.

A acusação caluniosa feita em juízo criminal não necessita de ação penal. Mas, feita em outro juízo requer ação. É autorizado para termos de reconhecimento de indignidade a denunciação feita em esfera cível, trabalhista, administrativa, eleitoral e até mesmo em sede de investigação administrativa.

“que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade”.

Não poderá ocorrer impedimentos ao autor da herança de testar. Protege-se a liberdade do testador, e não se estende aos seus familiares, como nas outras hipóteses.

Entende-se ampliar este rol àqueles que alteram, falsificam, inutilizam ou ocultam o testamento. Isso implica na possibilidade de quem deixou de receber o quinhão estabelecido no testamento pleitear perdas e danos. No entanto, não será punido se o culpado tiver tempo de corrigir seus efeitos ou, no caso de alteração do testamento, este era nulo.

Para ser enquadrado em algum desses casos, imprescindível a sentença judicial reconhecendo os atos de indignidade, que só produzirá efeitos depois do transito em julgado. Será reconhecida em ação ordinária (ação declaratória de indignidade), movida por quem tenha legítimo interesse contra aquele que praticou tais atos.

Poderá ser interessado a propô-la o co-herdeiro, legatário, donatário, fisco, ou até mesmo o Município, Distrito Federal ou União, sendo estes três últimos apenas no caso de não haver herdeiros legítimos e testamentários. Também pode ajuizá-la o credor prejudicado pela inércia de um daqueles propor ação. A doutrina sustenta que o Ministério Público tem legitimidade por ser guardião da ordem jurídica, mas isso não é unânime. Alguns entendem que a legitimidade do Ministério Público só ocorrerá quando houver herdeiros incapazes ou interesse público. Porém, quando a indignidade constitui crime de ação penal pública incondicionada, será possível a legitimação extraordinária.

A ação pode ser proposta em litisconsórcio facultativo, e mesmo que nem todos os interessados participem, os efeitos da sentença a todos se estendem.

A ação de declaratória de indignidade tira o direito adquirido do herdeiro/réu, tendo ele direito de defesa.

Ocorre a decadência da ação declaratória de indignidade se não proposta em 4 anos, contados da abertura da sucessão, devendo ocorrer enquanto o suposto indigno for vivo. Havendo herdeiros menores, esse prazo é contado depois que atingirem a maioridade.

A indignidade é declarada em autos próprios, e não em ação de inventário,  deverá tramitar no o mesmo juízo. Tal declaração tem os mesmos efeitos do herdeiro pré-morto. Como Orlando Gomes diz, o indigno se tem como pessoa inexistente.

Os efeitos da condenação são pessoais, não ultrapassando da pessoa do réu. Assim, seu quinhão hereditário irá a seus descendentes. Caso o indigno faleça antes da sentença, seu direito sucessório transmitir-se-á aos seus sucessores, mas sendo uma pena, esta não atinge seus descendentes, ou seja, falta legítimo interesse para se buscar a exclusão do herdeiro. Eles receberão por direito de representação o quinhão que àquele caberia, como se morto já fosse na abertura da sucessão, o que só é possível na sucessão legitima. Assim, serão equiparados aos herdeiros do pré-morto, ocorrendo apenas na linha reta descendente. Inexistindo descendentes, ocorrerá o direito de acrescer dos demais herdeiros do de cujus. Se não houver herdeiros da mesma classe do indigno, os seus sucessores serão chamados à sucessão por direito próprio, e não mais por representação.

Sendo sucessão testamentária, haverá somente o direito de acrescer em favor dos herdeiros legítimos.

Com a sentença declaratória de indignidade, há a retroação ex tunc, ou seja, os efeitos retroagirão à data da abertura da sucessão, não respondendo mais pelos encargos sucessórios sobre o quinhão que perdeu. Os bens deixados de compor a herança percebida pelo indigno recebem o nome de ereptícios, que são aqueles que retornarão ao acervo hereditário. Mas deverá restituir os frutos e os rendimentos percebidos, pois será equiparado ao possuidor de má-fé. Entretanto, ele terá direito a reembolso quanto às despesas feitas com a conservação dos bens do acervo.

O herdeiro testamentário excluído por indignidade deve trazer à colação as doações recebidas para repor a parte disponível.

Se já concluídos o inventario e a partilha, esta não será anulada. O quinhão do excluído deverá ser sobrepartilhado.

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Poderá, no entanto, ter efeito ex nunc, os atos praticados pelo excluído até o momento da exclusão. Para isso devemos entender que herdeiro aparente é aquele considerado como legítimo titular do direito sucessório, embora não seja por erro, exclusão da herança por indignidade ou deserdação, falsidade ou nulidade do testamento. Assim, o indigno é visto como herdeiro aparente, pois assim parecia até então. Os negócios onerosos por ele realizados serão válidos.

O terceiro de boa-fé que adquiriu bem onerosamente do herdeiro aparente, não será prejudicado se levada a efeito antes de sua exclusão, ou seja, até o trânsito em julgado da sentença declaratória de indignidade, em respeito a teoria da aparência.  Também serão válidos os atos de administração praticados antes da declaração. Dessa forma, se já citado para a ação de indignidade, será entendido agir de má-fé.

Já o herdeiro verdadeiro poderá pleitear perdas e danos do indigno, podendo exigir reposição patrimonial dele mesmo, e não do terceiro de boa-fé. Sendo a alienação gratuita ou se tratando de doações, estas serão anuláveis e podem ser desfeitas e, então, retornar à colação.

Se o indigno for casado, tal exclusão alcança seu cônjuge, mesmo que seja o regime de comunhão universal de bens, não fazendo jus nem à metade do quinhão hereditário, pois, como dito, será considerado como se morto fosse o indigno antes do de cujus.

Havendo filhos menores de idade, o pai/mãe indigno não poderá exercer os encargos patrimoniais decorrentes do poder familiar, não tendo direto ao usufruto dos bens dos filhos, e nem da administração. A herança recebida pelos filhos do indigno não se transmitirá a ele, caso aqueles morram antes deste.

No mais, pode ocorrer a reabilitação do indigno, que é irretratável. Não existe reabilitação tácita, admitindo-se apenas a expressa e autêntica. Se o documento de reabilitação for descoberto depois da exclusão por indignidade, esta se torna anulável. Assim, o excluído pode intentar ação rescisória ou ação de anulação da declaração de indignidade.

Caso o autor da herança beneficie o herdeiro com um legado, mas não expressa o seu perdão pelo ato cometido, não impede a propositura da ação. O herdeiro fica excluído da sucessão legitima, mas faz jus ao legado.

O reconhecimento da indignidade se dá depois da morte do autor da herança. Mas, enquanto vivo, poderá perdoá-lo e, então, o até então indigno terá de volta seu direito ao quinhão que lhe cabia.


BIBLIOGRAFIA

- GOMES, Orlando. Obrigações. 17. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.

- Sucessões. 15. Ed. Ver., atual. E aum. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

- HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito sucessório e Constituição: controvérsias e tendências. In: DIAS, Maria Berenice; BASTOS, Eliene Ferreira; MORAES, Naime Márcio Maris (coords.). Afeto e estruturas familiares. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. P. 215-226.

- DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 3º Ed. Revista dos Tribunais.

- WALD, Arnoldo. Direito das Sucessões. Ed. Saraiva.

- Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 6. Direito das Sucessões. 28. Ed. Saraiva.

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Sobre a autora
Luciana Machado de Oliveira

Aluna de Direito da UNAERP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Luciana Machado. Exclusão sucessória por indignidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4360, 9 jun. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33777. Acesso em: 22 nov. 2024.

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