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O Registro de Títulos e Documentos: um instrumento jurídico para segurança da sociedade.

Histórico, desenvolvimento e a era digital

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IX. - A possibilidade do reconhecimento de firma como certificação de documento digital:

Já vimos a impossibilidade da lavratura de atas notariais, da feitura de públicas-formas e da autenticação de cópias. Vejamos, agora, o reconhecimento de firma.

Após frustradas essas teses de certificação de documento digital em Tabelionatos de Notas, passaram, aqueles notários, a pretender unir, ao ato de reconhecimento de "firmas", a certificação do documento digital.

É evidente que aqui estamos tratando, novamente, de dois atos distintos. Um, o reconhecimento da "assinatura" digital, ato exclusivamente notarial; outro, a autenticação do documento digital.

E, no meio papel, o simples reconhecimento de "firma" das partes não induz a autenticidade do conteúdo do documento, como trivial, podendo ser discutido, até mesmo, pelas próprias partes.

Ademais, como já disse, se não me falha a memória, o Dr. Marcacini, reconhecer firma digital é, mais ou menos, como dar autenticidade à caneta, porque o que se reconhece são as chaves, pública e privada; é a origem, a autoria do documento, não o sinal personalíssimo da firma ou a veracidade do conteúdo.

Por isso pretender reconhecer, junto à atestação da autoria, a preservação do conteúdo dos documentos apresentados, em ato cujo único fim e a atestação da autoria da assinatura digital, vai uma longa distância...

Aqui faz-se necessário lembrar que, como é sabido e já vimos, tanto os atos de autenticação de cópias como os de reconhecimento de firmas possuem natureza de mera "atestação" e não de certificação, porque somente têm natureza de certificação os atos que notários e registradores praticam por meio de extração de seus arquivos, de seus livros, onde constam perpetuados os registros, os conteúdos dos documentos por eles lavrados ou registrados. Quem assim os classificou foi, nada mais nada menos que o imortal das letras jurídicas PONTES DE MIRANDA:

"Documentos públicos são os que procedem de autoridades públicas, ou de pessoas com fé pública, dentro dos limites das respectivas competências e atribuições. Documentos particulares são aqueles que não têm tal procedência. Os documentos em que se reconheceram a letra e as firmas (assinaturas) dos figurantes, ou só as firmas, são documentos particulares, pois o reconhecimento da firma apenas é objeto de atestação, e não de certidão, do oficial público. Quem atesta, por isso que procede ao exame do que se lhe apresenta, acredita (= dá crédito) ao que se lhe mostra. Quem certifica dá documento, por ser sobre aquilo que consta do seu ofício. É a distinção essencial entre o atestado e a certidão..O ato de conferência e concerto não é certidão, - é atestado, como o reconhecimento de firma.. Há declarações de conhecimento em todos esses atos; mas certidão somente há se o que se tem por certo consta de livros, ou papéis, ou arquivos de ofício mesmo de quem, com fé pública, certifica. ( A distinção que faz frei Francisco de S. Luís, Ensaio sobre alguns sinônimos da Língua Portuguesa, II, 123 s., é atécnica)" [33]

Alías, mais especificamente sobre o ato de reconhecimento de firmas, debruçou-se o mais ilustrado tratadista brasileiro, com maestria:

"Firmas reconhecidas.Os instrumentos com firma reconhecida somente levam a mais a afirmação do tabelião de que foram firmados pelas pessoas a que se atribuem. Nenhuma proposição há do tabelião quanto ao conteúdo, tanto mais quanto podem ser reconhecidas firmas de documentos em branco, ou em parte em branco (devendo o oficial público dizer que está em branco) e o próprio reconhecimento da letra e firma somente concerne aos sinais alfabéticos e outros sinais, como os algarismos, que no documento estejam, e à firma, sem se aludir ao que com eles se diz. No direito brasileiro, o reconhecimento de firma não é por ter o oficial público estado presente à assinatura; tem-se, também, o reconhecimento por comparação com a assinatura que está no fichário do tabelião, ou no seu livro de firmas." [34]

Como se vê, o ato de reconhecer firmas (ou à pretendida analogia às assinaturas digitais) foram previstos, apenas e tão somente, para atestar a autoria do documento particular. Nada mais.

Assim, vimo-nos obrigados a, mais uma vez, demonstrar o equívoco dos que crêem que a era digital teve o condão de alterar as atribuições extrajudiciais, lembrando a lição dada pelo excelentíssimo Doutor Marcio Martins Bonilha Filho, ao esclarecer que "é induvidoso que a utilização do meio digital não afetou as atribuições respectivas, nem alterou o sistema de competência, na prestação dos serviços delegados" [35], que, no nosso sentir, põe fim à discussão.

Não será, portanto, o simples reconhecimento da autoria do documento digital, por meio das chaves utilizadas, que irá validar o conteúdo do documento digital.

Concluindo:

1. - A autenticidade dos originais de documentos eletrônicos somente poderá ser conferida por meio do registro de seu conteúdo junto ao Oficial de Registro de Títulos e Documentos competente, que detém a especial atribuição para conferir valor probante aos instrumentos particulares obrigacionais e, aos demais, para sua perpétua conservação, valendo suas certidões como o próprio original (Lei 6015/73, art. 127, incisos I e VII c/c. Lei 5433/68, art. 1°, §1° - permitindo, mesmo, a incineração dos originais);

2. - Não se confunde original autenticado com cópia autenticada. O primeiro somente pode adquirir esta qualidade com seu registro em Títulos e Documentos; a segunda somente pode ser procedida em cópia, mediante confronto com o exame do documento original autêntico;

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3. -As públicas-formas foram suprimidas do nosso direito e as atas notariais e o reconhecimento de firmas não se prestam à validação, registro ou conservação do conteúdo de instrumentos sob forma digital, havendo regra especial, afastada fica a geral;

4. -Comparativamente, o registro do instrumento sob forma digital em Ofício de Títulos e Documentos é mais seguro (porque registrado seu conteúdo em microfilme); economiza espaço (porque o usuário não necessita tornar-se depositário de nenhum CD-ROM) e custo (porque o registro é mais barato que a ata notarial somada à autenticação da cópia extraída).

5. -O reconhecimento da autoria do documento não é suficiente para conferir-lhe autenticidade ou meio de prova de seu conteúdo, mas mera atestação de sua origem.

Vimos, assim, a importância do registro de títulos e documentos e sua aplicação na era digital.


Notas

1. Cf "Registros Públicos e Segurança Jurídica", Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, pág. 76.

2. Em 7 de fevereiro de 1924, foi sancionado o Decreto Legislativo n° 4827, reorganizando os registros públicos instituídos pelo Código Civil e, em 24 de dezembro de 1928, fazendo-se necessário disciplinar em âmbito federal sua execução, foi editado o Decreto n° 18.542.

3. "leges, nihil in eis debet esse inutile, ac superfluum, sine ministério aliquid operando" (Leis em nada devem ser inúteis, e supérfluas, sem produzirem algum efeito), in Axiomas e Lugares Comuns de Direito, de Simão Vaz Barbosa Lusitano, apud Regras de Direito de Augusto Teixeira de Freitas, ed. Lejus, 2000, pág. 132).

4. Miranda, Pontes de, in "Tratado de Direito Privado", tomo 3, 2000, Bookseller, pág. 482.

5. SILVA, De Plácido, VOCABULÁRIO JURÍDICO, vol. II, Forense, 2ª ed., 1967, págs. 561/562.

6. Idem, ibidem.

7. SILVA, De Plácido, ob. Cit., vol. III, pág. 1103.

8. Idem, ibidem.

9. SILVA, De Plácido, ob. Cit., vol. I, pág.442.

10. Cf. arts. 1079 a 1986 do Código Civil Brasileiro.

11. Cf. artigo 130 e seu parágrafo único da Lei 6015, de 31/12/1973.

12. Cf. artigo 156 da Lei 6015, de 31/12/1973.

13. Cf. art. 127, e incisos e 130 da Lei 6015, de 1973.

14. Cf. artigos 135, 138 e 139 do Código Civil.

15. Cf. arts. 372, 383, 385, 390 e 392 do CPC

16. in "Lei dos Notários e dos Registradores Comentada", ed. Saraiva, 1996, 1ª. ed., pág. 211, comentários ao artigo 41 da Lei 8935/94

17. cf. fl. 19, segundo parágrafo

18. ed. Livraria do Advogado, 1ª. ed., pág. 109

19. ob cit. pág. 24.

20. in "Repertório Enciclopédico do Direito Brasileiro" de J.N. de Carvalho Santos, editor Borsoi, vol. 5, pág. 111.

21. in Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, ed. Nova Fronteira, 1975, pág. 38.

22. Cf. arts. 127 e incisos e 130 da Lei 6015, de 1973.

23. Harvey, Paul, in "Dicionário Oxford de Literatura Clássica Grega e Latina", Jorge Zahar Ed., trad. Mario da Gama Kury, 1ª ed., 1987, pág. 466.

24. Cf. Processo 001.01.109541-5, 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo.

25. vide Decreto Federal n° 973, de 1903, hoje Lei 6015, de 1973, arts. 127 e ss. e Lei 8935, de 1994, art. 12.

26. SILVA, De Plácido, ob. Cit. vol. I, págs. 194/195.

27. Cf. art. 328 do Código Penal.

28. in http://www.anoregsp.org.br/jornal/jornal16edb.asp

29. cf. http://www.28tabeliao.com.br/atanotarial.asp.

30. vide artigo 38 do CPC, com a redação que lhe foi dada pela Lei 8952/94

31. Normas SP, Capitulo XIV, itens 51.2 e 54

32. vide Processo 000.01.109541-5, 2ª VRPSP.

33. In "Tratado do Direito Privado", Tomo 3, 2000, Bookseller, pág. 465.

34. Idem, ibidem, pág. 485:

35. idem, ibidem, processo 000.01.109541-5

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Sobre o autor
Paulo Roberto de Carvalho Rêgo

oficial do Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Cidade de São Paulo, vice-presidente do Centro de Estudos e Distribuição de Títulos e Documentos da Cidade de São Paulo, diretor da Associação de Notários e Registradores do Estado de São Paulo (ANOREG-SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RÊGO, Paulo Roberto Carvalho. O Registro de Títulos e Documentos: um instrumento jurídico para segurança da sociedade.: Histórico, desenvolvimento e a era digital. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3382. Acesso em: 19 abr. 2024.

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