A Comissão de Conciliação Prévia – CCP

27/11/2014 às 10:42
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Análise das características da Comissão de Conciliação Prévia e da aplicabilidade dos artigos referentes a esta.

No artigo publicado na semana passada, falei de maneira específica sobre a Arbitragem, método heterocompositivo de solução de conflitos alternativo à jurisdição, hoje tratarei sobre a Comissão de Conciliação Prévia, conhecida como CCP, sendo a sua utilização um método autocompositivo extraprocessual.

Segundo a doutrina majoritária, há três métodos de solução de conflitos: a autotutela, também conhecida como autodefesa; a autocomposição; e a heterocomposição. Se você tem interesse em entender mais sobre as especificidades de cada um destes, sugiro a leitura da introdução do artigo “As formas alternativas de solução dos conflitos: A Arbitragem”.

A COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA - CCP

A Comissão de Conciliação Prévia (CCP) foi fruto do advento da Lei 9.958/00, a qual incluiu os artigos 625-A a 625-H na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

A CCP adota o Princípio da Paridade, ou seja, é formada por igual número de representantes dos empregados e dos empregadores, conforme artigo 625-A, da CLT:

Consolidação das Leis do Trabalho, 1943.

Art. 625-A. As empresas e os sindicatos podem instituir Comissões de Conciliação Prévia, de composição paritária, com representante dos empregados e dos empregadores, com a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais do trabalho. Parágrafo único: As Comissões referidas no caput deste artigo poderão ser constituídas por grupos de empresas ou ter caráter intersindical.

A CCP apenas soluciona conflitos individuais, e não coletivos. Além disso, a sua criação é facultativa. Conforme determina o parágrafo único do artigo citado, a CCP pode ser sindical (formada no âmbito de um sindicato ou com caráter intersindical) ou empresarial (formada no âmbito de uma empresa ou por grupo de empresas).

Uma dúvida comum ocorre quando, na localidade da prestação de serviços, para a mesma categoria, existe uma CCP sindical e uma CCP empresarial. Neste caso, o empregado poderá optar por qualquer delas, e, se provocar as duas, será competente a que primeiro conhecer do pedido (art. 625-D, §4°, CLT).

A constituição da CCP sindical e as suas normas de funcionamento serão definidas em instrumentos de negociação coletiva (Convenção Coletiva de Trabalho ou Acordo Coletivo de Trabalho), nos termos do artigo 625-C, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho.

A constituição da CCP empresarial é regulamentada pela própria Consolidação das Leis do Trabalho, a qual estabelece que: os membros titulares serão, no mínimo, dois e, no máximo dez, sendo metade indicada pelo empregador, e metade eleita pelos empregados, em escrutínio secreto, fiscalizado pelo sindicato da categoria profissional; os suplentes serão tantos suplentes quantos forem os titulares, tendo, estes, mandato de 01 (um) ano, permitida uma recondução. Os membros titulares e suplentes, que sejam representantes dos empregados, possuem estabilidade provisória (também chamada de garantia de emprego) com duração de até 01 (um) ano após o final do mandato na CCP, período no qual os citados empregados somente poderão ser dispensados se cometerem falta grave, nos termos da lei (art. 625-B, §1°, CLT).

Quanto à estabilidade dos membros da CCP existem dois pontos polêmicos. O primeiro se refere ao termo inicial (dies a quo) da referida estabilidade, sendo a Consolidação das Leis do Trabalho omissa neste ponto. O segundo é sobre a necessidade de inquérito judicial para a apuração de falta grave para a dispensa do empregado.

Assim, existem duas grandes correntes doutrinárias a respeito de tais pontos. A primeira corrente, minoritária, afirma que o termo inicial da estabilidade provisória no caso em tela é a eleição para a CCP, e que não há necessidade do inquérito judicial para dispensa do funcionário estável por justa causa, sob o fundamento de que não há previsão legal para tanto. Já a corrente majoritária entende que o termo inicial é o registro da candidatura, e que há necessidade do inquérito judicial para apuração de falta grave. Tal entendimento está fundamentado na interpretação sistemática e analógica da garantia de emprego existente para o dirigente sindical, a qual é regulamentada pelo inciso VII do artigo 8° da Constituição Federal; pelo parágrafo 3º do artigo 543 da Consolidação das Leis do Trabalho; pela Súmula 197 do Supremo Tribunal Federal; e pela Súmula 379 do Tribunal Superior do Trabalho, vejamos:

Constituição Federal, 1988.

Art. 8° É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: [...] VIII – é vedada a dispensa do empregado sindicalizado, a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei; [...].

Consolidação das Leis do Trabalho, 1943.

Art. 543. §3° Fica vedada a dispensa do empregado sindicalizado ou associado, a partir do momento do registro de sua candidatura a cargo de direção ou representação sindical ou de associação profissional, até um ano após o final do seu mandato, caso seja eleito, inclusive como suplente, salvo se cometer falta grave devidamente apurada nos termos desta Consolidação.

Súmula 197, Supremo Tribunal Federal.

O empregado com representação sindical só pode ser despedido mediante inquérito em que se apure a falta grave.

Súmula 379, Tribunal Superior do Trabalho.

O dirigente sindical somente poderá ser dispensado por falta grave mediante a apuração em inquérito judicial, inteligência dos arts. 494 e 543, §3°, da CLT.

O artigo 625-D, da Consolidação das Leis do Trabalho, determina que havendo instituição da CCP, seja sindical ou empresarial, qualquer demanda de natureza trabalhista será submetida à mesma. Este dispositivo causou grande polêmica doutrinária e jurisprudencial sobre a obrigatoriedade ou facultatividade dos conflitos serem submetidos à CCP antes de atingirem o Judiciário.

A corrente minoritária defende a passagem obrigatória pela CCP antes de o conflito ser submetido ao Judiciário. Tal entendimento está baseado na interpretação gramatical ou literal do artigo citado. A expressão “será submetida” teria conteúdo imperativo. Além disso, a passagem pela CCP seria uma condição da ação ou pressuposto processual, cuja ausência conduziria à extinção do processo sem resolução do mérito (art. 267, IV e VI, CPC c/c art. 769, CLT). A passagem pela CCP estaria amoldada no interesse processual.

Contudo, o entendimento majoritário atual é de que a passagem pela CCP é facultativa. Este entendimento restou praticamente pacificado após o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 2.139-7 e 2.160-5 pelo Supremo Tribunal Federal, nas quais restou definido que a passagem obrigatória pela CCP seria inconstitucional, por ofensa ao artigo 5°, inciso XXXV, da Constituição Federal (Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição).

Sendo assim, foi dada, ao artigo 625-D da Consolidação das Leis do Trabalho, interpretação conforme a Constituição Federal, e a passagem pela CCP é facultativa, não constituindo condição da ação ou pressuposto processual.

O membro da CCP, representante dos empregados, desenvolverá as atividades normais da empresa e somente será afastado quando convocado para atuar como conciliador, devendo ser computado este período no tempo de serviço. Nesse sentido, trata-se de hipótese de interrupção do contrato de trabalho.

A CCP poderá ser provocada por escrito ou oralmente (sendo reduzido a termo) e, uma vez provocada, será aberto um prazo de 10 (dez) dias para a realização da sessão de tentativa de conciliação.

No caso de ocorrer a conciliação, deverá ser lavrado o termo de conciliação. Segundo o parágrafo único do artigo 625-E da Consolidação das Leis do Trabalho, o termo “é título executivo extrajudicial e terá eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas”.

Apesar da literalidade da norma, há uma linha de entendimento que sustenta a possibilidade de discussão desse termo perante o Poder Judiciário, tanto no aspecto processual quanto na seara meritória. Nesse sentido, alguns autores entendem que o dispositivo celetista deve ser interpretado teleologicamente, de forma que a eficácia liberatória do termo apenas deve abranger as parcelas expressamente consignadas, ou seja, independentemente de eventual ressalva.

Além disso, realizando uma interpretação sistemática do artigo referido diante do artigo 477, §2°, da Consolidação das Leis do Trabalho, da Súmula 330 do Tribunal Superior do Trabalho e da Orientação Jurisprudencial 270 da SDI-1, verifica-se que a regra do sistema brasileiro é que o termo extrajudicial não tenha eficácia liberatória geral:

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Consolidação das Leis do Trabalho, 1943.

Art. 477. [...]. §2° O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela para ao empregado e discriminado o seu valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas.

Súmula 330, Tribunal Superior do Trabalho.

A quitação passada pelo empregado, com assistência de entidade sindical de sua categoria, ao empregador, com observância dos requisitos exigidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, tem eficácia liberatória em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado à parcela ou parcelas impugnadas.

I – A quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, consequentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que estas constem desse recibo.

II – Quanto a direitos que deveria ter sido satisfeitos durante a vigência do contrato de trabalho, a quitação é válida em relação ao período expressamente consignado no recibo de quitação.

Orientação Jurisprudencial 270 da SDI-1.

A transação extrajudicial que importa rescisão do contrato de trabalho ante a adesão do empregado a plano de demissão voluntária implica quitação exclusivamente das parcelas e valores constantes do recibo.

Há, contudo, divergência no próprio Tribunal Superior do Trabalho quanto ao alcance da eficácia liberatória do termo de conciliação perante a CCP.

Não havendo conciliação, será fornecida ao empregado a Declaração de Tentativa Conciliatória Frustrada (DTCF), também chamada de “carta de malogro”, a qual deverá ser juntada à eventual reclamação trabalhista (art. 625-D, §2º, CLT). A DTCF também será fornecida ao empregado no caso do prazo de 10 (dez) dias para a realização de sessão de tentativa de conciliação não ser respeitado (art. 625-F, parágrafo único, CLT).

Por fim, destaca-se que a provocação da CCP importará em suspensão do prazo prescricional, conforme determina o artigo 625-G, Consolidação das Leis do Trabalho. O dispositivo mencionado afirma que o prazo prescricional retoma seu fluxo (pelo que lhe resta) após a tentativa frustrada de conciliação ou o esgotamento do prazo de 10 (dez) dias. Não obstante, a doutrina afirma que o prazo também fluirá a partir da conciliação efetivamente realizada.

FONTES:

Constituição Federal, 1988.

Consolidação das Leis do Trabalho, 1943.

Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000.

Súmula 197 do Supremo Tribunal Federal.

Súmula 330 do Tribunal Superior do Trabalho.

Súmula 379 do Tribunal Superior do Trabalho.

Orientação Jurisprudencial 270 da SDI-1.

Este artigo é de autoria própria e está protegido pela Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Havendo sua utilização como citação, a fonte deverá ser exibida, da seguinte maneira:

FARACO, Marcela. A Comissão de Conciliação Prévia - CCP. MF – Direito e Advocacia, 19 nov. 2014. Disponível em: <jus.com.br/1061604-marcela-faraco/publicações>.

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Sobre a autora
Marcela Faraco

Advogada, Consultora de Direito. Atuante, desde 2007, na carreira jurídica, nas áreas do Direito Civil, Direito do Trabalho, Direito Empresarial e Direito do Consumidor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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