A possibilidade de revisão e impugnação das decisões do Tribunal de Contas da União - TCU pelo Judiciário

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RESUMO: Este Artigo trata da possibilidade jurídica da revisão e impugnação das decisões exaradas pelo Tribunal de Contas da União –TCU pelo Poder Judiciário. Em que pese serem revestidas as decisões daquele órgão de controle externo e parte da estrutura do Congresso Nacional de formalidades e nomenclaturas afetas ao judiciário (ex. Acórdão), tais precedentes se constituem em atos administrativos típicos. Nesse sentido, o presente artigo esteia-se para sedimentar a tese esposada no sistema de jurisdição única adotado no Brasil; na teoria da repartição dos poderes (freios e contrapesos) e na abalizada doutrina administrativa e jurisprudência pátria que trata sobre o tema.

Palavras-chave: Administração Pública. Ato Administrativo. Controle Externo. Poder Judiciário.


1. Introdução.

O Tribunal de Contas da União, como órgão de controle externo da esfera da União configurado pelo legislador constituinte originário de 1988 como órgão auxiliar pertencente à estrutura formal do Congresso Nacional, tendo o míster de “Corte de Contas”, fiscalizando os atos que dispõe sobre o uso de recursos afetos à União sendo geridos e gastos pelo agente público em qualquer esfera ou por qualquer particular ou entidade.

Em face do vasto poder de agir que foi conferido ao TCU e, em que pese, indubitavelmente, do importantíssimo e inquestionável papel que vem desempenhando desde sua criação, algumas distorções tem se perpetuado, mormente, quanto a uma imprópria “judicialização” de suas decisões e de sua própria natureza como órgão auxiliar de controle externo.

Com efeito, o presente artigo traz à baila a problemática advinda do acima referido processo de judicialização, que tem o condão de enfraquecer o princípio do devido processo legal e da ampla defesa e do contraditório e do próprio sistema de jurisdição única aplicado no Brasil.

Ademais se parte da premissa de que as decisões (ou como designa impropriamente o TCU - Acórdão), nada mais são do que atos administrativos que, por este motivo, estão submetidos ao controle de legalidade pelo Poder Judiciário.

Com efeito, calçado na teoria dos atos administrativos e nos própios princípios informadores da atividade administrativa, se constrói o arcabouço que serve como garantia ao administrado.

Nesse sentido para embasar a tese do articulista é feita critica à própria redação do texto constitucional (arts. 70 a 75) que trata das competências e natureza do TCU, desde sua nomenclatura até o uso de expressões afetas ao poder judiciário como “jurisdição”.

Nesse norte, nunca é demais ressaltar que vivemos em um Estado Democrático de Direito, sob a égide de um sistema de repartição de poderes que se baseia em premissas básicas, a saber, o da independência e harmonia entre si e do sistema de controle recíproco chamado pela doutrina federalista norte-americana de checks and balances, ou seja, de freios e contrapesos.


2.  Da atividade administrativa – conceituação.

Segundo preconiza o mestre Hely Lopes Meirelles em obra lapidar[2], ad literam:

“o conceito de administração pública não oferece contornos bem definidos, quer pela diversidade de sentidos da própria expressão, quer pelos diferentes campos em que se desenvolve a atividade administrativa”. 

Com efeito, o citado administrativista, define que administrar tem como sentido amplo o ato de gerir interesses, seguindo princípios e normas concernentes à guarda de bens entregues à administração alheia. Estes interesses podem ser de caráter individual ou coletivo. Temos, portanto, a definição mais estrita de administração pública quando os bens e direitos pertencem a uma comunidade de âmbito municipal, estadual ou federal. O direito administrativo como um ramo do direito público faz distinção entre o vocábulo administração pública como sendo todo o aparato governamental que servem à gestão dos interesses coletivos e Administração Pública como sendo o conjunto de órgãos e instituições que a compõe, é a atividade estatal por excelência.

Por sua vez, Diógenes Gasparini[3], conceitua Administração Pública utilizando um critério formalista, ou orgânico:

“Pelo critério formal, também denominado orgânico ou subjetivo, a expressão sub examine indica um complexo de órgãos responsáveis por funções administrativas. De acordo com o material, também chamado de objetivo, é um complexo de atividades concretas e imediatas desempenhadas pelo Estado sob os termos e condições da lei, visando o atendimento das necessidades coletivas. Neste complexo, estão as atividades de fomento, polícia administrativa ou poder de polícia e os serviços públicos. Pelo critério formal, é sinônimo de Estado ( Administração Pública); pelo material, equivale a atividade administrativa (administração pública”

Neste sentido, a Constituição Federal, emprega tanto o sentido material e formal a locução Administração Pública, em seu artigo 37. Bem nota o constitucionalista José Afonso da Silva[4] ao sustentar em obra fundamental que:

“o art. 37 da Constituição emprega a expressão Administração Pública nos dois sentidos. Como conjunto orgânico, ao falar em Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Como atividade administrativa, quando determina sua submissão aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, da licitação e os de organização de pessoal administrativo”.

A natureza da administração pública consubstancia-se em um múnus publico, ou seja, conforme bem define Hely Lopes Meirelles (op. cit. pg. 85) em “um encargo de defesa, conservação e aprimoramento dos bens, serviços e interesses da coletividade.”

A atividade administrativa tem por excelência o objetivo de gerir recursos, bens e direitos com o intuito de prover e fomentar o bem comum, traduzidos em serviços públicos, poder de polícia, etc.

Por fim, a finalidade da Administração Pública é precipuamente atingir o bem comum da comunidade administrada, esta por sua vez investe o mandatário do poder de gerir, em nome da coletividade os bens, serviços e recursos com o fim específico de agir como um despenseiro, atendendo somente à vontade coletiva expressa na lei e não a sua vontade individual. Ensina o sempre atual professor Hely Lopes Meirelles (op. cit. pg. 86) que :

”Nos desempenhos dos encargos administrativos o agente do Poder Público não tem a liberdade de procurar outro objetivo, ou de dar, ou de dar fim diverso do prescrito em lei para a atividade. Não pode assim, deixar de cumprir os deveres que a lei lhe impõe, nem renunciar a qualquer parcela dos poderes e prerrogativas que lhe são conferidos. Isso porque os deveres, poderes e prerrogativas não lhe são outorgados em consideração pessoal, mas sim para serem utilizados em benefício da comunidade administrada. Descumpri-los ou renunciá-los equivalerá a desconsiderar a incumbência que aceitou ao empossar-se no cargo ou função pública. Por outro lado, deixar de exercer e defender os poderes necessários à consecução dos fins sociais que constituem a única razão de ser da autoridade pública de que é investido, importará renunciar os meios indispensáveis para atingir os objetivos da Administração.”


3. Princípios afetos aos atos administrativos

Segundo a lição de Carlos Ari Sunfeld[5] princípios são: “as idéias centrais de um sistema, ao qual dão sentido lógico, harmonioso, racional permitindo a compreensão de seu modo de organizar-se”.

A constituição federal expressamente, no caput do artigo 37, elenca certos princípios informativos que devem reger a Administração Pública como um todo, incluindo-se, por conseguinte a Administração Pública na esfera da União. São eles os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Tais cânones constitucionais devem ser entendidos como princípios que regem a atividade estatal como um todo, na esfera dos três poderes e também na instituição Ministério Público.

O princípio da legalidade encerra em seu bojo a noção de que o administrador ou gestor público deverá sempre agir secundum legem, ou seja, em perfeita sincronia com a norma legal aplicada ao caso concreto. Na definição de Hely Lopes Meirelles (op. cit. pg. 87) isto significa que:

“o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso”.

O aludido princípio traduz a noção de que não existe espaço na Administração Pública para devaneios pessoais, muito menos, liberdade irrestrita de contratar a exemplo do que ocorre no setor privado.

Como bem assevera MEIRELLES (op. cit. pg. 87), as normas que formam o sistema navegante do administrador público são de ordem pública, cogente, sem lacunas ou brechas para oportunismos ou casuísmos.

Por sua vez, o princípio da impessoalidade, impõe ao administrador uma barreira para impedir qualquer tipo de atendimento ou preferência em razão de suposto prestígio do administrando ou utilizar o poder público como um verdadeiro balcão de trocas e favores. Confunde-se tal princípio com o dogma constitucional da isonomia, Neste sentido, José Afonso da Silva (op. cit. pg. 570), atribui este sentido ao sustentar que: “O princípio ou regra da impessoalidade significa que os atos e provimentos administrativos são imputáveis não aos funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário”. Hely Lopes Meirelles (op. cit. pg. 85) assevera que o aludido princípio traz também nuances do princípio basilar da finalidade, principalmente no que tange à obrigação que tem o administrador de só praticar o ato para seu fim previsto expressamente na lei.

O princípio da moralidade segundo diz Diógenes Gasparini (op. cit. pg. 9) citando Hauriou que o citado princípio extrai-se do” conjunto de regras de conduta que regulam o agir da Administração Pública; tira-se da boa e útil disciplina interna da Administração Pública”.

O ato administrativo e a própria atividade estatal devem não só atentar e preencher os ditames legais, mas, também devem estar em conformidade com a moral coletiva, o sentimento de justiça e honestidade. Conforme, preconizavam os romanos, nem tudo o que é legal é moral.

Segundo assevera Hely Lopes Meirelles (op. cit. pg.89) , com base na lição de Manoel de Oliveira Franco Sobrinho, a moralidade administrativa está diretamente relacionada à noção de bom administrador, o qual exercendo sua competência, guia-se não só pelo texto legal mas, também, pela moral da coletividade administrada, levando a cabo ações que atentam, primordialmente pelo interesse público.

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A moral que trata este princípio, segundo MEIRELLES, apoiando-se em Hauriou, o sistematizador de tal princípio é a moral jurídica e não a moral comum, a qual deve ser entendida como “o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração Pública.”.

A publicidade, segundo aduz Jose Afonso da Silva (op. cit. pg. 669,670), sempre foi tido como um  princípio administrativo, pois se entende que: “ o Poder Público, por ser público, deve agir com a maior transparência possível, a fim de que os administrados tenham, a toda hora, conhecimento do que os administradores estão fazendo.”

Todavia, como bem ressalta o constitucionalista citado in retro, a publicidade não é elemento formativo do ato administrativo mas, sim, requisito de eficácia e moralidade do mesmo. Tal publicidade perfaz-se pela publicação do ato administrativo em jornais, editais e órgãos oficiais de imprensa. È condição de executoriedade para que o ato produza efeitos externos.

Com efeito, tal princípio não tem caráter absoluto, tendo a Constituição Federal o excepcionado, em seu art. 5º, inciso XXXIII, no caso de informações e atos que devam, por seu caráter sigiloso com vistas a resguardar a segurança da sociedade e do Estado.

Por sua vez, o princípio da eficiência, acrescentado ao texto constitucional pela EC nº. 19/98 trouxe ao administrador público o encargo de atentar para o desempenho da atividade administrativa, assemelhando a mesma, respeitando suas particularidades, aos níveis de excelência do setor privado. Segundo aduz Diógenes Gasparini (op. cit. pg. 20/21), a eficiência impõe à Administração Pública direta e indireta “ a obrigação de realizar suas atribuições com rapidez, perfeição e rendimento.

Contudo, conforme bem sustenta José Afonso da Silva (op. cit. pg. 671), a eficiência não é um conceito jurídico mas meramente econômico, a mesma, segundo o mesmo constitucionalista “orienta a atividade administrativa no sentido de conseguir os melhores resultados com os meios escassos de que se dispõe e a menor custo. Rege-se, pois, pela regra da consecução do maior benefício com o menor custo possível. Portanto, o princípio da eficiência administrativa tem como conteúdo a relação meios e resultados.”

Ao transpormos tal princípio para a esfera da Administração Pública, esbarramos, notadamente, na diferença de mensuração das variáveis de eficiência, na esfera da economia, quando aplicamos as mesmas no âmbito da Administração Pública. Com efeito, a eficiência está relacionada com a otimização do sistema transformador, aonde através da mensuração de entrada de dados ou matéria prima versus a saída dos mesmos em um dado sistema ou organização. No entanto, na esfera pública, muitas vezes, estas variáveis não são plenamente identificáveis, como por exemplo, na prestação de serviços públicos, assistência social, etc.

Como bem conclui José Afonso da Silva (op. cit. pg. 671), em lição lapidar, concernente à problemática, ora abordada, ad literam:

”Na Administração Pública as condições de eficiência são diferentes porque, em relação aos bens públicos, vale o princípio de não - exclusão, isto é, o consumo da parte de um agente econômico não exclui a possibilidade que outros consumam contemporaneamente o mesmo bem; enquanto no caso dos bens privados cada um consome diversas quantidades ao mesmo preço, no caso dos bens públicos (p. ex. , a defesa nacional), todos consomem a mesma quantidade atribuindo-lhes valores diferentes. È que o financiamento do custo dos bens públicos decorre normalmente de imposição tributária, cujo montante é independente das preferências individuais, como ocorre nos preços de bens privados”.

Adicionalmente aos princípios elencados acima, a doutrina administrativista  enumera outros princípios não diretamente expressos na Carta Magna, mas, que permeiam o ordenamento jurídico pátrio. São estes, os princípios da motivação, o qual tenciona forçar o administrador público a declinar os pressupostos fáticos que determinaram ou causaram o ato em si, bem como os pressupostos jurídicos que ensejam ou autorizam tal prática administrativa.

Ressalta-se que em certos atos administrativos, mormente os discricionários, a motivação poderá não ser expressamente anotada, contudo caso o administrador assim o faça, estará este adstrito aos mesmos, em respeito à teoria dos motivos determinantes, a qual autoriza o judiciário a proceder à análise dos motivos declinados mesmo em atos que o dispensem, caso os mesmos encontrem-se desvirtuados.

Com efeito, o aludido princípio encontra guarida em nossa Lei Maior, como uma garantia individual contra a arbitrariedade estatal e para assegurar a ampla defesa e o contraditório, no art. 5º, inciso LV. Neste mesmo sentido a Lei n.º 9.784/99 em seu art. 1º disciplina que a Administração Pública deverá obedecer ao princípio da motivação.

Dentre os princípios aplicados à Administração Pública que não estão expressamente elencados no art. 37 da Constituição Federal, destaco ainda, o da ampla defesa e do contraditório, estes constantes do art. 5º, inciso LV da CF/88 e materializados no art. 2º da legislação infraconstitucional in retro. Tal princípio, o qual trespassa todo o ordenamento jurídico pátrio, muito embora o legislador tenha usado o termo “litigante” – o que infere uma esfera jurisdicional, tais princípios se fazem presentes na dita “jurisdição” administrativa ou processo administrativo. Neste sentido, Hely Lopes Meirelles (op. cit. pg.102), com base na lição de Ada Pellegrini Grinover, in verbis:

“a Constituição não mais limita o contraditório e a ampla defesa aos processos administrativos (punitivos) em que haja acusados, mas estende as garantias a todos os processos administrativos, não-punitivos e punitivos, ainda que neles não haja acusados, mas simplesmente litigantes (...) litigantes existem sempre que, num procedimento qualquer, surja um conflito de interesses. Não é preciso que o conflito seja qualificado pela pretensão resistida, pois neste caso surgirão a lide e o processo jurisdicional. Basta que os partícipes do processo administrativo se anteponham face a face, numa posição contraposta. Litígio equivale a controvérsia, a contenda, e não a lide. Pode haver litigantes –e os há – sem acusação alguma, qualquer lide.”

O princípio da supremacia do interesse público traz em seu conteúdo uma intima relação com o princípio da finalidade, ou seja, o interesse coletivo deve nortear os fins do ato administrativo em detrimento de interesse individual ou setorial, mesmo quando os mesmos forem exarados de particulares em se tratando de atividades ou serviços públicos delegados. Deste princípio decorre a noção da indisponibilidade do interesse público.

Na lição de Celso Antônio Bandeira de Mello[6], o eminente jurisconsulto descreve com precisão a aplicação do presente princípio como condição de existência de qualquer sociedade:

“o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é principio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. È a própria condição de sua existência. Assim, não se radica em dispositivo específico algum da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas dele, como, por exemplo, os princípios da função social da propriedade, da defesa do consumidor ou do meio ambiente, ou tantos outros. Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio social”.

Celso Antônio Bandeira de Mello[7] conceitua o ato administrativo como:

“(...) declaração unilateral do Estado no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante comandos concretos complementares da lei (ou, excepcionalmente, da própria Constituição, aí de modo plenamente vinculado) expedidos a título de lhe dar cumprimento e sujeitas a controle de legitimidade por órgão jurisdicional”.

Constitui-se a declaração em manifestação de vontade, tal situação  distingue-se do fato dito como administrativo. O fato de ser unilateral, apesar de ser acidental, serve para distinguir o ato administrativo do contrato administrativo, o qual é constituído por mais de uma parte..

Os atributos dos atos administrativos são características que os diferenciam dos atos meramente privados, são prerrogativas excepcionais que o ordenamento jurídico os concede, a fim de permitir que o poder público exerça as suas funções.

Com efeito, os citados atributos esposam o fundamento de validade no Estado Democrático de Direito, e são voltadas para a finalidade pública, sendo conferidas aos atos administrativos, e não à Administração Pública.

Nesse norte, a presunção de veracidade e legitimidade atinge os atos administrativos de uma forma geral. Todo e qualquer ato administrativo possui esta característica, no entanto se trata de uma presunção relativa, juris tantum, da qual cabe prova em contrário.

A presunção é de veracidade e legitimidade. Veracidade relaciona-se com o conteúdo do ato administrativo, que se presume verdadeiro; fidedigno. Já a legitimidade traduz-se na existência da competência para a criação do ato, a qual se presume ser correta.

Nesse diapasão, o ato administrativo é, portanto, verdadeiro quanto ao conteúdo, e legítimo quanto à competência, até prova em contrário. Trata-se de uma inversão do ônus da prova, a fim de permitir ao poder público atingir as finalidades públicas que dele se esperam. Referida prova pode ser produzida pelo interessado, em processo judicial, ou no procedimento administrativo.

Nesse norte, a presunção relativa de veracidade e legitimidade decorre da incidência do princípio da legalidade, visto que, como a Administração Pública só está autorizada a fazer o que se encontra previsto na lei, pela lógica dedutiva todos os seus atos são, em tese, regulares, salvo prova em contrário decorrente da aplicação da lógica empirista.

Esta presunção possui grande relevância em termos processuais (em razão do ônus da prova no direito processual civil, regido pela Lei Federal nº. 5.869 de 1973), não sendo abalada por meras alegações genéricas, ou desprovidas de efetivo suporte probatório.

Ademais, importante registrar que, como nem todos os atos praticados pela Administração Pública são administrativos, nem todos são contemplados com tal atributo.

De fato, os atos praticados pela Administração Pública em regime privado, os atos políticos, ou de mera execução não possuem presunção de veracidade e legitimidade.

Nesse mesmo diapasão, nem todo ato administrativo é praticado pela Administração Pública, e nem todo ato praticado pela Administração Pública pode ser conceituado como administrativo.

Com efeito, se um ato jurídico for praticado pelo poder público, sem pertinência temática direta com uma função administrativa, este ato não será classificado como administrativo. Tal ato, dependendo das circunstâncias fáticas, poderá ser mero ato  de  direito privado, um ato material, ou um ato político.

Nesse norte, destaca-se que a motivação para a prática de um determinado ato administrativo pode ou não estar prevista em lei. Quando o motivo encontra-se descrito na lei, o ato passa a ser vinculado, e apenas pode ser praticado se a situação legalmente descrita efetivamente ocorrer.

Com efeito, quando a lei não descreve a motivação para a prática do ato administrativo, ou ao fazê-lo, carreia indeterminação, pode o agente público, escolher o motivo, o qual deve ser idôneo para justificá-lo diante do caso concreto, com pertinência lógica, e em sintonia com a legislação de regência abstrata do ato.

È importante ressaltar que os motivos que tiverem sido eleitos pelo agente para a prática do ato administrativo discricionário determinam a sua validade. Tal premissa coaduna-se com a da teoria dos motivos determinantes, majoritariamente abarcada pela doutrina pátria, com destaque para Celso Antônio Bandeira de Mello, bem como, pelo posicionamento dos Tribunais Superiores, segundo a qual a prática do ato por motivos falsos ou inexistentes conduzem à sua invalidade, ainda que este não dependesse de motivação específica.

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Sobre o autor
Rodrigo Sergio Guimarães Debiasi

Advogado, Graduado em Direito pela Universidade Católica de Brasília - UCB. Pós-graduado lato sensu em Direito Administrativo pela UGF. Atuou como Consultor Jurídico na área de licitações, contratos e convênios no Governo Federal, OPAS/OMS e UNESCO. É atualmente advogado na assessoria jurídica do SEBRAE Nacional.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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