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Crimes contra a ordem tributária e a representação fiscal para fins penais

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01/11/2002 às 00:00
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IV – Crimes contra a ordem tributária e a representação para fins penais

Os crimes contra a ordem tributária estão delimitados nos art.s 1.º e 2.º da Lei n.º 8.137, de 27 de dezembro de 1990, seguidos de outras disposições. É o texto destes artigos:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V.

Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:

I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo;

II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;

III - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal;

IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento;

V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Encontramos nestes dois artigos crimes dolosos de resultado, de dano ou crimes materiais, que são as condutas previstas no art. 1.º, que requerem o resultado de supressão ou redução de tributos, e crimes dolosos formais, quando a mera conduta do contribuinte for idêntica ao disposto nos incisos I a V do art. 2.º, e que, por si só, irá gerar a consumação do ilícito penal, independentemente de qual seja o resultado obtido pelo autor.

Primeiramente, antes de nos aprofundarmos nas discussões referentes às espécies penais acima descritas, necessário se faz comentarmos a existência de grande polêmica no direito penal tributário que vem ocorrendo com a deliberação, por parte do Fisco, de normas que possibilitem a representação perante o juízo criminal, no momento em que a autoridade administrativa lavra o auto de infração e imposição de multa, nele detectando a pratica de conduta delituosa tipificada como crime contra a ordem tributária.

Ocorre que art. 83 da Lei n.º 9.430, de 27 de dezembro de 1996, ao tratar dos crimes contra a ordem tributária, prevê que:

Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária definidos nos arts. 1.º e 2.º da Lei n.º 8.137, de 27 de dezembro de 1990, será encaminhada ao Ministério Público após proferida decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente.

Parágrafo único. As disposições contidas no caput do art. 34 da lei 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não recebida a denúncia pelo juiz. (grifos nossos).

O parágrafo único adequa a regra de representação à extinção da punibilidade dos crimes dos arts. 1.º e 2.º da Lei n.º 8.137/90 quando o pagamento do tributo juntamente com as demais cominações legais ocorrer antes da denúncia.

A regra contida no art. 83, por sua vez, reconheceu que a autuação fiscal representa um lançamento provisório geralmente contendo a imposição de penalidade administrativa também passível de questionamentos e de afirmação ou infirmação da matéria alegada, pois, a legislação prevê que se o contribuinte não concordar com a exigência fiscal poderá impugná-la no prazo de 30 (trinta) dias perante a Administração Pública competente, com efeito suspensivo do crédito, sem o recolhimento do valor questionado e dando início ao contencioso administrativo tributário.

Legislação referente aos crimes de sonegação fiscal, a Lei n.º 4.729, de 14 de julho de 1965, dispunha em seu art. 7.º que:

Art. 7.º. As autoridades administrativas que tiverem conhecimento de crime previsto nesta Lei, inclusive em autos e papéis que conhecerem, sob pena de responsabilidade, remeterão ao Ministério Público os elementos comprobatórios da infração, para instrução do procedimento criminal cabível.

Entendemos que este dispositivo foi revogado pelos artigos 1.º e 2.º da Lei n.º 8.137/90, de forma que os crimes de sonegação fiscal são entendidos como sendo os crimes de supressão ou redução de tributos ocorridos mediantes os procedimentos fraudulentos que esta lei descreve.

E ainda a Lei n.º 4.357, de 16 de julho de 1964, já revogada e que alterava a legislação do imposto de renda, dentre outras providências, dispunha em seu art. 11, § 3.º, entendimento similar ao do art. 83 da Lei n.º 9.430/96:

§ 3.º Nos casos previstos neste artigo, a ação penal será iniciada por meio de representação da Procuradoria da República, à qual a autoridade julgadora de primeira instância é obrigada a encaminhar as peças principais do feito, destinadas a comprovar a existência do crime, logo após a decisão final condenatória proferida na esfera administrativa.

Diante da norma do art. 83, encontramos divergências nas decisões judiciais, mesmo da Corte mais elevada, sobre este assunto. Vejamos as decisões seguintes sobre o assunto:

A representação fiscal a que se refere o art. 83, da Lei 9.430/96, estabeleceu limites para os órgãos da administração fazendária, ao determinar que a remessa ao Ministério Público dos expedientes alusivos aos crimes contra a ordem tributária, definidos nos arts. 1.º e 2.º, da Lei n.º 8.137/90, somente será feita após a conclusão do processo administrativo fiscal. (STF – Ac. HC n. 75.723-5-SP, DJ de 06.02.1998, p. 5, Rel. Min. Carlos Velloso) (12)

O art. 83 da Lei n.º 9.430 não estabelece condição de procedibilidade para a instauração da ação penal pública pelo Ministério Público, que pode antes mesmo de encerrada a instância administrativa, que é autônoma, propor a ação penal com relação aos crimes a que ela alude. (STF - Ac. Rec. Ord. (HC n. 77.258-2-SP, DJ de 03.09.1999, Rel. Min. Moreira Alves) (13)

TJSP - CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL -- Lei 8.137/90 -- Ação penal -- Instauração antes de definido o valor da dívida -- Admissibilidade -- Autonomia das instâncias civil e penal -- Procedimento administrativo-fiscal que não constitui pressuposto ou condição de procedibilidade, da ação penal ou de inquérito policial para apuração do delito -- "Habeas corpus" visando trancamento da ação negado -- Prosseguimento determinado (14).

TACrimSP - SONEGAÇÃO FISCAL -- Lei 4.729/65 -- Inquérito policial -- Instauração antes de definido o valor da dívida -- Admissibilidade face a autonomia das instâncias cível e penal, não ficando esta adstrita à prévia definição do real montante do débito tributário do contribuinte -- Justa causa reconhecida -- "Habeas corpus" visando a suspensão do procedimento negado -- Inteligência do art. 7. º da referida lei.(15)

A primeira decisão conclui pela limitação que se submete a administração fazendária de somente remeter ao Ministério Público os expedientes que denotarem a prática de crime contra a ordem tributária após a conclusão do processo, atendendo ao disposto no art. 83 da Lei n.º 9.430/96.

A segunda decisão e seguintes, por sua vez, afirmando que os limites impostos à administração não são condição de procedibilidade para o Ministério Público instaurar a ação pública e, neste caso, entendendo que se trata de ação pública incondicionada, somente poderiam se referir a outros crimes que não os dispostos nos artigos 1.º e 2.º da Lei n.º 8.137/90, pois entender de modo diverso seria admitir o início da ação penal sem a constituição definitiva do crédito tributário, ou seja, sem a materialidade do crime.

O que ainda se discute neste caso é a autonomia das instâncias administrativa e penal, da mesma forma como ocorreu durante a vigência da Lei n.º 4.729/65 sobre a autonomia das instâncias civil e penal e que gerou a edição, pelo Supremo Tribunal Federal, da Súmula n.º 609 dispondo que: É pública e incondicionada a ação penal por crime de sonegação fiscal, e, desse modo, garantindo a iniciativa do Ministério Público utilizando os elementos ou meios de prova a que tivesse acesso, o que não foi confirmado pelo art. 15 da Lei n.º 8.137/90 dispondo que: os crimes previstos nesta Lei são de ação penal pública, aplicando-se-lhes o disposto no art. 100 do Dec.-lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal e, a regra de direito penal, determina que a ação pública será condicionada à representação quando a lei expressamente assim o exigir.

Ainda se discute se o artigo 83 da Lei n.º 9430/96 não é incompatível com o artigo 129, I da Constituição Federal, dizendo que: Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma de lei. Nos explica o assunto Hugo de Brito Machado:

Essa tese, data vênia, envolve um equívoco dos méis evidentes, pois o próprio dispositivo constitucional já deixa claro que a conduta do Ministério Público há de se desenvolver nos termos da lei. Ou, em outras palavras, deixou o constituinte livre o legislador ordinário para definir como pública, ou privada, a ação penal neste ou naquele crime, e definir a ação penal pública como condicionada ou incondicionada. Como se vê, a questão da disputa de poder entre o Ministério da Fazenda e o Ministério Público, deve ser tratada a nível de lei ordinária, e não no altiplano constitucional.(16)

Importante ainda citarmos entendimento diverso, do juiz federal Nelson Bernardes de Souza, quanto ao art. 15 da Lei nº 8.137/90:

Referido dispositivo legal não foi alterado pelo art.83 da Lei n.o. 9.430/96, de modo a introduzir uma condição de procedibilidade para o exercício da ação penal. A representação de que fala o art. 83, já tratada pelos Decretos n.o. 982/93 e 325/91 nada tem a ver com a figura da representação, com o sentido jurídico que lhes empresta o Código Penal e o Código de Processo Penal. Para estes diplomas, a representação é condição de procedibilidade, enquanto que a representação de que trata o art. 83 da lei nº 9.430/96 não passa de mera notitia criminis, que não é possibilidade exclusiva das autoridades fazendárias (art. 16 da Lei nº 8.137/90 : "qualquer pessoa poderá provocar a iniciativa do Ministério Público nos crimes descritos nesta Lei...). (grifos originais)(17)

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Não entendemos ser, este, caso de mera notitia criminis,devido à complexidade da materialização do crédito tributário e de sua constituição definitiva pelo lançamento já discutido em esfera administrativa, ao que já nos reportamos anteriormente.

Na França, a ação penal pública nos delitos fiscais pode ter início com a representação exclusiva da Administração, o que é a regra ou poderá, nas hipóteses previstas em lei, conforme as circunstâncias e a gravidade da infração, nascer da iniciativa do Ministério Público, como nos explica Pierre di Malta:

Dans quelques hipothèses particulières, le ministère public a compétence pour poursuivre directement les auteurs de délits fiscaux, en l´absence de toute plainte de l´Administration. Cette solution s´applique, notamment, aux délits d´escroquerie en matière de TVA (cf. supra, nº 370), des refus collectif de l´impôt (cf. supra, nº 382) ou d´opposition collective à l´établissement de l´assiette de l´impôt (cf. supra, n. 379). Mais, en principe, l´action publique est subordonnée à l´initiative de l´Administration qui, selon les cas, apparaît exclusive ou partagée.(18)

O que complementa o autor adiante, dizendo que na iniciativa não exclusiva ou partilhada, a prisão é subordinada ao parecer da comissão de infrações fiscais e a representação não anula o ato do Ministério Público.

E o Ministro Edson Vidigal, manifestando-se sobre a existência ou não de inconstitucionalidade na determinação de somente o Fisco poder representar perante o Ministério Público após findo o processo administrativo fiscal, confirma o nosso entendimento explicando que :

Não se trata, a toda evidência, de cerceamento da ação institucional do Ministério Público. O que a lei restringe é a ação da repartição fazendária, proibida agora como esteve quando da vigência da Lei nº 4357/64, art. 11, § 3º, de remeter papéis, para fins de denúncia, ao Ministério Público, enquanto não se concluir, no processo administrativo, sobre a existência ou não da obrigação tributária. Isto é, o crime em tese contra a ordem tributária, somente despontará, em princípio, configurado ao término do procedimento administrativo. Não é mais um simples auto de infração, resultante quase sempre de apressadas, conquanto tensas inspeções, o instrumento com potencialidade indiciária suficiente para instruir uma denúncia criminal. Inconstitucionalidade é quando a lei, em seus requisitos formais e materiais, não encontra adequação com a constituição, ou seja, quando a sua proposição soa esquisito e colide com a harmonia que resume em si o corpo e o espírito da Constituição.(19)

Entendimento que, no seguinte julgado possui divergências:

STJ - CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA - Ação penal - Representação fiscal prevista no art. 83 da Lei 9.430/96 - Circunstância que não é condição de procedibilidade da persecução - Ministério Público que pode valer-se de quaisquer outros elementos informativos da ocorrência do delito para oferecer a denúncia. DENÚNCIA - Inépcia - Ocorrência - Crime contra a ordem tributária - Inicial acusatória que formula acusação genérica sem apontar de modo circunstanciado a participação da ré no fato delituoso - Mera qualidade de sócio ou diretor de uma empresa, na qual se constatou a ocorrência de crime de sonegação fiscal que não autoriza que contra o mesmo diretor seja formulada uma acusação penal em juízo - Inteligência do art. 41 do CPP.

Mas observamos ainda que o julgado acima incorre na mesma questão que vimos defendendo, da constituição definitiva do lançamento e, aqueles outros elementos que vislumbrem a ocorrência do delito contra a ordem tributária e dos quais possa valer-se o Ministério Público estarão, conseqüentemente, dependendo da apuração daquele crédito em esfera administrativa pois, a Lei n.º 8.137/90 fala em reduzir ou suprimir tributo e esta supressão ou redução deve ser apurada.

A limitação imposta pelo art. 83 acima não pode ser incompatível com os atos normativos infralegais das autoridades administrativas fiscais, que devem àquele dispositivo se adequar. Neste sentido, verificamos a ilegalidade da Portaria CAT-76/99, da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo que determina:

Art. 1.º Sempre que o Agente Fiscal de Rendas, quando da lavratura de AIIM, constatar situação que, em tese, possa configurar, também, crime contra a ordem tributária, comunicará o fato, de imediato, ao Delegado Regional Tributário de sua área.

§ 1.º - Se o Delegado entender que a notícia encerra matéria de relevante interesse, procederá, por avocação, o julgamento imediato e preferencial do Auto de Infração e Imposição de Multa em Primeira Instância.

§ 2.º - Após o julgamento, será imediatamente encaminhada ao Ministério Público a representação fiscal para fins penais, instruída com os elementos instrutórios do AIIM.

§ 3.º - A representação a que se refere o parágrafo anterior será elaborada segundo o modelo anexo.

Art. 2.º Na situação prevista nesta Portaria, a representação a que ela se refere será encaminhada independentemente do julgamento definitivo do processo de determinação do crédito nas esferas administrativas.(grifos nossos).

Ocorre que a norma contida no art. 83, muito embora haja o entendimento de que não seja cogente para os atos do Ministério Público o qual poderá agir com os elementos que possua para formar o seu convencimento sobre a existância ou não do ilícito, é cogente, determinante, para os atos da administração, a qual somente pode fazer o que a lei determina, não podendo os atos infralegais, como o é a Portaria do CAT acima, serem incompatíveis com a lei ordinária, hierarquicamente superior, pois somente com o término do procedimento administrativo fiscal é que o lançamento se tornará definitivo e se confirmará ou não a matérialidade delitiva. Antes desta constiutição definitiva, o ato de lançamento pode ser desconstituído, desaparecendo, consequentemente, o tipo penal.

A garantia prevista no art. 83 da lei nº 9430/96 ainda mais se justifica por se compatibilizar com os princípios de direito penal, uma vez que reafirma a presunção de inocência constante do inc. LVII do art. 5º da Constituição Federal. Referido dispositivo diz que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e, portanto, não se justifica o início da ação penal por iniciativa da própria fiscalização, se ao mesmo tempo esta se encontra revisando o seu lançamento.

A ausência de elementos suficientes para formar a sua convicção faria com que a decisão em lide penal, ficasse suspensa até o final da lide administrativa, decidindo pela existência ou não de crédito tributário e se houve ou não a prática de atos ilícitos pelo contribuinte.

A regra do art. 83 confirma também o devido processo legal e duplo grau: cerceamento do direito de ampla defesa constitucionalmente amparado pelo que dispõe a nossa Carta Magna em seu art. 5.º, incisos LIV, LV e LVII:

"LIV – Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal."

"LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;"

"LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".(grifo nosso).

Retornando agora à distinção que citamos no início deste capítulo, de que os crimes previstos no art. 1.º da Lei n.º 8.137/90 são crimes materiais ou de resultado, enquanto aqueles previstos no art. 2.º são crimes formais ou de mera conduta, observamos que esta distinção gera outra polêmica, no sentido de que somente os crimes previstos no art. 1.º, por dependerem de seu resultado, é que se inserem na regra do art. 83. Este não é o nosso entendimento, pois a regra contida no artigo 83 se refere aos dois artigos, não fazendo qualquer exceção aos tipos penais por serem ou não crimes de resultado.

Ocorre portanto que, sempre que o agente da fiscalização detectar um crédito tributário dotado de exigibilidade, irá primeiramente lavrar o auto de infração e imposição de multa, o qual poderá, ser impugnado no prazo de trinta dias com efeito suspensivo. Estando, enfim, a Administração Pública, convencida da existência do crédito tributário em seu favor devido à inexistência de causas que o afastem, por estarem findas as discussões em esfera administrativa e, se, além disso, detectar a prática de ilícito por parte do contribuinte, demonstrados os indícios suficientes de autoria e de existência do fato, então, somente neste momento, irá o agente comunicar o fato ao seu superior responsável para que encaminhe ao Ministério Público a representação fiscal para fins penais.

Entender de forma diferente seria desconsiderar, diante da complexidade da matéria referente ao ato de lançamento, toda a previsão legislativa de constituição definitiva do crédito tributário, que dá garantia de para o contribuinte de que ele somente sofrerá a tributação que estiver prevista em lei, atendendo deste modo ao princípio da legalidade, ao sobreprincípio da tipicidade fechada, quando a lei deve descrever todos os aspectos ou elementos da tributação e também ao sobreprincípio da segurança jurídica que garante ao contribuinte somente sofrer tributação, bem como as penalidades dela decorrentes, por meio de lei expressa e emanada do ente competente.

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Sobre a autora
Lais Vieira Cardoso

Analista judiciária do TRT da 15ª Região, professora universitária do Centro Universitário Moura Lacerda, Mestre em Direito das Obrigações Público e Privado pela UNESP de Franca e especialista em Direito Tributário pela PUC Campinas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARDOSO, Lais Vieira. Crimes contra a ordem tributária e a representação fiscal para fins penais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3450. Acesso em: 25 abr. 2024.

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