5. MEDIDAS PARA SANEADOR AS LACUNAS DA LEI 12.441/11
O Legislativo, ao identificar lacunas na legislação em estudo, propôs, por meio do PLS 96/2012, de autoria do Senador Paulo Bauer, o aperfeiçoamento da disciplina da EIRELI e a criação da Sociedade Limitada Unipessoal (SLU) como uma nova natureza jurídica.
No referido projeto, estabelece-se que tanto a EIRELI quanto a Sociedade Limitada Unipessoal poderão ser constituídas por pessoa jurídica ou pessoa natural. Caso o projeto seja transformado em lei, revogará a Instrução Normativa nº 117/2011 do DNRC, que atualmente não permite a constituição de EIRELI por pessoa jurídica. O projeto também prevê que o titular poderá ser proprietário de diversas EIRELI e/ou SLU.
No entanto, apesar de a exposição de motivos do projeto de lei discutir a exigência de capital mínimo para a constituição da EIRELI, o presente artigo não foi revogado no texto do projeto. Vale ressaltar que o projeto de lei não aborda questões relacionadas à capacidade civil.
Além disso, o projeto de lei propõe a criação da Seção IX, com o título "Da Sociedade Limitada Unipessoal", incluindo os artigos 1.087-A a 1.087-F, os quais tratam especificamente da constituição e regulamentação da Sociedade Limitada Unipessoal.
Atualmente, o projeto encontra-se aguardando parecer da Comissão de Constituição e Justiça.
6. CONCLUSÃO
A criação da EIRELI atendeu aos anseios do empreendedor individual que, para proteger seu patrimônio pessoal, era obrigado a constituir sociedades fictícias. A exposição de motivos da referida lei ressalta que sua finalidade é garantir a proteção do patrimônio pessoal do empreendedor por meio da limitação da responsabilidade.
Contudo, a lei apresenta algumas falhas em sua elaboração, como o equívoco na nomenclatura do instituto ao utilizar o termo "Empresa" para definir a nova natureza jurídica. Essa escolha não respeita a teoria da empresa adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Ademais, a Lei nº 12.441/2011 não abordou pontos relevantes, como:
a obrigatoriedade de capacidade civil do titular e a possibilidade de ser assistido;
a definição de capital social mínimo e sua atualização de acordo com o salário mínimo vigente no país;
a ausência de previsão para a comprovação do capital mínimo exigido;
a definição da natureza jurídica;
as regras para extinção;
a possibilidade de utilização por pessoa jurídica; e
a vinculação da EIRELI a atividades empresárias.
Com a regulamentação pelo DNRC, por meio da Instrução Normativa nº 117/2011, este órgão passou a legislar sobre os pontos omissos.
A capacidade civil, embora não tenha qualquer impedimento legal na Lei nº 12.441/2011, para os casos omissos, será regida de forma supletiva pelas regras da sociedade limitada. Essas regras permitem que sócios que não possuem capacidade civil sejam assistidos e/ou representados, conforme o art. 1.690 do Código Civil. Contudo, o entendimento do DNRC é que, por se tratar de empresário individual, o titular da EIRELI deve apresentar capacidade civil plena, não podendo ser assistido ou representado. Assim, empresários que desejem constituir uma EIRELI com titular assistido e/ou representado perante as Juntas Comerciais deverão recorrer ao Judiciário para obter o registro.
Por outro lado, os cartórios de registro de pessoas jurídicas permitem o registro de EIRELI cujo titular seja assistido e/ou representado, o que demonstra uma divergência no entendimento sobre o tema.
Ao estabelecer um capital social mínimo para a constituição da EIRELI, o legislador acabou limitando a participação de micro e pequenos empreendedores. O valor exigido, de R$ 72.400,00 (correspondente a 100 salários mínimos vigentes no país), encontra-se fora da realidade desse público, que muitas vezes não dispõe do capital necessário para a constituição de uma EIRELI.
Ademais, o capital social deve estar devidamente integralizado no momento da constituição da EIRELI, diferentemente do que ocorre na sociedade limitada ou com o empresário individual, onde o capital pode ser integralizado em parcelas sucessivas pelos sócios ou empresários. Não há, no entanto, exigência legal de comprovação do capital integralizado, bastando que o valor conste no ato constitutivo ou no instrumento de alteração.
Por conta da exigência de um capital mínimo descolado da realidade do micro e pequeno empresário, muitos continuam exercendo suas atividades econômicas por meio de sociedades fictícias ou constituem EIRELI sem observar o capital mínimo exigido por lei.
Além disso, ao determinar um capital mínimo, o legislador violou o princípio da livre iniciativa. Vincular o valor do capital a 100 vezes o salário mínimo vigente também é inconstitucional, uma vez que não é permitido utilizar o salário mínimo como indexador. A lei, embora exija o capital mínimo, não estabelece diretrizes para sua atualização em função dos reajustes do salário mínimo. O entendimento doutrinário majoritário é de que não há necessidade de reajustar o capital social sempre que o salário mínimo for alterado.
Outro ponto de divergência refere-se à natureza jurídica da EIRELI, se empresarial ou simples. A doutrina é contraditória a esse respeito. Os dois órgãos competentes para o registro da EIRELI adotam posições diferentes, sendo que ambos aceitam o registro de atividades civis. Contudo, as Juntas Comerciais não aceitam o registro da atividade de advocacia na forma de EIRELI, argumentando que são responsáveis apenas pelo registro de atividades empresariais e não podem regulamentar atividades simples.
Por sua vez, o registro de advocacia como EIRELI não é permitido, conforme o Estatuto da Advocacia, de forma que o DNRC também não poderia vedar esse registro, já que tal atividade não possui natureza empresarial.
Além disso, o DNRC vedou o registro de EIRELI cujo titular seja pessoa jurídica, mesmo que tal vedação não exista na Lei nº 12.441/2011. Isso força o empreendedor a recorrer ao Judiciário para obter o registro perante as Juntas Comerciais. Contrariamente, os cartórios de registro de pessoas jurídicas permitem não apenas o registro de EIRELI com titular pessoa jurídica, mas também o registro de holdings, indo além de suas competências.
Apesar dos pontos obscuros destacados acima, a referida lei conseguiu, em parte, atingir seu objetivo principal: limitar a responsabilidade do empresário individual, protegendo assim o seu patrimônio pessoal.
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Nota
1“Art. 2082. Empreendedor é o empresário que pratica profissionalmente atividade econômica organizada (2555, 2565) a fim de produzir ou troca de bens ou serviços (2135, 2195)”.