A implantação do direito constitucional nas escolas:uma medida de afirmação da cidadania

12/12/2014 às 11:55
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O presente artigo Jurídico objetiva demonstrar, a necessidade que tem os membros de uma sociedade em acessar o conhecimento sobre seus deveres e Direitos Fundamentais, bem como a todos aqueles que são indispensáveis ao exercício da cidadania.

Palavras-chave: Cidadania – Educação – Direto.    

1- INTRODUÇÃO

            O presente artigo tem como principal objetivo externar a extrema necessidade que um estudante em formação tem de conhecer, ao menos minimamente, o Direito Constitucional, ou seja, tornar pública a impossibilidade de se exercitar a cidadania plena sem tais conhecimentos.

            É de bom alvitre salientar que, este artigo não tem a pretensão de sugerir que se traga ao conhecimento do adolescente, temas como controle de constitucionalidade, poder constituinte, processo legislativo em sua totalidade e alguns outros que dependeriam de conhecimento prévio de Teoria Geral do Estado e Introdução ao Estudo do Direito, mas sim, que se abordem matérias Constitucionais que, mesmo inconscientemente, os aspirantes a cidadãos já vivenciam.

            Ademais, é de notório conhecimento de todos, que temas como, educação, cidadania, direitos políticos, nacionalidade, entre outros, são vistos e vividos por grande parte do povo brasileiro, já a partir das primeiras séries do ensino fundamental.

            Neste diapasão, não ensinar os princípios básicos para o exercício da cidadania ao estudante, configura omissão do poder público diante de um Direito Constitucional primário, visto que a grande maioria dos cidadãos sequer sabe o significado da referida palavra. Além do mais, o desconhecimento dos direitos e obrigações acarreta, indubitavelmente, dano a pessoa humana, ferindo-se sobremaneira um dos postulados constitucionais mais importantes a manutenção do Estado democrático de Direito.     

            Sendo assim, não é despiciendo lembra que a cidadania, não tem apenas a vertente jurídico-política, limitando-se a capacidade para votar e/ou ser votado, mas, também, está intimamente ligada a realidade sócio-jurídica e jurídico-filosófica.

            Em suma, deve-se visualizar passado e presente para que se possa traçar um novo e melhor futuro, posto que como já dizia o filosofo Immanuel Kant, “É no problema da educação que assenta o grande segredo do aperfeiçoamento da humanidade.”

2- DESENVOLVIMENTO

2.1 – A Cidadania, Modos de Aquisição e os Direitos e Garantias Fundamentais Indispensáveis ao seu Exercício.

2.1.1- A Cidadania

            Antes de abordarmos, sucintamente, os conceitos de cidadania trazidos pelos grandes autores a serem citados, bem como sua evolução histórica no Brasil e no direito Comparado, deve ser salientado que as doutrinas jurídicas pátrias, as quais se dedicam a elucidação do tema, são muito breves, e somente abordam a vertente política do instituto, ou seja, vincula-se a cidadania apenas aos direitos políticos, capacidade ativa e passiva, não enfatizando de maneira pormenorizada as conseqüências trazidas por esses mesmos direitos.

            Sendo assim, para a estruturação deste artigo, fazendo-o capaz de alcançar seu objetivo, fora necessário pesquisar no direito comparado e em doutrinas de cunho histórico, sociológico e filosófico, não sendo tal recurso capaz de desvirtuar o objetivo jurídico do tema, posto que o direito é um conjunto de normas voltadas a direcionar a sociedade e esta, por sua vez, é extremamente mutável e homogeneizada, motivo pelo qual dá-se acento a criações sócio-filosóficas, todas reguladas pelo Direito, e por conseguinte, pela Carta Magna.   

            Deste modo, a partir deste intróito, passemos então a analisar a cidadania da maneira mais abrangente possível, senão vejamos:

            O professor José Afonso da Silva, em seu Curso de Direito Constitucional Positivo, traz um título exclusivo para falar de cidadania, denominando-o como Direitos de Cidadania, o qual é constituído por quatro capítulos que são apresentados sucessivamente como, dos Direitos Políticos, dos Direitos Políticos positivos, dos Direitos Políticos negativos e dos Partidos Políticos, isto é, vinculou-se a cidadania apenas aos direitos políticos. Entretanto, o referido mestre, nesta mesma obra, definiu a cidadania como “um status ligado ao regime político”[1], o que é perfeito, pois nos demonstra que existe uma ligação fortíssima entre ambos, cidadania e direitos políticos, mas não uma exclusividade.

            De maneira mais abrangente, o professor Alexandre de Moraes afirmou que a cidadania “representa um status e apresenta-se simultaneamente como objeto e um direito fundamental da pessoa”[2], nos parecendo tal definição um pouco mais completa, contudo, ao definir cidadão, como “o nacional (brasileiro nato ou naturalizado) no gozo dos direitos políticos e participantes da vida do estado”[3], tornou a retroagir no resquício nacional de vinculação do status de cidadania unicamente ao seu direito político.

            Neste diapasão, nos permitimos definir o que entendemos por cidadania, tendo como base os pensadores supracitados:

            Cidadania é um status no qual, se tem como objeto principal alcançar a plenitude do exercício dos direitos fundamentais inerentes ao indivíduo, status esse ligado de maneira intrínseca ao regime político.  

            O referido status tem uma ligação essencial com o regime político, posto que, será através deste que o cidadão, por meio de seus representantes, alcançará seu direito às políticas públicas, ou seja, uma educação exemplar, saúde, segurança, entre outras.      

            Nesta linha de raciocínio, fazendo uma ponte entre o princípio da igualdade, tendo este assento constitucional no artigo 5º, caput, de nossa lex marter, e o modelo clássico traçado pelo cientista social T. H. Marshall, em sua obra Cidadania e Classe Social, baseada no modelo inglês, inseriu-se no status de cidadão a idéia de mínimo jurídico, ou seja, igualdade jurídica, que para o modelo de Marshall era um pressuposto essencial da cidadania[4].

            Vale ressaltar que tal igualdade básica não sugestiona igualdade econômica, tão pouco prega o socialismo ou comunismo, nem mesmo põe o capitalismo como o grande vilão da sociedade contemporânea, mas sim afirma ser a desigualdade econômica aceitável, desde que se tenha igualdade jurídica, servindo esta como moderante das diferenças econômicas.

            É neste momento que se começa a perceber a necessidade do Direito Constitucional na vida cotidiana, pois de que outra maneira poderia o estudante, isto é, o futuro cidadão, ter acesso a essas informações senão por meio do ensino de tal disciplina?

Obstando o atual sistema de ensino que afasta o educando da realidade sócio-política nacional, por meio da clássica imposição de dificuldades inverídicas, continuemos a explanação para que possamos pontuar cada motivo ensejador do objeto do artigo.

            Em total consonância com o proposto nessa obra, o professor T. H. Marshall, conceituou cidadania plena dividindo-a em três diferentes aspectos, o civil, o político e o social[5].

            O aspecto civil da cidadania refere-se ao total exercício das liberdades individuais, lembrando-nos dos direitos fundamentais de primeira geração, aparecendo no mundo, pela primeira vez, pós-revolução francesa.

            O aspecto político da cidadania teve sua formação no século XIX, e significava o fim de uma era em que tais direitos eram inerentes a uma classe social economicamente limitada, trazendo mais uma vez à baila a figura do mínimo jurídico.

            O aspecto social foi incorporado ao status da cidadania no final do século XIX, significando um grandioso avanço no controle popular sobre as políticas públicas, visto que além de se reportar em primeiro plano ao bem estar social em detrimento do direito individual, se tem como método assegurador dos direitos sociais, o exercício dos direitos políticos, motivo pelo qual concluímos ser este o aspecto ensejador da unificação de conceitos na doutrina jurídica pátria.

           

2.1.2 – Modos de Aquisição da Cidadania.

Não é despiciendo salientar que a cidadania no Brasil não fora originada através de conquistas populares, como ocorrera na aquisição dos direitos civis na França com a revolução francesa, mas sim de imposição imperial que visava equilibrar as desigualdades jurídicas erradicadas em nossa sociedade, oriundas de três séculos de explorações e de uma política monocultora, oligárquica e escravagista, sendo esta última, sem sombra de dúvida, o maior entrave na formação de futuros cidadãos.

Deste modo, faremos uma simples comparação histórica para, minimamente, ilustrar a pouquíssima evolução nacionalista, no que tange a cidadania. 

Por ocasião da vigência da constituição Imperial de 1824, seu artigo 90, fazia diferenciação entre cidadão ativo e os demais cidadãos membros da sociedade, posto que apenas aqueles exerciam os direitos políticos e, por conseguinte, obtinham o verdadeiro status de cidadão. Vislumbrando-se com isso o primeiro resquício jurídico Constitucional da vinculação de cidadania ao direito de votar e/ou ser votado. Tal artigo da referida Constituição, inclusive, ocasionou uma confusão para se definir e diferenciar cidadão de nacional, problema este que fora dirimido mais tarde com extrema facilidade.

Nos dias atuais, não obstante ao passar de quase trezentos anos, os doutrinadores e legisladores continuam dando a entender que, ser cidadão nada mais é que meramente exercitar-se o sufrágio universal, ou seja, eleger representantes para que em nome dos eleitores decidam o futuro de toda a nação.

Devido a isso, a partir da promulgação da Carta Constitucional de 1988, confere-se o status de cidadão aos nacionais no gozo dos direitos políticos e participante da vida do estado, obedecidos os ditames e exceções do artigo 14 da CRFB/88.    

2.1.3 - Direitos e Garantias Fundamentais Indispensáveis ao Exercício da Cidadania.

Nesse ponto, tem-se como indispensável, a noção de que em nenhuma outra disciplina pode-se ousar ensinar, com a clareza e o comprometimento necessários, os conhecimentos mínimos de tais direitos e garantias, senão pelo Direito Constitucional, posto que não é difícil encontrarmos instituições educacionais, nas quais professores de diferentes disciplinas, diga-se de passagem, pessoas com as melhores intenções, ensinando de maneira equivocada conteúdos que não fazem parte de seus currículos, mas por falta de opção e por verificarem que sem tais conhecimentos tudo estaria pior, os ministram da melhor maneira possível.

Saliente-se ainda que, não existe equiparação entre as disciplinas já existentes nos currículos escolares formais, ora como essenciais vezes por eletivas, tais como OSPB (Organização Social e Política Brasileira) e a Educação Moral e Cívica, com a disciplina Direito Constitucional, posto que esta se mostra infinitamente mais abrangente, e por ter influências de outras ciências do pensamento, implementa e exigem a necessidade de raciocínio aos que a estudam, o que não ocorre por exemplo na educação moral e cívica, disciplina esta que desbancou a OSPB e tornou-se obrigatória por ocasião do governo militar, visando única e exclusivamente a doutrinação patriótica dos nacionais, banindo os que ousassem pensar e ponderar.

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Impreterível ao exercício da cidadania é sem dúvida o conhecimento e o respeito às Leis. Corroborando com essa afirmação, traz o inciso II do art. 5º da CRFB/88 o princípio da legalidade, o qual reza que, ipsis litteris, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Mesmo com o princípio da publicidade trazido pelo artigo 37 da nossa Constituição, não se pode dizer que todo cidadão tenha ciência da existência de todas as Leis, mas se qualquer pessoa for surpreendida por um ato oriundo de Lei, este não poderá alegar desconhecimento, pois ninguém pode beneficiar-se de sua própria torpeza. Então não vislumbramos de que outra maneira pode-se garantir ao cidadão o mínimo saber necessário para que este tenha garantido o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88), senão pelo ensino do Direito Constitucional.

Como corolários do exercício da cidadania verificam-se nos incisos de IV a XXXI as diretrizes sobre a manifestação de pensamento, direito de resposta, liberdades religiosas direito de ir e vir, direito a herança e muitos outros.

Para ratificar a necessidade do conhecimento dos demais mandamentos do artigo 5º, verificamos no inciso XXXIII o direito as informações constantes nos órgãos públicos e de interesse particular, devendo este ser combinado com os incisos LXXII e LXXVII, os quais versam respectivamente da garantia judicial as informações e que tal garantia seja gratuita, assim como o inciso XXXIV concede ao cidadão o direito de petição gratuita, pois tal garantia é parecida com a anterior, mas tramita na seara administrativa. Já o inciso XXXV c/c LXXVIII é indiscutivelmente uma das maneiras mais eficazes trazidas pelo constituinte para garantir que direitos não sejam minorados, sob pena de qualquer lesão ou a mera ameaça de lesão ser levada ao conhecimento de judiciário para que este solucione mandamentalmente o litígio em tempo razoável, denominou-se tal direito como princípio da inafastabilidade do poder judiciário.

Na mesma linha de raciocínio o inciso XXXVI dá ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e a coisa julgada a não intervenção prejudicial, a distinção entre cada um desses institutos só pode ser conhecida por meio do estudo jurídico direcionado. Assim também ocorre com a instituição do tribunal do júri, reconhecida pelo inciso XXXVIII, vindo a garantir o exercício da cidadania quando exige que o julgamento de determinados crimes sejam feitos pelos pares do cidadão acusado. Sendo vedados quaisquer tipos de discriminações, conforme incisos XLI e XLII.

Com isso, esperamos ter conseguido demonstrar a extrema necessidade que tem o nacional de conhecer minimamente os seus direitos fundamentais por intermédio do Direito Constitucional, sob pena de nunca ser um cidadão no gozo da plenitude deste status.    

    

2.2 – Direitos Políticos e sua Essencialidade.

2.2.1 – Diferença Entre Cidadão e Nacional.

Antes de nos atermos aos motivos principais que dão aos direitos políticos uma posição privilegiada quando se fala em exercício da cidadania, devemos diferenciar os conceitos de cidadão e nacional, visto que esta diferenciação nem sempre foi simples, tendo-se em vista a falta de dispositivos normativos constitucionais que os delineassem. 

Não é novo o comentário a cerca da vinculação da cidadania aos direitos políticos, haja vista que como dito anteriormente o cidadão é o nacional regularmente inscrito nas juntas eleitorais, em gozo de seus direitos políticos e participante da vida pública do estado. Definição esta que muitas vezes traz a noção enganosa de que um nacional que vota já está em gozo de sua cidadania plena, ligando-se assim unicamente o cidadão a política.

Tais direitos são tão importantes para o exercício da cidadania que o legislador constituinte elencou nos artigo de 14 a 16 da Constituição da República Federativa do Brasil seu regramento basilar, e como afirma o Professor José Afonso da Silva, “os direitos políticos consistem na disciplina dos meios necessários ao exercício da soberania popular”[6], o dito status activae civitatis, ou seja, direitos cívicos.

Não é possível deixar de citar o ilustríssimo autor Pimenta Bueno, visto que trata-se do primeiro conceito completo de direitos políticos, já existente ao tempo da Constituição Imperial de 1824, além de ser este citado em todos os grandes autores que se dedicam ao tema, pois para ele os Direitos Políticos “são as prerrogativas, atributos, faculdades, ou poder de intervenção dos cidadãos ativos no governo de seu país, intervenção direta ou indireta, mais ou menos ampla, segundo a intensidade do gozo desses direitos”[7]

O referido conceito fora elaborado tendo como base o artigo 90 da Constituição Imperial, haja vista que, a época existia uma colidência de conceitos que confundiam o nacional com o cidadão (artigos 6º e 7º), por isso o autor menciona o termo “cidadão ativo” que significava o nacional com direito a voto (artigo 91). As constituições posteriores fizeram uma confusão ainda maior entre tais institutos, só vindo a ser dirimido com o advento da carta política de 1937, pois somente a partir daí é que se passou a dedicar um capítulo próprio a nacionalidade.   

Neste diapasão, e tendo em vista a essencialidade dos direitos políticos para que se exerça a cidadania plena, podemos afirmar que em virtude deste elo origina-se a confusão de conceitos, muitas vezes não pormenorizados nas doutrinas jurídicas.

2.2.2 - Causas da Essencialidade.

Indubitavelmente, são os direitos políticos as ferramentas necessárias para que o nacional adquira a cidadania plena, pois além desta aquisição ser conferida mediante alistamento eleitoral, o voto é o mecanismo pelo qual se dá poder a um mandatário para que em nome dos mandantes este busque o melhor para a coletividade que o elegeu.

Incessantemente estamos focando nossos esforços no conceito de cidadania plena, pois se pode dizer que o cidadão é aquele que está regularmente inscrito nas juntas eleitoras, mas isto não significa que esteja ele sendo amparado, socialmente, pela estrutura governamental para que se possa vislumbrar um cidadão em pleno gozo de seus direitos sociais.

Para que se verifique a cidadania plena é essencial que a partir do direito político se alcance todos os seus corolários, posto que se os mandatários do poder do povo lá estão com a finalidade única de buscarem melhorias para este, deve-se então fazer alcançar todos os direitos sociais incluídos ou não na Constituição da República, tais como educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, entre outros (artigo 6º e seguintes, CRFB/88).

2.2.3 – Direitos Políticos na Escola.

Sem nos desviarmos do tema proposto neste capítulo, abordaremos agora a importância de seu aprendizado durante o ensino médio, pois deve ser levado em conta o mandamento constitucional do artigo 14, § 1º, II, “c”, com referência na faculdade de votação do menor de dezoito anos e maior de dezesseis.      

  Não podemos deixar de abordar as pesquisas eleitorais feitas pelo Tribunal Superior Eleitoral, que nos alertam sobre a crescente e efetiva participação de adolescentes, menores de dezoito e maiores de dezesseis anos, nas últimas eleições nacionais. Isso significa que nossos jovens estão querendo se interar da vida política do país, o que é realmente muito bom, mas para que esses jovens não venham a fazer parte da massa de manobra supracitada, deverão instruir-se dos ditames constitucionais que regulam as eleições.

Assim sendo, mais uma vez trazemos a baila à pergunta: Como informar o eleitorado de seus direitos políticos sem a implantação do direito Constitucional nas escolas?

Este ponto é, indubitavelmente, um dos principais e mais concretos argumentos deste trabalho científico, haja vista que, mesmo nas escolas que acrescentam em suas grades curriculares a Educação Moral e Cívica, a Organização Social e Política Brasileira, ou até naquelas em que professores de Sociologia e Filosofia se esforçam para dar a seus alunos um senso crítico e opinião própria, não se tem como lesionar, objetivamente, os direitos políticos, ou seja, as bases essenciais para que um eleitor escolha seu representante de maneira convictamente correta.

Para que se alcance o direito/dever de votar, sem que com isso se esteja comprometendo o Estado Democrático de Direito pela ignorância, deve-se ter conhecimentos constitucionais mínimos, por ser este modelo caracterizado pela participação consciente do povo no poder do Estado.

Um exemplo típico da utilização da ignorância do povo, pelos políticos de má-fé, para que se obtenha o cargo eletivo almejado, é aquele candidato ao cargo de Senador da República que baseia sua candidatura em discursos dedicados a enfatizar que se eleito fará de tudo para defender os direitos de seu eleitor, mas como poderá este político cumprir sua promessa se conforme prevê no artigo 46 da Constituição Cidadã de 1988, o senador é representante dos direitos do Estado como ente autônomo e não representante dos direitos do povo, sendo tal função destinada aos deputados federais, em se tratando de nível nacional (artigo 45, CRFB/88). 

Isto significa dizer que, se um projeto de Lei em trâmite no Congresso Nacional, tiver cunho extremamente benigno ao povo de um determinado Estado da Federação, mas este mesmo projeto for de encontro aos interesses deste mesmo Estado, os senadores ocupantes das cadeiras reservadas àquele, terão que votar contra a aprovação, dando primazia aos interesses do estado, em detrimento do interesse popular.

Da mesma maneira ocorre quando o eleitor vota em um determinado político para que este se torne deputado ou vereador, não sabendo que se trata de eleição pelo voto proporcional, no qual antes do voto ser computado para este ou aquele candidato, se determina quantas cadeiras ocupará a legenda (partido ou coligação), para só então se verificar quais foram os mais votados dentro dos limites das cadeiras alcançadas. 

           

2.3 - Artigo 205 da CRFB/88, Uma Norma Constitucional Ineficaz.

2.3.1 – A Insuficiência Educacional para a Formação do Cidadão.

            A Constituição da República traz a educação em seu artigo 205 como direito de todos e dever do Estado e da família, sendo provida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, com o preparo do nacional para o exercício da cidadania.                           

            Mesmo se considerarmos a cidadania como a simples rotulação dada ao popular com direito ao exercício do sufrágio, não encontraremos em todo território nacional uma só escola capacitada a ensinar os principais detalhes necessários que seu estudante precisa para fazer o bom uso de seu voto, motivo pelo qual percebe-se o descumprimento desse preceito constitucional.

            Não se pode deixar de observar que, este mandamento Constitucional é sim uma norma de eficácia limitada, que tem aplicabilidade indireta, somente incidindo totalmente sobre o direito a educação, por exemplo, após a entrada em vigor de uma Lei infraconstitucional que desenvolva sua aplicabilidade, motivo esse que não pode ser tido como desculpa para o descumprimento desta imposição hierarquicamente superior.

Desta forma, o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo, e o não oferecimento ou seu oferecimento insuficiente, importará responsabilidade da autoridade competente (artigo 208, VII, §§ 1º e 2º da CRFB/88), pois a educação é direito de todos e dever do Estado e como dispara a douto professor José Afonso da Silva, “Tal concepção imposta, como já assinalamos, em elevar a educação a categoria de serviço público essencial que o Poder Público impende possibilitar a todos”[8], em razão disso, não se pode de maneira nenhuma, deixar de seguir fidedignamente os designos constitucional-educacionais.

2.3.2 – A Degradação do Ensino no Brasil.

            Infelizmente, não é despiciendo trazer o loco, o processo de degradação do ensino público médio e fundamental no Brasil, fato esse que muito nos envergonha, mas, em contra ponto, nos faz querer lutar pela volta dos tempos de ouro da educação.

            Até o fim dos anos cinqüenta, o ensino público foi sinônimo de excelência educacional, tendo em seu corpo discente alunos de todas as classes sociais, e em seu corpo docente os melhores e mais motivados profissionais, pois esta fora a época em que ser professor era fazer parte de uma elite intelectual e economicamente privilegiada. Cumprindo-se a risca o ditame constitucional de subsidiariedade do ensino privado em relação ao ensino em estabelecimentos oficiais, só se utilizando das entidades privadas aqueles que por opção assim escolhessem.

            O referido assunto fora tema do artigo “A educação nos 50 anos da Constituição de 1946”, escrito pelo autor Edivaldo M. Boaventura, abordando-se cautelosamente assuntos referentes à política educacional do Brasil, sistema educacional e seus históricos, sempre tendo como paradigma as constituições vigentes à época[9].        

            Hoje em dia, as instituições públicas de ensino médio e fundamental que têm, comprovadamente, condições de formar cidadãos, como por exemplo, o Colégio Pedro II e os colégios de aplicação, não são povoadas pelos menos favorecidos economicamente, nelas são exigidos exames de admissão e somente os filhos de uma classe média alta têm condições de pagar pelos “cursinhos” preparatórios para conseguirem o ingresso nestas.         

               De maneira parecida ocorre no momento dos vestibulares, os estudantes das entidades acima mencionadas, juntamente com os das escolas privadas tradicionais dirigem-se as universidades públicas e os estudantes do ensino público, quando muito param ao fim do ensino médio, não tendo a menor condição de competir por uma vaga e nem como pagar por uma faculdade particular.

            Ainda existem aqueles que defendem o fim do ensino público, sob o argumento de que só pagarão mensalidades os que podem arcar com os gastos, já os menos favorecidos seriam beneficiados por bolsas de estudos, afirmando ser esta “uma forma de praticar a justiça social”[10]. A referida tese vai de encontro ao princípio Constitucional do artigo 206, VI, que impõe a gratuidade do ensino fundamental, e como enfatiza o professor José Afonso da Silva “onde o ensino oficial, em qualquer nível, já é gratuito não poderá passar a ser pago. Onde é pago, se for fundamental, deverá passar imediatamente a ser oferecido gratuitamente”[11].

                       

2.3.3 – Princípio da Proibição de Retrocesso Social.

          Com base no exposto no tópico anterior, verificamos claramente a inobservância por parte de nossos governantes do princípio da proibição de retrocesso social, o qual está implícito no texto constitucional atual, haja vista que este vem à tona quando analisamos a fundo o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da CRFB/88) e o da máxima efetividade das normas de direito fundamental (artigo 5º, § 1º da CRFB/88), entre outros.

            Nesse sentido, é defeso ao administrador público extinguir determinadas políticas públicas que beneficiem o povo, salvo se para tanto, implante em seu lugar uma nova política que traga melhores condições aos administrados.

            Ao invés de se respeitar este princípio como regra, apenas em algumas situações muito espaçadas se percebe a exceção, como a louvável atitude tomada pelo governo paranaense em adotar para ensino básico o horário integral, lecionando matérias de grandiosa importância e retirando do alunado a ociosidade[12].       

            Pela primeira vez na história das constituições brasileiras, o legislador constituinte assumiu as impossibilidades e deficiências nacionais e traçou objetivos para que se alcançasse a evolução social. O artigo 3º da Constituição da República traz em seus incisos tais ditames, observe-se que essas finalidades são apenas exemplificativas, não esgotando o constituinte as hipóteses de como afirma Alexandre de Moraes “busca dos meios e instrumentos para promover condições de igualdade real e efetiva e não somente contentar-se com a igualdade formal”[13].

            O artigo 3º da Constituição da República dispõe que “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:”

            Observa-se neste contexto que, sendo estes objetivos a serem alcançados, significa dizer que nos dias atuais e a época da promulgação dessa carta, tais finalidades não haviam sido obtidas, ou seja, o que se passa a analisar é no que deve se tornar o Brasil, e não o que ele reflete socialmente: I – constituir uma sociedade justa, livre e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

           

3- CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Este trabalho é fruto de um estudo baseado na observação social, bem como de uma minuciosa análise histórico-jurídica, nas quais conseguimos delinear pontos críticos que julgamos responsáveis pela involução social brasileira. Sendo assim, percebemos que o problema que hoje assola nossa sociedade não é apenas pontual, mas sim estrutural, significando dizer que medidas imediatistas e eleitoreiras não dão solução a estigma, mas somente ludibriam o povo que, na verdade, necessita de uma política séria e global capaz de dar-lhes acesso à informação, expurgando-se o atual investimento na cultura de ignorância.

            Neste contexto, esperamos ter conseguido demonstrar, com o liame feito entre o problema social e a necessidade de conhecimento jurídico-constitucional, a impossibilidade de se galgar novos e melhores horizontes sem que se respeite o direito do povo de adquirir cultura por meio de políticas públicas, como a implantação do Direito Constitucional na Escola, que entendemos ser uma das mais eficazes maneiras de incentivo a formação de um cidadão realmente sabedor das atitudes que toma.

            Depois de todo esforço empreendido na elaboração deste artigo, será de muita valia para nós e para todos os brasileiros comprometidos com a causa meta-individual dos Direitos, que se compreenda a necessidade de se insuflar uma revolução cultural e educacional em nosso país, com a única intenção de propiciar-se a todos os membros dessa imensa nação o acesso efetivo a um ensino racional, para que em um breve futuro sejamos uma sociedade que admire e cumpra com os ditames Constitucionais e Legais, pois esta não será feita de cidadãos cheios de dogmas infundados, mas pelo contrário, teremos um povo contestador e participativo em todas as causas atinentes ao interesse coletivo.

4. REFERÊNCIAS.

Anderson, Benedict, Nação e Consciência Nacional. São Paulo, editora Ática, 1989.

Boaventura, Edivaldo M., A educação nos 50 anos da Constituição de 1946, Revista de informação legislativa ,  33 ,  n. 132 ,  p. 29-35 ,  out./dez. ,  1996 .

Carvalho, José Murilo. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro, 1ª edição:             Civilização Brasileira, 2001.

Dallari, Dalmo de Abreu, Elementos da Teoria Geral do Estado. São Paulo, 24ª edição, editora Saraiva, 2003.

Marshall, T.H., Cidadania e Classe Social. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1963.

Miranda, Henrique Savonitti, Curso de Direito constitucional. Brasília, Editora Senado Federal, 2004.

Morais, Alexandre de, Direito Constitucional. São Paulo,15ª edição, editora Atlas, 2004.

__ Constituição do Brasil Interpretada. São Paulo, 6ª edição, editora Atlas, 2007.

Silva, José Afonso, Curso de Direito constitucional Positivo. São Paulo, 28ª edição, editora Malheiros, 2007.

Torres, Ricardo lobo, Teoria dos direitos fundamentais. Rio de Janeiro, 2ª edição, editora Renovar, 2001.


[1] Silva, José Afonso. Curso do Direito Constitucional Positivo. ed. Malheiros, 28 Ed., p. 345, 2007.

[2] Moraes, Alexandre de. Direito Constitucional. Ed. Atlas, 15ª ed., p. 52, 2004.

[3] Moraes, Alexandre de. Direito Constitucional. Ed. Atlas, 15ª ed., p. 215, 2004.

[4] Marshall, T. H. Cidadania e Classe Social. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1963.

[5] Marshall, T. H. Cidadania e Classe Social. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1963.

[6] Silva, José Afonso. Curso do Direito Constitucional Positivo. ed. Malheiros, 28 Ed., p. 345, 2007.

[7] Bueno, Pimenta. Direito Público Brasileiro e Analise da Constituição do Império. p. 458.

[8] Silva, José Afonso. Curso do Direito Constitucional Positivo. ed. Malheiros, 28 Ed., p. 839, 2007.

[9] Boaventura, Edivaldo M., A educação nos 50 anos da Constituição de 1946, Revista de informação legislativa,  33,  n. 132,  p. 29-35,  out./dez.,  1996.

[10] Mendes, Amador Dias. “Declaração de Voto”, in documenta, Silva, José Afonso. Curso do Direito Constitucional Positivo. ed. Malheiros, 28 Ed., p. 842, 2007.

[11] Silva, José Afonso. Curso do Direito Constitucional Positivo. ed. Malheiros, 28 Ed., p. 841, 2007.

[12] www.senado.gov.br/web/senador/odias/trabalho/Discursos/Discursos/Discurso2005/050912.htm, dia 14 de maio de 2007, 17h34min.

[13] Morais, Alexandre de, Constituição do Brasil Interpretada. São Paulo, 6ª edição, editora Atlas, p. 146, 2007.

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Sobre o autor
Alexandre de Carvalho Ayres

Alexandre de Carvalho Ayres, Advogado, consultor tributário, professor Direito Tributário da Faculdade de Direito Tributário da CNEC ILHA DO GOVERNADOR, sócio titular do escritório Ayres e Masullo Assessoria Jurídica Empresarial, Mestrando em Direito de Empresa e Tributação pela UCAM, Especialista em Prática de Direito Tributário pela UNESA e Direito Público e Privado pelo Instituto Superior do Ministério Público, possui curso de atualização profissional em Direito Societário pela FGV-RIO.

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