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Direitos humanos e o direito internacional do desenvolvimento

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18/07/2016 às 15:37
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3  DESENVOLVIMENTO DOS DIREITOS HUMANOS

A Declaração Universal dos Direitos do Homem apresentava um grande problema concernente à eficácia de suas normas, visto que tinha a natureza de soft law, qual seja, possuía uma valor meramente moral, sem qualquer valor de obrigatoriedade para os Estados. Entretanto, é preciso registrar que o entendimento moderno considera a referida Declaração como costume internacional, revestido do caráter de obrigatoriedade, como afirma Mello[36]:

[...] Considerou-se ainda neste caso que se tratava de um texto programático, vez que era uma simples afirmação de princípios sem ser obrigatório para os Estados, porque não era um tratado. De qualquer modo, pode-se afirmar que atualmente há uma espécie de consenso em considerá-la um costume internacional e, portanto, obrigatória [...].

Em face deste antigo entendimento, procurou-se elaborar diversos pactos e convenções internacionais sobre os auspícios da ONU, objetivando a assegurar a proteção dos direitos do homem. Como exemplos são citados o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, aprovados pela Assembléia Geral em Nova Iorque, em 16 de dezembro de 1966, visando a conferir dimensão jurídica à Declaração de 1948, superando a obrigatoriedade apenas moral que a caracterizava. O Brasil veio a aderir a esses pactos em 1992, face à época existir em nosso solo um regime autoritário que o regia antes[37]. 

A ONU também tem tratado dos direitos humanos em várias outras declarações e convenções que versam sobre temas específicos como a Declaração dos Direitos da Criança, de 1959, a Declaração sobre a eliminação de qualquer forma de discriminação racial de 1963, a Declaração sobre eliminação da discriminação à mulher de 1967, a Convenção sobre Genocídio de 1948, a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento de 1996, a Convenção sobre os Direitos Políticos da Mulher de 1988, sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial de 1966 e sobre a punição do crime de apartheid de 1973, dentre outras[38].

Conforme se constata no plano regional, o continente europeu apresenta-se como a região do planeta mais desenvolvida no que se refere à proteção dos direitos humanos, em virtude da elaboração da Convenção Europeia dos Direitos do Homem pelo Conselho da Europa, fato ocorrido 4 de novembro de 1950, mas que passou a vigorar somente a partir de  3 de setembro de 1953. A referida convenção visa a diminuir as insuficiências normativas e processuais do Direito universal, revestindo-se de grande importância para instituir órgãos de controle abertos aos indivíduos, que deles podem socorrer-se mesmo contra o seu Estado[39].

No continente africano, foi adotada em 1981 a Carta Africana de Direitos do Homem e dos Povos, a qual representou um importante avanço, ao abrir novos caminhos para o reconhecimento e a proteção nessa região. Esse tratado apresenta características peculiares, em razão do próprio contexto sociopolítico no qual se insere a maioria dos países signatários, enfatizando, por isso, a eliminação de quaisquer formas de opressão e colonialismo, como o direito ao desenvolvimento dos povos, disposições estas, contidas no próprio preâmbulo da Carta[40].

Almir de Oliveira[41] assevera que, seguindo a tendência de regionalização dos instrumentos básicos de proteção dos direitos humanos, os Estados africanos aprovaram, em janeiro de 1981, na cidade de Banjul, capital da Gâmbia, a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, chamada Carta de Banjul[42]. De acordo com Cançado Trindade, no preâmbulo desse instrumento, reafirmaram o compromisso, por eles assumido na Carta de Organização da Unidade Africana, de “eliminar sob todas as suas formas o colonialismo da África, e coordenar e intensificar a sua cooperação e os seus esforços para oferecer melhores condições de existência aos povos da África”[43]. Inspirados nas suas tradições históricas e nos valores da civilização africana, reconheceram que os direitos fundamentais do ser humano se baseiam nos atributos da pessoa humana, o que justifica a sua proteção internacional. Além disso, reafirmaram a sua adesão às liberdades e aos direitos humanos e dos povos contidas nas declarações, convenções e outros instrumentos adotados no quadro da Organização da Unidade Africana, no Movimento dos Países Não-Alinhados e da Organização das Nações Unidas.

Na Carta dos Direitos Humanos e dos Povos no Mundo Árabe aprovado, em julho de 1971, a Liga dos Estados Árabes adotou o projeto elaborado em Siracusa, na Itália, por um grupo de juristas e intelectuais árabes, ali reunidos.

No Preâmbulo, a Carta fornece como base o reconhecimento da dignidade inerente a dos direitos iguais e inalienáveis de todos os membros de uma família é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz mundial e reafirma a sua fé nos princípios proclamados na Carta das Nações Unidades e na Carta Internacional dos Direitos Humanos.

A Carta cria, também, uma Comissão Árabe de Direitos Humanos e uma Corte Árabe de Direitos Humanos, com as mesmas características, atribuições e competências das européias. Em função das velhas tradições culturais do povo árabe, pode imaginar-se o quanto será difícil aos seus líderes e governantes operacionalizar entres eles as regras da Carta, principalmente, no que tange à igualdade e a não-discriminação por motivo de sexo e de religião. A Carta tem como base, à semelhança dos instrumentos aprovados sob a égide das Nações Unidas, uma filosofia nitidamente ocidental, estranha em grande parte à do mundo islâmico, onde o direito, o poder político e a religião praticamente se confundem[44].

Já no âmbito do continente americano, tem relevo a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada em 20 de março de 1948, por ocasião da IX Conferência de Bogotá, na qual foi também aprovada a Carta Internacional Americana de Garantias Sociais. Já em 1969, foi adotada a Convenção Americana de Direitos Humanos, denominada Pacto de São José da Costa Rica[45] e, em 1988, foi concluído o Protocolo Adicional da Convenção Americana sobre Direitos Humanos na área de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais[46], denominado de Protocolo de São Salvador[47].

Foi institucionalizado o Pacto de São José da Costa Rica, como meio de proteção dos direitos nele inseridos, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos configurada na Resolução VIII da V Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores, e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Este Pacto, que tem vigência desde 18 de junho de 1978, entrou somente em vigor no Brasil por via de adesão no ano de 1992, não se reconhecendo, entretanto, a jurisdição obrigatória da Corte prevista no artigo 62, em seu parágrafo 1º, do aludido instrumento internacional, que somente foi aprovado pelo Decreto Legislativo nº 89, em dezembro de 1998[48].

Salutar é salientar que apesar de todos esses documentos no continente americano, a proteção dos direitos humanos tem se demonstrado precária, inversamente do que ocorre no continente europeu, face à realidade político-social reinante na América Latina, inviabilizando a tutela e a implementação dos direitos do homem, conforme assinalado por Silva[49]: “A ineficácia desses documentos interamericanos retrata a tragédia dos países latino-americanos, sempre submetidos ao mais impiedoso autoritarismo e ao mais feroz desrespeito aos mais elementares direitos da pessoa humana “.

Na visão de Cançado Trindade[50], deve haver uma reavaliação dos Direitos Humanos, visando à solução dos problemas ainda persistentes em nossa atualidade, conforme expressa mediante o seguinte comentário: “A busca recente de meios mais eficazes de implementação de determinados direitos tem conduzido a uma reavaliação nos planos tanto global quanto regional das categorias propostas no passado.”

Fica demonstrado que, também no âmbito global, apesar de todo o encadeamento de normas internacionais, a área dos direitos humanos ainda enfrenta problemas, em face de um desenvolvimento distinto entre os Estados, das várias crises políticas reinantes em vários pontos do mundo, assim como o fato de a diversidade cultural tornar incapaz a aplicabilidade plena dos direitos humanos.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desde as épocas remotas o ser humano esta à procura de uma paz social onde os Direitos Humanos sejam respeitados e foram os tratados ou convênios que isto se corporificou, pelos menos no aspecto formal, já que com a celebração dos tratados demonstra o Estado suas intenções éticas, pactuado como obrigação moral ante ao Estado celebrante.

Nos países onde a instabilidade política e econômica prospera o desenvolvimento social e econômico fica prejudicado, visto que a desordem reinante inibe qualquer tipo de evolução.

Os Direitos Humanos estão no contexto social para harmonizar o meio social e conforme exposto neste trabalho o desejo das organizações internacionais foi no sentido de dar ao ser humano uma condição de vida condigna, demonstrado através dos vários tratados celebrados.

Constatou-se no decorrer dos séculos que para o desenvolvimento global se realizar a harmonia dos Direitos Humanos deveria estar equânime na maior parte do mundo. Tal harmonia propicia uma estabilidade política e esta leva a econômica.

No quadro apresentado visualiza-se a desordem global reinante, mediante a qual os países em desenvolvimento envolvidos em suas crises internas inibem de forma drástica o cumprimento das normas ratificadas por eles que existem no papel, mas que não são implementadas na prática. Exemplo que evidencia essa situação é o Pacto de São José da Costa Rica, que somente foi operacionalizado vários anos após a sua ratificação pelo governo brasileiro.

Os Estados deveriam adotar condutas responsáveis na condução dos Direitos Humanos, no seu âmbito interno, a fim de que a normalidade nesta área não inibisse o desenvolvimento do país.

Ao compatibilizar a busca do desenvolvimento equilibrado com os Direitos Humanos, o direito de integração deve ser percebido como a alavanca que impulsionará as sociedades em desenvolvimento para um futuro melhor.

Conforme constatado no presente trabalho, as crises internas, a instabilidade política e econômica levam à desestruturação social das nações, inibindo o cumprimento das normas dos Direitos Humanos ratificados por estes países e, por via de consequência, prejudicam o Direito Internacional do Desenvolvimento com a quebra de sua cadeia de normalidade. Logo, a estruturação política, econômica e social de um país facilita a aplicação das normas jurídicas de maneira geral, mais ainda as normas referentes aos Direitos Humanos.


REFERÊNCIAS

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BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Tradução: João Ferreira. Revisão geral: João Ferreira e Luis Guerreiro Pinto Cascais.    12. ed. Dicionário de Política. Brasília: UNB, 2002.

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LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.

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Sobre o autor
David Augusto Fernandes

Mestre e Doutor em Direito. Professor Adjunto da Universidade Federal Fluminense.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, David Augusto. Direitos humanos e o direito internacional do desenvolvimento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4765, 18 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35028. Acesso em: 22 dez. 2024.

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