Causas especiais de inelegibilidade

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1.4 Cônjuges, parentes e afins

 Em relação à inelegibilidade de cônjuges e parentes do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, a Constituição Federal de 1988, art. 14, § 7º, dispõe que:

São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.

     Com base nessa premissa, pode-se afirmar que aquele que já é detentor de mandato eletivo e estiver se candidatando à reeleição não está obrigado pela regra da inelegibilidade.

O TSE entende que no caso de cônjuges que ainda não exercem nenhum mandato eletivo, ambos podem chegar ao poder ao mesmo tempo, como prefeito e vice-prefeito do mesmo município. Conforme abaixo:

Consulta. Candidatura de cônjuges para os cargos de prefeito e vice-prefeito. [...] Possibilidade. [...]” NE: “A e B são cônjuges e nenhum deles exerce o cargo de Prefeito de determinado município. Pergunta-se: A pode ser candidato a prefeito e B candidata a vice-prefeita? [...] Pelo art. 14, § 7º da Constituição, o cônjuge não pode se candidatar se o outro já detiver cargo de chefia do Poder Executivo, ou seja, um não pode chegar ao poder no plano da chefia do poder Executivo, imediatamente após o outro, mas os dois podem chegar ao mesmo tempo, numa mesma eleição. [...] (Res. nº 23.087, de 23.6.2009, rel. Min. Joaquim Benedito Barbosa Gomes.)[12]

Portanto, no caso em apreço, a consulta ao TSE se deu tendo por base o caso concreto em que dois cônjuges pretendiam se candidatar a prefeito e vice-prefeito do mesmo município, sem estarem em exercício de cargo eletivo. O julgado deixa claro que, no caso de um dos cônjuges serem detentor de mandato eletivo como chefe do Poder Executivo, o outro cônjuge não poderia chegar ao poder nesse mesmo contexto político.

     Resta observar o entendimento de o julgado a seguir, onde o marido exerceu o mandato de Prefeito de determinado município em dois períodos consecutivos (2001/2004), e a esposa, exerceu o mesmo cargo em eleição posterior (2007) no qual pretendia a reeleição:

[...]. Registro de candidatura. Prefeito. Parentesco. Inteligência do art. 14, §§ 5º e 7º, da Constituição Federal. Prefeito que exerceu mandato no quadriênio 2001/2004. Cônjuge deste que se elegeu em eleição suplementar em 2007, está no exercício do mandato e pretende a reeleição. Terceiro mandato pela mesma família no mesmo cargo do Poder Executivo caracterizado. [...]. Cônjuge de prefeito que exerceu mandato entre 2001 e 2004, eleita prefeita em eleição suplementar, em 2007, não poderá ser reeleita, sob pena de se caracterizar o terceiro mandato no mesmo grupo familiar. O mandato, nos termos do art. 29, I,da Constituição Federal, é o período de 4 (quatro) anos entre uma e outra eleição regulares, sendo a eleição suplementar, ocorrida no seu curso, mera complementação desse período total. A renovação do pleito, por incidência do art. 224 do Código Eleitoral, não inaugura novo mandato, conforme inteligência do art. 81, § 2º, da Constituição Federal. (Ac. de 12.2.2009 no AgR-REspe nº 31.765, rel. Min. Joaquim Barbosa).[13]

Com efeito, o Ministro Joaquim Barbosa, ao analisar o caso acima, decidiu pelo não cabimento de registro de candidatura posto que se caracterizasse o terceiro mandato consecutivo dentro da mesma família, o que é vedado por lei.

Resta esclarecer, no entanto, que tal vedação a elegibilidade de cônjuge ou parente, só se dará se ocorrer em candidatura dentro da mesma base territorial, ou seja, no mesmo município, no caso de prefeito e vereador, no mesmo Estado, no caos de Governador e Deputado Estadual, assim por diante. O caso abaixo é emblemático dessa realidade: 

[...] Prefeito. Parentesco. Elegibilidade. [...] A inelegibilidade decorrente do parentesco ocorre no território da jurisdição do titular. NE: “[...] no que diz respeito à segunda parte do questionamento, é positiva a resposta quanto à candidatura em município diverso, desde que não seja resultante de fusão, incorporação ou desmembramento da municipalidade em que o parente exerceu a titularidade. [...]”

(Res. no 21.786, de 1o.6.2004, rel. Min. Humberto Gomes de Barros.).[14]

A decisão acima deixa claro que a elegibilidade de cônjuge ou parente é possível em outra base territorial diversa do titular. No entanto, em se tratando de município este não pode ser objeto de fusão, incorporação, ou desmembramento do município o qual o parente ou cônjuge exerceu seu mandato. A regra da inelegibilidade aplicada aos cônjuges e aos parentes consanguíneos ou afins, inclusive, alcança até mesmo o concunhado do titular de mandato eletivo. 


1.5 Desincompatibilizações de Pastores e Sacerdotes

A questão do abuso de poder dos religiosos no aspecto eleitoral merece ser analisada no presente trabalho. Para tanto, importante verificar que o abuso de autoridade, cujo desrespeito tem por penalidade a cassação do registro de candidatura ou do diploma, além de considerada a inelegibilidade de quem haja exercido esse abuso, está disposto tanto na CF/88, art. 37, § 1º, quanto na Lei nº 9.504/97, art. 74.[15]

Em relação aos religiosos que detêm cargo de pastores e sacerdote, pretendendo se candidatar a cargo eletivo, não poderá se utilizar de símbolos e dizeres para mencionar qualquer tipo de serviços ou obras públicas, atrelando estas a sua pessoa ou ao seu partido, ainda que de forma velada ou implícita. No caso de haver desobservância dessa regra, o candidato estará sujeito às cominações legais. O entendimento da jurisprudência no caso abaixo elucidativo:

Assim sendo, observa-se que a propaganda institucional do Município de São Francisco de Itabapoana coligida aos autos ofende os princípios elencados no art. 37 da Constituição da República, porquanto contém citação de cunho religioso - "Tudo posso naquilo que me fortalece" - e as cores do Partido da República - PR como pano de fundo. VII - A mensagem constante dos outdoors espalhados pelo Município, contendo a questionada propaganda, não possui qualquer cunho informativo ou educativo que pudesse caracterizá-la como propaganda institucional. Há, apenas, a imagem de pessoas reunidas ao lado dos dizeres ‘São Francisco de Itabapoana precisa de todos nós’, tendo como fundo painel com as cores do PR. O texto da mensagem indica, de maneira subliminar, que o Município precisa da permanência dos recorrentes, fazendo alusão, de forma dissimulada, ao pleito vindouro. Abuso de autoridade caracterizado. Pelo provimento parcial do recurso interposto, reformando-se a sentença para afastar tão somente a sanção de multa por prática da conduta vedada prevista no artigo 73, §§ 10 e 11, da Lei 9.504/97. Mantida a cassação do registro de candidatura dos recorrentes, com fundamento na prática de abuso de autoridade, a teor do artigo 74 da Lei 9.504/97. (TRE-RJ, RE nº 25077 Relator ALEXANDRE DE CARVALHO MESQUITA, DJERJ Data 12/08/2013).[16]

No caso concreto acima relatado, restou patente o abuso de poder quando foi utilizada a propaganda alusiva à entidade religiosa, ao mesmo tempo, em que o ligava diretamente a um determinado partido e às pessoas dele integrantes. Como não podia deixar de ser, o caso foi julgado como caso de abuso de autoridade, cassando-se o registro do candidato.

O art. 73 da Lei nº 9.504/97, procurando evitar esse abuso de poder dos sacerdotes e pastores, determina que em ano eleitoral, programas sociais financiados pelo governo não poderão ser realizadas por entidade nominalmente vinculada a candidato ou por este mantida. Isso não proíbe que o poder público transfira recursos a templos religiosos que são entidades sem fins lucrativos. Esse repasse pode ser feito por convênio legalmente constituído não sendo alvo da vedação do art. 73, da Lei nº 9.504/97, uma vez que o templo religioso é obrigado a fornecer uma contraprestação a esse repasse financeiro.

No caso específico, o que não pode ocorrer é a vinculação da Igreja ou templo religioso que recebe convênio do poder público a candidato ou partido político, mesmo que não seja de forma direta.

[...] II – A realização de transferência voluntária de recursos através de convênios a entidades sem fins lucrativos é permitida em ano eleitoral, por inexistir a figura da gratuidade estampada no § 10 do art. 73 da Lei 9.504/97.

III – A execução de programa social por entidade nominalmente vinculada a pretenso candidato, em ano eleitoral, configura conduta vedada, ainda que a vinculação do candidato com a entidade se dê de forma INDIRETA ou mesmo SUBLIMINAR.

IV – Não há prazo de vedação para a transferência de recursos a entidades sem fins lucrativos por meio da celebração de convênios, desde que não haja vinculação. Caso contrário, havendo vinculação ao candidato, o prazo será o do próprio ano eleitoral. (TRE-RO, Consulta nº 35-22.2012.6.22.000, Rel. Herculano Martins Nacif, DJE nº 120, de 03.07.2012). [17]

Da decisão acima se depreende que havendo a vinculação da entidade religiosa a partido político, no ano eleitoral não haverá o repasse de recursos advindo do poder público. Assim, no ano eleitoral, o possível candidato não poderá estar à frente de entidade religiosa, nem mesmo como patrocinador, sob pena de sofrer sanção prevista em lei.

Dessa forma, percebe-se que as causas de inelegibilidade são inúmeras e que todas têm um tratamento bastante diferenciado pela legislação eleitoral, o que a caracteriza com um complexo sistema de normas, cujo alcance abrange a todos indistintamente, dentro das peculiaridades que lhes são inerentes.


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