Estudo sobre aspectos jurídicos do Insider Trading.

Dever de sigilo no mercado de valores imobiliários

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Resumo:


  • O insider trading consiste em realizar operações com valores mobiliários de uma companhia, utilizando informações relevantes não divulgadas ao público.

  • A legislação brasileira impõe deveres aos administradores e equiparados, como guardar sigilo sobre informações não divulgadas e proibir o uso dessas informações para obter vantagens indevidas.

  • Os Estados Unidos possuem normas mais detalhadas para prevenir e punir o insider trading, como a Seção 16 a e b, e a Rule 10 b-5, que estabelecem responsabilidade objetiva nos casos de insider trading.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O combate à prática de insider trading está diretamente ligado à necessidade de se garantir um mercado de valores mobiliários econômica e juridicamente seguro e amparado pela legislação pátria.

INTRODUÇÃO

Pelo presente estudo pretende-se efetuar considerações relevantes, embora sucinta, dos aspectos jurídicos que envolvem o insider trading.

O combate à prática de insider trading está diretamente ligado à necessidade de se garantir um mercado de valores mobiliários economica e juridicamente seguro e amparado pela legislação pátria, para efeitos de transparência na divulgação de informações relevantes ao mercado – Princípio da Transparência ou Full Disclosure1, inserido no art. 3º da Instrução CVM nº358/ 022, através das seguintes premissas: 1. Conceito de ato ou fato relevante; 2. Deveres do administrador na repressão à prática de insider trading e, 3. Responsabilidade do administrador e penalidades aplicáveis ao mesmo.

No mesmo diapasão, a Lei prevê as punições de ordem administrativa e penal aos que praticarem insider trading, além da possibilidade de reparação por perdas e danos causados aos investidores.

Nas palavras de Vera Helena de Mello Franco e Rachel Sztajn, o fundamento da proibição de trading é, “a tutela da eficiência valorativa do mercado; o respeito ao princípio da transparência (full disclosure), e aquele da moralidade que veda a formação de canais privilegiados.”3

Percebe-se, assim, que a repulsa à pratica de insider trading se alicerça, basicamente, por razões econômicas e éticas.

A questão econômica está relacionada à eficiência na determinação do valor dos títulos negociados no mercado de capitais; a cotação das ações deve refletir informações publicamente disponíveis a todos ao mesmo tempo.

A questão ética está baseada na confiança no mercado, evitando desigualdades entre os investidores.

Deste modo, podemos considerar como bem jurídico tutelado a indispensável confiança no mercado de valores mobiliários, porquanto isto é o que estimula os investidores a aplicarem seus recursos no mercado.


DEFINIÇÕES PRELIMINARES

O termo insider refere-se a pessoas que têm acesso às denominadas informações relevantes em relação a determinada companhia, relativas aos seus negócios e transações.

Doutrinariamente, informações relevantes, são aquelas que influenciam a cotação dos valores mobiliários de emissão da companhia e, consequentemente, a decisão dos investidores de vender, comprar ou reter esses valores.

Embora o Direito Brasileiro (a exemplo de muitos países) ainda não tenha definido, expressamente, o que seja insider, a Lei nº 6.404/ 764 implicitamente conceitua o termo insider, ao tratar sobre os deveres de lealdade e de informação por parte dos administradores ou pessoas a eles equiparados. Da mesma forma, o faz a Lei 6.385/ 765, ao delegar à CVM – Comissão de Valores Mobiliários - poderes normativos relativos à informações que devem ser prestadas pelos administradores e controladores das companhias abertas.

Baseando-se nas definições Norte-Americanas, as disposições legais acima mencionadas admitem como insider, as seguintes pessoas que, em razão de sua posição, têm acesso a informações capazes de influir na cotação dos valores mobiliários de emissão da respectiva companhia:

  1. administradoresconselheiros e diretores da companhia (art. 145. - Lei nº 6.404/766);

  2. membros de quaisquer órgãos, criados pelo estatuto da companhia, com funções técnicas ou destinadas a aconselhar os administradores (art. 160. - Lei nº 6.404/767);

  3. membros do Conselho Fiscal (art. 165. - Lei nº 6404/768);

  4. subordinados das pessoas acima referidas (§ 2º do art. 155. - Lei nº 6.404/769);

  5. terceiros de confiança dessas pessoas (§ 2º do art. 155. - Lei nº 6.404/76) e

  6. acionistas controladores (art. 22, inciso V, - Lei nº 6.385/7610).

No Direito Brasileiro, o conceito de informações relevantes é exatamente aquele que se extrai do próprio texto legal, mais especificamente, do art. 155, §1º11 c/c 157, §4º, da Lei 6.404/ 76, qual seja: informações relevantes são aquelas referentes a fatos, ocorridos nos negócios da companhia, que possam influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado, de vender ou comprar valores mobiliários de sua emissão.

O art. 2º da Instrução 358/ 02 da CVM12 não só define como também, exemplifica, entre os seus incisos I ao XXII, hipóteses não exaustivas do que se considera ato ou fato relevante.

O administrador (e pessoas a ele equiparadas13) é obrigado a revelar, além de qualquer deliberação de Assembléia Geral ou dos órgãos de administração da companhia, qualquer "fato relevante, ocorrido nos negócios da companhia, que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado, de vender ou comprar valores mobiliários de sua emissão".

É o que se extrai da Lei 6.404/ 76, art. 157, §4º, exceto se hover expressa determinação em contrário pela CVM, nos termos do §5º do mesmo dispositivo14, quando a informação puder colocar em risco a companhia.

A Lei 6.385/76, em seu art. 22, §1º, VI15, também dispõe sobre a competência da CVM em expedir normas aplicáveis às companhias abertas sobre a "divulgação de fatos relevantes, ocorridos nos seus negócios, que possam influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado, de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia".

Nos termos do art. 8º, inciso III, da Lei nº 6.385/7616, compete ainda à CVM, "fiscalizar a veiculação de informações relativas ao mercado, às pessoas que dele participem e aos valores nele negociados”.

Assim, em cumprimento às disposições acima mencionadas, a Instrução CVM nº358/ 02, arts. 3º, §§ 3º, 4º e 5º17 e art. 5º, disciplina o modo de divulgação das informações relevantes.

De acordo com o art. 7º da referida Instrução18, a única excessão que se admite quanto à divulgação de informações relevantes, é “se os acionistas controladores ou os administradores entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia”.

Nesta linha também determina o art. 3º, §1º da Instrução CVM nº358/ 0219, que os controladores, membros do conselho de administração, do conselho fiscal e de quaisquer órgãos com funções técnicas e consultivas, têm o dever de comunicar de imediato, ao Diretor de relações com investidores, todo e qualquer ato ou fato relevante para a companhia.

Já o art. 8º da mesma Instrução20, determina, não só aos mencionados pelo art. 3º, §1º, mas também, a qualquer empregado da companhia que tenha acesso à qualquer informação relevante, o dever de absoluto sigilo.

No caso do §1º do art. 3º não se questiona quanto à culpabilidade do agente, uma vez que, a simples omissão de informação relevante por parte dos sujeitos arrolados no mencionado artigo é suficiente para demonstrar a prática ilícita.

Com relação aos terceiros, também denominados tippee, há necessidade de se comprovar que tinham conhecimentos de que se tratava de informação relevante ainda não divulgada ao mercado.


DO INSIDER TRADING

Insider Trading consiste em realizar uma operação com valores mobiliários de emissão de uma companhia, em proveito próprio e utilizando-se de informação relevante ainda não revelada ao público.

Significa, em outras palavras, aproveitar-se, em razão do exercício profisional, de informações relevantes ao mercado e antes de publicamente reveladas, transacionar ações de uma companhia.

A prática do insider trading é considerada como ilícita, nos termos do art. 155. da Lei 6.404/ 7621, que impõem deveres e vedações ao administrador (e àqueles que se lhe equipara) da companhia.

De se notar que o inciso I do art. 155. é expresso ao vedar ao administrador o uso, em benefício próprio ou alheio, independente de prejuízo à companhia, de oportunidades comerciais de que tenha conhecimento em razão de seu cargo ou função.

O mesmo dispositivo legal impõe, nos §§ 1º e 2º22, dois deveres e uma proibição ao administrador, cuja prática configuraria a prática do insider trading:

  1. dever de guardar sigilo da respeito de qualquer informação que ainda não tenha sido divulgada ao mercado de investidores e capaz de influir de modo ponderável na cotação dos valores mobiliário;

  2. dever de zelar para que a guarda do sigilo acima referido seja observado por seus subordinados ou terceiros de sua confiança, e;

  3. proibição de valer-se das informações consideradas relevantes e das quais tenha conhecimento em razão de sua função, para obter vantagem para si ou para outrem, mediante compra ou venda de valores mobiliários.

O mesmo artigo 155, §3º, garante ao prejudicado pela prática do insider trading o direito de buscar indenização por perdas e danos dos infratores, o que será melhor abordado mais adiante.

De se observar que a responsabilidade do administrador é extensiva aos seus subordinados ou terceiros de sua confiança.

A exemplo da legislação norte-americana, a legislação brasileira busca dar garantias aos investidores no sentido de que, há um respaldo legal para que busquem a respectiva indenização se prejudicados pela prática do insider trading, além de, de acordo com Norma Jonssen Parente, “evitar que o investidor prejudicado ficasse à procura de quem reponsabilizar pelo ato ilícito.”23

Neste diapasão, o art. 155, §4º da Lei 6.404/ 7624, também considera insider trading a utilização de informação relevante ainda não divulgada, por qualquer pessoa que a ela tenha acesso, e obtenha vantagem, para si ou para outrem, no mercado de valores mobiliários (market information).

Utilizamos novamente as palavras de Vera Helena de Mello Franco e Rachel Sztajn, para quem: “pune-se não somente a ‘insider information’, mas igualmente aquele que sem participar da organização societária tem, por qualquer meio, acesso à informação privilegiada (market information)”.25

Deste modo, há evidente interesse legal em assegurar a estabilidade do mercado e restaurar o equilíbrio econômico-jurídico, inevitavelmente alterados pelo dano causado por eventual prática do insider trading.

A Lei 6.385/ 76, em seu art. 27-D, qualifica a prática do insider trading como sendo:

Art. 27-D. Utilizar informação relevante ainda não divulgada ao mercado, de que tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo, capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiro, com valores mobiliário.

Referida legislação também atribuiu à CVM e ao CMN - Conselho Monetário Nacional - competência para ampliar o conceito de insider trading, enunciado pela Lei 6.404/ 76.

Dentre outras atribuições, o art. 4º, VII da Lei 6.385/ 76, determina que compete à CVM e ao CMN “assegurar a observância de práticas equitativas no mercado de valores mobiliários.”26

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Em seu art. 18, II, a e b27, dispõe que a CVM poderá definir métodos e práticas a serem observados no mercado, assim como as operações fraudulentas, quais sejam, operações realizadas utilizando-se informações relevantes e ainda não divulgadas ao mercado, caracterizando, assim, práticas não equitativas, portanto, insider trading.

De se notar que para caracterização do insider trading o agente deve utilizar a informação considerada privilegiada e relevante e negociar valores mobiliários obtendo vantagem indevida para si ou para outrem.


DA PROVA

No curso do processo administrativo e do inquérito, são aceitos todos os meios de prova admitidos em Direito, a teor do que dispõe o art. 12. da Res. 454/ 77 do Bacen: “na apreciação de provas, que poderão ser todas as admitidas em Direito, a autoridade julgadora formará livremente sua convicção.”

No entanto, os indícios são os elementos de maior relevância para a constatação do insider trading e é através deles que se presume a ocorrência da operação na maioria dos casos.

Um dos indícios que mais caracterizam a prática do insider trading é o denominado short swing profits28.


DAS CONSEQUÊNCIAS

Do ponto de vista administrativo, a prática do insider trading, acarretará, nos termos do art. 9º, V, da Lei 6.385/ 7629, apuração de competência da CVM, mediante inquérito administrativo, dos atos ilegais e das práticas não equitativas dos administradores, membros do conselho fiscal e acionistas de companhias abertas, dos intermediários e dos demais participantes do mercado.

Apenas para fins elucidativos, são considerados “atos ilegais” todos os atos do administrador, contrários às disposições das Leis 6.404/ 76 e 6.385/ 76.

Quanto às “práticas não equitativas”, são aquelas proibidas pelo art. 155. da Lei 6.404/ 76 e que caracterizam o insider trading.

Também compete à CVM aplicar as punições previstas no art. 1130 da Lei 6.385/ 76, que poderão ser: advertência, multa, suspensão do exercício do cargo de administrador, inabilitação temporária, suspensão da autorização ou registro para o exercício das atividades de que trata esta Lei, cassação de autorização ou registro, para o exercício das atividades de que trata esta Lei, e proibição temporária.

Note-se que nos termos do art. 9º, VI da Lei 6.385/ 7631, as punições previstas no art. 11. supra, não excluem a responsabilidade civil e penal.

Quanto à obrigação de indenizar, a exemplo do disposto nos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil32, o prejudicado pela pratica do insider trading poderá propor ação para haver indenização por perdas e danos contra o administrador ou a quem se lhe compare, nos termos do art. 155, §3° da Lei 6.404/ 76:

Art. 155.

§ 3º A pessoa prejudicada em compra e venda de valores mobiliários, contratada com infração do disposto nos §§ 1° e 2°33, tem direito de haver do infrator indenização por perdas e danos, a menos que ao contratar já conhecesse a informação.

Na esfera criminal, até o advento da Lei nº 10.303/2001, alguns doutrinadores defendiam que o insider trading era uma modalidade de estelionato34.

Com o advento desta lei, que alterou e acrescentou dispositivos na Lei 6.404/76 e na Lei 6.385/76, o uso indevido de informação privilegiada passou a ser tipificado como crime, nos termos do art. 27-D, da Lei 6.385/ 76, in verbis:

Art. 27-D. Utilizar informação relevante ainda não divulgada ao mercado, de que tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo, capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiro, com valores mobiliários:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime.

Neste sentido, o primeiro caso de condenação pela prática do insider trading no Brasil, ocorreu na 6ª Vara Criminal da Justiça Federal de São Paulo, ação penal fruto da atuação coordenada do MPF com a CVM (Proc. nº 0005123-26.2009.4.03.6181), após denúncia de insider trading no âmbito de oferta pública para aquisição de ações de emissão da Perdigão S.A. formulada, em 2006, pela Sadia S.A.

O processo resultou na condenação do ex-diretor financeiro e de relações com investidores e do ex-membro do conselho de administração da Sadia, respectivamente a um ano e nove meses de reclusão, pena substituída por prestação de serviços à comunidade e pena de reclusão de um ano, cinco meses e 15 dias, também substituída por prestação de serviços. Foram condenados, ainda, no pagamento de multas equivalente a R$349,7 mil e R$374,9 mil, respectivamente. Ambos também ficaram impedidos de exercer cargos de administrador e conselheiro fiscal de companhias abertas pelo mesmo período da pena imposta.

O terceiro executivo envolvido nas negociações da oferta hostil, então superintendente executivo de empréstimos estruturados do ANB, fez um acordo com o Ministério Público Federal e foi excluído da ação penal em troca da prestação de serviços a uma entidade filantrópica por quatro horas semanais durante seis meses e seu comparecimento obrigatório perante o juiz a cada dois meses, durante três anos.35

Trata-se de uma sentença histórica relacionada a crime financeiro. O caso encontra-se em sede de recurso por parte do MPF e dos condenados.


DO DIREITO COMPARADO

Os Estados Unidos possuem maior histórico envolvendo a prevenção e punição da prática do insider trading e também onde vem ocorrendo o maior número de casos julgados envolvendo a questão de responsabilidade dos insiders.

Compete à Securities and Exchange Commission - SEC (correpondente à CVM) fiscalizar o mercado acionário norte-americano e reprimir a prática do insider trading.

As principais normas de repressão ao insider trading frente a legislação norte-americana, são do Securities and Exchange Act - SEC de 1934, Seção 16 a e b, e a Rule 10 b-5 de 1942.

A Seção 16 a, obriga os administradores, diretores e quaisquer pessoas que detenham, direta ou indiretamente, mais de 10% de ações de uma companhia com títulos publicamente negociados, remeter à SEC relatórios mensais, indicando qualquer modificação no número de ações que possuem naquela companhia.

A Seção 16 b, dispõe que qualquer das pessoas acima elencadas deve devolver à companhia qualquer lucro obtido nas operações de compra e venda ou venda e compra de ações da mesma companhia dentro de um período de seis meses. Em outras palavras, o insider não pode comprar e vender em intervalo de tempo inferior à seis meses. As negociações realizadas fora deste prazo não são abrangidas pela norma.

Note-se que a legislação norte-americana estabelece responsabilidade é objetiva nos casos de insider trading. Em outras palavras, não é necessário que o autor da ação prove o intuito do insider em obter lucros indevidos ou causar danos à terceiros ou mesmo a efetiva utilização de informações confidenciais.

A Rule 10 b-536, estabelece como ilegal, a qualquer pessoa, negociar ações, prestando informações falsas ou incorretas, ou omitindo um "fato relevante" (material fact)37.

A jurisprudência norte-americana tem interpretado a Rule 10 b-5 no sentido de que o insider, quando na posse de informação relevante, deve revelá-la ao público e, se não puder fazê-lo, abster-se de negociar com ações daquela empresa ou recomendar à terceiros que o façam, enquanto a informação não for divulgada.

A Suprema Corte americana tem limitado o dever de indenizar apenas nos casos em que tenha havido venda ou compra de security relacionada com informações sonegadas ou veiculadas erroneamente. Deste modo, deve-se demonostrar a conduta enganosa e a intenção dolosa do insider.

A jurisprudência americana também firmou entendimento de que fato relevante é entendido como aquele que o investidor médio poderia considerar significante para tomada de decisão em investir ou não.

Interessante apontar o posicionamento norte-americano quanto: 1) quem são as pessoas proibidas de negociar e 2) se a lei proíbe tão somente o insider information ou também alcança o market information.

Com relação ao ponto nº 1, a doutrina assinala dois casos (cases) de maior repercurssão.

O primeiro – Vincent Chiarella v. United States38 – a corte americana decidiu que para haver o dever de indenizar, nos termos da Seção 10, b, 5, eventual comércio de informações relevantes, não divulgadas ao público, deveria ocorrer anteriormente ao dever de informar.

No segundo caso - Dirks v. SEC39 - a decisão da Corte foi no sentido de que o dever do chamado tippers-tippees (quem divulga a informação; dica) de informar ou abster-se de negociar, depende do fato do insider (ou tipper) ter percebido algum benefício direta ou indiretamente com a divulgação.

Percebendo-se a inexistência de qualquer ganho pessoal, não haveria violação do dever de informar, isentando-se de responsabilidade tanto o tipper quanto o tippee.

No tocante ao ponto nº 2, discutía-se sobre a diferença entre market information e insider information. Para alguns a diferença reside no fato de que a fonte do insider information é a própria empresa, enquanto que no market information a fonte é fora da empresa. Para outros, o diferencial esta na natureza da informação: dados quanto os lucros e ativos da companhia é insider information, enquanto que informação sobre o comportamento futuro das ações é market information. No caso mencionado Chiarella v. United States, em primeira instância decidiu-se pela condenação, alegando-se a market information, o que foi mantido na segunda instância.

Ocorre que a Suprema Corte reformou a decisão, entendendo que os market insiders não teriam os mesmos deveres que aqueles detentores de informação interna, inside information.

Em resposta a tal decisão da Suprema Corte, a SEC acabou por exarar a Rule 14 e-3, de 1982, que obrigou a aplicação extensiva do princípio disclose or abstain from trading (informe ou abstenha-se de negociar).

Tal regra dispõe que é ilegal o tipping (dar informações) sobre uma oferta pública de aquisição ainda não divulgada, independentemente de resultar no tipping em negociações realizadas pelos tippees . Até então era ilegal tão somente o tipping acompanhado de negociação por parte do tipee .

Deste modo, toda pessoa de posse de informações relevantes com relação a uma tender offer (oferta pública para aquisição de controle), que saiba ou possa saber, que a informação não foi aberta ao público e que obtenha, direta ou indiretamente do ofertante ou de qualquer pessoa ligada à companhia, tem o dever de informar ou abster-se de negociar enquanto tais informações não forem públicas.

A violação da regra autoriza a SEC impor multas pecuniárias equivalentes a três vezes o lucro obtido com a negociação vedada.

Outro caso que merece ser mencionado é o Carpenter v. United States40, no qual a Suprema Corte incovou a Misappropriation Theory e estabeleceu a responsabilidade a toda pessoa possuidora de informação relevante não divulgada ao público e que utilize esta informação, violando um dever perante terceiros, além dos acionistas da corporação, cujas ações foram negociadas.

Esta decisão provocou a ampliação da compreensão da Rule 10 b-5, cuja violação ocorreria quando: 1. Sonegando informação relevante; 2. Mediante a quebra de dever decorrente de relação de confiança; 3. Utilizasse a informação em negociação com securities; 4. Sem levar em consideração que teria algum dever para com os acionistas titulares das ações negociadas.

Também relevante, o Insider Trading and Securities Fraud Enforcement Act, 1988, promulgou a seção 20, A, do Exchange Act, atribuindo direito de ação em benefício a todos os investidores que estivessem negociando a mesma espécie de securities durante o tempo em que teve lugar a negociação ilegal, limitando-se a indenização aos lucros obtidos com esta. Neste caso a ação pode ser proposta contra os insiders ou contra os tippers.

O que se percebe é que a legislação americana procura definir mais as diversas condutas potencialmente geradoras de comportamentos ilegais com relação aos negócios com ações, não se preocupando tanto com o agente, o que torna a ilegalidade facilmente detectável.

Na França e na Inglaterra a legislação referente ao insider trading apresenta alguns pontos em comum.

Ambas as legislações consideram crime a prática de insider trading, havendo, ainda, grande tendência em torna cada vez mais abrangente o conceito de insider traging, tendência que também se verfica em outros países da Europa.

Na França a questão passou a ter disciplina a partir da Ordenação nº67-833 de 1967, que acrescentou o art. 162-1 à Lei de Companhias, que passou a exigir dos diretores e demais funcionários graduados a conversão de todas as ações ao portador em nominativas, além da obrigação de enviar relatórios periódicos à Commission des Operations de Bourse, referentes às trasações esfetuadas com referidas ações.

O insider trading passa a ser considerado crime com a Lei 70-1-208, de 1970, art. 10-1. Referido dispositivo obriga diretores, funcionários graduados, esposas e dependentes destes a converterem suas ações para a forma nominativa.

A Lei também considera insider qualquer pessoa que tenha acesso a informações técnicas, comerciais, financeiras ou operacionais da companhia, em razão do exercício profissional. Percebe clara extensão do conceito de insider pela jurisprudência.

Em 1982 houve aprovação de uma Lei que deu nova redação ao referido art. 10-1, com ampliação da definição de informações privilegiadas, passando a incluir as informações de mercado, referentes a projeções na evolução dos negócios da empresa ou no comportamente futuro do mercado de títulos.

Na Inglaterra, o Companies Act, 1980, também considera criminosa a conduta de insider trading, aplicando pena de prisão ao infrator.

Aplica-se a proibição de insider trading aos diretores, empregados da empresa e, também, aos indivíduos que mantenham relações profissionais ou comerciais com a companhia e tenha acesso a uma unpublished price sensitive information41, abrangendo aqueles que recebem refeida informação, as pessoas envolvidas em processo de takeover offer42, aos funcionários e seus tippes.

O que se precebe em comum ao acima disposto, é que o insider trading é considerado crime e passível de punições severas; há uma busca de ampliação do conceito de insider; e uma tendência de considerar, para efeitos de punição, não apenas a insider information, mas também a market information.

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Sobre o autor
Wilson de Alcântara Buzachi Vivian

Advogado. Membro do escritório Advocacia Ramos Fernandez Sociedade de Advogados. Sócio da imobiliária Modelo Imóveis. Mestre em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito - Fadisp. Pós-graduado em Direito Imobiliário pela Faculdade Autônoma de Direito - Fadisp. Graduado pela Faculdade de Direito da Alta Paulista de Tupã.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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