A CERTEZA E LIQUIDEZ DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO À LUZ DA LEI N. 8.383/91
O que se discute muito na jurisprudência, entretanto, como condição maior ao deferimento de medida liminar para compensação tributária, ou à declaração do seu direito, é a verificação da certeza e liquidez do crédito que se quer compensar, muitas das vezes, admitamos, não demonstradas satisfatoriamente pelo contribuinte, quando demonstrada.
A Excelentíssima Juíza Federal MARIA CRISTINA SARAIVA FERREIRA E SILVA, da 3ª Vara Federal/RS, no julgamento da Ação Ordinária n. 97.1503720-8, toma como suas as palavras da MMª. Juíza TÂNIA ESCOBAR, do TRF da 2ª Região, que oportunamente assim dispõe sobre a certeza e a liquidez:
"A liquidez e a certeza do crédito, exigidas para a compensação, tomam significações diferentes, conforme a espécie do procedimento adotado: se estiver fundado no Decreto-Lei n. 2.287/86 (ou na Lei n. 9.430/96), evidente que crédito líquido e certo será aquele sobre o qual o Fisco haja se manifestado previamente, pois a compensação, nesse caso, pressupõe restituição administrativa deferida. Agora, se o procedimento for realizado no âmbito do lançamento por homologação, que incumbe ao sujeito passivo a iniciativa do procedimento, crédito líquido e certo será o que assim for por ele considerado, em qualquer manifestação prévia, quer da Administração, quer do Judiciário." [14]
Continuando o raciocínio, a MMª. Juíza MARIA CRISTINA assim dispôs em sua sentença:
"De fato, sendo a compensação prevista na Lei n. 8.383/91 realizada no âmbito do lançamento por homologação, o seu procedimento equipara-se ao do pagamento antecipado, nos casos de tributos autolançados, efetivando-se sem qualquer participação do ente fiscal. Assim, diferentemente do que ocorre nos demais procedimentos compensatórios, que operam a extinção imediata do crédito tributário, créditos líquidos e certos, para os efeitos da referida lei, são aqueles que o próprio contribuinte registra em sua escrita fiscal, tal como procede em relação ao pagamento antecipado.
Esse o entendimento, aliás, do STJ, construído a partir do célebre julgamento dos Embargos de Divergência n. 78.3011/BA, realizado no dia 11 de dezembro de 1996, em que foi Relator o Ministro ARI PAGENDLER, e, no qual, refutando-se a tese defendida pela 1ª Turma daquela Corte, no sentido de que créditos líquidos e certos do contribuinte são aqueles que têm o respectivo quantum reconhecido pela Fazenda, firmou-se o entendimento de que a prévia quantificação e fixação dos valores a serem compensados não constitui requisito à implementação do procedimento previsto no art. 66 da Lei n. 8.383/91."
Os Embargos de Divergência citados pela culta juíza está assim ementado:
"TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO. TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO. AÇÃO JUDICIAL.
Nos tributos sujeitos ao regime do lançamento por homologação (CTN, art. 150), a compensação constitui um incidente desse procedimento, no qual o sujeito passivo da obrigação tributária, ao invés de antecipar o pagamento, registra na escrita fiscal o crédito oponível à Fazenda, que tem cinco anos, contados do fato gerador, para a respectiva homologação (CTN, art. 150, § 4º); esse procedimento tem natureza administrativa, mas o juiz pode, independentemente do tipo da ação, declarar que o crédito é compensável, decidindo desde logo os critérios da compensação (v.g., data do início da correção monetária)."
Nessa linha de raciocínio, HUGO DE BRITO MACHADO ensina que:
"O exercício do direito à compensação independe de autorização da Fazenda Pública. Independe também de decisão judicial reconhecendo a liquidez do crédito a ser compensado, ou do próprio direito à compensação. O contribuinte faz a compensação e assume a responsabilidade por seu ato". [15]
Voltando às palavras da MMª. Juíza do TRF da 4ª Região, TÂNIA ESCOBAR, em observação imprescindível:
"Com base na referência a créditos líquidos e certos contida no artigo 170 do CTN, durante muito tempo a jurisprudência condicionou a compensação autorizada no art. 66 da Lei n. 8.383/91 ao prévio reconhecimento fiscal ou judicial de que o contribuinte era credor do Fisco, ao argumento de que líquidos e certos são os créditos expressamente declarados pelo Fisco e os reconhecidos, como tais, por sentença com trânsito em julgado [16]. Se assim fosse, não precisaria o legislador ter inovado a ordem jurídica, pois da compensação envolvendo esse tipo de crédito já cuida o Decreto-Lei n. 2.287/86, compensação, esta, com previsão de ser efetivada apenas pelo Fisco." [17]
Então: "A liquidação do crédito tributário não é pré-requisito para o exercício da compensação do indébito tributário [18]. Ao contrário, a compensação do art. 66 da Lei n. 8.383/91 direciona-se, exatamente, para o momento anterior ao lançamento. A liquidez será apurada pelo agente administrativo, no momento da homologação." [19]
Com efeito, não sendo imprescindíveis a liquidez e a certeza para a compensação do art. 66 da Lei n. 8.383/91, a análise, por parte do magistrado, do pedido de liminar, então, deve-se ater aos pressupostos autorizados da medida liminar para o deferimento da compensação, ou da declaração de seu direito. O que o nobre ministro ARI PAGENDLER defende no precedente acima colacionado é o aceitável: "o juiz pode declarar que o crédito é compensável, decidindo desde logo os critérios da compensação", mesmo porque os dados são lançados por conta e risco próprios do contribuinte, que poderá ser fiscalizado a qualquer momento.
No caso, a declaração do direito à compensação, como veremos mais adiante, é objeto próprio de mandado de segurança, resguardando-se à ação ordinária a compensação propriamente dita, ou seja, que depende de dilação probatória complexa.
Alguns magistrados de 1º Grau têm notado a peculiar diferença entre o art. 170 do CTN e o art. 66 da Lei n. 8.383/91, aplicando, acertadamente, o entendimento esposado pelo Ministro ARI PARGENDLER. A exemplo, o MM. Juiz Federal ADÃO DE ASSUNÇÃO DUARTE, da 8ª Vara da Seção Judiciária da Bahia, analisando o pedido de medida liminar nos autos do MS n. 94.0004755-0, proferiu a seguinte decisão:
"Verifico haver razoabilidade na argumentação da impetrante, na sua substanciosa peça vestibular, como o complemento constante da peça de fl. 50, que veio em atenção à nossa decisão de fl. 48 dos autos (determinou à impetrante que especificasse qual o período do crédito tributário a ser compensado). Em sendo assim, entendo estarem presentes os requisitos e fundamentos estabelecidos no art. 7º, inciso II, da Lei n. 1.533/51, razão pela qual CONCEDO A LIMINAR pleiteada pela Empresa mencionada assegurando-lhe seja procedida a compensação pleiteada, dos valores que recolheu a maior a título de Contribuição Social sobre o Lucro no período de janeiro de 1993 a março de 1994, com eventuais débitos posteriores da mesma Contribuição Social sobre o Lucro."
Se atendidos, como no caso, os requisitos do art. 7º, II, da Lei n. 1.533/51 não há razão plausível para o indeferimento da medida liminar. Igual raciocínio deve-se ter em mente quando se trata do instituto da antecipação de tutela, mesmo porque: "embora a expressão "poderá", constante do CPC 273 caput, possa indicar faculdade e discricionariedade do juiz, na verdade constitui obrigação, sendo dever do magistrado conceder a tutela antecipatória, desde que preenchidos os pressupostos legais para tanto..." [20]. Em homenagem a tal entendimento, há de ser observado precedente do TRF4 que toma a antecipação de tutela como meio hábil à compensação de créditos tributários:
"PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. COMPENSAÇÃO.
A compensação de tributos pode ser deferida em provimento antecipatório da sentença de mérito. A despeito de constituir modalidade de extinção do crédito tributário, o provimento judicial que a defere não é irreversível, pois depende, para surtir os efeitos que lhe são próprios, de ulterior homologação fiscal"
(TRF4, AGAI n. 97.04.00707-8/SC, T2, Rel. Juíza TÂNIA ESCOBAR, DJ 10.09.97)
Ocorre que, mesmo quando demonstradas a liquidez e a certeza do crédito tributário, tanto em mandados de segurança quanto em ações ordinárias, a compensação não tem sido deferida liminarmente devido a generalidade das normas proibitivas que a regulamentam, utilizadas muitas das vezes como mecanismo processual de contenção de processos, como veremos a seguir.
Possível a compensação de créditos tributários "da mesma natureza" por sponte própria do contribuinte, conforme preceitua o art. 66 da Lei n. 8.383/91, devemos enfrentar e analisar outros pontos importantes, necessários à total compreensão da matéria, que, por si sós, embasariam o pedido de medida liminar para compensação, ou declaração de seu direito, de créditos tributários.
A RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO, A COMPENSAÇÃO E O "SOLVE ET REPETE".
A repetição do indébito tributário, prevista no art. 165, caput, do CTN, baseia-se precipuamente no princípio da estrita legalidade tributária (art. 5º, II, c/c o art. 150, I, ambos da CF/88), no da propriedade (art. 5º, XXII, da CF/88) e no da moralidade administrativa (art. 37 da CF/88).
Sabidamente o princípio da legalidade tem aplicação imediata (art. 5º, § 1º e art. 60, § 4º, da CF/88), estando o Estado e os entes que o compõem obrigados a respeitá-lo, ainda mais quando se trata de matéria tributária. Por isso que o Estado só pode exigir o legal. A cobrança do que é indevido, ou a não-restituição do que não lhe pertence, por parte do Estado, caracteriza ofensa direta a referido princípio, pois não há lei que o autorize a proceder de tal maneira, ensejando, de imediato, a devida restituição.
O doutrinador GARCIA NOVOA assim dispõe sobre o indébito e o princípio da legalidade:
"Seria indébito qualquier tributo exigido sin base legal puesto que solo la aeu puede determinar los hechos que definen el derecho del Estado a exigir los tributos y legitimar la retención de las sumas pagadas. Desde este punto de vista adquiere plena certeza la afirmación de Tesauro de que ‘la repetición del indebito em materia tributaria es um corolario necessario del princípio de legalidade". [21]
De outro lado, é imperioso observar os princípios da propriedade e moralidade administrativa.
"No rol dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, há o princípio constitucional que afirma o direito de propriedade. Tal princípio é de suma importância para o direito de repetição do indébito tributário, pois quando ocorre o pagamento da quantia indevida, é, na verdade, parcela da propriedade do contribuinte que está sendo indevidamente apoderada pelo Estado. A Constituição Federal arrola algumas hipóteses em que o cidadão pode ser legitimamente expropriado (arts. 5º, incs. XXIII, XXIV, XXV, XLVI, ‘b’ e ‘c’; art. 170, III; 182, § 3º; 184; 145 a 156). O indébito tributário, porém, não se coaduna com nenhuma dessas alternativas." [22]
Com efeito, se o contribuinte tem crédito a haver com a Fazenda Pública, a retenção não motivada desse crédito configura ofensa direta ao princípio constitucional da propriedade. Oportunamente e com propriedade, GABRIEL LACERDA TROIANELLI dispõe:
"Em qualquer dessas três hipóteses – postergação injustificada do ressarcimento do indébito, inconstitucionalidade útil ou inconstitucionalidade útil por inércia – o Estado utiliza a lentidão inerente ao um de seus próprios Poderes – o Judiciário -, se aproveita da boa-fé do contribuinte que pagou sem discutir o tributo indevido, abusa da sua posição privilegiada em relação às pessoas de direito privado, tudo para, seja arrecadando o que não deve, seja não devolvendo o que deve, incrementar os recursos fazendários, o que, longe de constituir uma finalidade em si do Estado – que não é uma empresa com fins lucrativos, mas uma pessoa de direito público que deve se ater ao interesse público -, é meramente um meio para que possa atingir seus verdadeiros fins, entre os quais se inclui, indiscutivelmente, o zelo pela legalidade e pelo direito de propriedade dos cidadãos". [23]
Quanto ao princípio da moralidade, maiores discussões são desnecessárias, mesmo porque "arrecadando o que não deve", "não devolvendo o que deve" o Estado manifestamente age contra a moralidade administrativa (art. 37 da CF/88).
Ocorre que o Estado, representado, no caso, pelo Fisco, toma por diversas vezes medidas equivocadas, contrárias à Constituição Federal. Hodiernamente, o Estado tem manifestamente agredido os direitos do contribuinte, tudo em nome da estabilidade financeira (entenda-se arrecadação), exigindo tributos indevidos e protelando a restituição dos já pagos, "certo de que sairá no lucro", com o infeliz respaldo do judiciário, que, em muitos casos, se dá, por exemplo, pela odiosa morosidade ou pela falta de recursos.
AROLDO GOMES DE MATTOS assim se manifesta sobre o assunto:
"Locupleta-se insaciável e impunemente o Estado, na certeza de que muitos contribuintes, pelo temor fiscal, abdiquem de seus direitos, resignando-se com a sobrecarga tributária, ou, então, de que serão tais direitos coarctados ou simplesmente neutralizados nas infindáveis dobras das contendas forenses". [24]
Diante do breve resumo colocado a respeito da repetição do indébito tributário e sua base constitucional, há de se estreitar o tema com o instituto da compensação. A repetição do indébito tributário guarda estreita ligação com a compensação tributária, uma vez que essa é utilizada como espécie daquela:
"A compensação é forma de devolução de indébito tributário, assim como o é o pagamento por precatório" (Ministra ELIANA CALMON [25])
"Se o pressuposto ontológico da compensação é o reconhecimento do pagamento indevido ou a maior pelo contribuinte, a repetição desse indébito é sua conseqüência óbvia e natural, que se pode materializar pela "compensação " na equação débito = crédito ou no recebimento do equivalente em espécie (por precatório)." [26] (Desembargador Federal LUCIANO TOLENTINO AMARAL)
Nesse diapasão, os mesmos princípios norteadores do indébito tributário são aqueles aplicáveis à compensação, devendo-se ter em mente algumas peculiaridades da repetição de indébito, como o perigo de se configurar o "solve et repete".
"Paga e Repete", é a tradução simples e literal ao vernáculo do fato de haver um pagamento de tributo indevido onde, depois do pagamento, solicita-se sua restituição; aplicável mesmo quando sabidamente indevido o tributo, ou seja: pague; depois, se indevido, discuta.
BALEEIRO explica a origem e a repulsa ao "malsinado" instituto, fazendo um paralelo com tema aqui tratado, a compensação:
"Impedir a compensação de um tributo pago indevidamente, com outro da mesma espécie que está sendo exigido, é o mesmo que se praticar o "SOVE ET REPETE". [27]
O "solve et repete", assim, nada mais é, expressando-se em poucas palavras, do que a configuração da ofensa ao direito de propriedade.
Nas palavras de HUGO DE BRITO MACHADO:
"É o restabelecimento do "solve et repete", regra segundo a qual o contribuinte não tem o direito de questionar a exigência de um tributo sem fazer o respectivo pagamento. Mesmo que o considere indevido, e questione, administrativa ou judicialmente sua exigência, deve fazer o pagamento para depois, se vitorioso na questão, pedir a restituição [28]. No dizer de Baleeiro, "é a garantia fiscal designada como solve et repete, que a legislação ditatorial de 1937 a 1946, introduziu em nosso país, pelos dec. leis nº 5, de 13.11.1937; nº 42, de 6.11.1937; número 3.336, de 10.6.1941 e outros diplomas, que, depois da Constituição de 1946, vem recebendo repulsa do Supremo Tribunal, em dezenas de julgados, a despeito da insistência das repartições arrecadadoras.
Se o contribuinte tem direito de compensar, a exigência do tributo de período subseqüente, sem permitir aquela compensação, é absolutamente indevida. Se para discutir se há ou não o direito à compensação o contribuinte é obrigado a ir pagando, para depois, se vitorioso, pleitear a restituição, tem-se restabelecido o malsinado "solve et repete." Mais uma manifestação do autoritarismo, somente compatível com a ditadura, onde aquela regra teve origem." [29]
Com efeito, quando o contribuinte demonstra e comprova prontamente a plausibilidade jurídica da repetição do indébito, no caso, da compensação, a exemplo do tributo pago indevidamente, seja porque, v.g., julgado inconstitucional seja porque pago equivocadamente, não há razão para denegar-se a medida liminar, se pleiteada, pois a demora na restituição do que foi pago indevidamente, como nos ensina os eméritos doutrinadores tributários citados, configura-se o famigerado instituto do "solve et repete", com ofensa direta aos já citados princípios da legalidade, da propriedade e da moralidade administrativa.
Não por acaso a preocupação do Código Tributário Nacional e da Constituição Federal quanto ao indébito tributário. Nessa exemplificada pelo art. 150, § 7º; naquele, pelo art. 165, respectivamente:
"Art. 150. (...)
§ 7º. A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido". (o grifo não é do original)
"Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do art. 162, no seguintes casos:
I – cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;
II – erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;
III – reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.
Existindo, então, crédito a ser devolvido ao contribuinte, este está legitimado a proceder à imediata ação de repetição de indébito ou, em vez disso, a buscar no judiciário a declaração do seu direito à compensação, seja na forma do art. 66 do art. 8.383/91, seja na forma de qualquer outra lei que lhe faculte tal direito, seja por meio de mandado de segurança ou por meio de ação de rito ordinário.
O eminente Desembargador Federal TOURINHO NETO, do TRF da 1ª Região, no julgamento do AG n. 1997.01.00.003577-0/DF, publicado no DJ 02/05/1997, p. 29893, assim se manifestou:
"PROCESSO CIVIL. RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. TUTELA ANTECIPADA. PROCEDIMENTO.
O pagamento devido pela Fazenda Pública, em ação de repetição de indébito, por força de tutela antecipada, só pode ser feito mediante precatório, nos exatos termos do art. 100 da Constituição Federal, ou mediante compensação.
Se "a compensação é forma de devolução de indébito tributário, assim como o é o pagamento por precatório" nada obsta, então, que, no caso do julgado acima, se autorizasse a compensação por meio da medida liminar (antecipação dos efeitos da tutela), assim como expressamente manifestado na ementa transcrita. Mesmo porque, o caminho do precatório (art. 100 da CF 88), em detrimento ao da compensação, nos casos de repetição de indébito, se mostra tortuoso e demorado, o que lhe dá ares do "solve et repete", como nos ensina BALEEIRO e HUGO DE BRITO MACHADO, além de ser ofensa ao princípio da propriedade (tema que por si só daria ensejo a outra monografia).
O indeferimento da compensação nos casos de tributos sujeitos a homologação, por sua vez, sobre a alegação de que acarretaria efeitos definitivos sua concessão, visto que se trata de forma extintiva do crédito tributário, só fortalece a presença do "solve et repete". Isso porque:
"Tal como acontece com o pagamento feito antes do lançamento, a compensação de que se cuida não extingue desde logo o crédito tributário. Não é razoável admitir-se, sem lei que o imponha a título de ficção jurídica, que algo pode ser extinto antes de existir. Assim, ocorrendo antes de completado o lançamento, a compensação, como o pagamento, extingue o crédito tributário sob condição resolutória da ulterior homologação do lançamento que o constitui." [30]
Por isso, o contribuinte, responsável pelos dados fornecidos ao fisco, verificando que incorreu em erro no preenchimento das informações prestadas, pagando a maior o tributo, ou recolhendo tributo indevido, tem direito, caso queira, a imediata compensação, a ser feita por conta própria. A negativa, então, de liminar provimento jurisdicional respaldando o seu ato, em alguns casos, v.g., fiscalização do fisco e autuação do contribuinte porque procedeu uma compensação "indevida", se mostra ato compatível com a figura do "solve et repete".
Diante da relevância da fundamentação e do risco de dano de difícil reparação, demonstrados e comprovados de plano pelo contribuinte, o magistrado deve deferir a medida liminar, se pleiteada, sob pena de agraciar o instituto do "solve et repete":
"TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. FÉRIAS-PRÊMIO. REGÊNCIA LEGAL.
1. O pagamento de férias não gozadas por necessidade do serviço não está sujeito à incidência do imposto de renda (Súmula nº 125 - STJ).
2. Sendo relevante a fundamentação e existindo o risco de dano de difícil reparação, radicado na necessidade de evitar o "solve et repete ", é de manter-se a decisão que, em mandado de segurança, determina liminarmente a sustação da tributação.
(TRF1, AG 1998.01.00.063967-2/MG, T3, Rel. JUIZ OLINDO MENEZES DJ 03 /09 /1999, p. 95)
O pior, talvez, não seja a verificação do instituto do "sove et repete" no dia-a-dia dos tribunais. O pior é o perigo de sua inserção dentro do quadro da lei, tornando-o, por via obliqua, instituto legal, minando os direitos do contribuinte e contrariando os princípios acima citados. Exemplo disso são as possibilidades existentes a partir da edição da Lei Complementar n. 104, de 10 janeiro de 2001, que deu origem ao art. 170-A do CTN.