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A substituição tributária progressiva no campo de incidência do ICMS

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CAPÍTULO II: A SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA E O ATENDIMENTO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

            2.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

            2.1.1 Definição do Princípio da Legalidade

            Dita a Constituição Federal de 1988 que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Eis o cerne do princípio da legalidade.

            Os modelos genéricos dos tributos são estabelecidos na Constituição Federal, que expressamente distribui as competências tributárias dos entes tributantes. Cabe ao legislador ordinário, então, especificar esses modelos genericamente previstos, posto que dentro dos limites estabelecidos pelos modelos padrões há uma certa liberdade.

            Todos os tributos, sem exceção, são previamente tipificados em lei. As hipóteses de incidência, os sujeitos ativos e passivos da relação obrigacional, as bases de cálculo e alíquotas, enfim todo o arcabouço jurídico precisa estar claramente definido em lei.

            Para Cabral (1993, p.50) a tributação sujeita-se ao princípio da legalidade:

            Se ninguém é obrigado a fazer ou não fazer alguma coisa senão em virtude de lei é óbvio que a primeira entidade a obedecer a tal comando deverá ser a administração, não podendo exigir tributo, impor obrigações a qualquer contribuinte, ou exigir que ele se abstenha de praticar algum ato se não existe lei prevendo tal exigência ou abstenção.

            Constata-se a imperiosa necessidade da tributação obedecer ao princípio da legalidade. Cabral (1993, p.158-159), categoricamente, diz:

            Incontroverso, pois, que a cobrança de qualquer tributo pela Fazenda Pública (nacional, estadual, municipal ou distrital) só poderá ser validamente operada, se houver uma lei que a autorize. O princípio da legalidade é um limite intransponível à atuação do Fisco. O tributo subsume-se a esse princípio constitucional.

      (...)

      Não é por outro motivo que se tem sustentado que em nosso ordenamento jurídico vige, mais do que o princípio da legalidade tributária, o princípio da estrita legalidade. Aliás, hoje mais do que nunca,(...), juristas de tomo têm feito empenho no sentido de que os tributos só podem ser criados ou aumentados por meio de lei ordinária.

            Carrazza (1996, p.154), tecendo comentários acerca do princípio da legalidade, diz:

            O princípio da legalidade – que não é exclusivamente tributário, pois projeta sobre todos os domínios do Direito – vem enunciado no art. 5º, II da CF : "Art. 5º (...) II – Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".

            Carvalho (1996, p.102) define com maestria o que seja princípio da legalidade:

            Sabemos da existência genérica do princípio da legalidade, acolhido no mandamento do art. 5º, II, da Constituição. Para o direito tributário, contudo, aquele imperativo ganha feição de maior severidade, como se nota da redação do art. 150, I: sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.

            Fonruoge, apud Bastos (1998, p.110), escreve:

            Um dos princípios essenciais do estado moderno é o da legalidade da tributação – também conhecido por reserva da lei – que a doutrina considera como regra fundamental do direito público.

            O princípio da legalidade aplicada à tributação vem expressamente contido no art. 150, I da Constituição Federal, segundo o qual nenhum tributo será exigido ou aumentado sem que a lei o estabeleça.

            Aliás, é a própria Constituição Federal quem atribui nominalmente as competências tributárias aos diversos entes públicos. Nela encontram-se presentes o rol de tributos de competência da União, dos Estados e do Distrito Federal, e dos Municípios, os princípios gerais do sistema tributário, os limites do poder tributante, bem como a regra padrão de cada tributo.

            É também a Constituição quem define as matérias tributárias que devem ser tratadas através de Lei Complementar. Expressamente, descreve o disciplinamento jurídico atribuído à tal espécie normativa. Logo, por exclusão, as demais matérias tributárias serão veiculadas por lei ordinária.

            A relação jurídica obrigacional tributária obedece ao princípio da estrita reserva legal. O fato típico tributário vem previsto em lei. E para que nasça a obrigação tributária é necessário a subsunção do fato concreto com a hipótese de incidência legalmente prevista.

            Assim, não será relevante para o nascimento da relação obrigacional tributária a vontade do sujeito ativo ou passivo, posto que não há espaço para o exercício da vontade das partes. Basta que se verifique a ocorrência concreta da hipótese de incidência, legalmente prevista, para que nasça a obrigação tributária.

            Não é a realização de qualquer fato ou ato que faz nascer a obrigação tributária, mas apenas aqueles que foram eleitos como necessário à ocorrência do fato gerador. É que o legislador garimpou dentre os inúmeros acontecimentos aqueles que têm relevância econômica, para, então, tipifica-los na norma jurídica tributária como hipótese de incidência de determinando tributo. Entretanto, não pode o legislador ordinário eleger fatos diferentes da norma padrão de incidência previamente estabelecida na Constituição.

            2.1.2 A Substituição Tributária e o Atendimento ao Princípio da Legalidade

            Por um longo período discutiu-se a legalidade do regime de substituição tributária. Apesar da previsão legal da responsabilidade por substituição, genericamente prevista no art. 128 do CTN, o instituto não foi de pronto regulamentado. Aliás, neste particular, a legislação tributária sempre esteve atrás das inovações introduzidas pelas práticas fazendárias.

            Diante das facilidades de controle e arrecadação dos tributos, decorrentes da adoção do regime em comento, houve uma verdadeira corrida em sua implantação. É claro que as diversas administrações fazendárias não tiveram o cuidado de aguardar que o instituto fosse devidamente regulamentado pela legislação tributária.

            Só a lei pode atribuir a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa. E neste caso, exclusivamente, lei em sentido formal, qual seja, aquele ato emanado do poder legislativo decorrente do processo legislativo previsto no art. 59 da Constituição Federal. Entenda-se por lei o ato normativo produzido pelo Poder Legislativo segundo forma prescrita na Constituição, gerando direitos e deveres em nível imediatamente infraconstitucional (Temer, 1995, p.129).

            E mais, além de necessidade de previsão em lei, a responsabilidade tributária tem que ser atribuída a terceira pessoa de modo expresso, conforme categoricamente determina no art. 128, do CTN.

            Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, foi atribuído à lei complementar competência para dispor acerca do regime de substituição tributária, na seara do ICMS, conforme art. 155, XII, g, da CF.

            No entanto, o art. 34, § 8º da ADCT, estabeleceu o prazo de 60 dias para a edição de lei complementar necessária à instituição do ICMS, sob pena do imposto ter suas normas regulamentares fixadas provisoriamente por convênio celebrado entre os Estados e o Distrito Federal. Foi, então, que o Convênio 66/88, fixou normas para regular provisoriamente o ICMS, até a entrada em vigor da Lei Complementar nº 87/96, que passou, então, a fixar normas sobre o imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.

            Tanto o Convênio 66/88, como a Lei Complementar nº 87/96 estabeleceram preceitos acerca do regime de substituição tributária.

            Contudo, com a penetração em nosso ordenamento jurídico constitucional do § 7º do art. 150 da Carta Magna, através da EC n.º 3/93, foi albergada em nível constitucional a figura jurídica que autoriza as diversas Fazendas Públicas a cobrança antecipada de tributo decorrente da ocorrência presumida da hipótese de incidência abstratamente prevista em lei.

            O regime de substituição tributária, que antes era tratado apenas na legislação infraconstitucional, agora foi albergado em nível constitucional, passando a figura jurídica do fato gerador presumido, decorrente de tal regime, a ter fundamentos na própria Constituição Federal. Assim, permitiu-se aos fiscos a cobrança antecipada de tributo de um fato gerador que presumivelmente irá acontecer.

            Quanto ao atendimento ao princípio da legalidade, o Superior Tribunal de Justiça já tornou pacífica sua jurisprudência acerca da matéria :

            TRIBUTÁRIO. ICMS. RECOLHIMENTO ANTECIPADO. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. EXIGÊNCIA LEGÍTIMA.

      1 – O recolhimento antecipado do ICMS, pelo substituto tributário, não caracteriza pagamento do imposto antes da ocorrência do fato gerador.

      2 – O momento de incidência da Lei para fazer gerar a obrigação tributária não se confunde com o ato de recolhimento do tributo.

      3 – O DL nº 406/68, recepcionado pela CF / 88, alterado pela Lei Complementar nº 44 / 83, e tendo convivência harmônica com o art. 128 do CTN, consagra a regra de substituição tributária.

      4 – O regime de recolhimento do ICMS antecipado por substituto tributário não pratica ofensa ao princípio da legalidade, da capacidade contributiva e da não cumulatividade do tributo. Não caracteriza, também, vinculação do substituto tributário com o fato gerador.

      5 – A Emenda Constitucional nº 3 / 93 veio reafirmar a sistemática da antecipação do recolhimento do tributo instituída por Convênio.

      6 – Recursos providos.

      Relator: MINISTRO JOSÉ DELGADO

      Turma: PRIMEIRA

      Processo: RESP 193258/PR ~ Data da decisão: 11/12/98. [grifos nossos].

            Desta forma, não merece mais destaque a discussão doutrinária acerca da legalidade do instituto da substituição tributária. Hoje em dia, tal regime, além de vir expressamente autorizado na Constituição Federal, encontra-se inserido em diversas normas jurídicas infraconstitucionais, de maneira que o princípio da legalidade seja de pronto atendido.

            2.2 PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE

            2.2.1 Definição do Princípio da Não-cumulatividade

            O princípio da não-cumulatividade tem como característica fundamental a compensação do tributo cobrado nas operações anteriores, sendo devido em cada operação apenas a diferença entre o montante do tributo relativo à operação atual e o cobrado nas operações anteriores.

            No texto constitucional, a não-cumulatividade vem expressamente definida nos artigos 153, § 3º, II; e 155, § 2º, I:

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            Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

      (...)

      IV – produtos industrializados;

      (...)

      § 3º. O imposto previsto no inciso IV:

      (...)

      II – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores;

      (...)

      Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

      (...)

      II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

      (...)

      § 2º. O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

      I – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;

            Conclui-se pela simples leitura dos dispositivos constitucionais acima transcritos, que a não-cumulatividade só se aplica a dois tributos: IPI e ICMS. Porém, os impostos decorrentes da competência residual da União, quando de sua instituição, terão que obedecer também ao princípio da não-cumulatividade, conforme previsão constitucional:

            Art. 154. A União poderá instituir :

      I – mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos...

            Através da não-cumulatividade, compensa-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores. Extrai-se da norma constitucional que o direito de utilização como crédito do montante do tributo pago nas operações anteriores não é mera faculdade outorgada ao contribuinte. É mandamento irrenunciável.

            A não-cumulatividade tem o condão de afastar o ônus tributário anterior. Cada etapa da tributação carrega seu próprio ônus. Neste caso, o tributo incide apenas sobre o valor agregado em cada etapa da produção ou circulação.

            As operações de produção e de circulação envolvem diversas etapas distintas, cada qual agregando valor à operação anterior. O preço final é, então, o somatório dos montantes agregados ao longo da cadeia de produção e de circulação. Como os tributos incidem concomitantemente a cada operação de produção ou circulação, é necessário excluir o montante pago nas operações anteriores. Sem este mecanismo, a incidência não se daria apenas sobre o valor agregado na própria operação, mas, também, sobre o valor das operações anteriores.

            Bastos (1998, p.262) comenta o princípio da não-cumulatividade nos seguintes termos:

            O Texto Constitucional, ao afirmar que o ICMS é não-cumulativo, outorga ao contribuinte o direito de compensar o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado. Fica claro, pois, que o direito de crédito tem como fonte primeira a própria Constituição.

      Observa-se que a apuração do saldo devedor ou credor, através da diferença entre o imposto relativo às saídas e o correspondente às entradas de mercadorias, surge tão-somente como uma técnica especial de tributação que, sem interferir na base de cálculo ou no fato gerador, assegura ao contribuinte, no entender de Geraldo Ataliba, o direito de deduzir do montante do imposto que deveria recolher o que já foi recolhido ou que incidir sobre as operações anteriores.

            No campo do ICMS, a Lei Complementar nº 87/96, em seu art. 19, assegura o direito ao contribuinte de utilização como crédito do montante cobrado nas operações anteriores:

            Art. 19. O imposto é não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por Estado.

            2.2.2 A Substituição Tributária e o Atendimento ao Princípio da Não-cumulatividade

            A Constituição Federal de 1998 delegou à norma jurídica complementar (art. 155, § 2º, XII, c da CF) o disciplinamento acerca do regime de compensação do ICMS. Assim, a Lei Complementar nº 87/96, introduzindo regras ao regime de apuração do ICMS, transferiu para as legislações estaduais a responsabilidade para dispor sobre o período de apuração e pagamento do tributo em comento. Mais adiante, o citado diploma legal, em seu art. 26, estabelece que em substituição ao regime periódico poderá ser promovido o cotejo entre créditos e débitos específico por mercadorias em cada operação:

            Art. 26. Em substituição ao regime de apuração mencionado nos arts. 24 e 25, a lei estadual poderá estabelecer:

      (...)

      II – que o cotejo entre créditos e débitos se faça por mercadoria ou serviço em cada operação.

      (...)

            Apesar da sistemática compensatória entre débito e crédito, via de regra, ser periódica, poderá ser efetivada individualmente por mercadoria em cada operação, atendendo de pronto ao princípio da não-cumulatividade.

            Não obstante sua aparência anômala, o regime de substituição tributária atende ao princípio da não-cumulatividade. Aliás, tal matéria é por demais pacífica na jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores. O Supremo Tribunal Federal tem reiterado à constitucionalidade do regime de substituição tributária, bem como o acatamento ao princípio da não-cumulatividade (STF, RE 190317/SP, DJU 01/10/99, p.49). Neste mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ, ROMS 8773/GO, DJ 02/08/99, p.137) inovou ao decidir que a substituição tributária é mera exigência de pagamento antecipado do tributo, não se caracterizando tal pagamento como recolhimento do tributo antes da ocorrência concreta da hipótese de incidência prevista em lei. Desta forma, a ocorrência concreta do fato gerador que faz surgir a obrigação tributária, não se confunde com o ato de cobrança do tributo.

            Logo, não poderá prosperar a idéia de que a substituição tributária ofende o princípio constitucional da não-cumulatividade. O Supremo Tribunal Federal assim se pronunciou acerca da matéria:

            ICMS. Recolhimento antecipado na venda de veículos automotores pelo regime da substituição tributária. Constitucionalidade.

      O Plenário desta Corte, ao terminar, há pouco, o julgamento do RE 213.396, relativo a esse regime de substituição tributária, afastou as diversas objeções concernentes à sua constitucionalidade, inclusive a veiculada neste recurso, a saber: a da ofensa ao princípio da não-cumulatividade (art. 155, § 2º, I, da Constituição).

      Recurso extraordinário não conhecido.

      Relator: MINISTRO MOREIRA ALVES

      Turma: PRIMEIRA

      Processo: RE-190317/SP ~ Data da decisão: 24/08/99. [grifos nossos].

            Entretanto, há aqueles que defendem que o famigerado regime ofende ao princípio da não-cumulatividade. Neste caso, a não compensação do ICMS pago a título de substituição tributária eqüivaleria tratar a operação seguinte como se fosse uma nova, sujeita à alíquota integral sem direito ao crédito compensatório. Tal entendimento chega a contrariar a própria Constituição Federal, visto que o acatamento da utilização como crédito do ICMS pago a título de substituição tributária representa uma cumulação de créditos, uma vez que no cálculo do ICMS pago antecipadamente já houve a compensação do ICMS da operação própria.

            Martins (1996), pronunciando-se acerca do direito à compensação periódica do ICMS nas operações próprias e de substituição tributária, escreve:

            O artigo 155, § 2º, inciso I declara que o sujeito passivo da obrigação poderá compensar o imposto devido em cada operação com o montante cobrado – leia-se incidente – nas operações anteriores. Não distingue, o texto constitucional, se o sujeito passivo deve ser responsável ou contribuinte, nem distingue se o mesmo sujeito passivo, se revestindo a condição de contribuinte e responsável, deve fazer duas contabilidades e adotar dois regimes jurídicos com o fim de realizar a não-cumulatividade para cada uma das condições.

            Com o encerramento do ciclo de tributação, ilógico seria esperar que as saídas de produtos ou mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária se conformassem posteriormente ao regime normal de apuração. Na hipótese, as operações sucessivas serão desoneradas, de tal sorte que não ocorra qualquer débito pelas saídas, já que as mesmas foram alcançadas antecipadamente pelo tributo.

            Apesar de toda discussão doutrinária a despeito da constitucionalidade ou não do regime de substituição tributária, verifica-se a não ocorrência de excesso da carga tributária final. Ao universo jurídico não foi dado o condão de desfazer os acontecimentos meramente aritméticos.

            Apreciando apenas elementos aritméticos, constata-se que não há qualquer prejuízo ao princípio da não-cumulatividade, já que o cálculo do ICMS pago antecipadamente a título de substituição tributária prever o abatimento do ICMS normal, em obediência ao disposto no § 5º, do art. 8º da Lei Complementar n.º 87/96, conforme abaixo transcrito:

            Art. 8º.

      (...)

      § 5º. O imposto a ser pago por substituição tributária, na hipótese do inciso II do caput, corresponderá à diferença entre o valor resultante da aplicação da alíquota prevista para as operações ou prestações internas do Estado de destino sobre a respectiva base de cálculo e o valor do imposto devido pela operação ou prestação própria do substituto. [grifos nossos].

            Como exemplo material da não-cumulatividade do ICMS pago a título de substituição tributária, é possível elaborar quadro demonstrativo de duas operações com mercadorias entre contribuintes mercantis, sendo a primeira sujeita ao regime normal de tributação, e a segunda sujeita ao regime de substituição tributária. Assim, considerando, hipoteticamente, que ambas as mercadorias foram adquiridas em outra unidade da Federação, localizada, por exemplo, no sudeste, por R$ 1.000,00, e partindo do pressuposto de que a mercadoria sujeita ao regime normal tenha sido revendida com um lucro bruto de 30%, e que a mercadoria sujeita ao regime de substituição tributária tenha, coincidentemente, uma margem de valor agregado de 30%, é possível a comparação da carga tributária conforme quadro abaixo elaborado:

 

            Regime Normal

            Regime Substituição Tributária

            Preço da Mercadoria

            R$ 1.000,00

            R$ 1.000,00

            ICMS Estado de Origem

            R$ 70,00

            R$ 70,00

            Valor de agregação

            30%

            30%

            Base de Cálculo

            R$ 1.300,00

            R$ 1.300,00

            ICMS 17%

            R$ 221,00

            R$ 221,00

            ICMS Estado de destino

            R$ 151,00

            R$ 151,00

            Fonte: Autor

            A despeito de toda discussão doutrinária, a antecipação da cobrança de um tributo cujo fato gerador presumivelmente irá ocorrer, concretamente não traz qualquer excesso na carga tributária final.

            Como carga tributária final entende-se aquela resultante da aplicação da alíquota interna sobra o valor da operação de venda a consumidor final. No exemplo dado, a carga tributária total seria apurado através da aplicação de 17% sobre R$ 1.300,00, o que resultaria em montante do ICMS de R$ 221,00.

            Verifica-se que o valor da carga tributária final, como não poderia deixar de ser, coincide exatamente com o somatório do valor do ICMS pago ao Estado de origem (R$ 70,00) com o valor do ICMS pago antecipadamente a título de substituição tributária (R$ 151,00).

            Extinta a preocupação em demonstrar que o regime de substituição tributária atende ao princípio da não-cumulatividade, as atenções se voltam para a possibilidade de excesso da carga tributária final quando a taxa de lucro arbitrada for superior ao lucro obtido na operação. Faz-se necessário que a base de cálculo arbitrada seja determinada de tal forma que se aproxime do valor real da operação, sob pena de provocar um aumento do tributo total devido.

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Sobre o autor
Alexandre Henrique Salema Ferreira

Professor de Direito Tributário e de Direito Financeiro do Curso de Direito da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Auditor Fiscal da Receita Estadual da Paraíba, Mestre em Ciências da Sociedade pela UEPB e Especialista em Auditoria Fiscal-contábil pela UFPB

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Alexandre Henrique Salema. A substituição tributária progressiva no campo de incidência do ICMS. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 61, 1 jan. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3570. Acesso em: 26 abr. 2024.

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