Considerações sobre os institutos do risco de vida e a periculosidade: qual a diferença?

25/01/2015 às 23:28
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Sabe-se que todos nós corremos riscos e vivemos quase que constantemente em perigo de dano físico ou material, por isso muitas pessoas fazem seguros de vida, contra danos etc. No campo do direito deve-se ter como ratio essentialis que o Direito não se presta a estudar todos os fatos e situações da vida em sua completude, por mais positivista que seja o regime jurídico.

Nesse caminho, interessa para o Direito temas que tenham relevo social. Dessa forma, os institutos da periculosidade e do risco de vida se mostram aptos a denunciar que determinados fatos mereceram o olhar do direito tutelando e limitando condutas ou obrigando ações práticas.

Consoante essa premissa, observa-se que situações que nos expõe a perigo e a risco de vida, como andar de bicicleta, caminhar na rua, dirigir seu carro de passeio entre muitas outras situações, não são tuteladas pelo direito no sentido de que se tenha uma compensação monetária por essas atividades(expositora a risco). Isso porque, essas atividades decorrem do dia - dia, do comportamento mediano, moderno-natural na convivência em sociedade.

Por outro lado, existem situações de perigo ou de risco que ultrapassam a medida do razoável, o a medida do normal ou mediana. Não se trata de atividade normal do dia - dia, e por mais repetitivas que sejam, não fazem parte dos riscos expostos nas relações diárias do homem médio. Pouco importando as relações jurídicas que se fundam.

Em outras palavras, o risco de vida não está apenas fundado numa relação de trabalho, mas em todo risco que o ser humano é exposto. Ressaltando que essa exposição ao risco ou perigo não pode ser aqueles do dia-dia. Frente a isso, o Direito cria regras e compensações para o indivíduo que está nesse regime. Daí, inicia-se o estudo da periculosidade e do risco de vida.

Muitas pessoas entendem ser sinônimo o instituto da periculosidade e do risco de vida. Entretanto, ao nosso sentir e na análise, trata-se de situações completamente diferentes. Inicialmente, é importante diferenciar quanto a gravidade. Risco de vida trata-se de perigo constante/ininterrupto à vida(bem protegido na espécie), já a periculosidade trata-se de eminente e casual risco de dano (que podem ser dos mais diversos inclusive a vida em sua forma extrema) a integridade do agente. É claro que ambos podem convergir para o fato danoso extremo, qual seja a morte. Assim, vislumbra-se que o primeiro já expõe o agente a esse dano extremo, já o segundo tem fatores extremos como consequências inesperadas.

Quem está em risco de vida em razão da função ou cargo (Juiz, Oficial de justiça, Policial), sofre constantemente a incerteza de que por ação de terceiro possa ter sua vida ceifada, sem que o agente em risco tenha contribuído para a situação de dano a vida. A seu passo o agente no exercício da atividade tem a certeza que corre risco de vida. Sendo essa uma das características fundamentais do risco de vida. Nesse caso, o estado de risco será sempre constante, incerto, imprevisível, porque isso decorre do cargo que ocupa ou da atividade desempenhada, assim, mesmo fora do serviço o agente está em risco de vida.

No caso de periculosidade, o estado(situação) de perigo não é constante, pois o agente se põe vez ou outra em situação de perigo, havendo intervalos entre essas situações de perigo. Cita-se o exemplo do caminhoneiro de cargas inflamáveis, no momento em que este está de folga não está em estado de perigo. Sendo assim, essa situação de periculosidade é momentânea, certa, previsível.

Ainda, salienta-se a diferenciação quantos a conduta do agente em perigo ou risco de dano, na periculosidade se o agente for imperito, negligente ou imprudente, suas ações o exporão a um ou mais perigos ou na pior das hipóteses ao resultado danoso extremo. Também, não se pode olvidar, que o agente em estado de perigo pode sofrer a ação de terceiro por negligencia, imprudência ou imperícia. Conclui-se que nessa hipótese o resultado estará sempre na seara da responsabilidade do agente ou de terceiro. ( Ex. o caminhoneiro de cargas inflamáveis um acidente dependerá da maneira que conduz o caminhão ou eventualmente terceiro agindo como já dito com imprudência, negligencia ou imperícia, ou Químico que pode distração mistura dois componentes e causa uma explosão.

A contrario sensu, o agente em risco de vida suas ações(conduta) não importam para evitar o risco ou o efeito danoso, pois o estopim do dano será sempre de terceiro, onde se apura o dolo ou a culpa desse agente causador.

Quanto a motivos de caso fortuito (raio, terremoto),à periculosidade se aplica, sendo um fato "normal" e "natural",imprevisível, incontínuo. Já para o risco de vida isso se aplica parcialmente visto que se trata intrinsecamente de atividade humana contra o agente em detrimento ao cargo ou atividade que desempenha. Ex 1. Eletricista que é atingido por um raio, nesse caso essa incidência é previsível para essa profissão ou atividade.Ex 2 Cientista que estuda tornados, é atingido por um e morre. Trata-se de fato previsível, apesar de ser ação da natureza.

Nessa mesma linha, o caso de Força Maior( ações humanas, roubo, furto) para para a periculosidade não se aplica isso porque é atividade previsível, se enquadrando melhor ao risco de vida. Nessa toada, mostra-se racional concluir que o caminhoneiro de cargas valiosas está sujeito a risco de vida e não a periculosidade, sendo fator determinante a previsibilidade de um assalto. Cumpre demonstrar que aquele quem em função de seu cargo é assaltado ( mesmo sendo fato fora da linha de suas atribuições, ou seja, sem ter conexão com o cargo ou atividade) corre risco de vida vez que revelado pelo cargo ou atividade, o risco já existente se exaspera/exacerba Ex. pessoa assaltada e o assaltante descobre que assaltado é policial, juiz, delegado, oficial de justiça etc.

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Razão pela qual, a atual prática de se conceituar como sinônimos o risco de vida e a periculosidade é incabível ao meu sentir. Isso porque, quem está em risco de vida tem por iminente lesão sua vida, já quem está em periculosidade tem uma gama de resultados possíveis dependendo da gravidade do quadro fático.

Em linhas práticas, observa-se que uma pessoa que está jurada de morte ou sua atividade naturalmente o expõe a esse risco extremo em função de seu cargo ou da atividade, se priva de "N" atividades de forma constante. Já o agente que está em periculosidade, quando termina sua atividade perigosa volta a sua vida normal, fato que não ocorre no risco de vida.

Nesse sentido, observa-se ser possível haver a incidência dos dois para o mesmo agente Ex. Motorista de carro forte, Policial, Oficial de justiça. Todos esses, além de estarem em risco de vida constante (dentro e fora do trabalho) em função do cargo ou atividade, estão em estado de periculosidade isso porque no exercício da função estão expostos a toda sorte de ações danosas( agressão, lesão corporal etc.)

A seu turno temos cláusula constitucional que assevera a necessidade de que haja a redução de riscos, por mais que seja voltada ao trabalho, numa interpretação teleológica este deve ser estendido a todo âmbito da convivência social como regra geral.Cita-se;

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

E xemplifica-se tal máxima: Exigir licenças para construção, necessidade de policiamento, vacinas, vigilância sanitária etc. são todas formas de redução de riscos e periculosidade de maneira geral. Mas como toda regra geral tem suas especialidade e exceções, deve-se ter um tratamento especial ´para aquele agente que se expõem mais a esses riscos que uma pessoa comum.

O que ocorre na prática, tanto nos julgados, quanto na legislação é que se coloca os dois institutos como sinônimos. Note-se que o TST já sinalizou essa diferença, mesmo não entrando no mérito da questão. A questão pode tomar contornos no direito Administrativo (servidores públicos) no direito do Trabalho ( CLT). Entretanto, por ora trata-se de uma singela opinião, e que deve ser discutida, pois como nos tempos passados onde se reunia para discutir uma tese e a posteriori submete-la ao fogo da crítica e argumentação, para no fim assentar sua força ou fragilidade. É o que fazemos agora, submetemos a você, para que pense no assunto de exponha sua opinião mesmo diversa.

Nesse sentido TST:

RECURSO DE EMBARGOS. NULIDADE DA DEC I SÃO PROLATADA PELA TURMA POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.Não existe a nulidade invocada porque a prestação jurisdicional foi devidamente entregue, fundamentadamente, com respeito aos princípios constitucionais garantidores da prestação jurisdicional previstos nos artigos 832 da CLT e 93, IX, da Carta Magna. Embargos não conhecidos. ADICIONAL CONTRATUAL DE RISCO. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM ADICIONAL LEGAL DE PERICULOSIDADE. Não há como se verificar a violação literal dos artigos invocados nas razões de embargos, quais sejam 7º, XXIII, da Constituição Federal e 193, § 2º, da CLT, pois esses preceitos não vedam expressamente a cumulação do adicional contratual de risco de vida e do adicional de periculosidade, devido por força de lei. Embargos não conhecidos.

(5607789619995045555 560778-96.1999.5.04.5555, Relator: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 29/10/2007, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DJ 09/11/2007.)

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Sobre o autor
Artur Félix

Nossa experiência no ramo do Direito surgiu no Rio de janeiro, nas áreas de Direito Adminstrativo, Família, Consumidor, e Direito Imobiliário. Sempre buscando uma atuação preventiva e prezando por uma advocacia estratégica e personalíssima.

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