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Improbidade administrativa

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19/11/1997 às 00:00
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6. DA DECLARAÇÃO DE BENS


Para possibilitar uma fiscalização efetiva e um acompanhamento eficaz da evolução patrimonial dos agentes públicos, a Lei 8.429/92 prevê a obrigação para todo agente público de apresentar declaração de bens e valores que compõem seu patrimônio particular, quando de sua posse em qualquer cargo público. Tal declaração deverá ser atualizada anualmente, bem como no momento em que o agente deixar o exercício de mandato, cargo, emprego ou função.

Legislação específica, Lei 8.730/93, estipula que as declarações em referência sejam entregues também aos Tribunais de Contas, aos quais caberá averiguar a respeito das situações e mutações patrimoniais ocorrentes, em relação ao patrimônio dos agentes públicos.




7. DA PRESCRIÇÃO


Cumpre-nos referir ao prazo para ajuizamento das ações destinadas a levar a efeito as sanções previstas na lei 8.429/92. Segundo esta, as mencionadas ações podem ser propostas até cinco anos após o término do exercício de mandato, cargo em comissão ou função de confiança.

Nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego, devem as ações ser propostas dentro do prazo prescricional previsto na lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público.




8. DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO E DO PROCESSO JUDICIAL


Questão da maior relevância é a que diz respeito ao procedimento administrativo e ao processo judicial que devem ser seguidos visando à apuração de atos de improbidade e à aplicação das sanções de que são merecedores os respectivos agentes.

A lei prevê um procedimento administrativo, que servirá de base para o processo judicial visando à aplicação das sanções, notadamente a perda do cargo e suspensão dos direitos políticos, de competência privativa do Poder Judiciário.

Confere a Lei 8.429/92 a qualquer pessoa a capacidade para representar à autoridade administrativa competente para que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade. A comissão que for designada para apurar a prática de improbidade dará conhecimento de sua instauração ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas, os quais poderão designar representantes para acompanharem o procedimento administrativo em referência.

Nessa fase, poderá ser solicitada pela comissão, ao Ministério Público ou à Procuradoria do órgão que seja requerida ao juízo competente o seqüestro dos bens do agente ou de terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao erário.

E aqui cabe-nos tocar em ponto da maior importância relativamente às atribuições dos Tribunais de Contas.

Como ficou assinalado, a lei prevê um procedimento administrativo, conferindo poder a qualquer pessoa para representar à autoridade administrativa competente, para que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade. Entendemos que os processos de prestação de contas dos diferentes agentes públicos, cujo julgamento cabe ao Tribunal de Contas, valem como os procedimentos administrativos a que se reporta a lei 8.429/92. Em tais processos, dada a amplitude de suas atribuições, e graças ao trabalho de suas equipes técnicas, os Tribunais de Contas verificam a legalidade das despesas; constatam a ocorrência de prejuízos aos erários sob sua proteção; atestam a prática de violação à moralidade administrativa, exercitada por diferentes meios; certificam o desvio de recursos, em favor dos agentes ou de terceiros; demonstram a realização de aquisições ou alienações viciosas de bens; comprovam o favorecimento de terceiros em detrimento do patrimônio público; evidenciam a omissão ou negligência do agente público; testemunham infrações aos princípios da legalidade, da legitimidade, da economicidade; enfim, procedem a toda uma investigação que, ao final, se revela capaz de autenticar a probidade ou improbidade do agente público, inclusive mediante análise da evolução de seu patrimônio conforme atribuição dada aos mencionados Tribunais pela Lei nº 8.730/93. Além disso as investigações feitas no âmbito dos Tribunais de Contas têm o acompanhamento diuturno do Ministério Público que, por imperativo constitucional (arts. 73, § 2°, I e 130) atua junto àquelas Cortes, exigência também feita pela lei 8.429/92. E mais: os agentes públicos, cujos procedimentos são fiscalizados e cujas contas são julgadas pelos Tribunais, têm assegurado em seu favor o contraditório e o exercício da mais ampla defesa, podendo defender-se pessoalmente ou através de procurador ou advogado, legalmente habilitado, e, em um outro caso, requerer diligências, vistorias, inspeções, tudo de modo a tornar efetiva a garantia constitucional prevista no artigo 5°, LV, da Constituição Federal:

aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Ora, diante de investigação tão completa, quer do ponto de vista formal quer do ponto de vista material, parece-nos que outro procedimento administrativo para apuração de improbidade administrativa não teria cabimento ou sentido nenhum, representando, tão somente, uma duplicidade de esforços e de gastos financeiros.

Se isso ocorre em relação aos agentes públicos comuns, com muito mais razão é de se compreender com referência aos chefes de Poderes, quer estaduais, quer municipais.

O artigo 14 da Lei 8.429/92 faculta a qualquer pessoa representar à autoridade administrativa competente, para que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de improbidade. Ora, tomemos o exemplo do Prefeito - chefe do executivo municipal. Se a representação a que se reporta o mencionado dispositivo legal há de ser feita à autoridade administrativa competente para que seja instaurada a investigação, perguntamos: a que autoridade municipal seria encaminhado o pedido, já que o Prefeito é, sem dúvida, a maior autoridade local, no âmbito executivo?

Aqui, socorre-nos a lição de Manuel Gonçalves Ferreira Filho, para quem:

"A probidade é uma obrigação elementar, a que todos, especialmente os que recebem, administram a aplicam dinheiro público, estão jungidos. O Presidente da República, evidentemente, não escapa a essa obrigação. Desse modo tem de zelar para que toda a administração pública se atenda estritamente às normas de probidade, sobretudo financeira.
A prestação de contas - enfatiza o renomado mestre - é um dos aspectos principais por que se manifesta a probidade administrativa" (Comentários, Saraiva, vol 2).

A prestação de contas - já tive ocasião de dizer - é instrumento de transparência da administração e é através dela que, na lição do renomado mestre, se revela a sua probidade ou a sua improbidade. Os Tribunais de Contas, no exame de contas tomadas por sua iniciativa ou prestadas pelos administradores municipais, pondo em movimentação todo o procedimento técnico-administrativo a que acima aludimos, têm condições de, à luz dos elementos contidos na Prestação de Contas ou por eles colhidos " in-loco", atestar o modo como se comportou o Prefeito, ou qualquer outra autoridade à frente dos negócios públicos. As suas investigações são, portanto, capazes de fazê-lo firmar juízo de valor sobre a conduta proba ou ímproba do agente público, competência reforçada com a disposição constitucional que confere às suas decisões, no caso de imputação de débito ou aplicação de multa, a eficácia de título executivo.




9. CONCLUSÃO


Em conclusão, do que vimos a respeito da Lei 8.429/92, força é convir que esse diploma legal representa valioso instrumento para assegurar-se a probidade administrativa por parte de todos a quantos se acha entregue a condução dos negócios públicos, nos entes a que se refere a mencionada lei, garantindo-se, assim, a incolumidade do patrimônio público e o respeito aos princípios da sã administração, mediante o ressarcimento do erário, a punição dos culpados e sua retirada temporária dos quadros político-administrativos.
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Sobre o autor
Flávio Sátiro Fernandes

conselheiro do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba, professor da Universidade Federal da Paraíba, membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e da Associação dos Constitucionalistas Brasileiros (Instituto Pimenta Bueno)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Flávio Sátiro. Improbidade administrativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 2, n. 21, 19 nov. 1997. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/359. Acesso em: 23 abr. 2024.

Mais informações

Palestra proferida em 24 de julho de 1997, na abertura do I Ciclo de Palestras, realizado para assinalar a inauguração do Auditório "Conselheiro José Braz do Rego", no Tribunal de Contas do Estado da Paraíba

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