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Linhas gerais do tribunal do júri: evolução histórica, princípios constitucionais e dinâmica procedimental

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25/09/2016 às 16:31
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5. Da Sentença Suicida e da Sentença Autofágica. 

A matéria relativa à sentença, uma das mais importantes do Processo Penal, é tratada no artigo 381 usque 393 do Código de Processo Penal.

Logo no artigo 381, o legislador tratou de apresentar tudo aquilo que deve constar na sentença, sendo esta um ato de manifestação e soberania do Estado, que demonstra sua legitimidade, e por sua vez, oferece oportunidade para que o Juiz de Direito declare a transparência, imparcialidade e coerência do seu ato. 

A motivação, um dos requisitos essenciais da sentença, é exigência de todas as legislações processuais modernas, exercendo a função de defesa do cidadão em face do arbítrio do juiz.

A motivação constitui, assim, segurança para o Estado de Direito, numa concepção garantista, permitindo ao Estado-Juiz manifestar sua vontade na correta administração da justiça.

Noutra via, a obrigação de motivar a sentença,  protege o juiz contra a suspeita de arbitrariedade, de parcialidade ou de outra injustiça.

A par disso, deve a sentença conter os nomes das partes ou, quando não possível, as indicações necessárias para identificá-las, a exposição sucinta da acusação e da defesa, a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão, a indicação dos artigos de lei aplicados, o dispositivo,  a data e a assinatura do juiz.

Alguns doutrinadores costumam apresentar duas modalidades de sentença: a sentença suicida e sentença autofágica.

Denomina-se sentença suicida, originária do direito Italiano,  aquela que apresenta contradição entre as suas próprias partes, estabelecendo uma confusão jurídica. A contradição ocorre entre o fundamento e a conclusão ou entre qualquer desses e o dispositivo.

"Sentença suicida é a que contém fundamentação divergente de sua conclusão" (TACRIM-SP - AP - REL. MARREY NETO - RJD 08/141)  

"É nula a sentença condenatória cuja parte dispositiva briga com a sua motivação, sem que se possa vislumbrar o deliberado propósito de invalidá-la, por parte de seu prolator" (TAGB - AP - REL. JORGE ALBERTO ROMEIRO - RT 476/424) 

Sentença suicida: na qual há uma contradição entre a parte dispositiva e a fundamentação. São nulas ou podem ser corrigidas por embargos de declaração (MIRABETE apud TÁVORA e ALENCAR, 2009);

Destarte a doutrina pátria faz menção à sentença autofágica. Considerando que a palavra fágico deriva do grego phagos, significando aquele que come, e que o prefixo auto significa próprio, pode-se concluir que autofágico é aquele que come a si próprio.

Logo, é autofágica a sentença em que o magistrado reconhece a imputação, mas declara extinta a punibilidade.


6. Conclusão

A instituição do Tribunal do Júri teve suas origens na Inglaterra quando da abolição do Sistema das Ordálias.

No Brasil, foi criado em 1822, inicialmente para julgamento dos crimes de imprensa e contra a Economia Popular, recebendo tratamento em quase todas as Constituições, exceto a de 1937, com previsão, ora como Órgão do Poder Judiciário, ora como direito fundamental e individual.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso XXXIX, estabeleceu os princípios do Júri, situando-o dentre as garantias fundamentais.

Toda a dinâmica do procedimento, desde a acusação e instrução preliminar até as atribuições do Presidente do Tribunal do Júri, vem detalhada no artigo 406 usque 497 do Código de Processo Penal.

Ademais, foram tecidas considerações sobre as modalidades de sentença suicida e autofágica, apesar das escassas construções doutrinárias pátrias a respeito.

Por derradeiro, restou demonstrada a importância da temática que envolve a construção das provas no procedimento do Júri, reproduzindo quase sempre aquilo que foi construído pela Polícia Civil na fase inquisitiva, levando à jurisdicionalização do Inquérito Policial.

Isso porque, durante o julgamento, mormente na fase dos debates orais, há uma tendência de desconstrução de tudo aquilo que foi edificado durante a colheita dos indícios probatórios realizada pela Polícia Civil, por meio de profissionais extremamente qualificados, que reúnem num só documento, chamado de inquérito policial, conhecimentos técnicos, científicos e jurídicos.

A conclusão a que se chega é a de que durante os debates do Tribunal do Júri,  a maioria, senão todas as autoridades policiais se transformam em virtuais torturadores, diante da defesa de teses absurdas e sorrateiras, que ventilam colheitas de provas não ortodoxas,  ainda que realizadas na presença de defensores, configurando o que denominamos de princípio da desconstrução aberrante e ultrajante probatória.


referências

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BETTIOL, Istituzioni di Diritto e Procedura Penale, 1966, página 220.

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CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional : Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional Positivo. 12º ed. rev. atual. amp. Belo Horizonte: Editora Del Rey.2006.

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Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Jeferson Botelho. Linhas gerais do tribunal do júri: evolução histórica, princípios constitucionais e dinâmica procedimental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4834, 25 set. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/36116. Acesso em: 26 abr. 2024.

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