RESUMO
Este estudo trata sobre o instituto da modificação da guarda e do papel do Estado no resguardo do melhor interesse da criança e do adolescente, à luz dos princípios do melhor interesse da criança e do adolescente e sobre limitação da atuação do Estado no direito de família à luz do princípio da intervenção mínima do Estado no direito de família. Para tal fim, aborda-se do instituto do poder familiar, sua conceituação, seu exercício, formas de extinção, suspensão e destituição. Aventa-se, também da guarda, das espécies de guarda admitidas no ordenamento jurídico pátrio, dos deveres dos guardiões e das causas ensejadoras da sua modificação. No terceiro capítulo, tratou-se do papel do Estado em relação à pessoa dos filhos, dos princípios do melhor interesse da criança e do adolescente e do princípio da intervenção mínima do Estado no direito de família abordando-se, ainda, a polêmica gerada pelo Projeto de Lei 7.672/2010 – a lei da palmada.
Palavras-chave: Poder familiar, guarda, modificação, obrigações do guardião, alienação parental, Lei da palmada.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente trabalho tem por objetivo apresentar as causas ensejadoras da modificação da guarda e papel do Estado no resguardo do melhor interesse da criança e do adolescente, abordando a conceituação de poder familiar, guarda, aspectos inerentes do seu exercício, seus efeitos, além das causas ensejadoras da sua modificação sob a égide do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), do Código Civil de 2002 (CC/2002) e da Constituição da República Federativa do Brasil (CF/1988).
Destarte, torna-se imprescindível versar sobre a liberalidade que o guardião tem no que diz respeito à guarda e, o papel do Estado na sua regulação respeitando-se sempre o princípio da intervenção mínima do Estado no direito de família sem, contudo, furtar-se do seu papel de apoio e assistência a cada ente do círculo familiar. Para tanto, é mister abordar a conceituação do poder familiar e guarda, elencando os tipos de guarda admitidos no ordenamento jurídico pátrio, as causas ensejadoras da modificação da guarda, sobretudo no que tange à sua subjetividade, além do papel do Estado no que concerne ao resguardo do melhor interesse da criança e do adolescente.
Assim sendo, tendo sempre em vista a preservação do melhor interesse da criança e/ou do adolescente, o Estado tem papel importante, sobretudo no que diz respeito a sua dignidade e à sua integridade física e psíquica, isto porque, por determinação legal, a criança e o adolescente gozam de plena proteção e prioridade absoluta em seu tratamento como forma de preservar o integrante mais frágil da entidade familiar, agindo como defensor dos interesses dos mesmos podendo, dentre outras coisas, utilizar-se do artifício da modificação da guarda.
Trata-se de um estudo descritivo, de natureza bibliográfica, cujo objetivo foi verificar quais as causas ensejadoras da modificação da guarda e qual o papel do Estado no resguardo do melhor interesse da criança e do adolescente. Para isso foram selecionados artigos em periódicos de Direito e doutrinas relacionados à temática, além das leis que versam sobre o tema.
Em processos judiciais de divórcio envolvendo guarda dos filhos é comum que o genitor guardião descumpra seus deveres, invadindo o campo de direito do menor, inclusive praticando a alienação parental de forma que se dificulte ou impeça o genitor não guardião de visitar os filhos, imputando-lhe acusações infundadas com o intuito de difama-lo com diversas alegações, fomentando a síndrome de alienação parental, outra das causas ensejadoras da modificação da guarda aqui pesquisado.
Far-se-á uma abordagem crítica no intuito de elencar as causas que dão ensejo a modificação da guarda sempre destacando o papel do Estado na tutela dos direitos da criança e do adolescente, traçando-se um paralelo entre os princípios da interferência mínima do Estado no âmbito do direito de família e o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.
1. PODER FAMILIAR
1.1. Lineamento histórico do poder familiar.
Na seara do direito de família, várias são as possibilidades de configuração de entidade familiar, bem como dos atributos a elas concernentes, dentre as quais se destaca o poder familiar, atualmente defendido por parte da doutrina como “autoridade parental”, que está relacionado à guarda e cuidado para com os filhos. Aliás, a nomenclatura autoridade parental, não está expressa no CC/2002, sendo expressão usada somente na doutrina. Segundo Maria Berenice Dias, “a expressão que goza da simpatia da doutrina, é autoridade parental”, por melhor refletir a profunda mudança que resultou da consagração constitucional do princípio da proteção integral de crianças e adolescentes (art. 227 CF/88).
O termo poder familiar é relativamente novo, sendo anteriormente denominado como pátrio poder, que é proveniente do direito romano: pater potestas, que era o poder ilimitado e incondicional atribuído ao chefe do núcleo familiar em relação à pessoa dos filhos. Nota-se uma conotação machista decorrente de uma sociedade patriarcal aonde o pai era o cabeça da família, não tendo a mulher o reconhecimento da sua importância no núcleo familiar.
Maria Berenice Dias, corroborando com essa afirmação assevera que:
a expressão ‘poder familiar’ é nova. Corresponde ao antigo pátrio poder, termo que remonta ao direito romano: pater potestas – direito absoluto e ilimitado conferido ao chefe da organização familiar sobre a pessoa dos filhos. Como se trata de um termo que guarda resquícios de uma sociedade patriarcal, o movimento feminista reagiu, daí o novo termo: poder familiar. Como lembra Paulo Lôbo, as vicissitudes por que passou a família repercutiram no seu conteúdo. Quanto maiores foram a desigualdade, a hierarquização e a supressão de direitos entre os membros da família, tanto maior foi o pátrio poder e o poder marital. A emancipação da mulher e o tratamento legal isonômico dos filhos é que restringiram o poder patriarcal. (2007, p. 337).
Na Roma e Grécia antigas, o pátrio poder atribuía ao pai poder absoluto, irrestrito e indiscutível com relação à pessoa dos filhos, alcançando, inclusive, o âmbito religioso visto que este desempenhava, também, o papel de sacerdote da família. Com o passar dos anos, houve um abrandamento do entendimento do pátrio poder sendo admitido, em alguns casos, que a mulher desempenhasse esse papel na ausência do pai.
Silvio de Salvo Venosa, ao dissertar sobre o poder irrestrito do pai, afirma que
em Roma, o pátrio poder tem uma conotação eminentemente religiosa: o pater familias é o condutor da religião doméstica, o que explica seu aparente excesso de rigor. O pai romano não apenas conduzia a religião, como todo o grupo familiar, que podia ser numeroso, com muitos agregados e escravos. Sua autoridade era fundamental, portanto, para manter unido e sólido o grupo como célula importante do Estado. De fato, sua autoridade não tinha limites e, com frequência, os textos referem-se ao direito de vida e morte com relação aos membros de seu clã, aí incluídos os filhos. O pater, sui juris, tinha o direito de punir, vender e matar os filhos, embora a história não noticie que chegasse a este extremo. Estes, por sua vez, não tinham capacidade de direito, eram alieni juris. O patrimônio era integralmente do pai. Os filhos não tinham bens próprios. Essa primeira concepção romana vai se abrandando com o tempo. Permite-se por exemplo, que o filho adquira o peculio castrense, propriedade de bens adquirida e decorrente de atividade militar. Outros peculios vão sendo paulatinamente permitido ao filius familiae (2010, p. 303)
O Código Civil de 1916, ao tratar sobre o poder familiar, trazia a ideia arraigada no direito romano antigo, assegurando o pátrio poder exclusivamente ao marido, o chefe da sociedade conjugal, somente na falta, impedimento ou indisponibilidade do pai, era atribuído à mulher a capitania da sociedade conjugal, assumindo assim o pátrio poder sobre os filhos. Tal era a discriminação com relação à mulher que, conforme leciona a familista Maria Berenice Dias, a mulher em caso de novo casamento, drasticamente perdia a o poder familiar sobre os filhos, in verbis: “tão perversa era a discriminação que, vindo a viúva a se casar novamente, perdia o pátrio poder com relação aos filhos, independente da idade deles.” (2007, p. 376)
Ainda nas palavras de Maria Berenice Dias,
só quando enviuvava novamente é que recuperava o pátrio poder (CC/1916 393). O Estatuto da Mulher Casada (L 4.121/1962) assegurou o pátrio poder a ambos os pais, mas era exercido pelo marido com a colaboração da mulher. No caso de divergência entre os genitores, prevalecia a vontade do pai, podendo a mãe socorrer-se da justiça. (2007, p. 376)
Com o advento da Constituição Federal de 1988, fora consagrado o princípio da igualdade jurídica entre homens e mulheres, nos termos do disposto no art. 5º, I, de forma a conceder tratamento isonômico independente do gênero. Já no art. 226, § 5º, a Carta Magana, consagrou a igualdade de direitos e obrigações entre cônjuges/companheiros em relação à entidade familiar, outorgando a ambos os genitores o desempenho do poder familiar relativamente aos filhos comuns, equilibrando, desta forma, a relação familiar.
Consoante às mudanças no tocante ao poder familiar implementadas pela consagração da CF/1988, o Código Civil de 2002, lei 10.406/2002, no seu artigo 1.630, sem definir o poder familiar, dispõe que: “os filhos estão sujeitos ao poder familiar enquanto menores”. Assim, o Código Civil trouxe significativas modificações ao instituto em análise, emergindo a igualdade de ambos os cônjuges no que tange ao exercício do poder familiar.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), acompanhando a tendência das modificações impostas pela promulgação dos novos dispositivos legais constitucionais e infraconstitucionais, mudou consideravelmente o instituto do poder familiar, deixando este de ter um sentido de dominação para passar a ter um sentido de proteção, atribuindo aos pais mais deveres e obrigações relativamente aos filhos do que direitos.
1.2. Conceituação de poder familiar.
A doutrina apresenta inúmeros conceitos acerca do instituto do poder familiar. Dentre eles verifica-se nas lições de Maria Helena Diniz, que o poder familiar pode ser definido como
[...] um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho. (2002, p. 447)
Na lição de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, o poder familiar é definido, como “o plexo de direitos e obrigações reconhecido aos pais, em razão e nos limites da autoridade parental que exercem em face dos seus filhos, enquanto menores e incapazes.” (2011, p. 586)
Na mesma linha doutrinária, Gediel Gaudino de Araújo Junior, ao lecionar sobre poder familiar, aduz que “o poder familiar representa um conjunto de direitos e obrigações que os pais têm em face dos filhos menores (art. 1.630, CC), e deve ser por eles exercido em igualdade de condições.” (2008, p.82)
Aprofundando o debate, Maria Berenice Dias defende que em se tratando de poder familiar, não é possível entendê-lo como o exercício de uma autoridade, mas de um múnus imposto aos pais. Afirma ainda que deve ser entendido como noção de poder-função ou dever-direito consagrador da teoria funcionalista das normas de direito de família, aduzindo ser o poder que é exercido pelos genitores, com vistas ao atendimento dos interesses do menor.
1.3. Exercício do poder familiar
O poder familiar, sendo o conjunto de direitos e deveres impostos aos pais relativamente aos filhos, sofre interferência do Estado de forma incisiva nesse instituto[1], delimitando este, o campo de atuação dos pais, cuidando de disciplinar no CC/2002, o rol dos poderes conferidos aos pais no exercício da autoridade parental, conforme verifica-se no art. 1.634 CC/2002, ipses literis:
Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
I - dirigir-lhes a criação e educação;
II - tê-los em sua companhia e guarda;
III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.
Os seis primeiros incisos se coadunam com o entendimento advogado por Maria Berenice Dias ao afirmar que o poder exercido pelos genitores, serve aos interesses dos filhos, ou seja, é exercido sob a ótica de proteção do interesse existencial do menor.
No que tange ao inc. VII, com o equilíbrio que lhe é peculiar, assevera Paulo Lôbo que:
Tenho por incompatível com a Constituição, principalmente em relação ao princípio da dignidade da pessoa humana (arts. 1.º, III, e 227), a exploração da vulnerabilidade dos filhos menores para submetê-los a "serviços próprios de sua idade e condição", além de consistir em abuso (art. 227, § 4.º). Essa regra surgiu em contexto histórico diferente, no qual a família era considerada, também, unidade produtiva e era tolerada pela sociedade a utilização dos filhos menores em trabalhos não remunerados, com fins econômicos. A interpretação em conformidade com a Constituição apenas autoriza aplicá-la em situações de colaboração nos serviços domésticos, sem fins econômicos, e desde que não prejudique a formação e educação dos filhos. (Acesso em: 03 mar. 2012)
Com relação aos bens dos filhos menores, os atributos na ordem patrimonial referem-se à administração e ao direito de usufruto. A esse respeito, tem-se o art. 1.689 do CC/2002 que prevê que, estando os pais no exercício do poder familiar, tem eles, o direito de usufruto e administração dos bens dos filhos menores. Impõe-se afirmar que, a administração garantida no artigo supramencionado, deve ter o entendimento necessário de que tal administração buscará preservar os bens dos menores. Assim entende, também, Carlos Roberto Gonçalves, ao afirmar que:
Os pais, em igualdade de condições, são, pois, os administradores legais dos bens dos filhos menores sobre sua autoridade. Havendo divergência, poderá qualquer deles recorrer ao Juiz para a solução necessária (CC, arts. 1.689, II, e 1.690, parágrafo único). Não podem, porém, praticar atos que ultrapassem os limites da pura administração.
No exercício do múnus que lhes é imposto, os pais devem zelar pela preservação do patrimônio que administram, não podendo praticar atos dos quais possa resultar uma diminuição patrimonial. Para alienar ou gravar em ônus reais os bens imóveis dos filhos menores precisam obter autorização judicial, mediante a demonstração da necessidade ou evidente interesse da prole (art. 1.691). Expedido o alvará, a venda poderá ser feita a quem melhor pagar, não devendo o preço ser inferior ao da avaliação. Não se exige a oferta em hasta pública. (2009, p. 383)
Semelhante entendimento tem Maria Berenice Dias ao asseverar que:
Ainda que sejam os genitores os administradores e usufrutuários dos bens da prole, não podem alienar nem gravar de ônus real tal acervo, como também não podem contrair obrigações que ultrapassem a simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse do filho (CC 1.691). Em qualquer hipótese, devem os pais se socorrer do juiz, comprovando que a alienação ou permuta de bens, ou, ainda, a assunção de cargo de determinada monta, atende ao interesse do filho. Deixando o detentor do poder familiar de buscar autorização judicial para realizar despesas de maior vulto, possível desconstituir as transações levadas a efeito. Além do filho, seus herdeiros ou seu representante legal (CC 1.691, parágrafo único) e também o Ministério Público dispõe de legitimidade para buscar a anulação (ECA 201 VIII). Como houve infringência a dever decorrente do poder familiar, sujeita-se o genitor a pena pecuniária (ECA 249) e à suspenção do poder familiar. (2007, p. 383)
Há, entretanto, bens que estão excluídos da administração e usufruto dos pais. Tais bens estão elencados no art. 1.693 do CC/2002 que, assim está posto:
Art. 1.693 – Excluem-se do usufruto e da administração dos pais:
I – os bens adquiridos pelo filho havido fora do casamento, antes do reconhecimento;
II – os valores auferidos pelo filho maior de dezesseis anos, no exercício de atividade profissional e os de bens com tais recursos adquiridos;
III – os bens deixados ou doados ao filho, sob a condição de não serem usufruídos, ou administrados, pelos pais;
IV – os bens que aos filhos couberem na herança, quando os pais forem excluídos da sucessão.
Essa limitação da autonomia da vontade dos pais na administração dos bens dos filhos se justifica exatamente pela busca da preservação dos interesses dos menores. Vê-se que, sempre que há uma ingerência do Estado no âmbito do direito de família, esta se dá em respeito aos princípios do superior interesse da criança e do adolescente, bem como da proteção integral. Tal cuidado para com os bens dos menores, sem dúvida foi o motivo pelo qual, no art. 1.691 do CC/2002 vedou a alienação ou criação de gravame de em ônus real sobre os bens dos menores, sendo permitida apenas em condições especiais e, mediante prévia autorização judicial.
1.4 Extinção, destituição e suspensão do poder familiar
A perda e a suspensão do poder familiar estão previstas tanto no ECA[2] quanto no CC/2002, entretanto, a sua extinção somente é abordada no CC/2002, mais precisamente no seu art. 1.635. Outrossim, a extinção e destituição do poder familiar ocorrem por ocasiões distintas.
A extinção se dá por causa não imputável a qualquer dos pais (art. 1.635 CC/20012) podendo ser:
a) pela morte dos pais ou do filho;
b) pela emancipação, nos termos do art. 5º[3], parágrafo único do CC/2002;
c) pela maioridade; e
d) pela adoção;
Por seu turno, a destituição do poder familiar é cabível quando, em virtude de comportamentos (culposos ou dolosos) graves dos pais, o juiz por meio de decisão fundamentada, determinará a destituição do poder familiar na forma do disposto no art. 1.638 do CC/2002 que, por sua vez, elenca as hipóteses para tal situação, a saber:
a) o pai ou a mãe que castigar imoderadamente o filho;
b) o pai ou a mãe deixar o filho em abandono;
c) o pai ou a mãe praticar atos contrários a moral e aos bons costumes;
d) o pai ou a mãe que incidir, reiteradamente em faltas autorizadoras da suspensão do poder familiar;
A respeito da suspensão do poder familiar, que se configura em uma perda temporária desse poder, esta se dá judicialmente quando, provocado pelo Ministério Público ou por familiar da criança, o juiz exercendo o seu poder geral de cautela, sem eximir do poder familiar o pai e a mãe em definitivo da sua autoridade parental, obsta o seu exercício. O art. 1.637 assim preceitua:
Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.
Observa-se que tanto a integridade física quanto a psíquica da criança e do adolescente é salvaguardada pela legislação, primando-se pelo seu bem estar. A extinção, destituição e suspensão do poder familiar devem ser aplicadas com o intuito de defender os interesses dos menores ainda que para isso possa-se lançar mão do poder familiar, servindo este ao melhor interesse da criança e do adolescente.
2. DA GUARDA E DAS CAUSAS ENSEJADORAS DA SUA MODIFICAÇÃO
As causas ensejadoras da modificação da guarda são, na sua maioria, de cunho subjetivo, cabendo ao juiz, mediante provocação de parente não guardião ou do Ministério Público, decidir com base no seu convencimento e, das provas juntadas aos autos, sobre a guarda da criança e/ou adolescente.
A guarda tratada aqui não é aquela prevista no ECA, ou seja, da medida de colocação em família substituta prevista no ECA, mas o instituto derivado do próprio poder familiar exercido pelos pais.
A doutrina aborda a guarda visando a proteção à pessoa da criança e/ou do adolescente, motivo pelo qual a atribuição da culpa[4] no divórcio, deixou de ser relevante para que se decidisse sobre a guarda. Primando pela proteção da criança e/ou adolescente, hodiernamente, a guarda é atribuída a quem revele melhores condições de exercê-la. Nesse sentido versa Miguel Reale:
Dissolvida, hoje em dia, a sociedade familiar, observar-se-á o que os cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos, e, se não houver acordo, será ela atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.
Nessa matéria é atribuído grande poder ao juiz, o qual, havendo motivos graves, poderá, em qualquer caso, a bem dos filhos, regular de maneira diferente da prevista no Código a situação deles para com os pais.
Acima, pois, da vontade destes, prevalecerá, por decisão do juiz, o que foi entendido mais conveniente à prole. À vista de tais disposições, poder-se-á dizer que o direito familiar atende, concomitantemente, a laços biológicos e sociais, tendo em vista os interesses dos filhos.
Em virtude dessa função social da família – que a Constituição considera ‘base da sociedade’ – cabe ao juiz o poder-dever de verificar se os filhos devem permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, atribuindo a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, de preferência levando em conta o grau de parentesco e relação de afinidade, de acordo com o disposto na lei específica, ou seja, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990). (Acesso em: 27 abr 2011)
Nas lições de Maria Berenice Dias, a lei cuida da guarda em pelo menos duas oportunidades distintas: a) quando do reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento (art. 1.611 e 1.612 CC/2002) e b) quando da separação dos pais (art. 1.583 a 1.589 CC/2002). Afirma ainda que em nenhum dos dois momentos o Estado dedica a atenção preconizada pela doutrina da proteção integral consagrada pela CF/1988 nem para os ditames do ECA a respeito da tutela do melhor interesse da criança e do adolescente.
A guarda é exercida inicialmente em conjunto pelos pais na constância do casamento ou união estável. Somente com a dissolução da sociedade conjugal/união estável é que se pode conceber a ideia de outra modalidade de guarda, isso porque, em regra, se o casal está ainda junto, não há que se falar em guarda senão a natural.
2.1. Conceituação de guarda
O conceito de guarda não deve ser confundido com o conceito de exercício de poder familiar embora exista forte ligação entre eles, isso porque a guarda restringe a ideia apenas de permanência da criança com uma determinada pessoa, ou seja, é a posse de fato[5], o meio necessário para a efetivação do poder familiar enquanto o poder familiar é o conjunto de direitos e deveres dos pais em relação à pessoa do filho.
Preleciona Waldyr Grisard Filho que a guarda consiste em,
um direito-dever natural e originário dos pais, que consiste na convivência com seus filhos, previsto no art. 384, II, do CC e é o pressuposto que possibilita o exercício de todas as funções paternas. (2000, p.47)
Para José Antonio de Paula Santos Neto e Rubens Limongi França,
guarda de menor é o conjunto de relações jurídicas que existem entre uma pessoa e o menor, dimanados do fato de estar este sob o poder ou a companhia daquela, e da responsabilidade daquela em relação a este, quanto à vigilância, direção e educação (2000, p. 138-39).
Por intermédio dos conceitos alhures, pode-se entender o instituto da guarda como sendo um conjunto de normas e princípios que estabelecem direitos e deveres dos pais relativamente aos filhos menores, com o intuito de zelar pela sua integridade física e psíquica e pelos seus interesses materiais e imateriais. É um poder-dever atributo pelo poder familiar, devendo ser exercido por ambos os genitores, em igualdade de condições, não se alterando com o advento da ruptura da sociedade conjugal/união estável.
2.2. Espécies de guarda admitidas no ordenamento jurídico pátrio
Existem em nosso ordenamento jurídico, quatro modalidades de guarda admitidas, são elas: a guarda por família substituta de que trata o ECA[6], a guarda natural (aquela exercida por ambos os genitores quando da constância do casamento ou união estável, proveniente do poder familiar), a guarda unilateral e a guarda compartilhada arroladas no CC/2002[7], dispondo a doutrina, no entanto, sobre outras formas de guarda existentes. Aproveita-se neste trabalho somente as tratadas pelo CC/2002 abordando-se, também, as catalogadas nas doutrinas.
A primeira delas é chamada de guarda unilateral ou exclusiva, sendo, ainda, a modalidade de guarda mais difundida no Brasil. Nela, apenas um dos pais detém, exclusivamente, a guarda tendo o menor no seu domicílio, cabendo ao outro o direito de visitas. Essa modalidade de guarda, segundo preconiza Carlos Roberto Gonçalves, “apresenta o inconveniente de privar o menor da convivência diária e contínua com um dos genitores.” (2009, p. 266). Esse, talvez, possa ter sido o motivo ensejador do surgimento da Lei nº 11.698 de 13 de junho de 2008 que alterou os arts. 1.583 e 1.584, ambos da Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002, com o intuito de instruir e disciplinar a guarda compartilhada.
A guarda unilateral deve ser deferida a apenas um dos genitores seguindo o que estatui o art. 1.583 do CC/2002, ou seja, ao que revelar melhores condições para seu exercício, sendo este entendido como o que revelar aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: “I – afeto nas relações com o genitor e como grupo familiar; II – saúde e segurança; III – educação” (art. 1.583,§ 2º CC/2002). Segundo entendimento de Carlos Roberto Gonçalves, “fica afastada, assim, qualquer interpretação no sentido de que teria melhor condição o genitor com mais recursos financeiros.” (2009, p. 267).
Salienta-se, que o instituto da guarda unilateral, não escusa o genitor que não está no exercício da guarda do seu dever de cuidado. Sabiamente o legislador, ao versar sobre o tema em tela, procurou deixar o menor amparado ao instituir que a guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos[8].
A segunda modalidade de guarda de que trata esse capítulo, é a chamada guarda compartilhada ou conjunta. Como já relatado, com o advento da Lei nº 11.698/2008, que alterou[9] os arts. 1.583 e 1.584 do CC/2002 emerge o conceito de guarda compartilhada que, nada mais é, do que o exercício conjunto da guarda por ambos os genitores, inexistindo a exclusividade de um em detrimento do outro. Essa modalidade de guarda é, no entendimento de autores como Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, é “[...] modalidade preferível em nosso sistema, de inegáveis vantagens, mormente sob o prisma da repercussão psicológica na prole, se comparada a qualquer das outras”. (2011, p. 599)
Por certo, ao tornar a guarda compartilhada preferível houve um avanço na legislação no sentido de proteger a integridade psíquica dos filhos, entretanto, o disposto no art.1.584, § 2º do CC/2002 é motivo de preocupação entre os doutrinadores vez que, como afirmam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona[10], na maioria esmagadora dos casos, quando não é possível a celebração de acordo quanto a guarda dos filhos, o juiz, dificilmente, poderá impor o compartilhamento da guarda pelo simples fato do mau relacionamento do casal, que, por si só, coloca em risco a integridade dos filhos.
Ao discorrer sobre as vantagens desse tipo de guarda, Leonardo Moreira Alves assim preleciona:
Como é cediço, inúmeros são os efeitos traumáticos provocados pela dissolução do casamento/união estável no desenvolvimento psíquico dos filhos menores e um deles, notadamente, é a perda de contato freqüente com um dos seus genitores. Nesse sentido, verifica-se que a guarda compartilhada pretende evitar esse indesejado distanciamento, incentivando, ao máximo, a manutenção dos laços afetivos entre os envolvidos acima referidos, afinal de contas pai (gênero) não perde essa condição após o fim do relacionamento amoroso mantido com o outro genitor (gênero) do seu filho, nos termos do art. 1.632 do Código Civil.
Nesse contexto, impende esclarecer que a guarda compartilhada não pode jamais ser confundida com a chamada guarda alternada: esta, não recomendável, eis que tutela apenas os interesses dos pais, implica em exercício unilateral do poder familiar por período determinado, promovendo uma verdadeira divisão do menor, que convive, por exemplo, 15 (quinze) dias unicamente com o pai e outros 15 (quinze) dias unicamente com a mãe; aquela, por sua vez, altamente recomendável, eis que tutela os interesses do menor, consiste no exercício simultâneo do poder familiar, incentivando a manutenção do vínculo afetivo do menor com o genitor com quem ele não reside.
Sobre a minoração dos efeitos da dissolução do casamento/união estável dos pais com a maior participação dos mesmos na vida dos seus filhos através da guarda compartilhada, assevera Paulo Lôbo:
A guarda compartilhada é caracterizada pela manutenção responsável e solidária dos direitos-deveres inerentes ao poder familiar, minimizando-se os efeitos da separação dos pais. Assim, preferencialmente, os pais permanecem com as mesmas divisões de tarefas que mantinham quando conviviam, acompanhando conjuntamente a formação e o desenvolvimento do filho. Nesse sentido, na medida das possibilidades de cada um, devem participar das atividades de estudos, de esporte e de lazer do filho. O ponto mais importante é a convivência compartilhada, pois o filho deve sentir-se ‘em casa’ tanto na residência de um quanto na do outro. Em algumas experiências bem-sucedidas de guarda compartilhada, mantêm-se quartos e objetos pessoais do filho em ambas as residências, ainda quando seus pais tenham constituído novas famílias. (LÔBO, 2008, p. 176).
De outro lado, a guarda compartilhada também possui o importante efeito de impedir a ocorrência do Fenômeno da Alienação Parental e a consequente Síndrome da Alienação Parental (capítulo 1), já que, em sendo o poder familiar exercido conjuntamente, não há que se falar em utilização do menor por um dos genitores como instrumento de chantagem e vingança contra o genitor que não convive com o mesmo, situação típica da guarda unilateral ou exclusiva.
Com efeito, essas são justamente as duas grandes vantagens da guarda compartilhada: o incremento da convivência do menor com ambos os genitores, não obstante o fim do relacionamento amoroso entre aqueles, e a diminuição dos riscos de ocorrência da Alienação Parental. Desse modo, constata-se que, em verdade, a guarda compartilhada tem como objetivo final a concretização do princípio do melhor interesse do menor (princípio garantidor da efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, tratando-se de uma franca materialização da teoria da proteção integral - art. 227 da Constituição Federal e art. 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente), pois é medida que deve ser aplicada sempre e exclusivamente em benefício do filho menor. (Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/12592>. Acesso em: 06 mar. 2012.)
Salienta-se, que o divórcio põe fim somente à sociedade conjugal, não eximindo os pais das obrigações com relação às pessoas dos filhos. Versa o art. 1.579 do CC/2002 que: “O divorcio não modifica os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos.” Deste modo, inequívoco o entendimento de que os pais devem, a todo o momento, zelar pelo bem estar dos filhos.
Outra modalidade de guarda admitida é a chamada guarda alternada, frequentemente confundida com a modalidade da guarda compartilhada, mas com características próprias. Nessa modalidade de guarda, os pais alternam períodos exclusivos de guarda, sendo ao outro atribuído o direito de visitas.
Ao contrário da guarda compartilhada, a guarda alternada apresenta malefícios aos menores, sobretudo no que tange ao desenvolvimento psicológico do menor que perdem a referência de lar. Sobre isso aduz Sylvia Maria Mendonça do Amaral:
a guarda alternada é aquela onde se estabelece que o menor permanecerá por iguais períodos na residência de um e de outro pai. Exemplificando: uma semana morando com o pai e outra semana com a mãe. Ou um mês na casa de cada um.
Esse modelo de guarda (alternada) mostrou-se ao longo do tempo maléfica ao desenvolvimento psicológico das crianças que acabam por perder a referência de lar. É difícil para que as crianças administrem bem o “ter duas casas”. Na semana que está com a mãe pode, por exemplo, desejar vestir uma roupa ou brincar com um brinquedo que estão na casa do pai. A consequência maior da perda da referência que se tem de um lar é a visível e comprovada insegurança do menor.
Evidente que o menor, já tão fragilizado com a separação de seus pais, que muitas vezes faz com permaneça “sob fogo cruzado”, não pode ser posto em situação de intenso estresse de ter que “dividir-se” entre o pai e a mãe, sendo ele o maior prejudicado com o constante vai-e-vem. Pode-se dizer que a criança passa seus dias e noites com uma mochila nas costas. (Acesso em: 07 mar 2012)
Parte da doutrina considera tal modalidade de guarda como não sendo, na prática, boa modalidade sob o prisma do interesse dos menores. A esse respeito, Maria Berenice Dias dispõe que “[...] não dá para confundir guarda compartilhada com a inconveniente guarda alternada, através da qual, mais no interesse dos pais que no dos filhos, procede-se praticamente a divisão da criança.” (2007, p. 397).
A guarda uniparental, espécie também elencada no rol das espécies de guarda conhecidas pela lei, é modalidade de guarda em que o filho é reconhecido somente por um o dos genitores, em regra, a mãe, ficando, obviamente, sob a guarda de quem o reconheceu (art. 1.612 CC/2002). Em sendo o menor registrado somente com o nome de um dos genitores, passa este a exercer a chamada guarda uniparental tendo em vista se tratar de uma família monoparental.
Muito embora, a legislação pátria almeje a proteção do menor, existe nela, artigo que trata os filhos havidos fora do casamento de forma discriminatória. Trata-se do art. 1.611 do CC/2002 que dispõe que “O filho havido fora do casamento, reconhecido por um dos cônjuges, não poderá residir no lar conjugal sem o consentimento do outro.” Sobre isso esclarece Maria Berenice Dias:
Quando o filho é reconhecido somente por um dos pais – geralmente a mãe –, é claro que fica sob a guarda de quem o reconheceu (CC 1.612). Aliás, nem poderia ser diferente. Registrado o infante somente no nome de um dos genitores, passa ele a exercer a guarda uniparental, constituindo uma família monoparental. Mas se a genitora for casada, o filho não poderá residir no lar conjugal se não houver o consentimento do seu cônjuge (CC 1.611). A norma, além de inconstitucional, é discriminatória. A Constituição Federal (227) assegura, com prioridade absoluta, a convivência familiar. Nada justifica a necessidade da vênia marital. Nitidamente, a regra remonta à época em que era vedado o reconhecimento do filho fora do casamento. Como deve prevalecer o melhor interesse da criança, nada pode impedir que a guarda seja atribuída ao genitor que o reconheceu, sendo totalmente descabido o condicionamento ao consentimento de seu consorte. (2007, p.394)
Notadamente, esta espécie de guarda cresceu muito nos últimos anos, entretanto, é sempre preferencial a guarda natural, ou seja, a guarda proveniente do próprio poder familiar quando da constância do casamento/união estável.
Outra espécie de guarda tratada somente na doutrina, a nidação ou aninhamento: é modalidade de guarda[11] na qual não são os filhos que alternam de lar como ocorre na guarda alternada, mas os pais alternam na convivência dos filhos por períodos idênticos num mesmo lar. Conforme prelecionam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, isso ocorre
[...] para evitar que a criança fique indo de uma casa para outra (da casa do pai para a casa da mãe, segundo o regime de visitas), ela permanece no mesmo domicílio em que vivia o casal, enquanto casados, e os pais se revezam na companhia da mesma. Vale dizer, o pai e a mãe, já separados, moram em casas diferentes, mas a criança permanece no mesmo lar, revezando-se os pais em sua companhia, segundo a decisão judicial. Tipo de guarda pouco comum, sobretudo porque os envolvidos devem ser ricos ou financeiramente fortes. Afinal, precisarão manter, além das suas residências, aquela em que os filhos moram. Haja disposição econômica para tanto! (2011, p. 599)
Embora pouco usual em nosso sistema, nota-se, facilmente, vantagens com relação à guarda alternada, pois, a visão de lar dos filhos permanece essencialmente a mesma muito embora não deixe de haver certa confusão psicológica no que diz respeito a companhia dos pais que que alternam.
2.3. Deveres do Guardião
O Brasil tem por lei maior a CF/1988. Dela, emanam todas as leis infraconstitucionais que regulam os mais diversos âmbitos da sociedade. Vários são os princípios norteadores da nossa CF/88, dentre eles, destacamos o princípio da dignidade da pessoa humana.
Em atendimento a esse princípio, o art. 227 da CF/1988 dispõe que:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Ora, emanando este artigo do princípio da dignidade da pessoa humana, entende-se que o atendimento ao referido dispositivo legal é, sem sombra de dúvidas, atribuição inerente à guarda e, por conseguinte, ao poder familiar. Impõe-se a afirmação de que tal dispositivo é basilar do princípio do melhor interesse do menor.
Em observância aos princípios insculpidos na nossa Carta Magna, em nosso ordenamento jurídico, foram elencadas as obrigações impostas ao guardião dos menores. Afigura no art. 1.583, § 2º do CC/2002:
Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada.
[...]
§ 2o A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores:
I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar;
II – saúde e segurança;
III – educação.
§ 3o A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos.
Na Lei 8.069/90, o ECA, o art. 33, apesar de se tratar da guarda por família substituta, atribui ao guardião deveres semelhantes aos impostos pelo dispositivo legal supramencionado, in verbis:
Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.
Note-se que, por entendimento extensivo, pode-se afirmar que o guardião, sendo o pai ou a mãe, ou ainda ambos, no caso da guarda natural, possuem o mesmo encargo[12] que o guardião de família substituta de que trata o art. 33 do ECA. Assim, é dever do guardião zelar pela integridade física e psíquica do menor sob a sua responsabilidade.
Flávio Guimarães Lauria visualiza na guarda uma gama de direitos e deveres de grande abrangência, externando o entendimento abaixo transcrito:
A guarda consiste num complexo de direitos e deveres que uma pessoa ou um casal exerce em relação a uma criança ou adolescente, consistindo na mais ampla assistência à sua formação moral, educação, diversão e cuidados para com a saúde. Bem como toda e qualquer diligência que se apresente necessária ao pleno desenvolvimento de suas potencialidades. (2002, p. 62)
Frise-se, no entanto, que este múnus imposto ao guardião não desobrigue ou desonere o genitor não guardião de qualquer responsabilidade. Com efeito, tem este o dever de fiscalização[13] conforme preceitua o art. 1.589 do CC/2002:
Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visita-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.
Além das obrigações impostas nos arts. 1.583 do CC/2002 e art. 33 do ECA, estendendo-se o entendimento, deve o guardião proporcionar as condições relativas ao poder familiar e quaisquer outras que possam por ventura ser relacionadas ao atendimento do melhor interesse da criança. Compete salientar aqui, o juízo de que não há de se confundir o instituto da guarda, que é a posse de fato, com o instituto do poder familiar já tratado em tópico próprio.
2.4. Causas ensejadoras da modificação da guarda
Nas causas ensejadoras da modificação da guarda, raros são os casos em que se elencam os motivos da sua modificação num rol de hipóteses, entretanto, em alguns casos específicos tem-se a perda da guarda listada como consequências de atos comissivos ou omissivos relacionados ao exercício da guarda como no caso da prática da alienação parental.
Esta pesquisa trata de duas hipóteses de fácil identificação: o descumprimento das obrigações relativas ao detentor do poder familiar/guarda e a alienação parental.
Conforme já tratado no tópico 2.3 deste trabalho, o guardião possui atribuições, deveres a cumprir inerentes da guarda e do próprio exercício do poder familiar. A observação a esses deveres é condição para a manutenção da guarda pelo guardião. Destarte, o não guardião, o Ministério Público ou qualquer parente dos menores, mediante provocação ao judiciário pode dar gênese ao processo de modificação de guarda. Faz-se uma listagem desses deveres. São eles:
Deveres decorrentes da CF/1988: Assegurar a criança e/ou ao adolescente com absoluta prioridade:
-
O direito à vida;
-
O direito à saúde;
-
O direito à alimentação;
-
O direito à educação;
-
O direito ao laser;
-
O direito à cultura;
-
O direito à dignidade;
-
O direito à liberdade;
-
O direito à liberdade e à convivência familiar[14] e comunitária;
-
O direito de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência; crueldade e opressão.
Do CC/2002, tem-se conforme estabelecido no art. 1.583, § 2º, os direitos:
-
Ao afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar;
-
À saúde e segurança;
-
À educação.
Compete afirmar que, a maioria dos direitos acima dispostos são, também, direitos fundamentais insculpidos no art. 5º da Carta Magna e, os que não o são, estão direta ou indiretamente ligados aos mesmos.
No ECA, estendendo-se o entendimento de guarda como sendo, também, relativa aos pais, entende-se que estes devem proporcionar aos menores sob sua guarda a assistência material, moral e educacional.
Assim, o descumprimento de quaisquer dessas obrigações, pode ensejar na modificação da guarda. Salienta-se que o juiz não processa a modificação de guarda ex oficio, sendo necessária a atuação do Ministério Público e/ou de parentes no sentido de provocar a justiça requerendo que haja uma reanálise da situação da guarda. É sabido que as decisões de guarda não fazem coisa julgada formal, daí possível a afirmação de serem passíveis de reexame em ação própria, mediante alteração da situação do menor ou fato superveniente à definição da guarda.
Outra hipótese de alteração da guarda se dá em decorrência da alienação parental.
A dissolução da sociedade conjugal/união estável traz consigo um grande desgaste emocional a todos os integrantes do núcleo familiar, sendo os filhos os que mais sofrem com tal situação, os mais afetados, isso, por ser parte hipossuficiente e ter, ainda em formação a sua personalidade.
Após o rompimento do vinculo conjugal/união estável, um dos genitores, ou ambos, lançando mão do bem estar dos filhos, decide utilizar-se dos filhos como meio de atingir ao outro investindo campanha difamatória de forma a desabonar a imagem do outro genitor em relação aos filhos. Tal conduta é conhecida por alienação parental[15].
O surgimento desse termo, nas lições de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona se deu em meados de 1985, pelo professor Richard Gardner, do Departamento de Psiquiatria Infantil da Faculdade de Columbia, em Nova York, EUA, segundo o qual
a Síndrome de Alienação Parental (SAP) é um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a ‘lavagem cerebral, programação, doutrinação’) e contribuições da própria criança par caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Sindrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável (Disponível em: <http://www.mediacaoparental.org/richard_gardner.php>. Acesso em: 14 mar. 2012)
Segundo as lições de Marcos Duarte, a alienação parental pode assim ser entendida:
Alienação Parental é expressão genérica utilizada atualmente para designar patologia psicológica/comportamental com fortes implicações jurídicas, caracterizada pelo exercício abusivo do direito de guarda com o impedimento da convivência parental no rompimento da conjugalidade ou separação causada pelo divórcio ou dissolução da união estável. A vítima maior é a criança ou adolescente que passa a ser também carrasco de quem ama, vivendo uma contradição de sentimentos até chegar ao rompimento do vínculo de afeto. Através da distorção da realidade percebe um dos pais totalmente bom e perfeito (alienador) e o outro totalmente mau (alienado). (Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=697>. Acesso em: 28 fev. 2012.
A lei 12.318, de 26 de agosto de 2010, trouxe no seu art. 2º o conceito de alienação parenta, ipses literis:
Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Traz ainda no seu parágrafo único, alguns exemplos de alienação parental, in verbis:
Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
II - dificultar o exercício da autoridade parental;
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.
O professor e psiquiatra Richard Gardner, a partir de suas pesquisas, listou algumas condutas costumeiramente praticadas pelo genitor alienador que caracterizam a ocorrência de Alienação Parental. Tais condutas que se coadunam com as hipóteses genéricas apontadas no parágrafo único do art. 2º da Lei 12.318/2010. São elas:
a) Recusar de passar as chamadas telefônicas aos filhos;
b) Organizar várias atividades com os filhos durante o período que o outro genitor deve normalmente exercer o direito de visitas;
c) Apresentar o novo cônjuge aos filhos como sua nova mãe ou seu novo pai;
d) Interceptar as cartas e os pacotes mandados aos filhos;
e) Desvalorizar e insultar o outro genitor na presença dos filhos;
f) Recusar informações ao outro genitor sobre as atividades em que os filhos estão envolvidos (esportes, atividades escolares, grupos teatrais, escotismo, etc.);
g) Falar de maneira descortês do novo conjugue do outro genitor;
h) Impedir o outro genitor de exercer seu direito de visita;
i) “Esquecer” de avisar o outro genitor de compromissos importantes (dentistas, médicos, psicólogos);
j) Envolver pessoas próximas (sua mãe, seu novo conjugue, etc.) na lavagem cerebral de seus filhos;
k) Tomar decisões importantes a respeito dos filhos sem consultar o outro genitor (escolha da religião, escolha da escola, etc.);
l) Trocar (ou tentar trocar) seus nome e sobrenomes;
m) Impedir o outro genitor de ter acesso às informações escolares e/ou médicas dos filhos;
n) Sair de férias sem os filhos e deixá-los com outras pessoas que não o outro genitor, ainda que este esteja disponível e queira ocupar-se dos filhos;
o) Falar aos filhos que a roupa que o outro genitor comprou é feia, e proibi-los de usá-las;
p) Ameaçar punir os filhos se eles telefonarem, escreverem, ou a se comunicarem com o outro genitor de qualquer maneira;
q) Culpar o outro genitor pelo mau comportamento dos filhos. (Disponível em <http://apase.org.br/94001-sindrome.htm>. Acesso em: 14 mar. 2012.
No que tange a modificação da guarda, a lei 12.318/2010, elenca dentre o rol das sanções impostas ao alienante, a alteração da guarda em favor do genitor alienado ou quem o faça as vezes. Assim versa o art. 6º da referida lei:
Art. 6o Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso:
I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;
II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
III - estipular multa ao alienador;
IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
VII - declarar a suspensão da autoridade parental.
Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.
A alienação parental, assim como o descumprimento das obrigações do guardião, não tem o condão de proceder a alteração da guarda sem que haja uma provocação por parte do genitor não guardião, de parente interessado, ou ainda, do Ministério Público. Para que haja a modificação é requisito, sine qua non, seja provocada a justiça.
3. OBRIGAÇÕES E LIMITAÇÃO DA ATUAÇAO ESTATAL NO DIREITO DE FAMÍLIA
O Estado, desde a sua formação, encampou direitos e obrigações que lhe foram cedidos pela coletividade que lançou mão desses direitos e deveres em prol da viabilidade da vida em sociedade. Assim passou o Estado a intervir nas relações entre os cidadãos que encontravam guarida em sua supremacia. Existem, entretanto, esferas de direitos que o Estado não pode interver como bem lhe convier, como é o caso do direito de família, tendo em vista a observação ao princípio da intervenção mínima do Estado no direito de família.
Isso não quer dizer, no entanto, que o Estado irá se eximir de toda e qualquer ingerência no âmbito do direito de família, tem este, a obrigação legal de cuidar do bem estar dos integrantes da entidade familiar, o que enseja o surgimento de princípios tais como o princípio da dignidade da pessoa humana e outros princípios atinentes ao direito de família como e o caso do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.
Tais princípios merecem destaque especial ao passo que se impõe tratar dos temas a eles relacionados à luz do que estabelece tanto a Constituição Federal de 1988 quanto as leis infraconstitucionais.
3.1. Princípio do melhor interesse da criança e do adolescente
O princípio do melhor interesse da criança emergiu da aprovação, por unanimidade, da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, ocorrida na sessão de 20 de novembro de 1989 da Assembleia Geral das Nações Unidas.
A Convenção Internacional dos Direitos da Criança foi ratificada no Brasil pelo Decreto nº 99.710/90 trazendo o mínimo que toda a sociedade deve garantir às suas crianças. Nesse contexto, seu art. 3.1 assim dispõe:
Artigo 3
1. Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.
Segundo as lições de Tania da Silva Pereira, o Brasil, ao promulgar a Convenção Internacional do Direito da Criança deu conotação quantitativa ao princípio em análise, já a versão original, traz em seu bojo uma conotação qualitativa, in verbis:
A Convenção Internacional dos Direitos da Criança foi aprovada, por unanimidade, na sessão de 20 de novembro da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1989, depois de um árduo trabalho de dez anos de representantes de 43 países-membros da Comissão de Direitos Humanos daquele organismo internacional, à época em que se comemoravam os 30 anos da Declaração Universal dos Direitos da Criança.
Fruto de compromisso e negociação, ela representa o mínimo que toda a sociedade deve garantir às suas crianças, reconhecendo em um único documento as normas que os países signatários devem adotar e incorporar às suas leis. Exige, por parte de cada Estado, que a ratifique, uma tomada de decisão, incluindo-se os mecanismos necessários à fiscalização do cumprimento de suas disposições e obrigações concernentes à sua infância, ou seja, pessoas menores de 18 anos.
Ratificada pelo Brasil através do Decreto n° 99.710/90, indique-se sua versão oficial, ao dispor no art. 3.1: "todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança”.
Destaque-se, especialmente, o texto original em inglês ao declarar: "In ali actions concerning children, whether undertaken by public or private social welfare institutions, courts of law, administrative authorities or legislative bodies, the best interests of the child shall be a primary consideration".
Estamos, portanto, diante de dois conceitos diversos: a versão original vinculada a um conceito qualitativo - the best interest - e a versão brasileira dentro de um critério quantitativo - o interesse maior da criança. Optamos pelo conceito qualitativo - melhor interesse - considerando-se o conteúdo da
Convenção, assim como a orientação constitucional e infraconstitucional adotada pelo sistema jurídico brasileiro.
O Brasil incorporou, em caráter definitivo, o princípio do "melhor interesse da criança" em seu sistema jurídico, e sobretudo, tem representado um norteador importante para a modificação das legislações internas no que concerne à proteção da infância em nosso continente.(Disponível em: <http://www.gontijo-familia.adv.br/2008/artigos_pdf/Tania_da_Silva_Pereira/MelhorInteresse.pdf> Acesso em: 07 mar. 2012)
O princípio do melhor interesse da criança, à miúde, impõe o entendimento de que, havendo conflito entre o interesse do menor e outro qualquer, deve prevalecer o daquele em detrimento deste. No que tange a definição da guarda, ainda que haja manifestação de ambos os genitores no intuito de requerimento da guarda, o menor, além de ser ouvido, conforme preceitua o art. 161, § 3º do ECA desde que respeitado seu estagio de desenvolvimento e grau de compreensão sobre as implicações do deferimento/modificação da guarda.
3.2. Princípio da intervenção mínima do Estado no direito de família
Diferentemente de outros ramos do direito, o direito de família tem, entre os princípios que o regem, o princípio da intervenção mínima do Estado no direito de família. Isso não quer dizer que o Estado deva se escusar de toda e qualquer ingerência neste ramo do direito, mas que deve este respeitar a singularidade da família prezando pelo bem estar de todos os seus componentes, em especial dos que, em virtude da sua condição, tornam-se hipossuficientes.
Como bem acentuou Rodrigo da Cunha Pereira:
O Estado abandonou a sua figura do protetor-repressor, para assumir postura de Estado protetor-provedor-assistencialista, cuja tônica não é de uma total ingerência, mas, em algumas vezes, até mesmo de substituição à eventual lacuna deixada pela própria família como, por exemplo, no que concerne à educação e saúde dos filhos (cf. art. 227 da Constituição Federal). A intervenção do Estado deve apenas e tão somente ter o condão de tutelar a família e dar-lhes garantias, inclusive de ampla manifestação de vontade e de que seus membros vivam em condições propícias à manutenção do núcleo afetivo. Essa tendência vem-se acentuando cada vez mais e tem como marco histórico a Declaração Universal dos Direitos do Homem, votada pela ONU em 10 de dezembro de 1948, quando estabeleceu em seu art. 16.3: A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado. (2006, p.157)
A respeito da intervenção do Estado no âmbito do direito de família, asseveram Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:
Não cabe, portanto, ao Estado, intervir na estrutura familiar da mesma maneira como (justificada e compreensivelmente) interfere nas relações contratuais: o âmbito de dirigismo estatal, aqui, encontra contenção no próprio princípio da afetividade, negador desse tipo de agressão estatal. (2011, p.104)
Esse obstáculo à ingerência do Estado no direito de família não quer dizer, no entanto, que o Estado vai se escusar do seu dever de guarda dos direitos dos entes da família, pode sim, ser chamado a intervir quando houver ameaça ou lesão a interesse jurídico de qualquer dos integrantes da família.
O princípio da interferência mínima do Estado no direito de família pode ser mais claramente vislumbrado no CC/2002, que trouxe, sem precedente no Código Civil de 1916, norma que veda essa ingerência, ipses literis: “Art. 1.513 – É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família.”
Depreende-se assim, que o Estado deve atuar apenas como guardião dos direitos dos entes da família quando houver ameaça ou lesão de direito se qualquer dos entes da família, vindo a intervir somente quando chamado para esse fim.
3.3. Apontamentos acerca do papel do Estado no resguardo do maior interesse da criança e do adolescente e acerca da limitação da sua atuação no âmbito do direito de família
O Estado, responsável pelo dever de resguardo dos direitos da criança e do adolescente, trouxe na CF/1988, especificamente no seu art. 227, o rol das obrigações solidárias da família, da sociedade e do Estado assim dispondo:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Levando-se em consideração o princípio do melhor interesse da criança já mencionado e, em obediência ao princípio da plena proteção das crianças e adolescentes, o Estado tem papel preponderante no sentido de resguardar tanto os interesses do menor quanto o de proteger o integrante hipossuficiente da entidade familiar.
O art. 227 da CF/1988, no seu § 4º[16] trata das consequências impostas aos que fizerem uso de violência e exploração sexual da criança e do adolescente. Assim, todas as leis infraconstitucionais, em atendimento ao disposto no art. 227, §4º, que dizem respeito à criança e ao adolescente, devem priorizar a plena proteção da criança e do adolescente levando em consideração o seu melhor interesse e sua plena proteção.
A Carta Magna alberga os direitos das crianças e adolescentes sempre na busca do seu bem estar, desempenhando sua função de guardião dos direitos da criança e do adolescente, ainda que para isso fuja à regra da intervenção mínima no direito de família.
Não só a CF/1988 tem o condão de proteger a criança e o adolescente. O Brasil, como Estado signatário da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, promulgado pelo Decreto 99.710 de 21 de novembro de 1990, compromete-se a fazer valer e fazer cumprir todos os direitos da criança e do adolescente insculpidos no Decreto supramencionado. Não obstante, também o ECA e o CC/2002 buscam a proteção da criança e do adolescente.
O Estado, no entanto, deve observar o princípio da intervenção mínima do Estado no direito de família, isso porque, como já dito, diferentemente de outros ramos do direito, não pode intervir nas relações familiares sem que seja chamado para esse fim. Sobre isso, sustentam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona que “ao Estado não cabe intervir no âmbito do direito de família ao ponto de aniquilar a sua base socioafetiva”.
Ex positis, pode-se verificar que o Estado tem a preocupação de proteger a pessoa da criança e do adolescente amparado por princípios[17] tais como o princípio da dignidade da pessoa humana, princípio do melhor interesse da criança, princípio da plena proteção da criança e do adolescente, dentre outros, ainda que para isso seja necessária uma mitigação do princípio da interferência mínima deste no direito de família. A inobservância de tais princípios, sem prejuízo de eventual responsabilização criminal e civil, pode, inclusive, resultar na destituição do poder familiar.
3.4. Ponderações acerca do Projeto de Lei 7.672/2010 (Lei da Palmada)
O Projeto de Lei nº 7.672/2010 causou bastante repercussão nos mais variados âmbitos da sociedade. Isso porque, o projeto nasceu com o intuito de erradicar o uso da reprimenda física na educação dos filhos.
Nota-se, por seu turno, que o projeto em tela adentra o âmbito da família dispondo contrariamente ao que preceitua o princípio da intervenção mínima do Estado no campo do direito de família. Ora, há muito tempo, os filhos são educados sendo submetidos a reprimendas físicas. A Bíblia Sagrada, ao tratar da educação dos filhos assim dispõe no seu livro de Provérbios, capítulo 13, verso 24: “O que retém a vara aborrece a seu filho, mas o que o ama, cedo, o disciplina”.
Não se trata aqui de apologia a violência, muito pelo contrário, trata-se da maneira de disciplina para com a pessoa dos filhos. De origem popular, quem nunca ouviu o jargão que diz que “é melhor apanhar em casa, dos pais que tem amor aos filhos, que apanhar da polícia, que não gosta de ninguém?” ou ainda “pé de galinha não mata pinto”? Por certo, o Projeto de Lei nº 7.672/2010, adentrou de forma muito incisiva na seara do direito de família, tendo, inclusive, invadido o campo religioso.
Vale transcrever o teor do Projeto de Lei nº 7.672/2010, in verbis:
Art. 1o A Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, passa a vigorar acrescida dos seguintes artigos:
‘Art. 17-A. A criança e o adolescente têm o direito de serem educados e cuidados pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar, tratar, educar ou vigiar, sem o uso de castigo corporal ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação, ou qualquer outro pretexto.
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, considera-se:
I - castigo corporal: ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso da força física que resulte em dor ou lesão à criança ou adolescente.
II - tratamento cruel ou degradante: conduta que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize a criança ou o adolescente.
Art. 17-B. Os pais, integrantes da família ampliada, responsáveis ou qualquer outra pessoa encarregada de cuidar, tratar, educar ou vigiar crianças e adolescentes que utilizarem castigo corporal ou tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação, ou a qualquer outro pretexto estarão sujeitos às medidas previstas no art. 129, incisos I, III, IV, VI e VII, desta Lei, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.’
‘Art. 70-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios atuarão de forma articulada na elaboração de políticas públicas e execução de ações destinadas a coibir o uso de castigo corporal ou de tratamento cruel ou degradante, tendo como principais ações:
I - a promoção e a realização de campanhas educativas e a divulgação desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos;
II - a inclusão nos currículos escolares, em todos os níveis de ensino, de conteúdos relativos aos direitos humanos e prevenção de todas as formas de violência contra a criança e o adolescente;
III - a integração com os órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, do Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente nos Estados, Distrito Federal e nos Municípios, Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, e entidades não governamentais;
IV - a formação continuada dos profissionais que atuem na promoção dos direitos de crianças e adolescentes; e
V - o apoio e incentivo às práticas de resolução pacífica de conflitos que envolvam violência contra criança e adolescente. ’
Art. 2o O art. 130 da Lei no 8.069, de 1990, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo:
‘Parágrafo único. A medida cautelar prevista no caput poderá ser aplicada ainda no caso de descumprimento reiterado das medidas impostas nos termos do art. 17-B.’
Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, ao abordar o tema entendem que:
A grande celeuma gira em torno da conhecida ‘palmadinha corretiva’, também vedada nos termos do projeto, e que, para muitos pais, estaria inserida no âmbito do lícito do direito correcional, desde que exercida de forma moderada.
Difícil falar, em tese, a respeito desse tema.
Não somos contra o projeto, mas advertimos que somente a cuidadosa análise do caso concreto poderá recomendar e justificar a aplicação de pinicão aos pais, por ser extremamente ampla e profunda a álea de compreensão da norma.
Vale dizer, uma interpretação excessivamente literal e rigorosa poderia resultar na indevida ingerência do Estado no âmbito familiar, sem que, de fato, perigo de dano houvesse a justificar uma medida sancionatória.
O juiz, pois, deverá adotar redobrada cautela na apreciação do caso concreto, até mesmo para que o processo – o strepitus fori – não acarrete, no seio da relação familiar, uma fissura difícil de cicatrizar, mais danosa do que o próprio castigo que se quer coibir. (2011, p. 594)
Da forma como está, o Estado está, sim, intervindo nas relações familiares além das atribuições que lhes são permitidas tendo sempre em vista o princípio da interferência mínima do Estado no direito de família.
Vale ressaltar que os doutrinadores supramencionados, apesar de serem favoráveis ao projeto de lei, veem com cuidado a aplicação das medidas sancionatórias de forma a tornar uma interpretação excessivamente literal pode resultar na indevida ingerência do Estado no âmbito familiar, podendo gerar uma fissura de difícil cicatrização mais danosa que o castigo que se deseja coibir.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As causas ensejadoras da modificação da guarda e o papel do Estado no resguardo do direito da criança e do adolescente foram os objetos de estudo deste trabalho. Diante dos estudos já realizados, questiona-se o seguinte: quais as causas ensejadoras da modificação da guara e qual o papel do Estado no resguardo do melhor interesse da criança e do adolescente?
Como já visto o Estado não tem o condão de adentrar no direito de família como bem entender tendo em vista a observância de princípios que regem o direito de família e, em especial, o princípio da interferência mínima do Estado no direito de Família. Isso porque, caso assim o fizesse, poderia estar colocando em risco a própria entidade familiar. No entanto, tem o Estado o dever de resguardo do melhor interesse da criança e do adolescente, sendo este, também, princípio norteador da atuação do Estado no âmbito do direito de família. Mas como observar ambos os princípios aqui citados sendo estes opostos?
Não deve o Estado interferir em demasia no âmbito do direito de família, entretanto, mediante provocação de parte interessada ou do Ministério Público, o Estado é chamado a interver e, em sendo um direito da criança e adolescente ameaçado ou lesionado, deve o Estado intervir de maneira que o interesse do menor seja preservado em detrimento de outros por ser este, parte hipossuficiente na relação familiar por ter ainda em formação sua personalidade e não gozar de capacidade civil para fazer valer seus direitos até por não ter a maturidade exigida para este fim.
No tocante a guarda, deve, também, ser observado o melhor interesse da criança e do adolescente, sendo esta atribuída a quem revele melhores condições de exercê-la sempre tendo em vista o interesse da criança. Para que isso seja observado, o Estado, mediante provocação, deve levar em consideração não somente a condição financeira do guardião, mas um conjunto de condições que devem ser observadas para proporcionar a criança e ao adolescente o ambiente mais saudável possível de forma a garantir seus direitos na integralidade.
Neste diapasão, a alteração de guarda vem como forma de garantir a preservação desses direitos visto que, como relatado a guarda não transita em julgado, ou seja, qualquer fato superveniente pode ensejar a sua modificação visando a defesa dos direitos da criança e do adolescente. Percebe-se que, em decorrência da aprovação da Convenção Internacional do Direito da Criança, a legislação brasileira tem sido modificada no sentido de dar guarita aos direitos da criança e do adolescente o que trouxe a possibilidade de sobrepor o interesse destes em relação aos seus guardiões.
Ex positis, conclui-se que embora sejam subjetivas as causas ensejadoras da modificação da guarda na sua maioria, o Estado deve dar guarita ao direito da criança e do adolescente, ainda que para isso, outros direitos devam ser subjugados. Embora exista princípio que obste a ingerência do Estado no âmbito do direito de família, este não pode escusar-se do seu dever de guardião dos direitos do hipossuficiente que, no caso em tela, é a criança e o adolescente.
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[1] A ingerência do Estado no direito de família será tratada em capítulo próprio à luz do princípio da interferência mínima do Estado no Direito de Família.
[2] Cf. art. 155 a 163 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA
[3] Art. 5o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria.
[4] O Código Civil de 2002 abandonou completamente a regra que vinculava a atribuição da guarda à discussão da culpa na separação sanção. Com efeito, na redação original tanto do Código Civil de 1916 como na Lei do Divórcio, se a separação ocorresse com base na culpa, a guarda dos filhos deveria ficar com o cônjuge considerado inocente. A guarda dos filhos era, assim, um prêmio ou um castigo definido de acordo com a decisão proferida na separação judicial. (TARTUCE, 2011, p. 188).
[5] Cf. art. 33, § 2º da Lei n. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA
[6] Cf. arts. 33 a 35 da lei 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do adolescente - ECA
[7] Cf. art. 1.583, Caput da lei 10.406/2002 – Código Civil
[8] Cf. art. 1.583, § 3º da Lei 10.406/2002 – Código Civil
[9] A antiga redação dos arts. 1.583 e 1.584 da Lei 10.406/2002 – Código Civil – assim dispunha:
“Art. 1.583. No caso de dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal pela separação judicial por mútuo consentimento ou pelo divórcio direto consensual, observar-se-á o que os cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos.
Art. 1.584. Decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.
Parágrafo único. Verificando que os filhos não devem permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, o juiz deferirá a sua guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, de preferência levando em conta o grau de parentesco e relação de afinidade e afetividade, de acordo com o disposto na lei específica.”
[10] Prelecionam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona que: “[...] somente em situações excepcionais, em que o juiz, a despeito da impossibilidade do acordo de guarda e custódia, verificar maturidade e respeito no tratamento recíproco dispensado pelos pais, poderá, então, mediante acompanhamento psicológico, impor a medida. (2011, p. 600)
[11] Segundo afirmação de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, esta modalidade de guarda incomum em nossa jurisprudência, mas bastante comum em países europeus. Conferir p. 599 da obra dos referidos doutrinadores elencada nas referências deste trabalho.
[12] Cf. Art. 22 da Lei 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente
[13] Cf. Art. 1.583, § 3º da Lei 10.406/2002 – Código Civil
[14] Cf. art. 19 da Lei 8.069/90 - ECA
[15] Cf. Documentário “A morte inventada”. Disponível no site <http://www.amorteinventada.com.br>
[16] CF/1988. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[...]
§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.
[17] Conferir, também, os princípios da afetividade, princípio da solidariedade familiar, princípio da função social da família, princípio da plena proteção das crianças e adolescentes, princípio da convivência familiar, todos atinentes ao direito de família.