1 INTRODUÇÃO
O princípio do acesso à justiça tem gerado grandes inovações no processo judicial, incluindo-se dentre tais avanços, a possibilidade de se postular em juízo através do instituo do jus postulandi. Desta maneira, atualmente, é possível pleitear em juízo tanto nos Juizados Especiais como na Justiça do Trabalho, sem interveniência obrigatória de advogado.
Contudo, com o advento da EC nº 45/2004, e a consequente ampliação da competência da Justiça do Trabalho, situações novas, diversas das controvérsias decorrentes da relação de emprego, surgem a cada dia, acirrando os debates sobre o tema, perante as Varas e Tribunais Regionais do Trabalho. E, por conta de tal vicissitude, vários Juízes e doutrinadores vêm se posicionando, e questionando-se no tocante a eficácia do jus postulandi.
Cabe destacar que o jus postulandi, por prescindir da devida assistência jurídica por profissional habilitado, dificulta a ampla defesa de seus interesses, face ao despreparo das mesmas.
Ainda, segundo a Constituição Federal de 1988, a atuação dos advogados ganhou status de função essencial à justiça; ou seja, sem estes profissionais, dotados de preparo técnico para defender as partes, não há garantia que se fará justiça.
Ora, tal prerrogativa permite o Estado desincumbir-se do ônus que lhe é imposto de promover a assistência judiciária gratuita integral, sem alcançar o real objetivo do livre acesso ao judiciário, que é a justiça.
Isto porque, ao permitir a auto postulação sem a presença de um profissional tecnicamente preparado, o Estado impossibilita a paridade de armas com aquele que se fez acompanhar do causídico, não aflorando garantias fundamentais como a ampla defesa e o contraditório.
O objetivo desta pesquisa é desenvolver uma breve analise dos efeitos negativos causados pela prerrogativa do jus postulandi na Justiça do Trabalho. Este estudo se justificou por sua pertinência e relevância no meio jurídico, vez que buscou apresentar as mudanças dialéticas e contradições que circundam o problema causado por tal instituo.
2. ACESSO À JUSTIÇA
À medida que as sociedades evoluíram e se tornaram complexas, foi necessário o Estado institucionalizar o poder e as formas de acesso a ele. Então, o poder público necessitou implementar mecanismos eficazes e atuantes que viabilizassem o acesso ao judiciário.
Sublinhe-se que direito de acesso à justiça é corolário do Estado Democrático de Direito e tem como funções a efetivação dos direitos fundamentais e a garantia da prestação da tutela jurisdicional a todos, sem que sejam exigidos pré-requisitos para tal. Esta garantia está consignada na CRFB/88, cujo texto magno (art. 5º, XXXV) encarta de forma expressa, a garantia de acesso à justiça, dispondo que: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
Acesso à justiça, ou mais propriamente, acesso à ordem jurídica justa, significa proporcionar a todos, sem qualquer restrição, o direito de pleitear a tutela jurisdicional do Estado e de ter à disposição o meio constitucionalmente previsto para alcançar esse resultado. (BEDAQUE, 2003, p. 71).
No mesmo diapasão, aduzem os doutos Cappelletti & Garth:
O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental - o mais básico dos direitos humanos - de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretende garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos” (CAPPELLETTI & GARTH, 1988, p.12).
Assim, tornou-se necessário que o Estado, figura garantidora de direitos, promovesse a assistência jurídica através de uma justiça acessível a todos e eficaz, esenvolvendo um sistema que solucione litígios e permita que as pessoas reivindiquem seus direitos, ou, noutra dicção, institucionalizasse o acesso à justiça.
Após advertir a dificuldade de se precisar o significado do epíteto “acesso à justiça”, Cappelletti & Garth aduzem que tal expressão determinam duas finalidades básicas do sistema jurídico:
O sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individualmente e justos(CAPPELLETTI & GARTH,1988, p. 8).
Verificou-se, então, uma modificação na organização judiciária já existente e a criação de outros órgãos jurisdicionais, a exemplo a Lei 9.099/95, que possibilitou a implantação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, para que todos tivessem seus direitos resguardados.
Porém, devido à grande procura e acúmulo de tarefas, o sistema judiciário tornou-se lento, não cumprindo seus principais objetivos e princípios orientadores, como o da celeridade e duração razoável do processo, sendo necessário implantação de novos Juizados Especiais, para complementar os já existentes.
Todavia, verifica-se que existem muitas barreiras para um real acesso à justiça, como por exemplo: custos elevados; longa duração do processo; falta de conhecimento técnico jurídico, formalismo; procedimento complexo, dentre outros.
Frise-se que a dificuldade no custeio das despesas como o litígio, é considerada o maior problema do acesso aos tribunais. Nesta ótica, preleciona Cappelletti & Garth (1988, p.18): “Torna-se claro que os altos custos, na medida em que uma ou ambas as partes devam suportá-los, constituem uma importante barreira ao acesso à justiça”. E o problema é ainda maior, quando se vive em um país de contrastes e com tantas desigualdades sociais, como o Brasil.
Diante de tais vicissitudes, a constituição Federal de 1988, buscando solucionar tal problema, consagra a assistência judiciária gratuita, como direito fundamental, conforme previsto em seu art. 5º, inciso LXXIV, in verbis: “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. Porquanto, a justiça deve ser acessível a todos, independente do poder aquisitivo do jurisdicionado, garantindo aos litigantes a ampla defesa e contraditório.
Ainda, é importante destacar que o desconhecimento básico jurídico, outro grave obstáculo já apontado alhures, não afeta somente as classes menos favorecidas, recaindo, também, sobre as pessoas dotadas de grandes recursos financeiros. Nesse sentido, conforme aduz Cappelletti & Garth (1988,p.23), “a complexidade das sociedades faz com que mesmo as pessoas dotadas de mais recursos tenham dificuldade para compreender as normas jurídicas”.
Desta maneira, para viabilizar o acesso à justiça, o Estado criou instrumentos de assistência judiciária aos pobres, tais como: assistência jurídica gratuita, nomeação de advogado dativo, defensoria pública, dentre outros. Ora, considerando a complexidade envolvida na utilização dos procedimentos necessários ao ajuizamento de uma ação judicial, o auxílio de um causídico torna-se essencial para elucidação das leis.
Outra maneira utilizada para promover o acesso à justiça se deu através dos mutirões de conciliação[1], ou seja, um procedimento alternativo, podendo ser dentro do processo, v.g. através da audiência de conciliação, como fora do processo, a exemplo dos balcões de justiça e cidadania. Saliente-se que em se tratando de procedimento sumaríssimo, a conciliação pode ser tentada a qualquer tempo, facilitando o acordo.
Também, no intuito de acelerar o procedimento jurisdicional, o ordenamento jurídico trabalhista possibilitou que, na Justiça do Trabalho, as partes não teriam a necessidade de constituir advogados para que os representassem; surgindo, assim, um dos princípios marcantes no ordenamento jurídico, o jus postulandi; ou seja, a capacidade postulatória da própria parte, que tem o poder de agir em um processo, sem a assistência de um causídico, uma vez que a situação econômica da maioria dos trabalhadores brasileiros era sofrível, o acesso à justiça trabalhista tornava-se difícil e custoso.
Não obstante todos estes sistemas de soluções de litígios, o principio do ius postulandi terminou suscitando batalhas doutrinárias e divergências jurisprudenciais no tocante à real possibilidade do acesso à justiça, questionando-se a vantagem desse princípio, porquanto, na maioria das vezes, o reclamante não tem conhecimento jurídico e fica prejudicado em relação à outra parte.
Ora, a complexidade que envolve o processo judicial requer o conhecimento técnico, que normalmente é detido por profissional habilitado. O desconhecimento da técnica postulatória requerida, de pressupostos processuais, prazos, etc., pode expor as partes, via de regra, leigas em questões jurídicas, a colocar em risco interesses que seriam melhor defendidos mediante assistência jurídica adequada, ou seja, através de advogado. Razão por que, a possibilidade das partes ingressarem em juízo, sem a devida assistência, atenta contra o acesso à justiça.
Nesta óptica é a lição de CINTRA et. al. (2002, p.33), nos seguintes termos:
Acesso à justiça não se identifica, pois, com a mera admissão ao processo, ou possibilidade de ingresso em juízo. (...) A ordem jurídico-positiva (Constituição e leis ordinárias) e o lavor dos processualistas modernos têm posto em destaque uma série de princípios e garantias que, somados e interpretados harmoniosamente, constituem o traçado do caminho que conduz as partes à ordem jurídica justa. O acesso à justiça é, pois, a idéia central a que converge toda a oferta constitucional e legal desses princípios e garantias.
Logo, essa forma de acesso à justiça consagra o desequilíbrio processual entre as partes da lide, fazendo com que, na maioria das vezes, a parte autora fique completamente indefesa e sem argumentos frente a um profissional treinado e competente para resolver as questões jurídicas.
3. JUS POSTULANDI
3.1 O advogado como parte essencial à justiça
Antes de discutir especificamente o jus postulandi das partes é importante analisar a figura do advogado no acesso à justiça, o qual é figura essencial para administração da justiça, ou seja, cabe a ele servir de elo entre a parte desprotegida e o direito que concerne a esta.
Dispõe o caput do artigo 133 da Constituição Federal, que o advogado é indispensável à administração da justiça, in verbis:
Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.
Verifica-se que a Carta Magna de 1988, também chamada de “Constituição Cidadã”, faz emergir em seu art. 133 um princípio basilar, consubstanciado em mais uma garantia fundamental: a imprescindibilidade do advogado. Igualmente, consta do Código de Ética profissional do Advogado (Lei nº 8.906/94), a seguinte redação:
Art. 2º. O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que exerce.
Ainda, a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, nos seus parágrafos seguintes do artigo 2°, trata:
§ 1º No seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social.
§ 2º No processo judicial, o advogado contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem múnus público.
Ora, é o advogado o profissional apto para representar seus clientes perante a Justiça, cabendo-lhe a função de ampará-lo, informando-lhe de seus direitos, bem como os pleiteando em juízo. Nesse mesmo sentido para Ada Pellegrini et. al. (2010, p. 242), “o advogado aparece como integrante da categoria dos juristas, tendo perante a sociedade a sua função específica e participando, ao lado dos demais, do trabalho de promover a observância da ordem jurídica e o acesso dos seus clientes à ordem jurídica”.
Frise-se que a atividade do causídico é um múnus público, ou seja, exige certos encargos em benefício coletivo ou da ordem social, uma vez que a lei, através das garantias constitucionais, possibilita estes profissionais utilizarem-se dos meios necessários, positivados ou não no ordenamento jurídico, para zelar pelas partes, onde estas compreendam os seus direitos.
Dessa maneira, dispensar o patrono de determinados encargos para facilitar o acesso à justiça em prol da sociedade, poderá ensejar um desequilíbrio entre as partes, uma vez que uma destas estará sem o auxilio de conhecimentos técnicos necessários ao participar destes encargos.
À lei caberá regulamentar o exercício da atividade do advogado, mas sem jamais chegar ao ponto de tornar a presença do advogado facultativa, pois assim estar-se-ia negando à sua atividade o caráter de função essencial. Isto porque, como sabido, essencial significa indispensável, necessário. Assim, sendo, não se pode admitir que o advogado seja essencial mas possa ser dispensado, sob pena de incorrermos em paradoxo gravíssimo. (CÂMARA, 2007, p. 244)
Importante salientar que por força de lei, o advogado atua com independência, em todas as instâncias judiciais, no mesmo nível hierárquico dos juízes, membros do Ministério Público, desembargadores e ministros de tribunais superiores, sendo estes obrigados a respeitar a isonomia constitucional existente entre ambos, dispensando tratamento compatível com a dignidade da advocacia, oferecendo a este profissional, com consideração e respeito, condições adequadas ao desempenho do múnus público que lhe é atribuído.
Ademais, cabe destacar que o advogado funciona como órgão subsidiário da justiça e contribui decisivamente para a concretização das grandes reivindicações do direito, sendo o preparador das decisões soberanas dos magistrados.
Ora, é o causídico o primeiro juiz, é ele que irá elencar os fatos e buscar no ordenamento jurídico fundamentação legal para a defesa de terceiros, ou seja, será ele que irá valorar a situação fática através da normatização que lhe é cedida. Essa fundamentação será a base para a decisão judicial. É através dos fatos elencados que irá materializar uma lide e será o pilar para gerar a jurisprudência.
Assim, nenhuma sociedade pode deixar de reconhecer a importância desse profissional para a segurança do cidadão e para a estabilidade das instituições. Advocacia é por certo, uma garantia para todos, principalmente para aqueles que necessitam da tutela jurisdicional. Sem advogado não se faz a devia justiça!
Defendendo a indispensabilidade do advogado, leciona Mauro Cappelletti:
O auxílio de um advogado é essencial, senão indispensável para decifrar leis cada vez mais complexas e procedimentos misteriosos, necessários para ajuizar uma causa. Os métodos para proporcionar a assistência judiciária àqueles que não a podem custear são, por isso mesmo, vitais. (CAPPELLETTI & GARTH, 1988, p. 32)
Portanto, a posição do advogado como ente essencial à administração da Justiça consolida sua indispensabilidade nas postulações judiciais, sendo a sua ausência uma violação ao acesso e a distribuição equitativa da justiça, uma vez que é a única profissão citada na Constituição Federal como indispensável à administração da Justiça, e fundamental para a formação, construção e concretização de um dos Poderes Estatais. Fora este profissional que um dia jurou “defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado Democrático, os direitos humanos, a justiça social”.
3.2 Capacidade de postulação
A capacidade postulatória, Jus Postulandi, é a prerrogativa legal de fazer valer e defender as próprias pretensões ou as de outrem em juízo. Ou seja, assegurar a tutela jurídica no âmbito do Poder Judiciário, abrangendo a capacidade de pedir e responder. É o que se depreende da inteligência do disposto no art. 36 do Código de Processo Civil:
Art. 36. A parte será representada em juízo por advogado legalmente habilitado. Ser-lhe-á lícito, no entanto, postular em causa própria, quando tiver habilitação legal ou, não a tendo, no caso de falta de advogado no lugar ou recusa ou impedimento dos que houver.
Não obstante, a lei faculta a postulação em juízo por pessoas que não detêm a habilitação de advogado. No entanto, para a prática de alguns atos processuais, a lei exige aptidão técnica especial do sujeito, sem o qual o ato é inválido, é o que se verifica diante de algumas limitações nos Juizados Especiais e na Justiça do Trabalho.
Por cautela, cumpre distinguir capacidade postulatória de capacidade processual, vez que esta diz respeito à capacidade de estar em juízo independentemente de assistência ou representação. Nesse sentido, Theodoro Junior adverte que:
Não se confunde a capacidade processual, que é a aptidão para ser parte, com a capacidade de postulação, que vem a ser a aptidão para realizar os atos do processo de maneira eficaz. A capacidade de postulação em nosso sistema processual compete exclusivamente aos advogados, de modo que é obrigatória a representação da parte em juízo por advogado legalmente habilitado (art.36). Trata-se de um pressuposto processual, cuja inobservância conduz à nulidade do processo. (THEODRO, 2008 p. 105).
Todavia, há exceções para se postular em juízo sem a necessidade do patrono tecnicamente habilitado. Conforme se constata no artigo 654 do Código de Processo Penal, transcrito a seguir:
Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.
Ainda, no Código de Processo Penal, o artigo 623, que trata da revisão criminal, permite ao réu, postular em juízo sem auxilio do causídico:
Art. 623. A revisão poderá ser pedida pelo próprio réu ou por procurador legalmente habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.
Também, outra exceção se verifica nas causas cíveis, com valor inferior a vinte salários mínimos, que podem ser propostas pelos próprios interessados, conforme redação do artigo 9º da Lei dos Juizados Especiais (Lei Federal n.° 9.099, de 26 de setembro de 1995), in verbis:
Art. 9. Nas causas de valor até vinte salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória.
Da mesma sorte, conquanto o art. 27 da Lei nº. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) imponha a obrigatoriedade de acompanhamento de advogado[2] em situação de violência doméstica, excepcionalmente admite que a mulher vítima de violência peça diretamente medidas de proteção contra o ofensor. É o que se verifica na redação do art. 19 esta lei:
Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
Pode-se, ainda, encontrar o jus postulandi atribuído às partes na Lei nº 5.478/68 (Lei de Alimentos), conforme dispõe seu artigo 2º:
Art. 2.º O credor, pessoalmente, ou por intermédio de advogado, dirigir-se-á ao juiz competente, qualificando-se, e exporá suas necessidades, provando, apenas, o parentesco ou a obrigação de alimentar o devedor, indicando seu nome e sobrenome, residência ou local de trabalho, profissão e naturalidade, quanto ganha aproximadamente ou os recursos de que dispõe.
Por fim, na Consolidação das Leis do Trabalho, foi introduzida a possibilidade das partes atuarem perante o Poder Judiciário do Trabalho sem o patrocínio de um advogado, consagrando-se, também, nessa justiça especializada, o instituto do jus postulandi.
Desta maneira, a regra, para validade da relação processual, é a representação por advogado. Esse poder é conferido ao advogado em razão do firmamento de um mandato procuratório. Ora, a redação de petições, a inquirição de testemunhas, a elaboração de defesas, o despacho com o juiz, o modo de colocações dos problemas, exigem pessoa habilitada, sem o quê, muitas seriam as dificuldades a advir, perturbando o andamento do processo.
Logo, ressalvadas as exceções previstas em lei, somente o causídico é capaz de postular, após estar devidamente constituído, em juízo. A ele foi atribuída à capacidade postulatória, estando expresso na constituição a imprescindibilidade de sua presença, conforme retroexplicitado.
3.3 O jus postulandi na Justiça do Trabalho
A Justiça do Trabalho é, seguramente, conforme assevera Silestrin (2004 e p.1), “a mais próxima do povo”. O Jus Postulandi surgiu como elemento facilitador do acesso do trabalhador ao órgão estatal responsável pela proteção de seus direitos trabalhistas, visto que sempre foi a parte mais frágil na relação jurídica laboral.
O artigo 791 da CLT consagra o jus postulandi na Justiça do Trabalho, nos seguintes termos:
Art. 791. Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final.
Ainda, o art. 839 do texto consolidado, observa-se a faculdade ao jurisdicionado, de deduzir suas pretensões pessoalmente ou através de representantes:
Art. 839. A reclamação poderá ser apresentada: a) pelos empregados e empregadores, pessoalmente, ou por seus representantes, e pelos sindicatos de classe.
De acordo com Saraiva (2008, p. 40), “em função do jus postulandi, reclamante e reclamado poderão atuar sem a presença de advogados em todas as instâncias trabalhistas, mesmo nos tribunais regionais e no Tribunal Superior do Trabalho”.
No mesmo sentido, preleciona Leite (2007, p. 374),
O ius postulandi nada mais é do que a capacidade de postular em juízo. Daí chamar-se, também de capacidade postulatória, que é a capacidade reconhecida pelo ordenamento jurídico para a pessoa praticar pessoalmente, diretamente atos processuais.
Nesta ótica, aduz o douto Martins (2004, p.196), “no processo do trabalho, as partes (tanto empregador como empregado) podem ingressar em juízo independentemente de patrocínio de advogado”.
Importante frisar que o ius postulandi foi criado como forma de solucionar o problema do acesso à Justiça, da população. Logo, a parte pode apresentar sua reclamação trabalhista por escrito, ou de forma verbal, conforme autorizado pelo art. 840 consolidado.[3]
Todavia, a Justiça Trabalhista contemporânea, semelhantemente aos demais órgãos judiciários, é dotada de ritos, procedimentos, formalismos e solenidades que a tornaram técnica e complexa. Desta maneira, a Súmula n.º 425 do TST limita a capacidade postulatória, ao determinar que:
o jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho.
Assim, com a finalidade de melhor operacionalizar o ius postulandi para as reclamações verbais, alguns Tribunais Regionais do Trabalho instituíram setores nos foros, denominados "atermação", onde o reclamante expõe os motivos do seu pleito, que é transformado em termo circunstanciado, o qual servirá como petição inicial da reclamatória.
Cabe frisar que quando o jurisdicionado busca os serviços prestados pelo setor de atermação, é orientado, sobre as vantagens de contar com o patrocínio de um profissional tecnicamente habilitado, ou seja, um advogado. Os servidores procedem a uma análise dos fatos e, caso o objeto da reclamação consista em uma demanda de natureza simples, quase sempre de rito sumaríssimo, a parte pode optar por ter sua reclamação reduzida a termo, e este será lavrado.
Todavia, nas demandas em que os servidores observarem que a matéria versada na reclamatória é de maior complexidade, a exemplo de produção de prova pericial ou defesa de teses mais elaboradas, recomendarão o ajuizamento desta por intermédio de advogado.
Saliente-se que a Súmula n.º 425 do TST limita a capacidade postulatória, ao determinar que:
o jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho.
Observa-se, portanto, que inicialmente as partes formulavam verbalmente sua postulação através do Distribuidor que reduzia a termo o pleito, ou seja, face à simplicidade do sistema processual, as partes tinham o direito de postular e acompanhar pessoalmente a causa até o final, caracterizado pela oralidade, informalidade e gratuidade.
Contudo, a Justiça Trabalhista contemporânea, semelhantemente aos demais órgãos judiciários, é dotada de ritos, procedimentos, formalismos e solenidades que a tornaram técnica e complexa, a exemplo de diversos institutos adotados no Judiciário Brasileiro, como: a tutela antecipada, habeas corpus, mandado de segurança, ação rescisória, recurso adesivo, agravo de instrumento, embargos de declaração, embargos infringentes, ação de consignação em pagamento, ação cominatória, ação revisional, requisito de transcendência no recurso de revista, dentre outros.
Logo, diante de todas essas inovações, é irracional que o trabalhador postule na Justiça Laborativa sem o devido assistente, vez que ele não terá capacidade técnica para tal. Importe destacar que até mesmo os profissionais mais competentes e experientes, em dadas situações de maior complexidade, sentem dificuldades diante de tantas formalidades e normas técnicas.
Assim, verifica-se que existem divergências com relação ao cabimento do jus postulandi nas instâncias da Justiça do Trabalho. Ora, o texto legal do art. 791 da CLT, permite que empregados e empregadores acompanhem pessoalmente suas reclamações até o final. Entretanto, esse não é o entendimento que prevalece no Colendo Tribunal Superior do Trabalho. A jurisprudência é pacifica ao entender que o ius postulandi na justiça do trabalho é limitada, não podendo a parte alcançar certas instancias sem a presença do advogado, conforme se vê nos recentes julgados:
AGRAVO REGIMENTAL. JUS POSTULANDI . ALCANCE. RECURSO DE COMPETÊNCIA DO TST. ATO PRIVATIVO DE ADVOGADO. SÚMULA Nº 425 DO TST. INCIDÊNCIA.A constituição de advogado para a representação em Tribunais Superiores revela-se imperiosa, mormente em face do acuro técnico que a postulação perante estas Cortes demanda. Intenta-se com isso proteger o interesse do próprio jurisdicionado que, por desconhecer os meandros da sistemática processual pátria, acaba por ingressar com ações ou recursos manifestamente incabíveis ou desfundamentados, em detrimento da satisfação de direitos que eventualmente possam lhe assistir. Assim, o instituto do jus postulandi na Justiça do Trabalho não alcança recurso de competência do Tribunal Superior do Trabalho, tratando-se, portanto, de ato privativo de advogado. Inteligência da Súmula nº 425 do TST. Agravo regimental não conhecido. (AgR-ED-ADIV 1787966742007500 1787966-74.2007.5.00.0000, Publicado em 17/06/2011)
JUS POSTULANDI. RECURSO. ATO PRIVATIVO DE ADVOGADO.Conforme já decidiu a egrégia SBDI-1 desta Corte, o ato de interpor recurso é privativo de advogado, nos termos do artigo 1º da Lei nº 8.906/94. Assim, o jus postulandi reconhecido na Justiça do Trabalho não confere à própria parte a capacidade para a prática do ato, salvo se tratar de profissional do direito devidamente habilitado atuando em causa própria, o que não é a hipótese dos autos. (Recurso Ordinario em Acao Rescisoria Roar 694236 694236/2000.2 (tst, Publicado em 14/11/2003.)
Desta maneira, percebe-se que a capacidade postulatória não é plena, e a própria justiça brasileira reconhece a indispensabilidade do causídico em demandas judiciais, uma vez que irá ocorrer um desequilíbrio entre partes ferindo princípios fundamentais do processo como a ampla defesa e o contraditório.
A capacidade postulatória das partes na Justiça do Trabalho é ranço pernicioso originário da fase administrativa e que ainda hoje persiste em total discrepância com a realidade atual. O Direito do Trabalho constitui hoje, seguramente, um dos mais, senão o mais, dinâmico dentro do ramo do Direito e a presença do advogado especializado já se faz necessária. (...)
Pretender que leigos penetrem nos meandros do processo, que peticionem que narrem fatos sem transformar a lide em desabafo pessoal, que cumpram prazos, que recorram corretamente, são exigências que não mais se afinam com a complexidade processual, onde o próprio especialista, por vezes, tem dúvidas quanto à medida cabível em determinados momentos. E é a esse mesmo leigo a quem, em tese, é permitido formular perguntas em audiência, fazer sustentação oral de seus recursos perante os tribunais. Na prática, felizmente, a ausência do advogado constitui exceção e ao leigo não se permite fazer perguntas em audiência mesmo porque sequer saberia o que perguntar. (OLIVEIRA, 1999, p. 6 apud SILVA, 2010, p.3).
Portanto, não obstante da permissibilidade que o jurisdicionado brasileiro proporciona em razão do principio de acesso à justiça e garantida de direitos a todos, esta irá consequentemente ferir ouros princípios fundamentais jurídicos já citados outrora, acarretando em uma garantia frágil e proporcionado na verdade uma jurisdição processual contenciosa.