O direito fundamental ao planejamento familiar e a Lei nº 9.263, de janeiro de 1996

Resumo:


  • O planejamento familiar é fundamental para a estruturação da sociedade e reflete no desenvolvimento do país, sendo um direito assegurado constitucionalmente e um aspecto essencial da saúde reprodutiva.

  • A Lei nº 9.263/96 regulamenta o planejamento familiar no Brasil, abordando métodos conceptivos e contraceptivos, assistência estatal, participação do setor privado e sanções, mas apresenta lacunas normativas que demandam atenção e regulamentação mais detalhada.

  • O Sistema Único de Saúde (SUS) tem o dever de promover o planejamento familiar, conforme estabelecido pela Constituição Federal e a legislação infraconstitucional, incluindo ações e programas específicos desenvolvidos pelo Ministério da Saúde.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O presente estudo tem como objetivo principal a análise do planejamento familiar e da Lei nº 9.263 de 13 de janeiro de 1996, lei ordinária que se destina a tratar do tema no Brasil.

1    INTRODUÇÃO

O núcleo familiar é objeto de muita proteção no Brasil, seja por parte da sociedade, seja por parte dos legisladores – que fazem refletir o pensamento social nas leis – e até das religiões, sobretudo a que tem o maior número de adeptos no país: o catolicismo. Os pensamentos são convergentes no sentido de que a base da sociedade é a família e, assim, é dever de todos zelar por ela.

Dentre os cuidados que se deve ter com a família está o planejamento familiar, que é o controle que as pessoas devem ter sobre a sua fecundidade e saúde reprodutiva. Sobre isso, temos, basicamente, dois aspectos: o controle sobre a concepção e a contracepção. Além disso, a conscientização das pessoas é um elemento de suma importância para que o planejamento familiar atinja a sua finalidade: formação de famílias de forma responsável, pensada, desejada.

Este trabalho científico tem como objetivo fazer uma análise detalhada e crítica da Lei 9.263/96, que trata do planejamento familiar no Brasil, e das nuances que nela constam. Para melhor compreensão, primeiramente será necessária a observação do posicionamento do organismo internacional que mais atua em relação a este assunto: a Organização das Nações Unidas (ONU). Também se faz imprescindível a análise (ainda que breve) do cenário mundial e, após, a colocação do tema no ordenamento jurídico, passando pelo âmbito constitucional, legislação infraconstitucional e até pelas Resoluções do Conselho Federal de Medicina.

Outrossim, serão vistos minuciosamente os métodos conceptivos e contraceptivos. Quanto à concepção, o alvo das atenções gira em torno da viabilização para que a gravidez aconteça, utilizando-se de métodos de reprodução humana assistida, como a inseminação artificial e a fertilização in vitro, tanto homóloga como heteróloga. Já a contracepção está no sentido diametralmente oposto: consistem em proporcionar à população métodos que evitem a gestação, a exemplo da esterilização voluntária (técnica que o legislador mais cuidou ao regulamentar na Lei 9.263/96). Ressalte-se que a mencionada disseminação dos métodos anticoncepcionais no Brasil visa apenas auxiliar na decisão das pessoas que assim deliberarem, não tendo qualquer intenção de controlar a natalidade no país, o quê, inclusive, é expressamente vedado pelo ordenamento. Também serão trabalhadas algumas das polêmicas que rodeiam a temática, motivadas pela falta de normas mais detalhadas e esclarecedoras.

Finalmente, será abordado o papel do Estado – que atua através do Sistema Único de Saúde (SUS) em matéria de saúde – na questão do planejamento familiar e, consequentemente, na promoção, proteção e recuperação da saúde (reprodutiva, no caso). Explorar-se-á a estrutura do SUS da composição à forma de custeio, do regime de pessoa às competências e atribuições, além de suas aparições na Lei 9.263/96 para que, assim, se facilite o entendimento e a importância desta cooperativa entre entes federativos no planejamento familiar brasileiro. E, ainda, procurar-se-á enfrentar a problemática entre o suposto direito subjetivo ao planejamento familiar, o mínimo existencial e a reserva do possível, fazendo uma passagem pela jurisprudência pátria a fim observar o que tem sido de entendimento nos Tribunais.

A pesquisa se justifica pela importância do próprio tema, que permeia os mais diversos campos: legal, social, religioso, dentre outros. É fundamental que o direito ao planejamento familiar seja discutido, posto que ainda carece de regulamentações mais específicas. Acredita-se que, alguma maneira, os estudos sobre o assunto devem chamar a atenção sobre as referidas carências e fomentar a produção de normas que, como já mencionado, detalhe e esclareça melhor sobre o planejamento familiar.

O presente trabalho científico está dividido em três capítulos de desenvolvimento, sendo o primeiro sobre o planejamento familiar, o segundo sobre os métodos conceptivos e contraceptivos e, por fim, o terceiro sobre as obrigações do Poder Público perante a sociedade. Estes estão subdivididos em seções por questões didáticas, para que o tema seja exposto de forma mais clara e organizada.

2    PLANEJAMENTO FAMILIAR

2.1    O TEMA NA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU)

Inicialmente, faz-se necessária a conceituação: a ONU é uma organização intergovenamental com adesão atual de 192 países, que se propõe a promover a paz, segurança e eficácia dos Direitos Humanos já reconhecidos por estes (BORGES, 2011). Inegavelmente, um dos referidos direitos é justo o planejamento familiar. Por isso, são diversos os documentos existentes em que as Nações Unidas trabalham a questão, nos mais diferentes aspectos. Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos trouxe no seu artigo XXV, nº 2, que “a maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais”, evidenciando a proteção do direito à maternidade.

Na Conferência de Direitos Humanos das Nações Unidas, realizada na cidade de Teerã em 13 de maio de 1968, o planejamento familiar foi novamente tocado pela ONU ao ser dito no nº 16 deste documento que: “a comunidade internacional deve continuar velando pela família e pelas crianças. Os pais têm o direito humano fundamental de determinar livremente o número de filhos e seus intervalos de nascimento”. Importante destacar a semelhança do disposto retro com o art. 226 da Constituição Federal (que estudaremos mais adiante).

Em 1974, na Conferência Mundial de População acontecida na capital da Romênia, Bucareste, foi reconhecido o direito fundamental dos indivíduos e casais ao planejamento familiar. Na mesma oportunidade, foram traçadas políticas de apoio e formas de implementação do Plano de Ação de Bucareste.

Após dez anos, na Conferência do México, dentre os pontos debatidos estava a capacidade das mulheres em controlarem e se responsabilizarem por suas vidas reprodutivas e a relevância de promoção pelo Estado de difusão do conhecimento sobre planejamento familiar à população (ALVES, 2001, p. 154).

Na Conferência Mundial sobre População e Desenvolvimento, realizada na cidade de Cairo (Egito) em 1994, uns dos temas mais discutidos foram: o direito reprodutivo, o planejamento familiar e a importância disto para a erradicação da pobreza e desenvolvimento dos países.

Já na IV Conferência Internacional sobre a Mulher, que aconteceu na cidade de Pequim, China, no ano de 1995, o planejamento familiar se mostrou na abordagem sobre o aborto e saúde reprodutiva da mulher.

Atualmente, três divisões ligadas à ONU realizam trabalho de pesquisa a fim de auxiliar nas questões de planejamento familiar: a UNFPA (United Nations Population Fund ou, em português, Fundo de População das Nações Unidas), a Divisão da População e a Divisão de Estatísticas. A ONU tem como uma de suas metas o acesso universal à saúde reprodutiva e é a Divisão da População a responsável por busca os índices de taxa de prevalência contraceptiva, de natalidade entre adolescentes e a necessidade de planejamento familiar – esta juntamente com o UNFPA. Já a UNFPA tem três áreas de atuação prevalecentes: saúde reprodutiva; igualdade de gênero; e população e desenvolvimento (ONU, 2011).

2.2    BREVE ESBOÇO NO DIREITO ESTRANGEIRO

Consideramos importante fazer um panorama do planejamento familiar no mundo, aproveitando para entender como o Brasil se coloca diante do cenário universal. Dois países, em especial, se destacam nesta temática: China e França. Um dos motivos é o fato dos governos posicionarem-se antagonicamente sobre a questão: de acordo com a classificação feita por José Augusto Lindgren Alves (2001, p. 152), o primeiro é “controlista” e o segundo é “natalista”.

A China é o país mais populoso do mundo. De acordo com o censo de 2000, o planeta Terra já contava naquele ano com 1,2 bilhões de chineses. Desde a década de 1970, baseado nestes índices e alegando dificuldades de manter acesso à saúde e à educação de qualidade, o Estado chinês implantou a “política do filho único”. Tal política consiste na proibição aos casais de terem mais de um filho, sob pena de punições. Por isso, é considerado um país “controlista”, intervencionista; lá, não é possível que as pessoas deliberem livremente sobre a quantidade de filhos que terão.

De outro lado, temos a França, que é tido como um país “natalista” por promover programas de incentivo à natalidade (sem qualquer atuação invasiva frente a decisão do seu povo). Os índices deste país são diferentes dos chineses: são 65,4 milhões de franceses no mundo, sendo que o crescimento populacional é de 0,49% ao ano e 20% da população já tem mais de 60 anos, comprometendo, inclusive, a economia do país no que tange ao sustento da aposentadoria pelos jovens. Assim, o governo francês oferece inúmeros benefícios a casais que têm três ou mais filhos.

Com isso, percebe-se que a política adotada pelos países no que toca ao planejamento familiar dependerá de questões econômicas e sociais. Ou seja, quanto maior a população e o crescimento populacional, menor o incentivo à natalidade e vice-versa.

Ao tomar como referência a China e a França, nota-se que o Brasil se encontra numa posição híbrida: o governo não intervém no planejamento familiar, sendo de livre escolha das pessoas e casais deliberar sobre a quantidade de filhos que terão, mas também não promove qualquer tipo de campanha pró-natalidade, incentivando o aumento da prole nas famílias. De acordo com o censo demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010, a população brasileira atual é de 190.732.694 de habitantes.

A título de informação complementar, vale mencionar que no dia 31 de outubro de 2011 o mundo chegou à marca de sete bilhões de habitantes. O tempo entre um bilhão e outro de novas pessoas no planeta vem diminuindo e, por isso, o novo marco causa preocupação às grandes entidades mundiais, a exemplo da ONU (2011):

O rápido aumento da população expõe problemas como o crime transnacional, a interdependência econômica, mudanças climáticas, a disseminação de doenças como HIV/AIDS e outras pandemias, e assuntos sociais como igualdade de gêneros, saúde reprodutiva, maternidade segura, direitos humanos, situações de emergência, e outras.

Outro motivo de preocupação se deve também ao fato de que a maior parte desses novos bebês nasce em países africanos subdesenvolvidos e com altos índices de miserabilidade (ONYANGO-OBBO, 2011).

Fabrício Collares Rosas (2005, p. 449) endossa:

Não se pode negligenciar que o futuro da humanidade está ameaçado pelo rápido crescimento demográfico, que carrega consigo sérios problemas com relação à alimentação, ao meio ambiente e recursos disponíveis, bem como múltiplos desajustes de natureza socioeconômica.

[...]

O planeta está se tornando cada vez mais quente, com o meio ambiente contaminado e poluído, instável em termos políticos e sociais e superpopuloso. A menos que medidas adequadas para a recuperação sejam tomadas rapidamente, nossos filhos e netos herdarão um planeta com graves danos ambientais e irreversivelmente empobrecido.

Para que o problema seja resolvido sem maiores transtornos para toda a população mundial, a ONU apresenta a sustentabilidade como meio possível de driblar a escassez de água e alimentos que já se vislumbra e alerta que, para que haja efetividade, os Estados soberanos devem aderir à ideia (CHESTNEY, 2012).

2.3    DIREITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL

2.3.1    Definição e casos excepcionais de restrição

Os direitos fundamentais são aqueles intrínsecos ao ser humano e à coletividade. José Afonso da Silva (2009, p. 178) expõe em sua obra a definição dos direitos fundamentais ao mesmo passo que destaca a sua importância no ordenamento jurídico e para as pessoas, bem como para a boa convivência entre elas:

Direitos fundamentais do homem constitui a expressão mais adequada a este estudo, porque, além de referir-se a princípios que resumem a concepção do mundo e informam a ideologia política de cada ordenamento jurídico, é reservada para designar, no nível do direito positivo, aquelas prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas. No qualificativo fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados. Do homem, não como macho da espécie, mas no sentido de pessoa humana. Direitos fundamentais do homem significa direitos fundamentais da pessoa humana ou direitos fundamentais. (grifos no original)

Nada pode ser oposto a estes direitos, bem como eles não podem ser restringidos pelo Estado. São direitos postestativos, incontestáveis. O único limite que o direito fundamental encontra é o direito fundamental de outrem. Excepcionalmente, poderá haver supressão ou restrição temporária destes direitos, de acordo com as hipóteses previstas na Constituição Federal, por exemplo, estado de defesa (art. 136, §1º, I) e estado de sítio (arts. 137 e 139), a ver:

Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

§ 1º. O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:

I – restrições aos direitos de:

a) reunião, ainda que exercida no seio das associações;

b) sigilo de correspondência;

c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica; (grifos nossos)

Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:

I – comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;

II – declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.

Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta. (grifos nossos)

Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no artigo 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:

I – obrigação de permanência em localidade determinada;

II – detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;

III – restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;

IV – suspensão da liberdade de reunião;

V – busca e apreensão em domicílio;

VI – intervenção nas empresas de serviços públicos;

VII – requisição de bens. (grifos nossos)

Assim, pode-se perceber que, em caráter excepcionalíssimo, alguns dos direitos fundamentais previstos no art. 5º, a exemplo do direito à liberdade, à inviolabilidade de domicílio e à reunião, poderão ser suprimidos temporariamente em prol de um bem maior, como a segurança e o bem-estar social de toda a sociedade.

2.3.2    Localização, características e classificação

No ordenamento jurídico brasileiro, pode-se notar que os direitos fundamentais permeiam toda a Constituição Federal de 1988. Eles podem aparecer através de normas expressas ou princípios e estão, na sua maioria, no Título II (“Dos Direitos e Garantias Fundamentais”). É possível encontrá-los também em tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil seja signatário (art. 5º, § 2º).

A doutrina pátria diverge sobre o rol de caracteres dos direitos fundamentais. Então, a fim de buscar uma informação mais completa, serão listados todos aqueles considerados pela maioria dos autores, como José Afonso da Silva (2009, p. 180-182), Vicente Paulo (2004, p. 56-57) e Pedro Lenza (2011, p. 864-865). São eles: historicidade, universalidade, concorrência, limitabilidade, inalienabilidade, imprescritibilidade, irrenunciabilidade, inviolabilidade, efetividade, interdependência e complementariedade. Sobre a irrenunciabilidade, cumpre ressaltar que o STF admite a renúncia de direito fundamental diante de um caso concreto (PAULO, 2004, p. 61) e, como exemplo, pode-se citar o direito à herança (art. 5º, XXX).

Quanto à classificação, encontramos na doutrina igual divergência, mas será reverenciada neste trabalho a que tem maior recorrência nas obras. A classificação apresenta cinco grupos de direitos fundamentais e baseia-se na separação feita pela própria CF/88 no mencionado Título II, qual seja: (a) Capítulo I – Dos direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5º); (b) Capítulo II – Dos direitos sociais (arts. 6º a 11); (c) Capítulo III – Da nacionalidade (arts. 12 e 13); (d) Capítulo IV – Dos direitos políticos (arts. 14 a 16); e (d) Capítulo V – Dos partidos políticos (art. 17).

2.3.2    Dimensões (ou gerações)

Os direitos fundamentais foram sendo alcançados gradativamente ao longo da história da humanidade, diante da “necessidade de limitação e controle dos abusos do poder do próprio Estado” (PAULO, 2004, p. 55). Muito embora eles se complementem, são divididos didaticamente pela doutrina em dimensões (ou gerações). A primeira, segunda e terceira dimensões se confundem com os lemas da Revolução Francesa (1789): liberdade, igualdade e fraternidade, respectivamente.

Na primeira, foi conquistada a liberdade individual (direitos civis e políticos) em detrimento do intervencionismo estatal. De acordo com Pedro Lenza (2011, p. 860), seis documentos históricos ilustram isto: Magna Carta (1215), Paz de Westfália (1648), Habeas Corpus Act (1679), Bill of Rights (1688), Declaração americana (1776) e Declaração francesa (1789).

A segunda dimensão, que representa a igualdade, foi marcada pelos direitos sociais, culturais, econômicos. Diferente da primeira geração, estes impõem ao Estado conduta positiva, para que ele cuide do bem-estar da coletividade, promova ações para garantir-lhes a condição de igualdade, etc. Aqui Pedro Lenza (2011, p. 861), destaca os seguintes documentos: Constituição do México (1917), Constituição de Weimar (1919), Tratado de Versalhes (1919).

O direito de fraternidade, que está posto na terceira dimensão, revela o cuidado com o indivíduo e sua posição na sociedade, com melhor relacionamento e convivência entre as pessoas. Encontra-se nesta geração os direitos de desenvolvimento, meio ambiente, consumidor, propriedade, comunicação, dentre outros.

Na quarta dimensão, têm-se duas opiniões divergentes, ambas de notáveis juristas: Noberto Bobbio e Paulo Bonavides (citados por Pedro Lenza (2011, p. 862). De um lado, Bobbio põe nesta geração os direitos oriundos da engenharia genética, das alterações provocadas por ela no patrimônio genético. De outro, Bonavides coloca a difusão dos direitos fundamentais, a globalização e universalização deles, que trazem como conseqüência a democracia, a informação e o pluralismo.

Por fim, a quinta dimensão é sustentada por Paulo Bonavides. O jurista defende que “o direito à paz deva ser tratado em dimensão autônoma, chegando a afirmar que a paz é axioma da democracia participativa, ou, ainda, supremo direito da humanidade” (BONAVIDES apud LENZA 2011, p. 863).

2.3.4    Garantias dos direitos fundamentais

As normas declaratórias de direitos os reconhecem e dão ciência a todos de sua existência, mas será apenas através das garantias (normas assecuratórias) que eles serão efetivamente respeitados e cumpridos. José Afonso da Silva (2009, p. 188) chama a atenção para a divisão das garantias dos direitos fundamentais: gerais – que viabilizam a própria existência de direitos fundamentais em um Estado soberano por estabelecerem o Estado Democrático de Direito – e as constitucionais que, nas palavras do jurista, “consistem nas instituições, determinações e procedimentos mediante os quais a própria Constituição tutela a observância ou, em caso de inobservância, a reintegração dos direitos fundamentais”.

O doutrinador alerta, ainda, para a subdivisão das garantias constitucionais:

São, por seu lado, de dois tipos: (a) garantias constitucionais gerais, que são instituições constitucionais que se inserem no mecanismo de freios e contrapesos dos poderes e, assim, impedem o arbítrio com o que constituem, ao mesmo tempo, técnicas de garantia e respeito aos direitos fundamentais; são garantias gerais precisamente porque consubstanciam salvaguardas de um regime de respeito à pessoa humana em toda a sua dimensão; (b) garantias constitucionais especiais, que são prescrições constitucionais estatuindo técnicas e mecanismos que, limitando a atuação dos órgãos estatais ou de particulares, protegem a eficácia, a aplicabilidade e a inviolabilidade dos direitos fundamentais de modo especial; são técnicas preordenadas com o objetivo de assegurar a observância desses direitos considerados em sua manifestação isolada ou em grupos.

Assim, conclui-se que a garantia é o meio pelo qual o direito fundamental se faz ser respeitado e cumprido (vertente preventiva) ou restabelecidos (vertente repressiva). Note-se que os famosos remédios constitucionais, como desdobramentos da garantia constitucional, são vias adequadas para proteger um direito sob ameaça de violação, bem como para reprimir o direito já violado.

2.4    DIREITO FUNDAMENTAL AO PLANEJAMENTO FAMILIAR

Dentre os direitos fundamentais, destaca-se aquele que é tema da presente pesquisa científica: o planejamento familiar. E, devido à sua importância, será detalhado nas seções que se seguem.

2.4.1    Conceito e finalidade

De acordo com o art. 2º da Lei nº 9.263/96 – lei ordinária destinada a cuidar do tema –, planejamento familiar é “o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal”. Ou seja, é o direito à reprodução, à saúde reprodutiva e ao controle da fecundidade. O direito ao planejamento familiar está intimamente ligado também ao direito à maternidade, à paternidade responsável, à descendência e à filiação.

No Portal da Saúde, sítio mantido pelo governo brasileiro na internet, o planejamento familiar está claramente definido:

Planejamento familiar é o direito que toda pessoa tem à informação, à assistência especializada e ao acesso aos recursos que permitam optar livre e conscientemente por ter ou não ter filhos. O número, o espaçamento entre eles e a escolha do método anticoncepcional mais adequado são opções que toda mulher deve ter o direito de escolher de forma livre e por meio da informação, sem discriminação, coerção ou violência.

O Ministério da Saúde, na obra que elaborou juntamente com o Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (O SUS de A a Z, 2009, p. 242) acrescenta que “planejar é, fundamentalmente, avaliar o passado, sondar o futuro, tomar decisões e prometer fazer”.

A finalidade do planejamento familiar, como o próprio nome diz, é tornar a decisão de constituir família uma atitude pensada, desejada, feita de forma responsável, bem compreendida e assumida através da difusão de conhecimento e informação à população sobre métodos conceptivos e contraceptivos. É mister que as pessoas que querem formar um núcleo estejam conscientes da sua postura e preparadas para receberem filhos, tanto econômica quanto psicologicamente, de forma a propiciar um ambiente sadio e equilibrado para a sua prole (DINIZ, 2007, p. 132).

2.4.2    Âmbito constitucional

A principal norma sobre o tema encontra-se na Constituição Federal de 1988, que reconheceu o direito fundamental ao planejamento familiar, consagrando-o no seu art. 226, §7º:

Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

O professor Carlos Roberto Gonçalves (2007, p. 17) teceu, em sua obra, comentários à atenção com que o direito ao planejamento familiar foi tratado com na Constituição Federal de 1988:

No tocante ao planejamento familiar, o constituinte enfrentou o problema da limitação da natalidade, fundando-se nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, proclamando competir ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito. Não desconsiderando o crescimento populacional desordenado, entendeu, todavia, que cabe ao casal a escolha dos critérios e dos modos de agir, “vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais e particulares”.

O princípio da dignidade da pessoa humana a que se refere o parágrafo 7º está explícito no art. 1º, III da CF, como sendo também um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Este princípio se propõe a delimitar o mínimo necessário à vida das pessoas para que elas tenham uma vida digna. É possível concluir, então, que o planejamento familiar foi posto pelo constituinte no patamar de necessidade humana básica, essencial.

Além deste dispositivo principal sobre o planejamento familiar, a Constituição traz alguns outros, o que deixa evidente a importância que a Assembléia Constituinte deu para proteção à família, a ver os seguintes trechos:

Art. 5º, L – às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação; (grifos nossos)

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (grifos nossos)

Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XVIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias;

XIX – licença-paternidade, nos termos fixados em lei; (grifos nossos)

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:

[...]

II – proteção à maternidade, especialmente à gestante; (grifos nossos)

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; (grifos nossos)

Merece destaque o art. 5º, inciso L. Quanto à presa, foi reconhecido à mãe o direito de continuar convivendo com seus filhos por se entender que afastá-los caracterizaria uma punição não prevista no nosso ordenamento. Aliás, o distanciamento somente acarretaria danos físicos e psicológicos tanto para a mãe como para a criança. O raciocínio é que a relação a ser corrigida é entre a mulher-criminosa e a sociedade e não a relação da mulher-mãe com a família. Neste ponto, é justo que ela tenha os mesmos direitos de qualquer mãe. Além disso, pesquisas científicas já comprovaram a importância do leite materno no desenvolvimento da criança, o que justifica o lapso temporal escolhido pelo constituinte (“durante o período de amamentação”).

Note-se que três dos artigos citados retro tangem ao Direito Previdenciário. O afastamento decorrente do nascimento da prole ao qual se referem os incisos XVIII e XIX do art. 7º da CF/88 caracterizam-se interrupção do contrato de trabalho, posto que os empregados continuarão percebendo normalmente seus salários. Quanto às mães, os mencionados salários serão pagos pela Previdência Social – às seguradas – e não pelo empregador, nas condições dos art. 71 e seguintes da Lei nº 8.213/91. Às mães não seguradas a prestação será feita pela Assistência Social (art. 203, I da CF). Já a licença-paternidade do art. 7º, XIX, com duração de cinco dias, é arcada pelo próprio empregador. Importante dizer que as mesmas regras se aplicam em caso de adoção, uma reverência ao princípio de não discriminação entre os filhos (art. 227, §6º da CF).

                    

2.4.3    Legislação infraconstitucional

O planejamento familiar também está presente na legislação infraconstitucional brasileira. O legislador se preocupou em tratar do tema, regulamentando e complementando o que está disposto na Carta Magna.

No art. 1.565, § 2º do Código Civil está posto que “o planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas”. Isto reforça o que já foi dito pelo §7º do art. 226 da CF, reafirma que o direito à reprodução deve ser livremente deliberado pelas pessoas e casais, sendo incumbido ao Estado apoiar, em sentido amplo, a viabilização deste direito.

Já a Lei nº 11.770/08 criou o Programa Empresa Cidadã com o objetivo de facultar a prorrogação da licença-maternidade prevista no mencionado inciso XVIII do art. 7º, por mais 60 dias nas instituições públicas e privadas. Estas, em contrapartida, recebem incentivo fiscal. Logo, havendo adesão, além dos 120 (cento e vinte) dias constitucionalmente assegurados, a mulher terá mais 60 (sessenta), totalizando 180 (cento e oitenta) dias. A iniciativa se baseou em pesquisas científicas que comprovaram a importância do aleitamento materno até o 6º (sexto) mês de vida da criança (PASSANHA et al., 2008). Em contrapartida, ficará proibido à empregada exercer outra atividade ou colocar a criança em creche durante o período da licença (art. 4º da Lei), imposição que visa o evitar o desvio de finalidade do instituto.

Outrossim, a Lei nº 9.656/98, alterada pela Lei nº 11.935/09, passou a prever no seu art. 35-C, inciso III, a cobertura obrigatória pelos planos de saúde de atendimento nos casos de planejamento familiar, inclusive de acesso a métodos conceptivos, como tratamento hormonal e reprodução assistida – inseminação artificial e fertilização in vitro – (ABDELMASSIH, 2000). Em agosto de 2011, a ANS (Agência Nacional de Saúde) atualizou o rol de procedimentos e eventos que constitui a referência básica para cobertura assistencial mínima nos planos privados de assistência à saúde através da Resolução Normativa nº 262, inclusive no que toca à “cobertura das ações de planejamento familiar” (art. 17, VII). Agora constam no Anexo I da RN nº 262 a obrigatoriedade dos planos em prestar atividade educacional e consulta de aconselhamento para planejamento familiar.

Outra lei que tange à temática é a Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84). A LEP reverencia o princípio da dignidade da pessoa humana e, zelando pela proteção à família e à maternidade, dispõe o seguinte:

Art. 14, § 3º.  Será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido.

Art. 83, § 2º.  Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade.

Note-se que estes artigos complementam a ideia do art. 5º, L da CF/88 e que este prazo de 6 (seis) meses para amamentação do art. 83, §2º se assemelha aos 180 (cento e oitenta) dias promovidos pelo já mencionado Programa Empresa Cidadã (Lei 11.770/08), posto que o objetivo é o mesmo.

Por fim, temos a Lei nº 9.263/96, que regula diretamente o art. 226, §7º da Constituição Federal e é o objeto específico de estudo nesta pesquisa científica. Esta lei ordinária trata do planejamento familiar em si, conceituando-o, atribuindo competências, arrolando seus diversos meios de aumento e limitação da prole, vedações, sanções penais e administrativas. A Lei nº 9.263/96 é bastante pragmática ao trazer logo no seu art. 1º que o planejamento é um “direito de todo cidadão”.                    

2.4.4    Resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM)

É válido destacar, ainda, as Resoluções editadas pelo Conselho Federal de Medicina. Importante dizer que o CFM integra a Administração Indireta sob a denominação de “conselhos de classe” ou “autarquia profissional”. O seu reconhecimento como autarquia veio através da Lei nº 3.268/57, que foi alterada posteriormente pela Lei nº 11.000/04; e sua aprovação foi feita pelo Decreto nº 44.045/58, alterado pelo Decreto nº 6.821/09.

O CFM editou a Resolução nº 1.957/10 – revogando a Resolução 1.358/92 –, que adotou as técnicas de reprodução assistida para solucionar os casos de infertilidade humana, considerada como um problema de implicações médicas e psicológicas, superável diante dos avanços da ciência, sempre atentos à ética.

Da mesma forma, o CFM editou a Resolução nº 1.931/09, que aprovou o Código de Ética Médica. No seu art. 15 a questão da ética nas técnicas de reprodução assistida volta a ser trabalhada no momento em que se expõem as vedações aos médicos:

Art. 15. Descumprir legislação específica nos casos de transplantes de órgãos ou de tecidos, esterilização, fecundação artificial, abortamento, manipulação ou terapia genética.

§ 1º No caso de procriação medicamente assistida, a fertilização não deve conduzir sistematicamente à ocorrência de embriões supranumerários.

§ 2º O médico não deve realizar a procriação medicamente assistida com nenhum dos seguintes objetivos:

I – criar seres humanos geneticamente modificados;

II – criar embriões para investigação;

III – criar embriões com finalidades de escolha de sexo, eugenia ou para originar híbridos ou quimeras.

§ 3º Praticar procedimento de procriação medicamente assistida sem que os participantes estejam de inteiro acordo e devidamente esclarecidos sobre o mesmo.

Com relação ao §3º, ter-se-á a oportunidade de estudar melhor adiante, quando forem analisados os aspectos legais dos métodos conceptivos e contraceptivos, a necessidade de consentimento expresso das pessoas envolvidas para a realização de reprodução humana assistida.

3    MÉTODOS CONCEPTIVOS E CONTRACEPTIVOS: O CONTROLE SOB A REPRODUÇÃO

Quando se toca ao tema de planejamento familiar, toca-se também à questão do controle que as pessoas devem ter sobre a própria vida reprodutiva, ou seja, a deliberação de ter ou não ter filhos. Isto porque há de se ter a consciência de que a decisão de gerar uma vida deve ser pensada com a importância que ela merece; deve ser planejada, querida, esperada, de forma que os pais estejam preparados para amparar seus filhos com tudo quanto necessário a lhes proporcionar uma vida digna. E esta preparação não está só ligada ao aspecto econômico-financeiro, mas também, principalmente, ao aspecto psicológico.

A assistência à concepção e contracepção está prevista no art. 3º, parágrafo único, inciso I, da Lei nº 9.263/96, devendo ser prestada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Na mesma lei, o legislador ainda dispôs sobre os métodos e técnicas que envolvem a mencionada assistência:

Art. 4º. O planejamento familiar orienta-se por ações preventivas e educativas e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade. (grifos nossos)

Art. 9º. Para o exercício do direito ao planejamento familiar, serão oferecidos todos os métodos e técnicas de concepção e contracepção cientificamente aceitos e que não coloquem em risco a vida e a saúde das pessoas, garantida a liberdade de opção. (grifos nossos)

Para que se tenha tal domínio sob a própria reprodução, hodiernamente, a ciência disponibiliza diversos métodos conceptivos (aqueles que estimulam a gestação) e contraceptivos (aqueles que evitam a gestação), quais serão detalhadamente expostos a seguir.

3.1    MÉTODOS DE CONCEPÇÃO HUMANA

Além da forma natural de reprodução (ato sexual), alcançada por casais capazes de procriar normalmente, existe uma minoria em torno de “dez a vinte por cento dos casais do mundo inteiro” (ALVARENGA, 2005, p. 229) que, por razões morfofisiológicas, não tem esta capacidade gerativa. Os médicos Fábio Firmbach Pasqualotto e Eleonora Bedin Pasqualotto, citando dados a World Health Organization (WHO) – ou Organização Mundial de Saúde –, conceituam a esterilidade da seguinte maneira (2005, p. 405):

Infertilidade é mais bem definida como a inabilidade de um casal sexualmente ativo, sem utilização de métodos contraceptivos, estabelecer gravidez dentro de um ano, período no qual por volta de 90% dos casais o fazem.

Nas palavras de Léo Meyer Coutinho (2004, p. 344), “estéril é o ser vivo que não procria, que não dá frutos, que não gera, que não pode conceber”. Na mesma oportunidade, o médico alerta que a esterilidade pode ser permanente ou transitória e que ambas se subdividem em absoluta ou relativa.

Com o desenvolvimento da ciência, estas pessoas podem contar hoje com alguns procedimentos de reprodução assistida que auxiliam na concepção e, assim, aumentam as chances da pessoa estéril alcançar o seu desejo de filiação.

A finalidade das técnicas de concepção humana, de acordo com a Resolução nº 1.957/10, Seção I, n. 1, da CFM, é “auxiliar na resolução dos problemas de reprodução humana, facilitando o processo de procriação quando outras terapêuticas tenham se revelado ineficazes ou consideradas inapropriadas”.

Assim, o principal desafio dos casais e da ciência é vencer a esterilidade, a infertilidade. Historicamente, segundo o jurista Edson Tetsuzo Namba (2009), até o século XVII a responsabilidade pela incapacidade de gerar era exclusiva da mulher. Somente depois se teve noção de que o problema de esterilidade poderia ser também do homem ou do casal.

De acordo com Raquel de Lima Leite Soares Alvarenga (2005, p. 230) as principais causas de infertilidade na mulher são: distúrbios dietéticos, anemias agudas, estados ansiosos, fobias, ausência de útero, hipoplasia uterina, disgenesia gonodal, insuficiência ou disfunção hipotálamo hipofisária, distúrbios tiroidianos, hiperplasia supra-renal, insuficiência ovariana, doença policística ovariana, hiperprolactinemias, inflamações pélvicas, tuberculose, obstrução das trompas, endometriose, miomas e pólipos, cervicites e vaginites.

Ainda segundo Raquel de Lima Leite Soares Alvarenga (2005, p. 231), a infertilidade masculina é, geralmente, causada por orquites (inflamações nos testículos), criptorquidismo, radiações, quimioterapia, toxinas (maconha, álcool, cigarro), varicocele, trauma, causas cogênitas, causas idiopáticas (sem causa aparente), tumor hipotalâmico, deficiência na secreção do hormônio liberador de gonadotrofinas, tumor da hipófise, hiperprolactinemia, hipotireoidismo, drogas (estrógenos, andrógenos, progestinas), trauma, inflamação, ereção insuficiente, anejaculação, ejaculação precoce verdadeira, hipospádias, coito em períodos não férteis, obstrução ou ausência dos vasos deferentes, ejaculação retrógrada, infecção do sêmen, anticorpos anti-espermatozóides, pseudo-hermafroditismo e espermatozóides com função prejudicada.

3.1.1    Reprodução assistida (RA)

A reprodução assistida consiste no “conjunto de técnicas que têm por escopo suprir uma limitação humana quanto à possibilidade de ter filhos” (MONTENEGRO, 2005, p. 189), ou seja, “procedimentos que se acham disponíveis atualmente para ajudar casais a conseguir uma gravidez depois que métodos mais simples falharam” (ALVARENGA, 2005, p. 232). De acordo com as necessidades de cada casal, a referida fecundação acontecerá dentro ou fora do útero – neste último caso, posteriormente haverá a transferência do embrião para a cavidade uterina; o primeiro método é denominado inseminação artificial e, o segundo, fertilização in vitro. A Resolução nº 1.957/10 da CFM, determina os critérios de submissão à RA:

As técnicas de RA podem ser utilizadas desde que exista probabilidade efetiva de sucesso e não se incorra em risco grave de saúde para a paciente ou o possível descendente. (Seção I, n. 2)

O consentimento informado será obrigatório a todos os pacientes submetidos às técnicas de reprodução assistida, inclusive aos doadores. Os aspectos médicos envolvendo as circunstâncias da aplicação de uma técnica de RA serão detalhadamente expostos, assim como os resultados obtidos naquela unidade de tratamento com a técnica proposta. As informações devem também atingir dados de caráter biológico, jurídico, ético e econômico. O documento de consentimento informado será expresso em formulário especial e estará completo com a concordância, por escrito, das pessoas submetidas às técnicas de reprodução assistida. (Seção I, n. 3)

Todas as pessoas capazes, que tenham solicitado o procedimento e cuja indicação não se afaste dos limites desta resolução, podem ser receptoras das técnicas de RA desde que os participantes estejam de inteiro acordo e devidamente esclarecidos sobre o mesmo, de acordo com a legislação vigente. (Seção II, n.1)

Como informação complementar, vale dizer que, em clínicas privadas, os custos dos tratamentos de inseminação artificial variam entre R$1.500,00 (mil e quinhentos reais) a R$3.500,00 (três mil e quinhentos reais) e de fertilização in vitro, entre R$3.000,00 (três mil reais) e R$20.000,00 (vinte mil reais) (BUCOSKI; SILVEIRA, 2008, p. 308).

Em ambas as técnicas de RA poderá ser usado o material genético de terceiros (doadores), rigorosamente selecionados por estado de saúde e qualidade do referido material, bem como o útero de mulher estranha à relação de paternidade, em caso de incapacidade de gestar da mãe biológica – esta prática é popularmente conhecida como “barriga de aluguel” quando há caráter lucrativo ou “maternidade por substituição”, quando não há.

Ainda sobre a participação de terceiros, é importante que observar a legislação de cada país, pois alguns autorizam e outros proíbem. No Brasil, a utilização de material biológico humano doado é permitida (a ver no Capítulo 3, ponto 3.1.1.1.1), assim como a gestação por substituição, ambas regulamentadas pela Resolução 1.957/10 da CFM. Sobre esta, dispõe da seguinte maneira na Seção VII:

SOBRE A GESTAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO (DOAÇÃO TEMPORÁRIA DO ÚTERO)

As clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técnicas de RA para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contra indique a gestação na doadora genética.

1 - As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família da doadora genética, num parentesco até o segundo grau, sendo os demais casos sujeitos à autorização do Conselho Regional de Medicina.

2 - A doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.

Índia, Ucrânia e em alguns estados norte-americanos também adotam a maternidade de substituição, mas diferem do Brasil ao admitirem o caráter comercial do útero (“barriga de aluguel”). Por outro lado, esta é proibida por lei em países como Itália, França, Alemanha, Reino Unido e Irlanda (BBC, 2011).

Segundo Ana Carolina Brochado Teixeira (2005, p. 321), “a gestação de substituição é uma das formas para que as mulheres impossibilitadas de gerar concretizem a maternidade desejada”. Sobre a polêmica do conflito positivo de maternidade, a autora é enfática:

Quem é mãe? A verdadeira mãe é aquela que intencionou ter um filho e viu-se impossibilitada de concebê-lo em razão de problemas físicos, uma vez que a maternidade atravessa caminhos do afeto, e este, por sua vez, percorre as trilhas do desejo.

E, ainda, citando Régine Mougin-Lemerle, a jurista arremata: “certa está a Psicanálise, ao afirmar que ‘a filiação não é tão evidente assim: não basta gerar’”. Assim, resta evidente o posicionamento da jurista de que, uma vez cedido o ventre para gerar o filho deseja por outrem, não há de se reinvidicar a maternidade posteriormente. Ou seja, o filho é de que almejou trazê-lo ao mundo.

Paulo Luiz Netto Lôbo, citado por Carlos Roberto Gonçalves (2007, p. 288), de outro ponto de vista, aduz:

[...] está proibida a utilização de embrião excedentário por homem e mulher que não sejam os pais genéticos ou por outra mulher titular de entidade monoparental. O que ocorrerá, contudo, se a vedação for descumprida e ocorrer a concepção no útero da mulher que não seja a mãe genética? O filho será juridicamente daquela e, no caso de par casado, do marido, neste caso em virtude do princípio pater is est e da presunção de maternidade da mulher parturiente, além da circunstância de não ter o Brasil, ao lado da maioria dos países, acolhido o uso instrumental do útero alheio, sem vínculo de filiação (popularmente conhecido como ‘barriga de aluguel’).

Neste último caso, ocorrendo a utilização de embrião excedentário sem a autorização dos titulares do material genético que o gerou, opina-se pela responsabilização civil e criminal de todos que tenham ciência do ato praticado.

3.1.1.1 Inseminação artificial

A inseminação artificial ou intra-uterina ou fecundação in vivo ou GIFT (Gametha Intra Fallopian Tranfer), é a técnica de reprodução humana assistida que consiste na introdução do gameta masculino (espermatozóide) na cavidade uterina, onde já se encontra liberado o gameta feminino (óvulo) e deve acontecer a fecundação. Todos os procedimentos e manipulações são realizados por médico especialista e sua equipe, observadas as determinações do Código de Ética Médica e das Resoluções do CFM. Regina Beatriz Tavares da Silva, citada por Carlos Roberto Gonçalves (2007, p. 288), faz a sua definição: “a inseminação artificial, consiste na introdução de gameta masculino, por meio artificial, no corpo da mulher, esperando-se que a própria natureza faça a fecundação”.

Para facilitar a fecundação, o sêmen recolhido passa por um processo de melhoramento – seleção de espermatozóides saudáveis, com mobilidade adequada, etc. – e, do outro lado, a mulher faz uso de medicamentos que induzem à liberação de maior número de óvulos. É possível constatar se o procedimento teve êxito após o 14º (décimo quarto) da sua realização, pela dosagem de gonadotrofina coriônica (beta-hCG) no sangue da paciente (BUCOSKI; SILVEIRA, 2008, p.306).

Há uma divergência doutrinária sobre a data da primeira inseminação artificial humana. Enquanto alguns autores afirmam ter sido em 1791 (NAMBA, 2009), outros registram o ano de 1984 (SANTOS, 2005, p. 396).

3.1.1.2    Fertilização in vitro (FIV)

A fertilização in vitro ou ectogênese ou ZIFT (Zibot Intra Fallopian Tranfer) é a técnica de reprodução humana de união dos gametas masculinos (espermatozóide) e femininos (óvulo) fora do útero, em laboratório, quando esta fecundação não pode acontecer nas Trompas de Falópio (ALVARENGA, 2005, p. 232). Todos os procedimentos são realizados por médico especialista e sua equipe, que manipularão o material genético e acompanharão a fecundação e o desenvolvimento do embrião.

De acordo com Roberto Wider (2007, p. 8-13), para viabilizar o procedimento, a mulher recebe doses de medicamentos que estimulam a liberação de óvulos, bem como o crescimento e amadurecimento destes. Além disso, é realizada uma seleção de espermatozóides saudáveis, com mobilidade satisfatória. Em seguida, os gametas são colocados num mesmo tudo de ensaio (proveta), onde ocorrerá a fecundação. Após alguns dias, os embriões são transferidos para a cavidade uterina e a gestação seguirá normalmente, da mesma maneira que uma gravidez natural. Deverá ser observada a determinação a Resolução nº 1.957/10 do CFM, Seção I, n. 6, que visa evitar as gestações múltiplas:

O número máximo de oócitos e embriões a serem transferidos para a receptora não pode ser superior a quatro. Em relação ao número de embriões a serem transferidos, são feitas as seguintes determinações: a) mulheres com até 35 anos: até dois embriões); b) mulheres entre 36 e 39 anos: até três embriões; c) mulheres com 40 anos ou mais: até quatro embriões.

A comprovação do êxito do procedimento poderá ser auferida após o 14º (décimo quarto) após sua realização, através do colhimento de sangue e análise de dosagem do hormônio gonadotrofina coriônica (mais conhecido por sua sigla, beta-hCG).

Também é de 14 (quatorze) dias “o tempo máximo de desenvolvimento de embriões in vitro” permitido pelo CFM (Resolução 1.957/10, Seção VI, n. 3). José Eduardo de Souza Pimentel (2003, p. 5-6) apresenta duas justificativas distintas para a escolha deste prazo:

É fato que, durante os primeiros catorze dias, o embrião se constitui de uma massa indiferenciada de células. Há quem diga a respeito desse grau de desenvolvimento que, até aqui, não nos deparamos com um indivíduo humano (a diferenciação celular se dá a partir do 14.º dia). Essa tese reduz o embrião, nas duas primeiras semanas de vida, a uma “massa indiferenciada de células”, para negar-lhe o status de ser humano. Outros sustentam que o prazo dos 14 dias foi estabelecido de modo arbitrário e tão-somente para servir de justificativa ao descarte dos embriões excedentes.

Conclui-se que a escolha do prazo de 14 (quatorze) dias se fez para que se evitasse qualquer confronto com a parcela que acredita haver vida depois deste período e, consequentemente, o descarte dos embriões excedentes caracterizaria um atentado ao direito constitucionalmente assegurado.

Por fim, uma curiosidade: o primeiro “bebê de proveta”, Louise Brown, nasceu na Inglaterra no ano de 1978, após a bem-sucedida experiência do criador da FIV, o embriologista Robert Edwards – contemplado em 2010 com o prêmio Nobel de Medicina (ÉPOCA, 2010). No Brasil, a mesma experiência aconteceu pela primeira vez em 1984, com o nascimento de Ana Paula Caldeira (VEJA, 2010).

3.1.1.2.1    Fertilização in vitro clássica e por Injeção Intracitoplasmática de Espermatozóides (ICSI)

A fertilização in vitro poderá ser realizada através de duas técnicas diversas: clássica (ou convencional) e por Injeção Intracitoplasmática de Espermatozóide (ICSI). Roger Abdelmassih (2011, p. 16) faz a diferenciação entre elas:

A técnica da FIV pode ser dividida em cinco fases: estimulação da ovulação, coleta dos óvulos, manipulação dos gametas, transferência dos embriões e suporte da fase lútea. Os procedimentos para a realização da FIV convencional e ICSI são os mesmos, exceto, obviamente, no momento da manipulação dos gametas para o processo de fertilização.

Assim, enquanto na FIV clássica os óvulos são colocados em um mesmo tubo de ensaio (proveta) com os espermatozóides e incubados por 16-18 horas para que se fecundem por si só, de outro lado, na ICSI apenas um espermatozóide é escolhido com ajuda de uma micropipeta de injeção e injetado no óvulo fixado com auxílio de uma micropipeta de sucção (ABDELMASSIH, 2001).

3.1.1.3    Reprodução assistida homóloga e heteróloga

Será considerada reprodução assistida homóloga (ou auto-reprodução) quando os gametas utilizados forem do próprio casal, ou seja, quando o sêmen transferido para o útero da mulher for do seu marido ou companheiro. Logo, os casais que se utilizam desta técnica produzem material genérico em seus organismos e a esterilidade está ligada à dificuldade do espermatozóide do homem chegar à cavidade uterina onde se encontra o óvulo, o que pode ocorrer por diversos fatores, por exemplo, na oligospermia (baixa contagem de espermatozóide por mililitro de sêmen).

Por outro lado, a reprodução assistida será heteróloga (ou heterreprodução) quando um ou ambos os gametas utilizados forem de terceiros estranhos à relação de paternidade, ou seja, doadores. O Conselho Federal de Medicina, na Resolução nº 1.957/10, Seção IV, impõe os seguintes critérios à doação de gametas:

DOAÇÃO DE GAMETAS OU EMBRIÕES

1 - A doação nunca terá caráter lucrativo ou comercial.

2 - Os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-versa.

3 - Obrigatoriamente será mantido o sigilo sobre a identidade dos doadores de gametas e embriões, bem como dos receptores. Em situações especiais, as informações sobre doadores, por motivação médica, podem ser fornecidas exclusivamente para médicos, resguardando-se a identidade civil do doador.

4 - As clínicas, centros ou serviços que empregam a doação devem manter, de forma permanente, um registro de dados clínicos de caráter geral, características fenotípicas e uma amostra de material celular dos doadores.

5 - Na região de localização da unidade, o registro dos nascimentos evitará que um(a) doador(a) venha a produzir mais do que uma gestação de criança de sexo diferente numa área de um milhão de habitantes.

6 - A escolha dos doadores é de responsabilidade da unidade. Dentro do possível deverá garantir que o doador tenha a maior semelhança fenotípica e imunológica e a máxima possibilidade de compatibilidade com a receptora.

7 - Não será permitido ao médico responsável pelas clínicas, unidades ou serviços, nem aos integrantes da equipe multidisciplinar que nelas trabalham participar como doador nos programas de RA.

Assim, os doadores deverão ser mantidos no anonimato, o sigilo deverá ser absoluto por parte do banco de gametas. Eles passam por uma seleção rigorosa para doar ao banco de sêmen e óvulos, que analisam a saúde, além da qualidade de material genético (WIDER, 2007, p. 13). Atente-se também para a vedação da comercialização de gametas e embriões: a doação não poderá ser remunerada ou comercializada.

3.1.1.4    Vedações

Os métodos conceptivos foram desenvolvidos com a finalidade de vencer o obstáculo da esterilidade na geração de filhos, todavia, tais métodos não podem ser utilizados indiscriminadamente. Por isso, o CFM, na Resolução 1.957/10 (Seção I, n. 4, 5 e 7, Seção IV, n. 7 e Seção VI, n. 1 e 2) cuidou de proibir as seguintes práticas e situações: (a) as técnicas de RA não devem ser aplicadas com a intenção de selecionar o sexo (sexagem) ou qualquer outra característica biológica do futuro filho, exceto quando se trate de evitar doenças ligadas ao sexo do filho que venha a nascer; (b) é proibida a fecundação de oócitos humanos com qualquer outra finalidade que não a procriação humana; (c) em caso de gravidez múltipla, decorrente do uso de técnicas de RA, é proibida a utilização de procedimentos que visem à redução embrionária; (d) toda intervenção sobre embriões in vitro, com fins diagnósticos, não poderá ter outra finalidade que não a de avaliar sua viabilidade ou detectar doenças hereditárias, sendo obrigatório o consentimento informado do casal; (e) toda intervenção com fins terapêuticos sobre embriões in vitro não terá outra finalidade que não a de tratar uma doença ou impedir sua transmissão, com garantias reais de sucesso, sendo obrigatório o consentimento informado do casal; e (f) não será permitido ao médico responsável pelas clínicas, unidades ou serviços, nem aos integrantes da equipe multidisciplinar que nelas trabalham participar como doador nos programas de RA.

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A Lei 9.263/96 também trouxe duas vedações: a primeira, no art. 2º, parágrafo único, determina que é defeso o uso dos métodos conceptivos e contraceptivos  para “qualquer tipo de controle demográfico”. A outra, no art. 8º, veda a “realização de experiências com seres humanos no campo da regulação da fecundidade” sem a prévia autorização do órgão competente.

3.1.2    Lacunas normativas e suas consequências

O avanço da medicina proporcionou a solução de problema da infertilidade dos casais, todavia, surgiram outras questões jurídicas que ainda não foram resolvidas pela legislação brasileira. A Lei 9.263/96, que se destina a regulamentar o planejamento familiar, não traz regras detalhadas sobre as técnicas de reprodução assistida (existindo somente uma Resolução do CFM, de nº 1.957/10), bem como não abordou as suas conseqüências jurídicas, de forma que ainda existem muitas perguntas sem respostas. A doutrina se manifesta neste sentido:

Tais avanços no campo da ciência podem suscitar conflitos entre direitos ou deveres contraditórios e a ética, em primeira [sic] lugar com sua orientação, e o direito, em segundo, com suas prescrições, são chamados a resolver e cujas soluções se situam entre o ser da ciência e o dever da ética ou do direito, procurando-se responder à seguinte questão: tudo o que é tecnicamente possível também o será ética e juridicamente? (AMARAL apud WIDER, 2007, p.71)

Sandra Lima Alves Montenegro (2005, p. 194) também aponta a escassez de normas e a fundamental produção de novas regras:

Vale salientar que a necessidade de nova legislação sempre é trazida à baila quando se trata de técnicas de reprodução humana assistida, pois se entende que uma nova lei traria segurança na solução dos problemas encontrados na prática dessas técnicas.

Assim, existem inúmeras situações advindas das técnicas de reprodução medicamente assistida que representam conflito entre as normas do ordenamento jurídico pátrio e, até mesmo, entre costumes da sociedade brasileira que continuam sem regulamentação. Como exemplo, podemos citar a ausência de regras sobre responsabilidade civil por dano moral ou patrimonial das clínicas médicas que realizam procedimentos de RA. A Lei nº 9.263/96 previu a competência do SUS para normatizar, mas até hoje inexiste qualquer regulamentação. Sobre o assunto, encontra-se apenas disposição na Seção III da Resolução nº 1.957/10 da CFM que, diga-se de passagem, é extremamente superficial:

REFERENTE ÀS CLÍNICAS, CENTROS OU SERVIÇOS QUE APLICAMTÉCNICAS DE RA

As clínicas, centros ou serviços que aplicam técnicas de RA são responsáveis pelo controle de doenças infectocontagiosas, coleta, manuseio, conservação, distribuição, transferência e descarte de material biológico humano para a paciente de técnicas de RA, devendo apresentar como requisitos mínimos:

1 - um diretor técnico responsável por todos os procedimentos médicos e laboratoriais executados, que será, obrigatoriamente, um médico registrado no Conselho Regional de Medicina de sua jurisdição.

2 - um registro permanente (obtido por meio de informações observadas ou relatadas por fonte competente) das gestações, nascimentos e malformações de fetos ou recém-nascidos, provenientes das diferentes técnicas de RA aplicadas na unidade em apreço, bem como dos procedimentos laboratoriais na manipulação de gametas e embriões.

3 - um registro permanente das provas diagnósticas a que é submetido o material biológico humano que será transferido aos pacientes das técnicas de RA, com a finalidade precípua de evitar a transmissão de doenças.

Existe também uma polêmica jurídica – muito embora haja dois textos normativos sobre o assunto – versa sobre o destino do material genético homólogo crioconservado quando o depositante já faleceu: deve-se descartar, devolver à viúva e/ou permitir a sua utilização para posterior RA? A já mencionada Resolução do CFM, na sua Seção VIII, determina que “não constitui ilícito ético a reprodução assistida post mortem desde que haja autorização prévia específica do(a) falecido(a) para o uso do material biológico criopreservado, de acordo com a legislação vigente”.

No mesmo sentido, o Código Civil: “art. 1.597. Presumem‑se concebidos na constância do casamento os filhos: [...] III – havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido”.

Carlos Roberto Gonçalves (2007, p. 287) acrescenta a seguinte informação:

Na Jornada de Direito Civil realizada no Superior Tribunal de Justiça no mês de junho de 2002, aprovou-se preposição para que se interprete o inciso III do citado art. 1.597 no sentido de ser obrigatório, para que se presuma a paternidade do marido falecido, “que a mulher, ao se submeter a uma das técnicas de reprodução assistida com o material genético do falecido, esteja ainda na condição de viúva, devendo haver ainda autorização escrita do marido para que se utilize seu material genético após sua morte”.

Ainda assim, a doutrina brasileira se divide em suas opiniões. Maria Claudia Crespo Brauner, citada por Roberto Wider (2007, p. 80), manifesta-se favorável à reprodução póstuma:

De fato, se o interesse da criança deve ser preponderante, isso não implica concluir que seu interesse se contrapõe, de forma reiterada, ao recurso às técnicas de procriação artificial e que ela não possa vir a integrar uma família monoparental, desde que o genitor isolado forneça todas as condições necessárias para o filho que se desenvolva com dignidade e afeto.

Na mesma obra, Capelo de Sousa reitera (2007, p. 81):

Válida a vontade inequivocamente manifestada pelo marido quando vivo de querer dar à esposa, mesmo depois de sua morte, o poder de conceber uma criança, através de esperma seu depositado e congelado em sua vida, desde que o relacionamento sexual ou a inseminação artificial não tenham sido possíveis e eficazes em vida.

De outro lado, Maria Helena Diniz (2007, p. 503) questiona sobre a possível violação ao direito à imagem e à intimidade do falecido ao admitir-se a inseminação post mortem, se revelando avessa à prática. Roberto Wider (2007, p. 73) endossa o posicionamento da doutrinadora, observando as possíveis consequências psicológicas acarretadas, como a prévia orfandade paterna para a criança.

Caio Mário, citado por Carlos Roberto Gonçalves (2007, p. 287), observando de outro ângulo a questão, levanta um ponto importante:

Não se pode falar em direitos sucessórios daquele que foi concebido por inseminação artificial post mortem uma vez que a transmissão da herança se dá em consequência da morte (CC, art. 1.784) e dela participam “as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão” (art. 1.798). Enquanto não houver uma reforma legislativa, até mesmo para atender ao princípio constitucional de não discriminação de filhos, caberá à doutrina e à jurisprudência fornecer subsídios para a solução dessa questão.

Ainda no art. 1.597, o inciso IV também toca à reprodução humana assistida: “Art. 1.597. Presumem‑se concebidos na constância do casamento os filhos: [...] IV – havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga”.

Contudo, o Código não estabeleceu regras para a situação de o casal estar divorciado ou em processo de divórcio. Mas o suprimento desta lacuna veio ainda em 2002, na I Jornada de Direito Civil, com o Enunciado 107:

Finda a sociedade conjugal, na forma do art. 1.571, a regra do inc. IV somente poderá ser aplicada se houver autorização prévia, por escrito, dos ex-cônjuges para a utilização dos embriões excedentários, só podendo ser revogada até o início do procedimento de implantação desses embriões.

Finalmente, o inciso V do art. 1597 do CC também estende a mencionada presunção para os filhos “havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido”. Observe-se que o dispositivo não determina a comprovação de que o marido é portador de impotência coeundi ou generandi, bastando a autorização, bem como não impõe a forma legal desta autorização, se expressa ou verbal, adotando-se, então, a mais flexível (GONÇALVES, 2007, p. 289).

A autorização só poderá ser revogada até a realização do procedimento. Esta determinação reverencia o princípio da segurança jurídica, visando evitar que o marido queira se esquivar, posteriormente, das suas responsabilidades como pai, como bem leciona Maria Helena Diniz (2007, p. 621):

Na inseminação artificial heteróloga os problemas jurídicos e morais serão ainda maiores, tais como:

[...]

g) Arrependimento do marido após a realização da fecundação artificial, sugerindo o aborto, ou depois do nascimento, gerando o infanticídio, rejeição, abandono ou maus-tratos, trazendo sérios problemas, pois poderá mover ação negatória de paternidade, alegando, por exemplo, que foi dolosamente enganado ou que anuiu por coação. [...] Tal vontade procriacional é um meio de impedir o marido de desconhecer a paternidade do filho voluntariamente assumido ao consentir na inseminação heteróloga de sua mulher. A paternidade, então, apesar de não ter fundamento genético, terá o moral, privilegiando-se a relação socioafetiva. Seria torpe, imoral, injusta e antijurídica a permissão para marido que, consciente e voluntariamente, consentiu na inseminação artificial com esperma de terceiro e depois negasse a paternidade. Seria admitir um indecoroso e cruel venire contra factum proprium, como diz Zeno Veloso.

[...]

i) A impugnação da paternidade pelo marido de sua mãe conduzirá o filho a uma paternidade incerta, pela impossibilidade de se a estabelecer, devido ao segredo profissional médico e ao anonimato do doador do sêmen inoculado na mulher. A presunção de paternidade (CC, art. 1.597, V) poderá ser excepcionalmente desconstituída por iniciativa do marido (CC, arts. 1.600 e 1.602); [...] O art. 1.597, V, do Código Civil procurou fazer com que prevalecesse o elemento institucional e não o biológico. Mas, para que isso fosse possível, deveria ter especificado que o consentimento para a inseminação artificial heteróloga fosse por escrito e irrevogável.

Edson Tetsuzo Namba (2009) adota o mesmo posicionamento de Maria Helena Diniz no que diz respeito à preponderância do fator socioafetivo. Segundo o Namba, “paternidade responsável vai além da consaguineidade; ser pai inclui na relação com o filho o compromisso de amar e respeitar”.

É por tratar de assuntos de relevante delicadeza que o planejamento familiar e os meios de realizá-la merecem maior atenção, bem como urgente regulamentação por parte das autoridades competentes. A família, como primeiro núcleo da sociedade onde as pessoas são inseridas, deve ser fonte das melhores referências e sentimentos, cabendo ao Estado, eliminar todos os danos possíveis de serem experimentados por ela.

3.2    MÉTODOS DE CONTRACEPÇÃO HUMANA

Como já foi dito, é de grande responsabilidade a decisão de trazer ao mundo uma nova vida. É necessário que as pessoas escolham ter filhos com a certeza de que lhes garantirão, ao menos, o mínimo para que tenham uma existência com dignidade. E o planejamento familiar não tem só o enfoque de auxiliar as pessoas na concepção de um filho, mas também de ajudá-los a não procriar se assim entenderem como a melhor opção; o planejamento tem a função de conscientizar de que, enquanto as pessoas e casais não estiverem aptos a zelar pelo bem-estar de uma criança, devem evitar concebê-las. Então, surgem os métodos anticoncepcionais, tornando possível a “separação entre a sexualidade e a fertilidade”, ou seja, “entre o prazer sexual e o ônus da reprodução” (HALBE, 2005) e, de outro aspecto, dando à mulher o controle eficaz da sua fertilidade e proporcionando sua “emancipação e participação no marcado de trabalho” (KUNDE et al., 2006, p. 219).

A assistência à concepção e contracepção está prevista no art. 3º, parágrafo único, I, da Lei nº 9.263/96, devendo ser prestada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Observe-se os arts. 4º e 9º da Lei:

Art. 4º. O planejamento familiar orienta-se por ações preventivas e educativas e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade. (grifos nossos)

Art. 9º. Para o exercício do direito ao planejamento familiar, serão oferecidos todos os métodos e técnicas de concepção e contracepção cientificamente aceitos e que não coloquem em risco a vida e a saúde das pessoas, garantida a liberdade de opção. (grifos nossos)

Existem hoje vários meios de se impedir uma gestação, denominados métodos anticoncepcionais ou contraceptivos, que são amplamente difundidos à população. Estes métodos podem ser classificados em reversível e irreversível, natural e não natural, mecânico e químico. Observe-se o quadro:


Fonte: quadro elaborado pela autora da presente pesquisa com o objetivo de melhor compreender as questões que circulam o tema em análise.

Todos os métodos do quadro esquemático serão detalhadamente explanados a seguir.

3.2.1    Métodos reversíveis

As técnicas contraceptivas reversíveis são aquelas que, ao deixarem de ser usadas, viabilizam a gravidez. Traduzem a idéia de contracepção momentânea, temporária. O método reversível se subdivide em natural e não natural.

São reversíveis naturais – também denominados “métodos comportamentais” (KUNDE et al., 2006, p. 220) – os métodos que consideram o período de fertilidade da mulher para evitar a gravidez. Como exemplo, pode-se citar: (a) abstinência sexual (ato de evitar a prática sexual de introdução do pênis na vagina); (b) coito interrompido (consiste em retirar o pênis da vagina antes da ejaculação); (c) método do calendário ou “tabelinha” (cálculo feito após a observância dos ciclos menstruais da mulher a fim de definir o seu período fértil e evitar relações sexuais neste); (d) método do muco (abstenção de relação sexual quando o muco vaginal está mais fluído, pois este estado coincide com o período fértil da mulher); e (e) método da temperatura (constatação do período fértil da mulher a partir da elevação de sua temperatura corporal). Importante ressaltar que os métodos naturais são de baixa eficácia e não afastam a possibilidade de contração de Doença Sexualmente Transmissível (DST).

De outro lado, os métodos reversíveis não naturais são aqueles que impedem, através de forma mecânica ou química, o encontro do espermatozóide com o óvulo e a consequente fecundação. Diz-se que é mecânica (ou não hormonal) quando o que impede a fecundação e nidação é um obstáculo físico, a exemplo do diafragma, preservativo (masculino e feminino) e Dispositivo Intra Uterino (DIU). E a forma é química (ou hormonal) quando são introduzidas no organismo substâncias químicas, como os hormônios, a fim se inibir a ovulação ou exterminar os espermatozóides e, assim, prevenindo a gravidez. São exemplos: pílula contraceptiva oral ou anticoncepcional, implante contraceptivo, adesivo contraceptivo e espermicida. A eficácia dos métodos não naturais é muito superior à dos naturais.

Os métodos não naturais também são conhecidos como “métodos de barreira”, pois visam impedir a “trajetória dos espermatozóides em direção ao óvulo” (ROSAS, 2005, p. 449).

3.2.2    Métodos irreversíveis

As técnicas irreversíveis são aquelas que visam inviabilizar completamente a gravidez e, devido a esta irreversibilidade, “deve ficar reservada a casais que têm a sua prole completa e estão absolutamente conscientes” (KUNDE et al., 2006, p. 224).  É necessário que a pessoa se submeta a procedimento cirúrgico, denominada esterilização voluntária. Pode ser realizado tanto na mulher (laqueadura) como no homem (vasectomia).

A laqueadura, ligadura tubária ou de trompas uterinas consiste no bloqueio das trompas de Falópio através de corte, colocação de anel, por exemplo, impedindo a passagem do óvulo para o útero e eventual encontro com o espermatozóide e, assim, evita a gravidez (KUNDE et al., 2006, p. 224).

Já o procedimento de vasectomia (ou eferentectomia) é o bloqueio dos canais deferentes, de forma a impossibilitar a excreção de espermatozóides. Vale dizer que é rara a disfunção sexual dos pacientes que se submetem ao procedimento (HENTSCHEL; BRIETZKE, 2006, p.286).

Apesar de estarem enquadradas como métodos de contracepção permanente e irreversível, tanto a laqueadura como a vasectomia admitem reversão. Diferente do que a maioria das pessoas imagina, estas técnicas também são falíveis em relação à gravidez, o que provoca recorrente discussão nas vias judiciais, a exemplo dos recentes julgados:

RESPONSABILIDADE CIVIL. Erro médico Ação de indenização por danos morais Autora que se submeteu a cirurgia de esterilização pelo método da laqueadura, tendo porém engravidado novamente cerca de três anos depois

Alegação de que não fora informada acerca da falibilidade do método O dever de informar a paciente a respeito dos riscos da cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldades de sua reversão e opções de contracepção reversíveis existentes decorre de lei (art. 10 § 1º da Lei 9.263/1996) - Conquanto o réu, médico responsável pelo procedimento, haja sustentado que a autora teve acesso a tais informações, sequer tendo trazidos aos autos cópia dos prontuários médicos da autora ou do termo de consentimento informado que aduz haver sido por ela firmado Prova testemunhal, de mais a mais, que dá conta da ausência da devida cientificação da autora acerca da matéria Culpa do médico caracterizada Quantum indenizatório elevado para R$ 10.000,00, com observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, na esteira de precedentes

Ação procedente em parte Apelo da autora provido em parte, desprovido o do réu.

(Apelação Cível nº 0012917-51.2009.8.26.0482, 1ª Câmara de Direito Privado. Relator: Des. Eduardo Razuk. Publicação: 14/02/2012. Registro: 15/02/2012)

AÇÃO ORDINÁRIA Laqueadura que se inscreve no campo das ações de Planejamento Familiar, objeto da Lei Federal nº 9.263/96, feita mediante assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido-TCLE, objeto de normas editadas pelo Ministério da Saúde, no qual a parte certamente foi

advertida dos riscos envolvidos no procedimento e da possibilidade de engravidar, probabilidade que, segundo a literatura médica, no caso de laqueadura tubária, é de 5 para cada cem mulheres Inexistência de responsabilidade por eventuais repercussões no campo material Inexistência de dano moral Recurso improvido.

(Apelação Cível nº 0565639-11.2009.8.26.0577, 7ª Câmara de Direito Público. Relator: Des. Luiz Sérgio Fernandes de Souza. Publicação: 19/12/ 2011. Registro: 10/01/2012)

E, ainda, há decisões mais radicais:

RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICO ERRO MÉDICO VASECTOMIA REVERSÃO ESPONTÂNEA GRAVIDEZ INDESEJADA POSSIBILIDADE ATO ILÍCITO INEXISTÊNCIA INDENIZAÇÃO DESCABIMENTO.

1. Inexiste método contraceptivo absolutamente infalível, com garantia de eficiência total e absoluta, haja ou não informação sobre isso ao paciente.

2. A responsabilidade civil do médico somente decorre de culpa provada. Médico que adotou todos os procedimentos adequados e esperados durante o ato cirúrgico e no período pós-operatório. A reversão espontânea da vasectomia, conquanto remota e excepcional, é factível e uma vez ocorrida qualifica-se como caso fortuito ou força maior. Obrigação de indenizar inexistente. Pretensão julgada procedente. Inadmissibilidade. Sentença reformada. Reexame necessário acolhido. Recursos providos.

(Apelação Cível com Revisão nº 9085636-68.2006.8.26.0000, 9ª Câmara de Direito Público. Relator: Des. Décio Notarangeli. Publicação: 05/10/2011. Registro: 06/10/2011)

Contudo, o entendimento majoritário é de que há configuração ou não da responsabilidade depende da existência do dever de comunicação do médico ao paciente e do chamado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) é o instrumento hábil à manifestação de vontade a que se refere o art. 10, inciso I da Lei nº 9.263/96, que veremos mais detalhadamente no tópico que se segue.

3.2.3    Aspectos legais

No que toca aos métodos contraceptivos, a legislação brasileira é bastante escassa. A Lei nº 9.263/96, que regulamenta o planejamento familiar no país, se ateve apenas à esterilização voluntária (um dos métodos de contracepção irreversível), dedicando ao assunto 12 (doze) dos seus 25 (vinte e cinco) artigos.

No art. 10, encontra-se a autorização normativa para submissão à esterilização voluntária, bem como as hipóteses e requisitos para a sua realização, como idade, estado da pessoa, número de filhos, forma de manifestação de vontade:

Art. 10. Somente é permitida a esterilização voluntária nas seguintes situações:

I - em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização precoce;

II - risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, testemunhado em relatório escrito e assinado por dois médicos.

A manifestação de vontade a que se refere o inciso I deverá ser feita por documento escrito e firmado (art. 10, §1º). Carecerá de validade a manifestação cujo discernimento esteja comprometido pelo uso de álcool, drogas, estados emocionais alterados, bem como em caso de incapacidade mental temporária ou permanente (art. 10, §3º) - nesta última situação, será necessária autorização judicial (art. 10, §6º). Se a pessoa que deseja se submeter à esterilização voluntária for casada, o processo também dependerá do consentimento expresso do seu cônjuge (art. 10, § 5º). O consentimento é considerado objeto de extrema importância e merecedor de muita atenção, sob pena de ser violado não só o consentimento informado (sentido estrito), mas também o dever de informação (GOLDIM et al., 2006, p. 295).

O art. 10 também traz algumas vedações à esterilização voluntária:

§ 2º É vedada a esterilização cirúrgica em mulher durante os períodos de parto ou aborto, exceto nos casos de comprovada necessidade, por cesarianas sucessivas anteriores. (grifos nossos)

§ 4º A esterilização cirúrgica como método contraceptivo somente será executada através da laqueadura tubária, vasectomia ou de outro método cientificamente aceito, sendo vedada através da histerectomia e ooforectomia. (grifos nossos)

A título de informação, conceituar-se-á as práticas vedadas pelo §4º: a histerectomia consiste na retirada cirúrgica do útero (SBROGGIO et al., 2004, p. 270); e ooforectomia, na remoção de um ou ambos os ovários (GIRALDO et al. 2008). Da mesma maneira, não poderão ser usados métodos que confrontam com a dignidade da pessoa humana, como a mutilação, cirurgia ablativa das gônadas ou amputações imotivadas (FERRAZ apud DINIZ, 2007, p. 144).

A inobservância do estabelecido no art. 10 configura crime punido com reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos, “se a prática não constitui crime mais grave” (art. 15). Contudo, o parágrafo único determina que esta pena poderá ser aumentada em um terço se houver descumprimento dos parágrafos §2º (exceto no caso do inciso II do art. 10), §3º, §4º, 6º, bem como se houver cesária indicada para fim exclusivo de esterilização.

O art. 12 veda “a indução ou instigamento individual ou coletivo à prática da esterilização cirúrgica”. Quando individual, se dolosa, o art. 17, caput, pune a atitude com pena de reclusão de 1 (um) a 2 (dois) anos. Se coletiva, o parágrafo único do mesmo artigo cuidou de enquadrá-la como crime de genocídio (Lei nº 2.889, de 1 de outubro de 1956).

Outra vedação trazida pela Lei está no art. 13, que proíbe a “exigência de atestado de esterilização ou de teste de gravidez para quaisquer fins”, sob pena de reclusão de 1 (um) a 2 (dois) anos e multa. Esta proibição ganha reforço do art. 373-A, inciso IV da CLT e da Lei nº 9.029/95, que se destinam a combater a mencionada exigência na seara trabalhista, posto que é uma prática ainda recorrente nas relações de emprego tanto para admissão de empregadas como para a manutenção de vínculo empregatício com elas.

A Lei nº 9.263/96 tratou ainda das obrigações do médico que realizar o procedimento de esterilização. Segundo seu texto, ele terá, obrigatoriamente, que notificar à direção do Sistema Único de Saúde sobre a ocorrência do procedimento (art. 11) e, sob pena de detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa (art. 16).

Quanto às pessoas jurídicas que promovem a esterilização, sejam instituições públicas ou privadas, deverão ser cadastradas, fiscalizadas e controladas pelo SUS (art. 14). A autorização para que possam realizar a esterilização só será conferida às instituições que ofereçam também todos os meios e métodos de contracepção reversíveis (parágrafo único do art. 14).

Pelas práticas ilícitas ocorridas nas instituições, responderão como concorrentes os seus gestores e responsáveis (art. 19 da Lei) e lhes serão aplicadas penas proporcionais às suas culpas, nos termos do art. 29 do Código Penal brasileiro.

Art. 29. Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

§ 1º Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço.

§ 2º Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser‑lhe‑a aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.

De acordo com o art. 20 da Lei, as sanções penais não prejudicarão a aplicação das sanções administrativas às instituições privadas (inciso I) ou públicas (inciso II):

Art. 20. As instituições a que se refere o artigo anterior sofrerão as seguintes sanções, sem prejuízo das aplicáveis aos agentes do ilícito, aos co-autores ou aos partícipes:

I - se particular a instituição:

a) de duzentos a trezentos e sessenta dias-multa e, se reincidente, suspensão das atividades ou descredenciamento, sem direito a qualquer indenização ou cobertura de gastos ou investimentos efetuados;

b) proibição de estabelecer contratos ou convênios com entidades públicas e de se beneficiar de créditos oriundos de instituições governamentais ou daquelas em que o Estado é acionista;

II - se pública a instituição, afastamento temporário ou definitivo dos agentes do ilícito, dos gestores e responsáveis dos cargos ou funções ocupados, sem prejuízo de outras penalidades.

Também não será prejudicada a responsabilização subjetiva e objetiva na esfera civil, nos termos do art. 21 da Lei:

Art. 21. Os agentes do ilícito e, se for o caso, as instituições a que pertençam ficam obrigados a reparar os danos morais e materiais decorrentes de esterilização não autorizada na forma desta Lei, observados, nesse caso, o disposto nos arts. 159, 1.518 e 1.521 e seu parágrafo único do Código Civil, combinados com o art. 63 do Código de Processo Penal.

Atente-se que a Lei nº 9.263 foi elaborada no ano de 1996, na vigência do Código Civil de 1916. Portanto, os cumpre dizer que os arts. 159, 1.518 e 1.521 aos quais se refere seu art. 21 encontram correspondência no Código Civil de 2002 nos arts. 186 c/c 927, 942 e 932, respectivamente.

3.2.4    Notas sobre a questão do aborto

Para que não haja confusão, cabe fazer uma observação importante: no Brasil, o aborto não é uma alternativa de evitar gestação indesejada. Isto porque o legislador brasileiro se ateve apenas a auxiliar no impedimento de concepção ao elaborar a Lei nº 9.263/96, e não na interrupção de uma gravidez já existente. Da mesma forma, o objetivo do art. 226, §7º da CF/88 é planejar e não corrigir, por isso, rechaça-se o denominado aborto social ou econômico, “realizado para impedir que se agrave a situação de miséria da gestante, pois o Estado não pode permitir a ocorrência de um crime como justificativa para os problemas sociais” (SANTOS; ARAÚJO, 2009). Então, a expressão “contracepção” deve ser considerada na sua literalidade.

Esclareça-se ainda que, segundo Ivanaldo Santos e Francisco Garcia de Araújo (2009), há quatro formas de aborto: natural ou espontânea, acidental, criminoso e legal ou permitido. Os dois primeiros são inevitáveis, imprevisíveis e independentes da vontade humana e, por isso não ferem a “inviolabilidade do direito à vida”, constitucionalmente resguardada no art. 5º, caput. O aborto criminoso está expressamente vedado pelo ordenamento e tipificado no CP, arts. 124 a 127:

Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento

Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque:

Pena – detenção, de um a três anos.

Aborto provocado por terceiro

Art. 125. Provocar aborto, sem o consentimento da gestante:

Pena – reclusão, de três a dez anos.

Art. 126. Provocar aborto com o consentimento da gestante:

Pena – reclusão, de um a quatro anos.

Parágrafo único. Aplica‑se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

Forma qualificada

Art. 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá‑lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.

Já o aborto legal ou permitido, excepcionalmente admitido, está previsto no art. 128 do CP, hipóteses taxativas em que a prática é eximida de punibilidade:

Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico:

Aborto necessário

I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

Aborto no caso de gravidez resultante de estupro

II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Também é mister pontuar a atual discussão ao redor da admissão ou não do aborto chamado eugênico ou piedoso – a exemplo dos casos que envolvem anencefalia do feto –, matéria pendente da análise pelo STF do ADPF nº 54. O interessante é que o impasse coincide com mesmos questionamentos sobre o uso de embriões excedentários da fertilização in vitro para pesquisas científicas na Lei de Biossegurança (o art. 5º da Lei 11.105/05 foi objeto da ADI nº 3.210): quando começa a vida? A manipulação dos embriões não fere a inviolabilidade do art. 5º, caput? No caso da ADI, “o STF entendeu, por votação bastante apertada, 6 X 5, que as pesquisas com célula-tronco embrionária, nos termos da lei, não violam o direito à vida” (LENZA, 2011, p. 873). Dessa forma, vejamos as hipóteses permitidas na lei:

Art. 5º. É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células‑tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.

§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.

§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células‑tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.

§ 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.

A Suprema Corte entende que a existência de vida coincide com a existência de cérebro, assim, o embrião em estágio inicial não tem cérebro e, da mesma forma, não tem vida. Também se baseia no cérebro o fim da vida, sendo o marco final a morte encefálica. Outrossim, seguindo esse raciocínio, Pedro Lenza (2011, p. 874) acredita que o STF não criará óbices para a autorização de aborto do feto anencéfalo, posto que destituído de cérebro, logo, de vida.

Outro ponto na ADI 3.510 toca ao tema deste estudo. Ainda de acordo com Pedro Lenza (2011, p. 874), outra argumentação usada para a declaração de constitucionalidade do art. 5º da Lei de Biossegurança versa sobre dignidade da pessoa humana, paternidade responsável e planejamento familiar:

Outro argumento utilizado foi a ideia de dignidade da pessoa humana e paternidade responsável, lembrando o art. 226, §7º.

De fato, o Estado não pode, constitucionalmente, restringir a quantidade de filhos por casal. A Constituição, contudo, determina o dever de orientação em relação ao planejamento familiar.

Dessa forma, afirmou o Ministro Relator, se não se define o número de filhos, feita a fertilização in vitro o casal pode optar pela quantidade de embriões a serem introduzidos no útero. Se eventualmente não quiserem introduzir todos, os embriões poderão ser congelados.

E se o casal não tiver como congelar (até porque isso gera custo)? Respondeu outro Ministro, indagando: serão os embriões jogados como lixo hospitalar? Então, se admita a pesquisa, dentro dos critérios éticos fixados na lei e consagrando a ideia de uma sociedade fraterna (preâmbulo e art. 3º, I, além da ideia de direitos de 3ª dimensão), objetivando a cura das pessoas com doenças degenerativas (e nos parece que, nesse ponto, bastante acertada a decisão). (grifos nossos)

Ressalte-se que, ainda que pendente o julgamento da ADI nº 3.510, é possível encontrar nos Tribunais alguns julgados sobre o aborto eugênico,  favoráveis em sua maioria, a ver:

Mandado de segurança. Aborto de indicação “eugênica”. Feto anencefálico. Interrupção da gravidez requerida pelos pais. Aplicação analógica, nos termos do art. 4.° da Lei de Introdução ao Código Civil, do art. 128, II, do Código Penal (que, dizendo respeito a feto saudável, claramente se aplica, com ainda maior razão, ao caso). Ordem concedida.

1. Trata-se de mandado de segurança impetrado por Rosângela Maria de Lacerda Ventura e Rafael George Fernandes Ventura contra r. decisão do MM. Juízo de Direito da 1.ª Vara Criminal de São José do Rio Preto, que indeferiu autorização para que se interrompa a gestação da impetrante, requerida por se ter verificado quadro de anencefalia. Deferida a liminar e prestadas as informações, manifestou-se a douta Procuradoria Geral de Justiça pela concessão da ordem.

[...]

5. Em síntese, e para encerrar: em face da expressa autorização legal para o uso da analogia, do evidente cabimento de seu emprego na hipótese, e tendo já (embora contra minhas convicções pessoais) autorizado a interrupção da gravidez de diversos fetos saudáveis, em casos de estupro, não me vejo autorizado a impedi-lo num caso em que o sofrimento da mãe é pelo menos tão grande como naqueles, e em que a vítima poderá ter, quando muito, uma vida vegetativa.

6. Pelo exposto, meu voto ratifica a liminar e concede a segurança.

(MS nº 0011516-37.2011.8.26.0000 TJSP. Des. Rel. Francisco Bruno, 9ª Câmara de Direito Criminal, D.J. 24 de março de 2011) (grifos no original)

HABEAS CORPUS. ANENCEFALIA. ANTECIPAÇÃO DE PARTO. ABORTO. Pedido indeferido em primeiro grau. Admissão do ‘habeas corpus’ em função de precedente do STJ. Ausência de previsão legal. Risco de vida para a gestante não demonstrado. Eventual abalo psicológico não se constitui em excludente da criminalidade.

Trata-se de habeas corpus impetrado por advogados em favor de MICHELE CARVALHO SEIXAS FARIAS. Diz que a requerente é casada há um ano com Samuel da Silva Farias, o qual expressamente concorda com o presente pedido formulado para interrupção terapêutica da gestação da paciente.

[...]

Por tais razões, com a vênia dos que pensam diferentemente e já se pronunciaram no presente feito, não vejo razão jurídica relevante para desacolher a pretensão formulada, o que equivaleria a impor aos recorrentes um árduo sofrimento, coisa que não se inclui entre as funções do Direito, salvo como retribuição pela prática delituosa.

Por derradeiro, incorporo a este voto a singela mas percuciente observação do ilustre Promotor de Justiça que atuou em 1º grau de jurisdição: “A corriqueira resistência ao tema repousa, geralmente, em convicções religiosas.  Todavia, não se pode fundir religião e direito.  Respondam os peticionários, se for o caso, no foro da espiritualidade.  Aos aplicadores da lei impõe-se, tão só, atestar a ausência de óbice jurídico ao pleito, sem impor crenças pessoais aos que dela não compartilham.”

Em face do exposto, DOU PROVIMENTO ao apelo, para deferir o pedido de interrupção da gravidez da primeira apelante, determinando a imediata expedição de ofício ao Serviço de Obstetrícia do Hospital Nossa Senhora da Conceição.

(HC nº 70020596730 TJRS. Des. Rel. Ivan Leomar Bruxel, 1ª Câmara Criminal, D.J. 25 de julho de 2007) (grifos no original)

Então, embora o aborto não tenha ligação direta com a Lei de Planejamento Familiar através dos métodos de contracepção, os assuntos se relacionam ao tangenciarem a polêmica discussão sobre o início da vida humana.

Por fim, pode-se concluir, sob outro ponto de vista, que os elevados índices de abortamento no país refletem deficiência do planejamento familiar. Na versão preliminar da obra “Aborto e Saúde Pública”, do Ministério da Saúde (2008, p. 11), consta que “um estudo recente sobre a magnitude do aborto no Brasil estimou que 1.054.242 abortos foram induzidos no Brasil em 2005”.

4    O PAPEL DO ESTADO NO PLANEJAMENTO FAMILIAR

Sabe-se que o planejamento familiar integra os cuidados à saúde do ser humano (gênero), mais especificamente, da saúde reprodutiva (espécie). Tanto o direito ao planejamento familiar como o direito à saúde foram reconhecidos a todas as pessoas através da Constituição Federal de 1988 (arts. 196, 197 e 227, §7º). Assim, para que tais direito sejam respeitados e viabilizados, caberá a “alguém” o dever de implementá-los: o Estado. Observem-se os mencionados dispositivos constitucionais:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (grifos nossos)

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. (grifos nossos)

Art. 227, §7º. Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. (grifos nossos)

O disposto na CF/88 encontra reforço no art. 2º da Lei nº 8.080/90 e art. 5º da Lei 9.263/96, que reitera a obrigação estatal:

Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

§ 1º. O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

§ 2º. O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade. (grifos nossos)

Art. 5º. É dever do Estado, através do Sistema Único de Saúde, em associação, no que couber, às instâncias componentes do sistema educacional, promover condições e recursos informativos, educacionais, técnicos e científicos que assegurem o livre exercício do planejamento familiar. (grifos nossos)

No mesmo sentido está o §2º do art. 1.565 do CC, que guarda visível semelhança com o art. 227, §7º da CF: “o planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas”.

Ressalte-se, ainda, que o art. 6º da Magna Carta arrola a saúde como um dos direitos sociais, grupo este pertencente à segunda dimensão de direitos e garantias fundamentais e que reinvidica atuação positiva por parte do Estado para efetivação de uma vida digna ao seu povo (ponto 2.3.2). Isto porque é inegável a afirmação de que o planejamento familiar e a saúde se relacionam diretamente com a dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, expõe Ingo Sarlet (2010, p. 132):

O princípio da dignidade da pessoa humana impõe ao Estado, além do dever de respeito e proteção, a obrigação de promover as condições que viabilizem e removam toda sorte de obstáculos que estejam a impedir as pessoas de viverem com dignidade.

Então, em 1988, reverenciando o art. 197 da CF e admitindo a sua responsabilidade perante a sociedade no que toca à saúde, o Poder Público criou o Sistema Único de Saúde (SUS), concentrando neste órgão todo o compromisso perante a população com tudo que se relaciona à saúde.

4.1    SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)

Diante da obrigação de promover, proteger e recuperar a saúde de toda população, o Poder Público, através da descentralização de poder, criou o Sistema Único de Saúde (SUS), no ano de 1988. Ele está previsto na Constituição Federal (art. 198) e de forma mais minuciosa na Lei nº 8.080/90, lei ordinária onde está disposto o conceito, objetivos, atribuições, competências, princípios, diretrizes, organização, direção, gestão, saúde do indígena, atendimento e internação domiciliar, acompanhamento durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, recursos para o financiamento, além de conter regulamentação sobre a participação do setor privado na assistência à saúde.

O Ministério da Saúde e Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde elaboraram “O SUS de A a Z” (2009, p. 40-41), um livro que explana todas as nuances que o sistema único comporta e, inclusive, define o que é “atenção à saúde” para o sistema único:

É tudo que envolve o cuidado com a saúde do ser humano, incluindo as ações e serviços de promoção, prevenção, reabilitação e tratamento de doenças. No SUS, o cuidado com a saúde está ordenado em níveis de atenção, que são a básica, a de média complexidade e a de alta complexidade. Essa estruturação visa à melhor programação e planejamento das ações e serviços do sistema. Não se deve, porém, considerar um desses níveis de atenção mais relevante que outro, porque a atenção à Saúde deve ser integral. Nem sempre um município necessita ter todos os níveis de atenção à saúde instalados em seu território, para garantir a integralidade do atendimento à sua população.

Particularmente no caso dos pequenos municípios, isso pode ser feito por meio de pactos regionais que garantam às populações dessas localidades acesso a todos os níveis de complexidade do sistema. A prioridade para todos os municípios é ter a atenção básica operando em condições plenas e com eficácia.

Importante ressaltar que o SUS é considerado o maior sistema único de saúde pública do mundo (e o melhor, teoricamente). Além disso, com base em dados concretos, é o mais completo e abrangente sistema público de transplante de órgãos do planeta (BRASILIS, 2010).

4.1.1    Conceito e finalidade

De acordo com o art. 198 da CF e art. 2º da Lei nº 8.080/90, o SUS consiste em ações e serviços públicos de saúde implementados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios:

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I – descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

II – atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III – participação da comunidade.

Art. 4º. O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde (SUS). (grifos nossos)

Observe-se: o planejamento familiar enquadra-se nos “serviços assistenciais” previstos no inciso II do art. 198.

O inciso I determina que haverá apenas uma direção do SUS na União, entre os Estados e Municípios. No mesmo sentido, o inciso IX do art. 7º da Lei nº 8.080/90 prevê a “descentralização político-adminitrativa, com direção única em cada esfera de governo” e o art. 9º:

Art. 9º. A direção do Sistema Único de Saúde (SUS) é única, de acordo com o inciso I do artigo 198 da Constituição Federal, sendo exercida em cada esfera de governo pelos seguintes órgãos:

I – no âmbito da União, pelo Ministério da Saúde;

II – no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente; e

III – no âmbito dos Municípios, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente. (grifos nossos)

Contudo, esclarece a cartilha “Entendendo o SUS” (2006, p. 8) – produzida pelo Ministério da Saúde –, que não há hierarquia entre os entes:

A relação entre a União, estados e municípios não possui uma hierarquização. Os entes federados negociam e entram em acordo sobre ações, serviços, organização do atendimento e outras relações dentro do sistema público de saúde. É o que se chama de pactuação intergestores. Ela pode ocorrer na Comissão Intergestora Bipartite (estados e municípios) ou na Comissão Intergestora Tripartite (os três entes federados).

A finalidade do SUS é promover, proteger e recuperar a saúde da sociedade, de forma eficiente, estabelecendo os critérios de atendimento, o fornecimento de medicamentos para combater os diagnósticos, identificação das cidades que necessitam de maior cuidado e repasse para a saúde. Ou seja, o SUS objetiva prestar serviços de saúde à população de forma igualitária, universal e eficaz.

4.1.2    Formas de custeio

O financiamento do SUS é feito da reunião de recursos das esferas de governo e outras fontes, na forma descrita nos incisos dos §§2º e 3º do art. 198 – que são, basicamente, os impostos recolhidos pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios dentro de suas competências tributárias – todos constantes no orçamento da seguridade social.

A Lei nº 8.080/90 destinou o Título V para tratar dos meios de financiamento do sistema único, dividindo-o em três capítulos: dos recursos (arts. 31 e 32), da gestão financeira (arts. 33 a 35) e do planejamento e do orçamento (arts. 36 a 38). Destaque-se os arts. 31 e 32, por complementarem o texto constitucional; o primeiro trata dos recursos advindos da seguridade social e o segundo arrola quais são as “outras fontes” a que a CF se referiu:

Art. 31. O orçamento da seguridade social destinará ao Sistema Único de Saúde (SUS) de acordo com a receita estimada, os recursos necessários à realização de suas finalidades, previstos em proposta elaborada pela sua direção nacional, com a participação dos órgãos da Previdência Social e da Assistência Social, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Art. 32. São considerados de outras fontes os recursos provenientes de:

I – VETADO;

II – serviços que possam ser prestados sem prejuízo da assistência à saúde;

III – ajuda, contribuições, doações e donativos;

IV – alienações patrimoniais e rendimentos de capital;

V – taxas, multas, emolumentos e preços públicos arrecadados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS); e

VI – rendas eventuais, inclusive comerciais e industriais.

(grifos nossos)

O financiamento do SUS foi explanado de forma bastante clara pelo livro do MS, “O SUS de A a Z” (2009, p. 150):

Cada esfera governamental deve assegurar o aporte regular de recursos ao respectivo fundo de saúde de acordo com a Emenda Constitucional nº 29, de 2000. As transferências, regulares ou eventuais, da União para estados, municípios e Distrito Federal estão condicionadas à contrapartida destes níveis de governo, em conformidade com as normas legais vigentes (Lei de Diretrizes Orçamentárias e outras). Esses repasses ocorrem por meio de transferências “fundo a fundo”, realizadas pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS) diretamente para os estados, Distrito Federal e municípios, ou pelo Fundo Estadual de Saúde aos municípios, de forma regular e automática, propiciando que gestores estaduais e municipais contem com recursos previamente pactuados, no devido tempo, para o cumprimento de sua programação de ações e serviços de saúde.

As transferências regulares e automáticas constituem a principal modalidade de transferência de recursos federais para os estados, municípios e Distrito Federal, para financiamento das ações e serviços de saúde, contemplando as transferências “fundo a fundo” e os pagamentos diretos a prestadores de serviços e beneficiários cadastrados de acordo com os valores e condições estabelecidas em portarias do Ministério da Saúde. As transferências voluntárias são, por sua vez, entregas de recursos correntes ou de capital a outra esfera da federação para cooperação, auxílio ou assistência financeira não decorrente de determinação constitucional, legal, ou que se destine ao SUS.

Para arrematar, cumpre dizer que o ordenamento jurídico se preocupou em inibir o desvio de finalidade destas verbas que se destinam ao custeio do sistema único. O art. 199, §2º da CF/88 veda a “destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos”.

Na mesma esteira, o art. 52 da Lei nº 8.080/90 lembra que o emprego irregular de verbas ou rendas públicas está tipificado no art. 315 do CP brasileiro, logo, uso dos recursos destinados ao SUS em finalidades diversas enquadra-se neste crime. Esta conduta é apenada com detenção de um a três meses ou multa.

4.1.3    Regime de pessoal

O Ministro e Secretários estaduais e municipais de saúde que dirigem o SUS são nomeados livremente pelos Chefes do Poder Executivo da respectiva esfera e, da mesma maneira, eles dispõem de alguns cargos em comissão para ocupá-los com pessoas de sua confiança. Todavia, a contratação de pessoal para atuar como agentes comunitários e de combate às endemias deverá ser precedida de concurso público compatível com a complexidade e atribuições dos cargos. É de competência da União dispor sobre o regime jurídico, remuneração, planos de carreira, além de regulamentar sobre estas atividades (art. 198, §§4º e 5º, CF).

O art. 26, §4º da Lei nº 8.080/90 traz a seguinte proibição: “aos proprietários, administradores e dirigentes de entidades ou serviços contratados é vedado exercer cargo de chefia ou função de confiança no Sistema Único de Saúde (SUS)”. O objetivo do legislador ao estabelecer esta vedação foi evitar que as pessoas da iniciativa privada que prestem serviço ao Poder Público se auto-beneficiassem.

4.1.4    Organização, objetivos, competências, atribuições, princípios e diretrizes

Em nível constitucional, as competências do SUS estão arroladas nos oito incisos do art. 200:

Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:

I – controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos;

II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador;

III – ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde;

IV – participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico;

V – incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico;

VI – fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano;

VII – participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos;

VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.

Na Lei nº 8.080/90, pode-se encontrar detalhados os objetivos e atribuições (arts. 5º e 6º), os princípios e diretrizes (art. 7º), a organização, direção e gestão (arts. 8º ao 14) e competências (arts. 15 a 19). Vale ressaltar, dentre todos estes artigos, aqueles que tocam ao tema central desta pesquisa científica, por trazerem o dever de controle e fiscalização sobre os serviços e produtos ligados à saúde, objetos tão presentes na Lei de Planejamento Familiar. A ver:

Art. 5º. São objetivos do Sistema Único de Saúde (SUS):

[...]

III – a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas.

Art. 6º. Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS):

I – a execução de ações:

[...]

d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;

[...]

VII – o controle e a fiscalização de serviços, produtos e substâncias de interesse para a saúde;

[...]

§ 1º. Entende‑se por vigilância sanitária um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde, abrangendo:

[...]

II – o controle da prestação de serviços que se relacionam direta ou indiretamente com a saúde.

Art. 15. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições:

I – definição das instâncias e mecanismos de controle, avaliação e de fiscalização das ações e serviços de saúde.

Art. 16. A direção nacional do Sistema Único da Saúde (SUS) compete:

[...]

VIII – estabelecer critérios, parâmetros e métodos para o controle da qualidade sanitária de produtos, substâncias e serviços de consumo e uso humano;

[...]

XII – controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde;

Observe-se que há em comum entre os textos legais selecionados o controle, fiscalização e poder de regulamentar que o SUS tem sobre as pessoas e instituições públicas ou privadas que lidam com a saúde da população. Todas estas atribuições e competências dadas pelo legislador fazem intersecção com a Lei nº 9.263/96, que as espelha ao abordar, por exemplo, a esterilização voluntária (art. 11) e cadastro, fiscalização e controle das “instituições e serviços que realizam ações e pesquisas na área do planejamento familiar” (art. 14).




 

4.1.5    O setor privado como coadjuvante na assistência à saúde

Nos termos do art. 20 da Lei nº 8.080/90, “os serviços privados de assistência à saúde caracterizam‑se pela atuação, por iniciativa própria, de profissionais liberais, legalmente habilitados, e de pessoas jurídicas de direito privado na promoção, proteção e recuperação da saúde”. Ou seja, é quando instituições privadas realizam as ações e serviços que eram, inicialmente, atribuídas a instituições públicas ligadas ao SUS, visando à mesma finalidade.

A autorização para participação do setor privado, seja pessoa física ou jurídica, nas ações e serviços de saúde está expressa na Constituição Federal (arts. 197 e 199, caput) e Lei nº 9.263/96 (art. 6º):

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. (grifos nossos)

Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. (grifos nossos)

Art. 6º As ações de planejamento familiar serão exercidas pelas instituições públicas e privadas, filantrópicas ou não, nos termos desta Lei e das normas de funcionamento e mecanismos de fiscalização estabelecidos pelas instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde.

Parágrafo único - Compete à direção nacional do Sistema Único de Saúde definir as normas gerais de planejamento familiar.

A Lei do SUS (Lei nº 8.080/90), no seu art. 4º, §2º, endossa as disposições retro: “a iniciativa privada poderá participar do Sistema Único de Saúde (SUS), em caráter complementar”.  No mesmo sentido, o art. 21 da Lei volta a repetir: “a assistência à saúde é livre à iniciativa privada”.

O exercício das ações e serviços pelas instituições privadas também está regulamentada na Lei nº 8.080/90 (art. 1º), onde consta determinado que cabe ao SUS a normatização, fiscalização e controle do referido exercício (arts. 6º, VI; 15, XI; 16, XIV; 22; e 26).

Segundo o Ministério da Saúde, no livro “SUS de A a Z” (p. 108), o credenciamento é o “ato do gestor municipal distrital e estadual certificar um estabelecimento de saúde para a realização de procedimentos constantes nas tabelas do SUS, que pode necessitar ou não de ratificação do gestor federal (habilitação), conforme normas vigentes”.

Diz que a participação do setor privado é coadjuvante porque, de acordo com o art. 199, §1º da CF, esta atuação será complementar à pública, firmada por contrato de direito público ou convênio e deverão ter preferência as entidades filantrópicas e sem fins lucrativos. O dispositivo constitucional é reforçado pelos arts. 4º, §2º; 7º; 8º; 24; e 25 da Lei. Em regra, os serviços públicos contratados serão gratuitos (art. 43 da Lei).

Contudo, vale fazer uma pequena observação: independente de prestar serviços ou não ao sistema único, todos os estabelecimentos que tem como atividade a saúde das pessoas devem ser cadastradas:

Cadastramento de estabelecimentos de saúde: ato do gestor municipal ou estadual cadastrar o estabelecimento de Saúde, de qualquer esfera administrativa, prestador ou não do SUS existente em seu território e sob a sua gestão (responsável pelo alvará de funcionamento), no Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde (Cnes).

(Ministério da Saúde, “SUS de A a Z”, p. 65)

Merece destaque as empresas e capitais estrangeiros, visto que o assunto apareceu em três textos distintos durante a pesquisa: Constituição Federal, Lei nº 8.080/90 e Lei nº 9.263/96. O art. 199, §3º da CF veda a “participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros na assistência à saúde no País, salvo nos casos previstos em lei”.

A mesma proibição consta no art. 23 da Lei do SUS, todavia, faz três ressalvas: doação de organismos internacionais vinculados à ONU, de entidades de cooperação técnica e de financiamento e empréstimos. Em todas elas, haverá autorização e controle do Ministério da Saúde (art. 23, §1º).

No mesmo sentido, art. 7º da Lei de Planejamento Familiar põe como condição para participação de empresas ou capitais estrangeiros “nas ações e pesquisas de planejamento familiar” a autorização, fiscalização e controle pelo órgão de direção nacional do Sistema Único de Saúde, ou seja, Ministério da Saúde.

Além das instituições privadas, o cenário da saúde reprodutiva e da conscientização sobre planejamento familiar no Brasil conta com o trabalho de inúmeras organizações não-governamentais (ONG), como a AADS|Ipas Brasil Ações Afirmativas em Direitos e Saúde). Maria Helena Diniz (2007, p. 166) ainda cita duas outras que participaram da evolução do pensamento sobre o planejamento no país:

Em 1965, foi criada a Sociedade Civil de Bem-Estar Familiar (BENFAM) [sic] com a finalidade de trinar profissionais da saúde para a prática de planejamento familiar e prestação direta de assistência exclusiva em ações contraceptivas, através de unidades próprias ou conveniadas com Prefeituras, sindicatos, Secretarias da Saúde, etc. E o Centro de Pesquisas de Assistência Integrada à Mulher e à Criança (CPAIMC) consolidou uma ideologia contraceptiva intervencionista no meio médico, ao financiar treinamentos de profissionais vinculados ao ensino da medicina, enfermagem e áreas afins, sustentando uma rede de médicos que atuavam na realização de esterilizações cirúrgicas por laparoscopia e distribuindo material contraceptivo.

Portanto, há o reconhecimento da atividade fundamental que as instituições privadas e ONGs realizam perante a sociedade, com o fito único de ajudar o governo brasileiro a promover o bem-estar social, a assistência à saúde e, consequentemente, o desenvolvimento do país.

4.2    O SUS E A LEI Nº 9.263 DE 1996

O direito ao planejamento familiar está intimamente relacionado ao direito à saúde, sendo um desdobramento deste. Por isso, a Lei nº 9.263/96, que tratou de regulamentar o planejamento familiar no Brasil traz, em diversos artigos, o sistema único como órgão competente para normatizar, realizar programas, ações e serviços ligados ao planejamento familiar.

No primeiro deles, o art. 3º, parágrafo único, inciso I da Lei, a concepção e contracepção estão postas como atividades básicas a serem prestadas pelo SUS em todos os níveis, ou seja, por todas as esferas de governo:

Art. 3º, parágrafo único - As instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde, em todos os seus níveis, na prestação das ações previstas no caput, obrigam-se a garantir, em toda a sua rede de serviços, no que respeita a atenção à mulher, ao homem ou ao casal, programa de atenção integral à saúde, em todos os seus ciclos vitais, que inclua, como atividades básicas, entre outras:

I - a assistência à concepção e contracepção; (grifos nossos)

No art. 4º da Lei, enquanto o caput estabelece a igualdade na difusão dos “meios, métodos e técnicas” de planejamento familiar, o parágrafo único garante a efetividade do dispositivo, deixando a cargo do SUS a preparação dos seus agentes para trabalharem nas questões de saúde reprodutiva:

Art. 4º. O planejamento familiar orienta‑se por ações preventivas e educativas e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade.

Parágrafo único. O Sistema Único de Saúde promoverá o treinamento de recursos humanos, com ênfase na capacitação do pessoal técnico, visando a promoção de ações de atendimento à saúde reprodutiva. (grifos nossos)

O art. 5º da Lei volta tocar na difusão de conhecimentos sobre planejamento familiar à população, ressaltando a importância da informação para a efetividade do planejamento:

Art. 5º. É dever do Estado, através do Sistema Único de Saúde, em associação, no que couber, às instâncias componentes do sistema educacional, promover condições e recursos informativos, educacionais, técnicos e científicos que assegurem o livre exercício do planejamento familiar. (grifos nossos)

Logo adiante, o art. 6º deixa clara a autorização de participação do setor privado ao lado do público na missão de proporcionar às pessoas ações de planejamento familiar, cabendo ao SUS definir estas ações e controlar as instituições de ambos os regimes:

Art. 6º. As ações de planejamento familiar serão exercidas pelas instituições públicas e privadas, filantrópicas ou não, nos termos desta Lei e das normas de funcionamento e mecanismos de fiscalização estabelecidos pelas instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde. (grifos nossos)

Parágrafo único - Compete à direção nacional do Sistema Único de Saúde definir as normas gerais de planejamento familiar. (grifos nossos)

No mesmo sentido, o art. 14 da Lei:

Art. 14. Cabe à instância gestora do Sistema Único de Saúde, guardado o seu nível de competência e atribuições, cadastrar, fiscalizar e controlar as instituições e serviços que realizam ações e pesquisas na área do planejamento familiar. (grifos nossos)

No art. 7º da Lei consta uma questão já discutida nesta pesquisa científica na parte final do ponto 4.1.5: “participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros nas ações e pesquisas de planejamento familiar”. Foi visto que o art. 199, §3º traz uma vedação geral a esta participação e ressalva as hipóteses trazidas por Lei, seguido pelo art. 23, §1º da Lei 8.080/90. E o art. 7º da Lei 9.263/96 apresenta, justamente, uma hipótese de autorização, que fica sob os cuidados do SUS:

Art. 7º. É permitida a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros nas ações e pesquisas de planejamento familiar, desde que autorizada, fiscalizada e controlada pelo órgão de direção nacional do Sistema Único de Saúde. (grifos nossos)

As pesquisas sobre controle de fecundidade encontram uma limitação no art. 8º da Lei. O mencionado artigo coloca o SUS como responsável pela fiscalização destas pesquisas, garantindo que elas sejam feitas dentro dos parâmetros permitidos e dos critérios da OMS – agência especializada em saúde ligada à ONU. Ou seja, uma vez que as experiências tenham que passar obrigatoriamente pelo controle do sistema único, estar-se-á inibindo práticas inescrupulosas e antiéticas:

Art. 8º. A realização de experiências com seres humanos no campo da regulação da fecundidade somente será permitida se previamente autorizada, fiscalizada e controlada pela direção nacional do Sistema Único de Saúde e atendidos os critérios estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde. (grifos nossos)

O art. 11 da Lei também prevê participação do SUS. Nele, está disposto que a esterilização voluntária “será objeto de notificação compulsória à direção do Sistema Único de Saúde”. Inclusive, a não observância da regra pelo médico implicará em detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa (art. 15).

4.3    PROGRAMAS DE PLANEJAMENTO FAMILIAR DESENVOLVIDOS PELO MINISTÉRIO DA SAÚDE    

O Ministério da Saúde, órgão pertencente à Administração Direta do governo brasileiro, responsável por gerir e fiscalizar a saúde no país, ao longo dos anos demonstrou preocupação em zelar pela saúde reprodutiva da população. Prova disto são os diversos programas desenvolvidos pelo Ministério, que visam não só preservar a mencionada saúde reprodutiva como também difundir informações, levando conhecimento ao público.

Inicialmente, o Ministério da Saúde desenvolveu inúmeros programas à partir dos anos 70, com o Programa de Saúde Materno-Infantil, o Programa de Prevenção de Gravidez de Alto Risco (1977) e o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (1983) (DINIZ, 2007, p. 166).

No ano de 2004, considerando que a Lei de Planejamento Familiar se estende até a assistência ao parto, ao puerpério e ao neonato (art. 3º, inciso III da Lei), o Ministério da Saúde implementou o Pacto Nacional pela Redução de Mortalidade Materna e Neonatal.

Após, em 2007, foi criada a Política Nacional de Planejamento Familiar, que consiste na distribuição gratuita de oito métodos contraceptivos nas unidades básicas de saúde a mulheres entre 10 a 49 anos (idade fértil), bem como na venda mais barata destes anticoncepcionais nas Farmácias Populares. De acordo com o sítio eletrônico do governo brasileiro, “graças à política de distribuição de meios anticonceptivos, houve diminuição no número de gravidezes indesejadas. Esse fator pode ter contribuído com a queda nos índices de abortos inseguros e, consequentemente, na mortalidade materna”. Os oito métodos mencionados são: anticoncepcional injetável trimestral, anticoncepcional injetável mensal, pílula oral combinada, diafragma, DIU, preservativo (masculino e feminino), pílula de emergência e minipílula. De acordo com os números mais recentes fornecidos pela página do MS na internet, o SUS realizou 61.847 laqueaduras em 2008 e 34.144 vasectomias em 2009, alcançando as metas estabelecidas pelo “Programa Mais Saúde: Direito de Todos”.

De outro lado, foi elaborada também a Política Nacional de Atenção Integral em Reprodução Humana Assistida (Portaria nº 426/GM de 22/03/2005) com objetivo inverso: propiciar auxílio no tratamento da infertilidade. Este apoio pode ser encontrado em, pelo menos, cinco hospitais e centros clínicos, como o Centro de Reprodução Assistida do Hospital Regional da Asa Sul (HRAS), Centro de Referência em Saúde da Mulher, Instituto Materno Infantil de Pernambuco (IMIPE), Hospital Universitário de Ribeirão Preto, Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (USP) e Hospital Universitário da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Em 2008, o Ministério criou o Programa Saúde na Escola (PSE), com a finalidade de levar aos colégios o conhecimento sobre gravidez e formas de preveni-la e, assim, reduzir os índices de gestação entre os adolescentes.

Existem também as Políticas Nacionais de Atenção Integral à Saúde do Homem e da Mulher, políticas estas que focam nos problemas relacionados à cada gênero no que tange à saúde reprodutiva e cuidam de orientar os homens e mulheres sobre eles. Quanto às mulheres, ainda há outras ações específicas, desenvolvidas em conjunto com outros ministérios, departamentos e áreas técnicas, como a Saúde da População Indígena (com a Funasa), Saúde da Mulher Negra (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial - SEPPIR), Saúde da Mulher Trabalhadora (SGTES e Área Técnica de Saúde do Trabalhador) e Violência contra a Mulher (Secretaria Especial de Políticas para Mulheres e Secretaria Nacional de Segurança Pública).

O Ministério da Saúde também promove – com financiamento do Departamento de Atenção Básica da Secretaria de Atenção à Saúde e do Departamento de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos – a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS). O livrete “O SUS de A a Z” (p. 240-241) traz a sua finalidade:

A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Mulher e da Criança (PNDS) objetiva, por meio da coleta de informações, a elaboração de indicadores demográficos, de saúde e de nutrição para mulheres em idade fértil, de 15 a 49 anos e crianças menores de cinco anos para subsidiar a avaliação de políticas e estratégias de ação nessas áreas. Os dados relevantes levantados serão apontados no campo da saúde reprodutiva da mulher, na história de nascimentos, na anticoncepção, na esterilização, no planejamento da gravidez, no aleitamento materno, na vacinação e saúde, no casamento e atividade sexual da mulher, na segurança alimentar, no acesso aos medicamentos, na antropometria, nos exames bioquímicos, entre outros.

Uma destas pesquisas, concluída em 1996, demonstrou que “cerca de 50% das mulheres que foram mães entre 1990 e 1995 tiveram uma gravidez não-planejada”, o que ratifica a importância da difusão do planejamento familiar no país.

Finalmente, vale dizer que o Ministério também incentivou iniciativas privadas de conscientização e difusão de conhecimentos sobre o planejamento familiar, como nos casos das ONGs Sociedade Civil de Bem-Estar Familiar (BEMFAM), fundada em 1965 e Centro de Pesquisas de Assistência Integrada à Mulher e à Criança (CPAIMC). Estas instituições, inclusive, realizam procedimentos e distribuem medicamentos contraceptivos.

4.4    MÍNIMO EXISTENCIAL, RESERVA DO POSSÍVEL    E DIREITO SUBJETIVO AO PLANEJAMENTO FAMILIAR                    

A dignidade da pessoa humana está disposta no art. 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988 como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Contudo, questionou-se sobre em que consistiria esta dignidade, ou seja, o que seria preciso para se dizer que certa pessoa tem uma vida digna. Então, foram estabelecidas algumas condições mínimas de existência – que são relativas, posto que dependem do contexto socioeconômico em que a pessoa está inserida. Nesse sentido, expõe Nidia Caldas Farias, citando Robert Alexy (20--, p. 24):

[...] a idéia do mínimo existencial reporta-se ao princípio da igualdade de fato, cuja aplicação torna viável uma ponderação nacionalmente controlável dos valores em jogo conforme as circunstâncias espaço, temporais vigentes. Nesse sentido, introduz a noção de um mínimo existencial relativo, passível de se adequar [...].

Fernando Facury Scaff (2006, p. 148) ) endossa este raciocínio:

O mínimo existencial não é uma categoria universal. Varia de lugar para lugar, mesmo dentro de um mesmo país. É a combinação de capacidades para o exercício de liberdades políticas, civis, econômicas e culturais que determinará este patamar de mínimo existencial. Não são apenas os aspectos econômicos os principais envolvidos.

Assim, o mínimo existencial caracteriza-se como sendo as condições materiais indispensáveis a uma existência digna, levando-se em consideração a comunidade à qual a pessoa faz parte.

Este mínimo existencial confunde-se com os direitos fundamentais inerentes ao indivíduo, vez que estes direitos visam garantir às pessoas uma vida pautada na dignidade. Note-se que, principalmente no que tange aos direitos sociais, a garantia destes direitos dependem de uma prestação positiva do Poder Público e, consequentemente, dos recursos que ele arrecada – já que grande parte dos direitos coletivos envolve gastos econômicos (BUCOSKI; SILVEIRA, 2008, p. 304). Ocorre que a verba recolhida pelo Estado não é suficiente para manter toda a Administração e ainda assegurar todos os direitos sociais constitucionalmente previstos, de modo que se soluciona a escassez de recursos fazendo-se a prestação dentro das possibilidades do Estado. É aqui que se justifica a teoria da reserva do possível.

Assim, a reserva do possível é o limite encontrado pelo Estado para conciliar a obediência aos mandamentos da Carta Magna e os recursos orçamentários que dispõe. Ingo Sarlet e Mariana Figueiredo (2007, p. 188) abordam a questão:

De acordo com a noção de reserva do possível, a efetividade dos direitos sociais a prestações materiais estaria sob a reserva das capacidades financeiras do Estado, uma vez que seriam direitos fundamentais dependentes de prestações financiadas pelos cofres públicos. [...] dependem da real disponibilidade de recursos financeiros por parte do Estado, disponibilidade esta que estaria localizada no campo discricionário das decisões governamentais e parlamentares, sintetizadas no orçamento público.

[...]

A reserva do possível constitui, em verdade (considerada toda a sua complexidade), espécie de limite jurídico e fático dos direitos fundamentais, mas também poderá atuar, em determinadas circunstâncias, como garantia dos direitos fundamentais, por exemplo, na hipótese de conflito de direitos, quando se cuida da invocação – desde que observados os critérios da proporcionalidade e da garantia do mínimo existencial em relação a todos os direitos fundamentais – da indisponibilidade de recursos com o intuito de salvaguardar o núcleo essencial de outro direito fundamental.

Ao compreender que o Poder Público enfrenta escassez de recursos e que, por isso, tem de enquadrar a prestação de direitos às suas condições orçamentárias, os autores retro observam que a teoria da reserva do possível também tem como vertente o princípio da igualdade e da razoabilidade. Assim, além de já estar consignado que a prestação não será feita a todos, também deverá ficar evidente que, dentre os agraciados, será dada prioridade aos hipossuficientes. Observe-se o seguinte trecho do artigo (2007, p. 189):

[...] Com efeito, mesmo em dispondo o Estado dos recursos e tendo o poder de disposição, não se pode falar em uma obrigação de prestar algo que não se mantenha nos limites do razoável. Assim, poder-se-ia sustentar que não haveria como impor ao Estado a prestação de assistência social a alguém que efetivamente não faça jus ao benefício, por dispor, ele próprio, de recursos suficientes para seu sustento.

É importante que o Poder Público considere a situação da máquina estatal para poder melhor prover a sociedade. De nada adianta fazer uma prestação superficial e a todos dos mencionados direitos e se olvidar da finalidade maior de promover o bem-estar, a igualdade e gerir adequadamente o Estado.  É o que Holmes e Sunstein – citados por Sarlet e Figueiredo (2007, p. 191) – quiseram transparecer ao afirmarem que “levar direitos sociais a sério (especialmente pelo prisma da eficácia e efetividade) é sempre também levar a sério o problema da escassez”.

Scaff (2007, p. 158) sinaliza que sobre a invocação da teoria da reserva do possível: “esta teoria somente pode ser arguida quando for comprovado que os recursos públicos estão sendo utilizados de forma proporcional aos problemas enfrentados pela parcela da população que não puder exercer sua liberdade jurídica [...]”.

Todavia, a teoria da reserva do possível comumente vem tendo a sua finalidade desviada pelos gestores do Poder Público, que a usam para se eximir das suas obrigações, mesmo quando elas estão dentro das possibilidades.

[...] a reserva do possível há de ser encarada com reservas, [...] as limitações vinculadas à reserva do possível não são, em si mesmas, necessariamente uma falácia. O que tem sido, de fato, falaciosa, é a forma pela qual muitas vezes a reserva do possível tem sido utilizada entre nós como argumento impeditivo da intervenção judicial e desculpa genérica para a omissão estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais, especialmente de cunho social. (SARLET; FIGUEIREDO, 2007, p. 191)

O Ministro Celso de Mello se pronunciou nesta mesma esteira no julgamento da ADPF nº 45, qual foi relator:

Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da “reserva do possível” – ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível – não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.

Um dos pontos chaves desta pesquisa científica está justamente em observar a relação entre o mínimo existencial, a teoria da reserva do possível e o direito fundamental ao planejamento familiar – principalmente no aspecto da concepção. Valendo-se de tudo quanto foi visto dos dois primeiros institutos, considerem-se os inúmeros casais onde um ou ambos sofrem de infertilidade, mas também não tem condições de arcar com os caros tratamentos para concepção: os direitos à maternidade e à paternidade podem ser considerados como um mínimo existencial à vida digna? Há um direito subjetivo à prestação de assistência por parte do Estado? É oponível a este direito a alegação de escassez de verbas?

Muito embora o art. 226, §7º da CF/88 e art. 3º, parágrafo único, inciso I da Lei nº 9.263/96 determinem ser dever do Estado promover o planejamento familiar, a assistência à concepção e à contracepção, este é um dos casos onde (como vimos) o Poder Público se utiliza da teoria da reserva do possível para justificar a sua omissão, alegando trata-se de mera satisfação pessoal que não pode prevalecer sob pena de prejudicar a coletividade. Na contramão deste pensamento, Ingo Sarlet e Mariana Figueiredo (2007, p. 196) sustentam que os direitos sociais (e aqui se enquadra o direito à maternidade) são direitos subjetivos a prestações materiais, não sendo oponível a reserva do possível:

Até mesmo a tese de que a reserva do possível poderia servir de argumento eficiente a afastar a responsabilidade do Estado (por ação ou omissão, vale dizer!) não nos parece possa ser aceita, ainda mais de modo generalizado, na esfera das prestações que inequivocadamente dizem com o mínimo existencial. Que a defesa de um direito subjetivo definitivo na esfera das prestações vinculadas ao mínimo existencial e a superação da reserva do possível especialmente neste âmbito – aqui retomada sem maior desenvolvimento – não afasta a necessidade de se discutir uma série de problemas (parte dos quais já anunciados) e não responde todas as indagações, resulta evidente.

Na mesma linha, Frederico Menezes Breyner (2008, p. 128):

[...] como a nossa Constituição adota o modelo democrático de Estado de Direito (art. 1º), cumpre observar em seu texto as normas que imputam ao Poder Público o dever de oferecer prestações positivas, atribuindo aos cidadãos o direito subjetivo de exigir a atuação, de forma a garantir o pleno exercício das liberdades e faculdades jurídicas. São elas: art. 6º (que abarca amplamente os direitos sociais); art. 144 (segurança pública); art. 196 (saúde); art. 205 (educação); art. 225 (meio ambiente ecologicamente equilibrado); art. 230 (amparo ao idoso); art. 226, §7º (direito a recursos educacionais e tecnológicos necessários ao planejamento familiar); art. 227 (amparo à criança e ao adolescente). (grifos nossos)

Diante da resistência do Estado e do sentimento de violação de um direito pelo cidadão acometido pela infertilidade, este tende a recorrer ao Poder Judiciário para ver garantido o seu direito. Mas, se na doutrina aparentemente se evidencia um posicionamento pró prestacional e defesa do planejamento familiar como mínimo existencial, na jurisprudência o que se percebe é uma postura que se aproxima mais à dos administradores públicos. No ponto a seguir, veremos como os Tribunais se comportam perante o direito fundamental ao planejamento familiar.

4.5    EXAME JURISPRUDENCIAL                            

Ao Poder Judiciário cabe a colocar em prática o reconhecimento do planejamento familiar como um direito constitucionalmente previsto. Não se encontram demandas no que toca ao fornecimento de métodos anticoncepcionais por parte do Estado; aparentemente, a população não tem tido problemas quanto a isto que justifique recorrer às vias judiciais. No entanto, quando o enfoque são os métodos de concepção, depare-se com um daqueles casos em que a prática se distancia da teoria.

Muito embora haja o reconhecimento das técnicas concepcionais como um direito e sua importância para a sociedade, os magistrados esbarram nas questões do mínimo existencial e da reserva do possível – anteriormente trabalhadas. O entendimento majoritário da jurisprudência brasileira caminha no sentido de que não cabe a prestação individual de métodos conceptivos pelo Estado, diante da impossibilidade de fazê-la para todos aqueles que necessitam em atendimento ao princípio da isonomia. Ou seja, não se conhece direito subjetivo individual. Observem-se os seguintes julgados:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ART. 226 DA CF E LEI Nº 9.263/96. DIREITO AO PLANEJAMENTO FAMILIAR. INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL. TRATAMENTO. DIREITO SUBJETIVO CONSTITUCIONAL. INEXISTÊNCIA. URGÊNCIA. INOCORRÊNCIA.

I - A norma constitucional que cuida do planejamento familiar (art. 226, da CF), bem como a Lei nº 9.263/96, que o regula em nível infraconstitucional, determinam o respeito à liberdade de decisão do casal acerca da prole e, abarcados nessa seara, o dever estatal de propiciar recursos (educacionais e científicos) para o exercício desse direito, assim como, por consectário lógico, a vedação de qualquer mecanismo coercitivo por parte das instituições oficiais ou privadas que impeçam a implementação do planejamento familiar.

II - Nessa esfera de respeito e garantia à liberdade de planejamento familiar assegurados constitucionalmente, que se insere o dever estatal (educacional e científico) previsto no tratamento normativo. Não se olvida que ao Estado incumbe, em seu papel solidarista e humanista, dispensar a assistência necessária ao exercício do direito de planejamento familiar, inserida nesse contexto a assistência à concepção e à contracepção. Tal dever de assistência, todavia, não inclui nem autoriza direito subjetivo constitucional à reprodução in vitro.

III - Não se vislumbra imprescindibilidade à saúde da Autora do tratamento pleiteado (inseminação artificial), de forma a comprometer a sua integridade física, não obstante respeitar-se a louvável pretensão deduzida, a maternidade.

(Apelação Cível nº 2005.51.01.004958-3 TJRJ. Relator: Des. Sérgio Schwaitzer, Sétima Turma Especializada. Julgamento: 11/07/2007. Publicação: 24/07/2007, pág. 595)

Apelação Cível. Ação Cominatória com pedido de antecipação de tutela. Fornecimento de medicamentos para tratamento e posterior submissão ao procedimento de fertilização //; vitro. Autora que busca medicação para posterior tentativa de engravidar por método de fertilização mas que não é portadora de qualquer doença que a coloque em risco, ou que obrigue o Estado a fornecer os meios. Ação julgada procedente na origem. Precedentes desta Corte. Recurso provido para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido.

(Apelação Cível nº 0002342-63.2010.8.26.0024 TJSP. Relator: Des. Rui Stoco, 4ª Câmara de Direito Público. Julgamento: 05/12/2011. Registro: 18/01/2012)

MEDICAMENTO — Disponibilização de tratamento gratuito para a reprodução assistida pela rede pública de saúde — Não fornecimento de medicamentos prescritos para o tratamento — Dever de ponderação entre o direito ao planejamento familiar e o direito à vida. Aplicação, no presente caso, do princípio da reserva do possível — Recurso improvido

(Apelação Cível nº 0473079-98.2010.8.26.0000 TJSP. Relator: Des. Moacir Peres, 7ª Câmara de Direito Público. Julgamento: 20/06/2011. Registro: 04/07/2011)

Agravo de instrumento. Mandado de segurança. Fornecimento de medicamento para fertilização "in vitro". Liminar indeferida. Insurgência. Descabimento. Ausência dos requisitos legais ("fumus boni júris" e "periculum in mora"). Tratamento que não visa debelar risco à saúde da agravante, mas apenas a atender expectativas pessoais. Necessidade de racionalização no cumprimento do comando constitucional. Decisão mantida. Recurso improvido.

(Agravo de Instrumento nº 0584164-89.2010.8.26.0000 TJSP. Relator: Des. Osni de Souza, 8ª Câmara de Direito Público. Julgamento: 09/02/2011. Registro: 17/02/2011)

Destaque-se a decisão do desembargador (e também doutrinador) Sérgio Cavalieri Filhos:

FERTILIZAÇÃO IN VITRO. Pretensão de Custeio de Tratamento pelo Estado. Impossibilidade. A Constituição da República assegura o direito à saúde e prevê, em contrapartida, o dever de o Estado, mediante políticas sociais e econômicas, viabilizar o acesso universal igualitário a serviços e ações para sua proteção e recuperação (art. 196). Para tanto, os recursos públicos, já tão escassos, devem ser destinados a pessoas hipossuficientes economicamente, a fim de atender ao maior número de necessitados e de forma igualitária, como determina a Lei Maior.

Na espécie, a pretensão da impetrante não se inclui no âmbito de proteção ao direito fundamental à saúde (CR, 196, caput), pois se refere a tratamento de fertilização in vitro, por alegada hipossuficiência econômico-financeira e infertilidade da autora. Trata-se de caro procedimento que não é assegurado em lei, nem regulamentado em programa governamental de planejamento familiar. A autora não está acometida de doença alguma; apesar de conexo, o planejamento familiar (CR, 226, §7º) não se confunde com o direito à saúde. De outro lado, a suposta infertilidade da autora foi por ela mesma causada, porque se submeteu, há aproximadamente nove anos, ao procedimento de laqueadura de trompas, ciente dos riscos e da dificuldade de reversão. Denegação da ordem.

(Mandado de Segurança nº 1.464/2008 TJRJ. Relator: Des. Sérgio Cavalieri Filho, Décima Terceira Câmara Cível. Julgamento: 25/03/2009. Publicação: 27/04/2009) (grifos no original)

Em quantidade consideravelmente menor, encontram-se também decisões onde os julgadores entenderam haver o compromisso do Estado no provimento de saúde (no sentido amplo) e, assim sendo, é de sua obrigação cumpri-la:

APELAÇÃO CÍVEL - Mandado de Segurança - Prestação de serviço público e obrigação de fazer - Fornecimento de medicamentos para a realização de fertilização in vitro - Hipossuficiência para a aquisição - Admissibilidade - A Constituição Brasileira e a Estadual garantem o amplo acesso e o atendimento integral à saúde da população, sem nenhuma restrição - Inexistência de dispositivo legal que limite o fornecimento de medicamentos apenas aos cidadãos que estejam em iminente perigo de morte - A saúde deve ser interpretada em seu sentido amplo, englobando o aspecto físico e mental do ser humano - Recurso provido.

(Apelação Cível n 578.558-5/5-00 TJSP. Relator: Des. Osvaldo de Oliveira, 12ª Câmara de Direito Público. Julgamento: 30/07/2009. Registro: 09/09/2008)

REPRODUÇÃO ASSISTIDA. INFERTILIDADE HUMANA E SAÚDE. DIREITO DO CIDADÃO. ART. 226, § 7º, CF/88. INFERTILIDADE E SAÚDE. ARTIGOS 6º, 23, II, E 196, CF/88.

A infertilidade humana corresponde a problema de saúde, como reconhecido pelo Conselho Federal de Medicina, não deixando a reprodução assistida, consistente no procedimento médico de assegurar a gravidez, de atender dever do Estado vinculado ao planejamento familiar, cujo regramento constitucional está no art. 226, § 7º, CF/88.

Reconhece o Estado brasileiro, regulamentando pauta constitucional, ser direito de todo cidadão o planejamento familiar (art. 1º, Lei nº 9.263/96), com o que assumiu prestações de ordem variadas para permitir sua efetivação, inclusive no campo da saúde, atraindo toda a jurisprudência formada em torno dos arts. 6º, 23, II e 196, CF/88.

Se é certo, quanto aqueles que não disponham de condições financeiras, estar prevista cobertura pelo SUS (art. 3º, parágrafo único, Lei nº 9.263/96), em cujo âmbito instituída a Política Nacional de Atenção Integral em Reprodução Humana Assistida (Portaria nº 426/GM, de 22.03.05; Portaria nº 388, do Secretário de Atenção à Saúde, de 06.07.05), no entanto não se pode deixar ao relento casos em que tal atendimento resta impossibilitado ou extremamente difícil.

(Apelação Cível nº 70039644265 TJRS. Relator: Des. Armínio José Abreu Lima da Rosa, Vigésima Primeira Câmara Cível. Julgamento: 26/01/2011. Publicação: 11/02/2011)

Interessante destacar que, no voto deste mesmo acórdão, o Desembargador Relator sustenta que é “é inegável a preponderância do direito à saúde, assegurado pela Constituição Federal, frente ao princípio da reserva do possível”.

A desembargadora Teresa de Andrade Castro Neves é ainda mais veemente e defende que o direito ao planejamento familiar, amplamente considerado, é também o direito de ser feliz:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. MEDICAMENTOS PARA FERTILIZAÇÃO IN VITRO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. DIREITO À FAMÍLIA. DIREITO DE SER FELIZ.

É dever do Estado garantir o planejamento familiar, seja através de métodos contraceptivos, como conceptivos. Art. 226, § 7º, da CRFB/88. Art. 294, da CERJ. Lei nº. 9.263/96. Pretensão de obter medicamentos necessários ao tratamento para fertilização in vitro não foge do postulado de garantia à saúde, que deve ser assegurado pelo Poder Público. Não obstante a existência de outras formas para se ter um filho, como a adoção, por exemplo, não é possível privar a cidadã hipossuficiente de gerar um filho em seu ventre, já que a infertilidade e o impedimento de conceber um filho pela via natural pode acarretar abalo na saúde psicológica da autora, cabendo ao Estado garantir, assim, a saúde dos seus administrados. A premissa de que não implica em risco à saúde o fato de não poder ter filho não se sustenta, mormente porque o Conselho Federal de Medicina reconhece a infertilidade como uma patologia, que pode ter consequências psicológicas e psiquiátricas, inclusive. Assim como o Estado fornece medicamentos e preservativos para contracepção, deve também fornecer os meios para a concepção àqueles que não tem condições financeiras de custear os medicamentos decorrentes do tratamento. Ademais, é dever constitucional do Estado garantir a todos o direito à vida digna, à família e a ser feliz, sendo irrefutável que a sobrevivência digna e feliz da autora se dará com a concepção do seu filho, não podendo o Estado ser presente num aspecto do planejamento familiar (contracepção) e omisso noutro (concepção). Reforma da sentença. Provimento do recurso.

(Apelação Cível nº 0024323-86.2008.8.19.0001 TJRJ. Relator: Des. Teresa de Andrade Castro Neves, Sexta Câmara Cível. Julgamento: 09/11/2011. Publicação: 16/11/2011) (grifos no original)

Pode-se concluir que, apesar da preponderância jurisprudencial no sentido de que o dever do Estado na prestação de métodos e técnicas conceptivas é relativizado pelo princípio da reserva do possível, também existem decisões recentes que entendem fazer parte da essencialidade da vida o efetivo direito ao planejamento familiar. Note-se também que a divergência existe devido à escassez de leis em torno do tema.

5    CONSIDERAÇÕES FINAIS

O planejamento familiar relevância tanto a nível mundial – já que o planeta que alcançou a marca de sete bilhões de habitantes e tem recursos cada vez mais escassos – como no caso específico do Brasil, um país com grande potencial de desenvolvimento, posto que o êxito do seu avanço está intimamente ligado ao povo que o sustenta. Para fazer frente a outros Estados soberanos, o país precisa primeiro “arrumar a casa”, é dizer, ter sob controle o seu crescimento populacional, índices de natalidade, formação planejada da família e, consequentemente, a diminuição de abortos e de todas as experiências negativas que a maternidade/paternidade indesejada podem representar. Assim, o trabalho busca demonstrar a importância da paternidade responsável e do planejamento e o quanto isto influência desde o pequeno núcleo familiar até na emergência de um país.

A pesquisa também destrinchar a Lei nº 9.263/96, a Lei de Planejamento Familiar brasileira, esclarecer sobre suas regras – conceito e finalidade do planejamento familiar, métodos conceptivos e contraceptivos, assistência estatal na prestação destes métodos, participação do setor privado e penalidades intrínsecas –, mas, principalmente, apontar as muitas lacunas existentes nela. O ordenamento jurídico pátrio carece de normais que preencham as diversas interrogações que pairam entre doutrinadores, magistrados e pensadores do direito. O trabalho aponta a necessidade de “selar” melhor a matéria, diminuir sensivelmente as brechas e, por consequência, dar mais segurança jurídica à questão em voga, podendo funcionar, inclusive, como subsídio para os órgãos competentes.

Além disso, procurou-se estabelecer a obrigação e responsabilidade do Estado na prestação de informações, ações e serviços relacionados ao direito fundamental de planejamento familiar, constitucionalmente assegurado pelo art. 226, §7º, através do Sistema Único de Saúde (SUS). E, finalmente, objetivou-se ponderar a existência do direito subjetivo ao referido planejamento, a mínimo existencial e a reserva do possível – esta, tão alegada pelo Poder Público –, bem como observar como os Tribunais brasileiros estão se comportando perante o tema.

O intuito foi, realmente, explorar o planejamento familiar, que apesar de ser um assunto bastante rico e interessante, não tem tido a devida atenção por parte dos legisladores. Anseia-se, sem nenhuma pretensão, que a presente pesquisa científica – repita-se! – sirva como inspiração ou, pelo menos, como material para debate e fomentação de ideias que procurem reduzir a mencionada carência de normas.

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Sobre a autora
Fernanda de Oliveira Santana Ramos

Advogada. Bacharela pela Faculdade de Direito da Universidade Católica do Salvador. Pós-graduada em Direito do Estado pelo JusPodivm.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Monografia apresentada ao JusPODIVM como requisito parcial para a obtenção de grau de Especialista em Direito do Estado.

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