Terceirização de serviços: necessidade urgente da elaboração de um marco legal

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Necessidade de elaboração de uma lei que discipline a terceirização. a terceirização é tema atualmente de Repercussão Geral no Supremo Tribunal Federal.

                                    Os que são contra a elaboração de uma lei que discipline a terceirização acreditam que, sendo ela elaborada,  poderão  ocorrer abusos de toda ordem com prejuízos aos trabalhadores que exercem esses serviços.   

                                    Esquecem, porém, que todo e qualquer abuso  nessa área será sempre apurado pelo Ministério Público do Trabalho, como lhe determina a Constituição. A própria fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, na companhia ou não das entidades sindicais de trabalhadores interessadas, pode e deve agir contra todos os que praticam os  referidos abusos, que violam a legislação trabalhista.   

                                    Atualmente, o vazio legal sobre a terceirização de serviços é preenchido pela Súmula n. 331, do Tribunal Superior do Trabalho, que está vazada nos seguintes termos:   

 “Contrato de prestação de serviços. Legalidade.  

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei n. 6.019, de 3.1.1974).  

II — A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

 III — Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei n. 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.  

IV — O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei n. 8.666, de 21.6.1993)”.  

                                    Essa Súmula foi redigida para  vedar a contratação dos  serviços terceirizados  relativos à atividade-fim da empresa contratante. Com isso,  ela tem provocado uma apreciável insegurança jurídica para os trabalhadores e para os empregadores. Essa insegurança jurídica deságua no Poder Judiciário trabalhista sob a capa de milhares de reclamações trabalhistas individuais ou plúrimas e de ações coletivas ajuizadas pelo Ministério Público do Trabalho ou por entidades sindicais.  

                                    Sensível a essa grave questão, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, em maio do ano passado, a existência da repercussão geral no Agravo em Recurso Extraordinário n. ARE 713.211, que se encontra pendente de julgamento. Nele será discutido o conceito de atividade-fim nesses casos de terceirização de serviços.  

                                     O Ministro Relator Luiz Fux  deixou assentado no reconhecimento da repercussão geral desse processo que a delimitação das hipóteses de terceirização diante do que se compreende por atividade-fim é matéria de índole constitucional, onde sobreleva a ótica da liberdade de contratar. Registrou ele, inclusive, que a existência de inúmeros processos sobre essa matéria poderia ensejar condenações pecuniárias expressivas por danos morais coletivos semelhantes  àquela imposta no citado processo.

                                     Sublinhe-se que nós nos posicionamos a favor da tese de que a terceirização não se há de restringir às atividades-meio de uma empresa, como consta da Súmula n. 331, do TST.

                                   Como crítica a essa Súmula,  sustentamos que cabe ao administrador do empreendimento verificar o que mais lhe convém, isto é, se a terceirização deve limitar-se a algo que não se relacione com a sua atividade principal ou se esta poderá, também, ser incluída no processo.

                           Ora, a Constituição Federal não abriga qualquer disposição que vede tal tipo de negócio jurídico e, por via de consequência, inexiste lei ordinária que proíba semelhante operação.

                           Está o empresário, em seu labor, sob a proteção de dois dispositivos da Lei Fundamental, quais sejam o art. 5º, XIII e art. 170. O primeiro estabelece que “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

                           Nada e nem ninguém podem impedir o exercício de atividades lícitas inerentes à administração de uma empresa.

                           Mas essa liberdade sofre, ainda no plano constitucional, certo condicionamento. É o que deflui do segundo dispositivo citado (art. 170) da Lex Legum: “A ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social...”.

                           A liberdade econômica ou a livre iniciativa não podem ser levadas a extremos que importem no aviltamento do trabalho humano. Os assalariados, por seu turno, estão impossibilitados de exigir vantagens e privilégios que põem em risco o bem-estar de todos, ou melhor, da comunidade. Como se vê, vários são os planos da liberdade que se limitam reciprocamente.         

                           Nessa linha de raciocínio, se o empresário transfere a terceiros certas operações com o objetivo de fraudar direitos dos trabalhadores, é curial que tal censurável prática será considerada nula por força do disposto no art. 9º, da CLT: “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”.                     

                                    Recorde-se que o princípio da legalidade, albergado na Constituição, tem o seguinte significado para o particular: “este é livre de praticar o ato desde que não seja proibido por lei”.   

                                    Já para o Poder Público, o princípio da legalidade tem outro significado, qual seja “ele só pode praticar aquilo que estiver previsto em lei”.   

                                    Colocada a questão nesses termos, observa-se que é importantíssimo que se elabore norma legal,  na forma da Constituição, no sentido de disciplinar a contratação por uma empresa de todas suas atividades empresarias -  fim ou meio -  para serem executadas por uma  ou mais outras empresas.   

                                    É ponto pacífico que os  trabalhadores, que trabalham por força de um contrato de terceirização, merecem uma atenção especial no que tange às normas de segurança, higiene e medicina do trabalho em virtude da própria realidade em que se desenvolvem tais trabalhos terceirizados. Muitas vezes, a empresa contratada e seus trabalhadores não têm o completo domínio das condições ambientais existentes na empresa contratante.    

                                    Nesse caso, deve o Ministério do Trabalho e Emprego lançar mão da faculdade que lhe outorga o  art. 200, da CLT, para acrescentar  dentro da Portaria n. 3.214/78, que trata da segurança, higiene e medicina do trabalho, certas normas  relativas à contratação de serviços terceirizados. Assim procedendo, esse órgão ministerial dará maior efetividade às normas relativas a essa matéria, como todos reclamam.   

                                    Ora, existe uma distinção entre eficiência, eficácia e efetividade. A ciência da administração ensina que eficiência não se confunde com eficácia. Enquanto a eficiência está relacionada com a excelência dos meios utilizados para consecução dos objetivos, a eficácia refere-se ao resultado, aos fins efetivamente perseguidos. Da conjugação desses fatores surge o conceito de efetividade, obtida com a adequação de meios e fins. Assim, a eficiência corresponde à otimização dos meios, a eficácia, à consecução do fim esperado (“fazer a coisa certa”) e a efetividade corresponde à conjugação desses dois fatores, “fazendo a coisa certa da maneira certa”. Aliás, de uns tempos a esta parte, a expressão “efetividade” está sendo utilizada na ciência processual: “a efetividade da jurisdição”, por exemplo.                                                                

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                               Frisamos, aqui, que a terceirização é praticada há muito tempo no país, mas, com a expansão da nossa economia, ela ganhou maiores dimensões e, por isso, despertou a atenção dos líderes sindicais e dos estudiosos da temática trabalhista.

                               Nunca, em tempo algum, ela se limitou às atividades-meio da empresa. Vamos dar um exemplo em abono da nossa assertiva: a indústria automobilística. As empresas montadoras dos veículos recebem peças, de centenas de outras empresas, indispensáveis à realização de sua atividade fundamental.

                               Na estratégia organizacional, acentua-se, modernamente, a tendência a dar-se novo perfil à terceirização. Grandes empresas adquirem vasto terreno que comporta suas próprias instalações bem como as daquelas que produzem peças ou componentes de seu produto principal. Exemplo: montadoras de veículos automotores. A rigor, não deve formar-se o grupo econômico de que trata o § 2º do art. 2º desta Consolidação, se a grande empresa — do exemplo — limitar-se a adquirir a produção das organizações que se instalarem em terreno por ela adquirido.

                               Do que dissemos até aqui se conclui que a terceirização não é sempre um mal para o trabalhador. Na maioria das vezes, beneficia o trabalhador, a empresa e a comunidade.

                               A legislação pátria, como a de muitos outros países, não dedica atenção especial ao negócio jurídico da terceirização.  

                               O contrato de fornecimento de mercadorias ou de serviços tem aspectos importantes, como, por exemplo, a garantia de que a empresa contratada prestará o serviço ou fabricará o produto segundo as estipulações técnicas estabelecidas; segurança da continuidade do ajuste; mecanismo de acomodação dos preços ao processo inflacionário; duração que permita a recuperação do valor investido; venda exclusivamente a um comprador, o que impossibilitará a venda, pelo fabricante, de peças de reposição etc.  

                               Escusado dizer que o empresário provará com mais facilidade sua boa-fé se fizer a terceirização com uma pessoa jurídica que lhe presta serviços especializados.

                               Quem quer que se dedique à análise da terceirização não pode limitá-la aos seus efeitos trabalhistas; tem ela outros aspectos também relevantes que interessam ao empresário e à comunidade.

                               Numa palavra: é a terceirização condenada quando for simples instrumento de fraude à lei trabalhista.

                               Há que se examinar cada caso concreto de terceirização para averiguar se ele encobre u’a manobra ilegal.

                                    Finalizando, precisamos, hoje, mais do que nunca,  de uma lei  que discipline a terceirização de serviços no país, notadamente neste momento em que ele é sacudido por apreciável crise econômica interna, que é agravada pelo que ocorre em outros países, o que confirma não sermos nós uma ilha dentro do pretenso paraíso celestial.   

                                    Toda a sociedade clama por um rápido posicionamento dos Poderes Legislativo e Executivo. Não podem eles ficar inertes diante de tão delicada e complexa matéria.  

                                                            

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Sobre os autores
José Eduardo Duarte Saad

Advogado, Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo, Ex-Procurador Chefe do Ministério Público do Trabalho em São Paulo Ex-Assessor de Ministro do Supremo Tribunal Federal, Autor da CLT Comentada, Direito Processual do Trabalho e Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, todos da Editora LTr

José Eduardo Duarte Saad

Advogado, Parecerista, Professor, Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo, ex-Procurador-Chefe do Ministério Público do Trabalho, em São Paulo, Ex-Assessor Jurídico de Ministro do Supremo Tribunal Federal, Autor da CLT Comentada SAAD, ora na 48a Edição, Curso de direito Processual do Trabalho, na 7a Edição e Código de Defesa do Consumidor Comentado, na 6a Edição<br>

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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