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A publicidade enganosa via Internet

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01/03/2003 às 00:00
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V – EXEMPLOS DE PUBLICIDADE ENGANOSA VIA INTERNET

Três exemplos de publicidade enganosa que ocorrem com certa freqüência e constatáveis por todos aqueles que navegam na Web podem ser mencionados.

Ricardo Luis Lorenzetti [11] trata da técnica denominada metatag, que considera como um caso de publicidade enganosa. Consiste essa técnica na inclusão em uma página na Internet de palavras-chaves que nada tem a ver com o conteúdo da mesma, mas que são muito empregadas ou procuradas pelos usuários. Assim, quando da utilização de sites de busca ("buscadores", searchers) pelo "internauta", se este efetuar uma pesquisa com alguma das palavras-chave incluídas, aparecerá a página em questão, embora não tenha uma relação direta com tais palavras. O autor supra lembra que uma das páginas mais visitadas em 1996 incluía como metatag mais de 500 palavras relacionadas com o sexo, porém o conteúdo da página nada tinha a ver com o tópico.

Sem dúvida a enganosidade é evidente, já que o § 1° do art. 37 do CDC estabelece que "É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedade, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos ou serviços."

Ora, a inserção na página de palavras desvinculadas do conteúdo do site possui intuito publicitário, tanto que objetiva a seleção pelos "buscadores". Todavia é falsa e visa induzir a erro o consumidor que, só acessará aquela página na esperança de localizar um serviço relacionado àquela palavra pesquisada.

Outra prática que, em nosso sentir, pode configurar a publicidade enganosa via Internet é a utilização dos chamados cookies, que, muito embora sejam comumente abordados sob o ponto de vista da proteção da privacidade, possuem aspectos que, em certos casos, podem conduzir à caracterização de enganosidade publicitária.

Pois bem, o chamado cookie é um arquivo texto que, via de regra, é gravado no hard disk e utilizado pela memória RAM enquanto o internauta navega na Web.

Deste modo, quando de sua primeira visita a um Website podem lhe ser formuladas perguntas que vão de seu nome a informes financeiros. Tais informações serão gravadas no cookie que será colocado em seu sistema para que sua futura navegação seja "personalizada" [12].

Entretanto, quando o usuário daquele site não é notificado previamente da presença de tais fichários e não lhe é requerido o seu consentimento, entendemos que se configura aí omissão sobre dado essencial do serviço, no caso, a página a ser acessada (§ 3° do art. 37 do CDC).

Com efeito, não seria absurdo supor que, muitos daqueles que acessam determinadas páginas da Web, pensariam duas vezes antes de fazê-lo novamente se soubessem que seu hard disk estaria sendo infestado por esse tipo de arquivos e que informações pessoais do "internauta" poderiam estar, a partir daquele momento, indo compor um banco de dados que, por sua vez, não se sabe que destino terá e nem se está resguardado por qualquer proteção contra invasões de terceiros ou utilizações indevidas.

E entendido o dado essencial, de acordo com o magistério de Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin [13], como sendo aquele dado que tem o poder de fazer com que o consumidor não materialize o negócio de consumo, caso o conheça, não há como afastar a enganosidade por omissão.

Finalmente, outro caso de publicidade enganosa bastante comum no meio Internet é a utilização de banners ou mesmo de mensagens divulgadas por correio eletrônico (e-mail), com dizeres chamativos, mas nem sempre verdadeiros, do tipo: "Ganhe muito dinheiro sem qualquer esforço" ou "Clique aqui e ganhe prêmios". Na verdade, tais mensagens para os freqüentadores mais familiarizados com a Internet não passam de chamariscos.

Mas, como bem anota Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin [14], não se afere a enganosidade pela menção ao homo medius – vez que não é apenas ao cidadão regular que a mensagem está dirigida. Tutela-se, também, a boa-fé da criança, do homem do campo, do ignorante, do desprotegido, etc.

Mesmo porque, como já se ressaltou, a Internet tem como característica principal a de ser um meio de comunicação democrático, de livre e fácil acesso. Ali navegam pessoas de todos os tipos, inclusive crianças, às quais devem ser asseguradas práticas de publicidade pautadas pela lealdade, boa-fé, pela veracidade e clareza das informações.


VI – responsabilidade dos provedores de acesso à Internet PELA VINCULAÇÃO DE PUBLICIDADE ENGANOSA

Questão bastante pertinente é suscitada acerca da responsabilização do provedor de acesso por publicidade enganosa vinculada na rede. Isto é, responde o provedor de Internet por todos os conteúdos ofertados por terceiros, dentro de uma responsabilidade extracontratual, que ultrapassa a gama de serviços e produtos por ele diretamente disponibilizados para o consumo direto de seus serviços? [15].

Como se sabe, o provedor de Internet coloca à disposição de usuários o acesso à rede mundial de computadores, usualmente via fax modem, mediante conexão telefônica.

Ricardo Luis Lorenzetti [16] cita três posições acerca da temática do provedor de acesso: a) são meros intermediários e equiparáveis ao titular de um cartão de crédito ou de uma linha telefônica, que dão provimento, mas não respondem pelos atos de que os utilizam. Ou seja, o provedor concede o uso e o gozo de um site virtual contra o pagamento de um preço, com o que não assume responsabilidade frente a terceiros; b) além de suprir o uso e o gozo também é o organizador e criador do site, protegido por direitos autorais, e por isso sua posição jurídica, não é passiva, mas ativa. Em contraposição, alega-se que essa tese tende a transformar o provedor numa espécie de censor institucional; c) por fim, uma posição intermediária: em regra, o provedor de acesso não é responsável, mas pode ser imputado se teve a oportunidade de valorar a ilegalidade do conteúdo da informação (no caso a enganosidade da publicidade).

Em nosso sentir, diante dos princípios norteadores das relações consumeristas no Brasil, da vulnerabilidade evidente do usuário da Internet frente à agressiva publicidade vinculada pela rede, diante do art. 6º, IV, do CDC que estabelece como direito básico do consumidor a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, bem como olhos postos no parágrafo único do artigo 7º do CDC, que prevê a responsabilidade solidária quando a ofensa tiver mais de um autor, não há como afastar uma eventual responsabilização do provedor de acesso se teve a oportunidade de valorar a ilicitude do conteúdo (no caso a enganosidade da publicidade), vez que é responsável pela criação, organização e funcionamento do site.


VII – as alternativas do consumidor

O CDC, nesses casos, concede ao consumidor (individual ou coletivo), a utilização de vários mecanismos de defesa, como pleitear indenização por danos morais ou materiais, a imposição de multa e contrapropaganda, a suspensão da publicidade com a pena de execução específica em caso do não cumprimento da obrigação imposta na sentença.

Deve-se ressaltar a importância das ações cautelares, com a concessão de liminares, ou as antecipações de tutela, visando à suspensão imediata da veiculação da publicidade enganosa ou abusiva na rede. Por fim, ainda fica sujeito, o responsável, ao enquadramento penal.

Na concretização dos mecanismos previstos pelo CDC contra a publicidade enganosa e abusiva, é de se registrar a atuação do Ministério Público e de Associações Civis de Defesa do Consumidor, tanto através de meios judiciais (ações coletivas) quanto extrajudiciais, como sejam, os inquéritos civis, a vigilância dos meios de comunicação, a mobilização popular.


VIII – CONCLUSÃO

Como se pode depreender do que foi discutido até agora, a Internet vem trazendo, e certamente trará a cada dia, novos desafios às relações humanas e à estrutura que até então procura regular estas relações.

Tendo sempre em vista a aplicabilidade dos preceitos do Código de Defesa do Consumidor, a sociedade em geral e os freqüentadores da Web em especial, devem estar atentos a toda e qualquer forma de publicidade enganosa, denunciando sempre este tipo de prática e se valendo dos meios de proteção albergados pelo CDC.

Ademais, interessa também aos fornecedores, que se valem da rede como forma de incremento de vendas de bens e serviços, a vigilância constante contra esse tipo de publicidade, prejudicial não só aos consumidores, mas também à boa e leal concorrência entre fornecedores.

Não se pode esquecer que a credibilidade da Internet como instrumento de negócios e como veículo de comunicação deve ser consolidada a cada dia visando a canalização de mais e mais consumidores para o comércio virtual, sem dúvida mais rentável, principalmente devido à redução de custos que proporciona.

Por fim, em que pese o fato de o Código de Defesa do Consumidor aplicar-se às relações de consumo travadas pela rede, aspectos específicos do comércio eletrônico B2C, em especial da publicidade enganosa, podem e devem ser regulamentados por uma legislação complementar. Não obstante, tal legislação deve levar em consideração as dimensões da rede mundial, a quantidade de informações nela contidas, bem como as características dessa forma revolucionária de comunicação.

Dentre tais características está a liberdade de informação e de expressão, a autonomia dos usuários e o caráter democrático da rede.

Não obstante, isso não significa a total falta de controle da informação e da publicidade vinculada pela Internet. Afinal, a própria Constituição Federal, no art. 5º, XXXII da CF/88m estabelece que "o Estado proverá, na forma da lei, a defesa do consumidor" e o art. 70, V, erige a defesa do consumidor à condição de princípio da ordem econômica.

Por conseqüência, a liberdade de expressão não pode ser, de maneira nenhuma, incondicionada, mormente no que tange às relações que envolvam os consumidores nacionais protegidos que estão pelos preceitos do CDC e pela CF/88.

Em nosso sentir, uma solução legislativa possível para o controle e punição da publicidade enganosa vinculada pela Internet, passa pela adoção de tecnologias de filtragem de conteúdo, a serem utilizadas por um órgão público com competência para examinar e julgar casos de publicidade enganosa.

Assim, verificada por esse órgão a ocorrência de prática de publicidade enganosa por determinado site, ainda que estrangeiro, uma das sanções aplicáveis seria o bloqueio, em nível nacional, do conteúdo daquele site, por determinado período (ex. um ano).

A nosso ver, essa solução é perfeitamente possível em nosso ordenamento jurídico e preserva a liberdade de expressão característica da Internet sopesada pelos preceitos de proteção ao consumidor contra a publicidade enganosa.


IX-NOTAS

01. BLUM, Renato M. S. Opice. "A Internet e os tribunais", http://www.ciberlex.adv.br/intertribunais.htm.

02. Estado de São Paulo, 29/05/2000.

03. LUCCA, Newton de, SIMÃO FILHO, Adalberto, et. Al.. Direito & Internet – Aspetos Jurídicos Relevantes. Editora Edipro. 1ª edição, São Paulo, 2000, Pág. 354.

04. MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 1992. Pág. 138.

05. JACOBINA, Paulo Vasconcelos, A Publicidade no Direito do Consumidor. Rio de Janeiro. Editora Forense, 1996. Pág. 87.

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06. JACOBINA, Paulo Vasconcelos, op. citada. Pág. 15.

07. BENJAMIN, Antônio Herman, in "Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto". Ed. Forense Universitária, 1992, p. 197, 243.

08. Cfr. "Reno vs. Aclu", 521.US.844, citação feita por Ricardo Luís Lorenzetti, em Direito & Internet – Aspetos Jurídicos Relevantes, coordenada por LUCCA, Newton de, SIMÃO FILHO, Adalberto. Editora Edipro. 1ª edição, São Paulo, 2000, Pág 423.

09. PUGLIESE, Fábio. "O Site e a Lei", http://www.ciberlex.adv.br/artigos/ositeealei.htm.

10. Brasil, Ângela Bittencourt. "O e-mail e a prova judicial", http://www.ciberlex.adv.br/artigos/emailprova.htm.

11. LUCCA, Newton de, SIMÃO FILHO, Adalberto, op. Cit., pág. 441.

12. NETO, Amaro Moraes e Silva. "Cookies, esses indigestos biscoitos...", http://www.advogado.com/Internet/zip/cookies.htm.

13. Benjamin, Antônio Herman de Vasconcellos e, et alli. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 2ª ed., Rio de Janeiro, Ed. Forense Universitária, 1992, pág. 205.

14. Benjamin, Antônio Herman de Vasconcellos e, et alli. op. Cit., pág. 199.

15. RÜCKER, Bernardo. "Responsabilidade do Provedor de Internet Frente ao Código do Consumidor", http://www.apriori.com.br/artigos/provedor_de_Internet_e_cdc.htm.

16. LUCCA, Newton de, SIMÃO FILHO, Adalberto, op. Cit., pág. 447


X – BIBLIOGRAFIA

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Sobre o autor
Daniel da Silva Ulhoa

procurador da Fazenda Nacional, MBA em Direito da Economia e da Empresa pela FGV

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ULHOA, Daniel Silva. A publicidade enganosa via Internet. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 63, 1 mar. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3796. Acesso em: 23 nov. 2024.

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