Capa da publicação Lavagem de dinheiro: modificações da Lei 12.683/2012
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Lavagem de dinheiro: considerações sobre a Lei 9.613/1998 e as recentes modificações da Lei 12.683/2012

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01/06/2024 às 08:47
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6. ASPECTOS PROCESSUAIS

6.1. AUTONOMIA PROCESSUAL

O crime de lavagem de dinheiro é classificado como sendo crime acessório. “O crime de lavagem de dinheiro é acessório em relação à infração penal antecedente”.113 Mirabete leciona:

Os crimes acessórios como a denominação indicam, sempre pressupõem a existência de uma infração penal anterior, a ele ligada pelo dispositivo penal que, no tipo, faz referência àquela. O crime de receptação (art. 180), por exemplo, só existe se antes foi cometido outro delito (furto, roubo, estelionato etc.); o mesmo ocorre nos crimes de favorecimento pessoal (art. 348), de favorecimento real (art. 349).114

Assim a redação do art. 2º da Lei 9.613/98.

Art., 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:

(...)

II- independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento.

A autonomia processual para o crime de lavagem de dinheiro encontra-se insculpida no artigo acima, não se exige condenação prévia da infração penal antecedente. “Como o processo por crime de lavagem não tem por objeto o crime antecedente, não se faz necessário provar a materialidade deste, com todos os seus elementos e circunstâncias, no processo relativo ao crime de lavagem”.115

É elementar e necessário que a infração penal antecedente também seja ilícito penal no país onde ela foi praticada, não há necessidade de uma correlação textual, mas que ao menos o bem jurídico tutelado seja o mesmo.116

Conquanto a lei 9.603/98 antes da inovação legislativa dava a entender que esta autonomia processual fosse absoluta, na prática a jurisprudência já afirmava que tal autonomia era relativa, vez que cabia ao juiz analisar, e a partir daí dar o seu entendimento, pela conveniência ou não da união dos processos.

6.2. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO CRIME ANTECEDENTE

Questão interessante, e que vem na esteira da recente modificação, é quando o crime anterior já está prescrito.

Como a lavagem é caracterizada como um crime derivado e parasitário, ele não existe por si só, e uma vez que o agente pode ser processado independente de processo ou condenação pelo crime anterior, vem à baila a questão da prescrição, e a este respeito:

A prescrição, prevista no art. 107, IV, do Código Penal, é instituto que isenta o réu de pena, estando inserida, sistematicamente, no titulo VIII do código Penal, que prevê “Da extinção da punibilidade”. É, portanto, exclusão de punibilidade, e não de ilicitude ou antijuridicidade.117

A lei não deixou dúvidas a respeito disto ao afirmar “ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente”.118

Seria muito difícil fazer aplicar a lei, se após longo decurso de tempo os recursos que foram obtidos de forma ilícita pudessem de novo serem integrados ao mercado econômico formal, agora simplesmente porque o tempo fez cair a sua ilicitude. Frise-se que o tempo exclui a punibilidade, mas não o caráter ilícito que anteriormente detinha.

Andou bem o legislador ao entender que mesmo extinta a punibilidade para o crime antecedente, ainda assim é possível instaurar inquérito policial e o Ministério público oferecer denúncia, havendo indícios suficientes do cometimento de lavagem de dinheiro.

Em artigo escrito por Cavalcante:

ANTES: a Lei nº 9.683/98 não explicitava se havia o crime de lavagem no caso de estar extinta a punibilidade da infração penal antecedente. AGORA: a alteração trouxe regra expressa no sentido de que poderá haver o crime de lavagem ainda que esteja extinta a punibilidade da infração penal antecedente. Vale ressaltar que já havia julgado do STJ nesse sentido, a despeito da omissão legal. A inovação, contudo, é produtiva para que não haja qualquer dúvida quanto a esse aspecto.119

A lei 12.683/2012 foi taxativa na imposição ao afirmar que poderá haver o crime de lavagem de dinheiro, mas quando já extinta a punibilidade da infração antecedente, e a este respeito escreveu Mendroni:

O dispositivo da lei de lavagem de dinheiro citado prevê expressamente que são puníveis os fatos... ainda que desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime (infração penal). Então, fácil concluir que no contexto deste termo “isento de pena” também se encaixa a isenção de pena- da extinção da punibilidade, seja ela qual for, inclusive a prescrição. Obviamente, exceto no caso de “morte do agente”.120

E continua o mesmo autor:

Concluímos que, mesmo que a infração penal anterior seja prescrita, e mais, abrangida por anistia, graça, indulto, ou seja, qual for a causa de “extinção de punibilidade”, ainda assim, se houver indícios da sua prática- diga-se, indícios veementes-, as condutas da pessoa suspeita poderão ser investigadas e ela poderá ser processada pelo crime de lavagem de dinheiro. Entende-se que o crime (infração penal) anterior existiu, mas o réu não pode ser punido- por aquele crime. Nada impede, entretanto, venha ser punido por outro crime- daquele decorrente.121

O mesmo autor arremata o assunto com a seguinte explanação:

Com o acréscimo da parte final, que determina a possibilidade de oferecimento da Denúncia, ainda que extinta a punibilidade da infração penal antecedente, tornou-se indiscutível não só a independência de apuração e processamento entre as infrações penais, antecedente e de lavagem de dinheiro, mas também a viabilização do segundo mesmo quando o primeiro estiver prescrito- correndo a prescrição do crime de lavagem de dinheiro de forma independente e segundo as próprias regras.122

Ponto pacífico, portanto a partir da nova redação da lei, uma vez que na escrita anterior havia espaço para a dubiedade.

6.3. CITAÇÃO E INAPLICABILIDADE DA SUSPENSÃO DO PROCESSO

O art. 2º, § 2º, prevê a não aplicação do art. 366 do Código de Processo Penal. Assim a lei:

“§ 2º No processo por crime previsto nesta lei, não se aplica o disposto no art. 366 do Decreto-Lei 3.689/1941 (Código de Processo Penal), devendo o acusado que não comparecer nem constituir advogado ser citado por edital, prosseguindo o feito até o julgamento, com a nomeação de defensor dativo”.123

Com uma pequena controvérsia a respeito da constitucionalidade de tal dispositivo, o fato é que ele visa afastar a incidência do art. 366 do CPP, que prevê a suspensão processual, no caso de o acusado ser citado por edital e o mesmo não comparecer. A citação por edital faz-se da seguinte forma:

É feito um edital de citação contendo, dentre outras informações, o nome do juiz, a qualificação do réu, a finalidade da citação, o juízo, o dia, a hora e o lugar em que o réu deverá comparecer (art. 365 do CPP). Este edital é afixado na porta do edifício onde funcionar o juízo e publicado pela imprensa, onde houver. A citação por edital é considerada como uma espécie de citação ficta considerando que, como não foi realizada pessoalmente, apenas se presume que o acusado dela tomou conhecimento.124

A finalidade precípua do art. 366 do CPP é garantir que o acusado que não foi citado pessoalmente não seja julgado à revelia.

Vejam-se duas visões diferentes a respeito do mesmo artigo, sendo a primeira de Bottini e a segunda de Mendroni.

O § 2º do art. 2º da Lei 9.613/1998 é inconstitucional, por clara violação da ampla defesa e impossibilitar o exercício do contraditório. Aliás, foi justamente por isso, e para adequar o ordenamento brasileiro aos compromissos internacionais assumidos em tratados de direitos humanos, que a Lei 9.7241/1996 alterou a redação do art. 366, impedindo que o acusado ausente pudesse ser processado. De outro lado, a incompatibilidade é ainda mais flagrante em comparação o art. 8.2 alínea b, da Convenção Americana de Direitos Humanos, que assegura ao acusado, entre outras garantias mínimas, o direito à “comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada”.125

A segunda posição, diametralmente oposta a esta:

Durante a fase de investigação, a pessoa investigada deixa consignada nos autos o(s) seu(s) endereço(s), onde possa ser encontrada. Evidentemente, ela já conhece a possibilidade de que a investigação converta-se em processo criminal. Imaginar o contrário seria excesso de ingenuidade e zelo em razão de uma clara situação jurídica. Seria a pura aplicação do hipergarantismo, que, ao invés de atender os princípios constitucionais vigentes, beneficiaria suspeito criminoso, inclusive em posição de vantagem em relação àqueles menos abastados, da criminalidade de menor potencial ofensivo126 - estes, sem posses para transferir residência.

E continua o mesmo autor:

O que não pode acontecer é atrelar-se a justiça ao sabor da ocultação de um suposto criminoso que, endinheirado, não hesitará em valer-se dos mais variados artifícios para não ser encontrado, ainda mais em um país de dimensões continentais.127

Em verdade a alteração da lei apenas corrigiu uma falha do texto anterior, vez que ele já afirmava que não se aplicava o art. 366 do CPP, mas como não afirmava qual o procedimento a ser tomado não era objeto deste tipo de questionamento.

Cavalcante conclui esta linha de pensamento afirmando:

Trata-se de mera opção legislativa. O legislador entendeu que, para os crimes de lavagem de dinheiro, deve haver um tratamento mais rigoroso ao réu, não se aplicando a suspensão do processo: “A suspensão do processo constituiria um prêmio para os delinquentes astutos e afortunados e um obstáculo à descoberta de uma grande variedade de ilícitos que se desenvolvem em parceria com a lavagem ou a ocultação”. (Item 63 da Exposição de Motivos 692/MJ).128

Cesar Antonio da Silva, escrevendo a respeito deste tema entende ser o texto inconstitucional, e assim afirmou:

Com isso, a vedação de suspensão do processo nos termos do art. 366 do Código de Processo penal é absolutamente inconstitucional, não apenas por contrariar o Pacto de São José da Costa Rica, mas também porque o está excluindo do texto da Carta magna, uma vez que passou a integrá-la a partir do momento em que entrou em vigor para o Brasil (25.9.92), por força do disposto no §2º do art. 5º da Constituição Federal. Diante desse enfoque, o §2º do art. 2º é vigente, apenas porque é parte integrante da Lei 9.613/98, formalmente produzida; porém, é inválido por contrariar dispositivo constitucional.129

Apesar dos diferentes posicionamentos, a modificação está posta, com rigor ou imprecisão na sua redação, até porque nas palavra de Bottini: “... foi extremamente infeliz... ora, o que faz com que o acusado seja citado por edital não é o seu não comparecimento, mas o fato de não ser encontrado para a citação pessoal (art. 361 do CPP).” 130

Fica a polêmica, mas Gilmar Mendes já entendia da seguinte forma:

Uma questão polêmica é a cláusula constante da lei que determinava a não aplicação do disposto no artigo 366 do Código de Processo penal, relativa à suspensão do processo na hipótese de citação por edital. É claro que dentro de uma visão ortodoxa é razoável que se faça crítica. Quem considerar a gravidade do crime, certamente com interesse na persecução, não terá também dificuldade para justificar a opção legislativa que aqui se faz.”131

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A alteração reafirmou: não se aplica o art. 366 do CPP e deixa claro que se o acusado não comparecer, e nem constituir advogado, será nomeado defensor dativo e o feito prossegue de forma regular até o seu julgamento.

6.4. DELAÇÃO PREMIADA

Com a recente alteração da lei 9.613/1998, houve uma ampliação das hipóteses de ocorrência da chamada delação premiada.

Aquele que colaborar espontaneamente com a investigação e prestar esclarecimentos que auxiliem na apuração dos fatos, na identificação dos agentes da lavagem do dinheiro ou na localização dos bens, será beneficiado com a redução da pena, sua extinção ou substituição por restritiva de direitos.132

A delação premiada é um instituto ainda pouco compreendido na legislação pátria, não goza de unanimidade entre os doutrinadores, embora ela esteja sendo usada com relativo sucesso na legislação italiana.

Damásio, citado por Cesar Antonio da Silva assim se expressou:

A delação premiada, sem qualquer exceção, ainda que possa trazer algum benefício com possível esclarecimento de crimes graves, é eticamente reprovável, porque lastreada na traição, na infidelidade; nada tem, por conseguinte, de pedagógica.133

Agora é possível a realização da delação premiada a qualquer momento, vez que não há uma limitação temporal, podendo ela ocorrer em qualquer fase da persecução penal. Mesmo após transitada em julgado admite-se a aplicação do instituto referido.

Vejamos o entendimento de Wladimir Aras em recente artigo para o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais:

Com a Lei 12.683/2012, o § 5º do art. 1º da lei de Lavagem de Dinheiro passa a permitir a realização da delação premiada a qualquer tempo. Se já se admitia o benefício, manifestação do direito premial, na investigação e durante a ação penal até a sentença de mérito, doravante poderá haver colaboração premiada mesmo após a decisão penal condenatória recorrível, e também na fase de execução penal.134

Não é qualquer esclarecimento que se presta a ser merecedor do benefício jurídico. Há que se trazer fatos concretos, como po r exemplo, indicando datas, nomes, a apresentação de documentos que comprovem aquilo que está sendo afirmado.135

A lei fala que a colaboração deve ser espontânea, ainda que possa ser efetuada em qualquer momento de processo. Por espontâneo entende-se aquele que é feito pela própria pessoa, não pode ser provocado por terceiro, ou realizada mediante coação.

Para que cumpra os seus efeitos, isto é, a redução da pena, não se perquire a respeito da intenção do delator, pode ser que ele queira vingança em relação a comparsas, ou simplesmente colaborar com a investigação.136

A redação trazida pela Lei 12.683/2012 prevê três efeitos que a delação espontânea deve produzir; quais sejam: “prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime”. Produzindo um ou mais efeitos já é o suficiente para que tal delação seja levada ao juízo e por ele valorada.

Os sujeitos participantes da delação premiada por óbvio que são o réu e o Ministério Público.137 O projeto original previa que o acordo deveria ser “referendado pelo Ministério Público”, e isto afastava de vez a possibilidade de uma formalização entre a parte e seu advogado, ou mesmo mediante a autoridade policial.138

6.5. MEDIDAS ASSECURATÓRIAS

A lei 12.683/2012 trouxe algumas mudanças em relação ao texto original da Lei 9.613/1998, tornou mais clara a redação do art. 4º.

Art. 4º O Juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação do delegado de polícia, ouvido o Ministério Público em 24 (vinte e quatro) horas, havendo indícios suficientes de infração penal, poderá decretar medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou existentes em nome de interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes previstos nesta lei139 ou das infrações penais antecedentes.

Houve um propósito de ampliar a incidência das medidas assecuratórias.140 Uma das medidas de maior utilidade prática e grande eficácia no combate ao crime organizado é buscar de forma célere, no início da investigação ou durante o processo a indisponibilidade dos bens dos envolvidos, o que reduz de modo sensível a sua capacidade de protelar a efetividade da justiça e reduz ser poder econômico para delinquir. Assis Cavalcante:

A experiência mostra que a prisão preventiva sem a indisponibilidade dos bens é de pouca utilidade nesse tipo de criminalidade porque a organização criminosa continua atuando. Os líderes, mesmo presos, comandam as atividades de dentro das unidades prisionais ou então a organização escolhe substitutos que continuam a praticar os mesmos crimes, considerando que ainda detêm os recursos financeiros para a prática criminosa.141

O uso da expressão medidas assecuratórias, vez que é uma terminologia mais ampla dá ao juiz a possibilidade de decretar todas as espécies de medidas cautelares.

Questão que merece reflexão é da possibilidade de o juiz de ofício decretar as medidas assecuratórias, ainda mais na fase das investigações, no momento onde ainda nem há acusação formal pelo Ministério Público. Assim também há que se questionar se este dispositivo não viola o princípio da inocência. A este respeito assim se expressou Mendroni:

Longe de violar o princípio da presunção de inocência, o dispositivo cria instrumento indiscutivelmente necessário para a sistemática da lei como um todo. É preciso entender que a “presunção” de inocência como o próprio nome revela, nada mais é do que presunção. Diga-se, simples presunção. Presunção esta que pode estar ou não adstrita a outro princípio constitucional- do devido processo legal. É dizer: o devido processo legal pode não estabelecer a presunção de inocência. Aliás, isso resta mais do que evidente na simples leitura do dispositivo constitucional: Art. 5º, LIV: “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.142

Não há o perdimento de imediato dos bens, uma vez que uma vez provada a licitude da origem dos bens estes de plano serão revertidos ao acusado. Assim, opera-se uma inversão do ônus da prova, vez que compete ao acusado provar a licitude da origem de seus bens. Assim já afirmava Nelson Jobim quando ministro do STF:

Outro ponto que gostaria de destacar é que os bens objeto da lavagem poderão ser apreendidos, durante a instrução, a investigação policial, por determinação judicial, ou durante a própria demanda. Diz a lei claramente: “Esses bens só serão liberados antes da sentença final se o requerente provar a sua origem lícita”. Há, portanto, no processo cautelar, uma inversão do ônus da prova. Indícios autorizam apreensão. A liberação antes da sentença penal somente é possível depois de um interessado provar a origem lícita dos bens.143

Trata-se, pois de um dispositivo que foi amplamente discutido no âmbito da comunidade internacional, uma vez que se trata da grande interessada no combate à criminalidade organizada.144

6.6. MEDIDAS ASSECURATÓRIAS CABÍVEIS

Nas palavras de Bottini:

Sob o rótulo de medidas assecuratórias, o Código de Processo Penal disciplina medidas que costumam ser identificadas pela doutrina como medidas cautelares patrimoniais penais. É lição corrente que a tutela cautelar é um instrumento que visa assegurar a utilidade e a eficácia de um provimento jurisdicional a ser proferido em “outro” processo, dito “processo principal”. Assim sendo, a análise da tutela cautelar não pode prescindir da verificação do conteúdo e da finalidade dessa tutela.145

A nova redação prevê que poderão ser decretadas “medidas assecuratórias” e não mais as duas espécies do gênero- apreensão e sequestro- como na redação anterior, sendo assim são cabíveis as seguintes medidas: o sequestro de bens, a inscrição e registro de hipoteca, o arresto e a busca e apreensão.

As medidas assecuratórias previstas no processo penal visam evitar o dano proveniente da morosidade da ação penal, garantindo, através da guarda judicial das coisas, o ressarcimento do prejuízo ca usado pelo delito, sendo que, por ter a natureza de processos incidentais, a competência para presidi-las é do juiz competente para o processo criminal.146

6.7. ALIENAÇÃO ANTECIPADA

A recente mudança na lei passou a prever de forma expressa, a possibilidade de alienação antecipada em casos bastante pontuais, veja-se a letra da lei:

Art. 4º (...)

§ 1º Proceder-se-á à alienação antecipada para preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção.

Trata-se de dispositivo novo na lei, ela estabeleceu que para maior celeridade, e para manutenção dos seus valores é possível a alienação antecipada de bens, direitos ou valores.

Assim Saadi em artigo para o IBCCRIM:

Sem sombra de dúvida, essa é uma medida de extrema utilidade prática. A alienação antecipada é a medida de precaução mais adequada, pois é a que representa menor risco de depreciação do valor do bem, possibilitando uma melhor preservação do seu real valor até o final da prestação jurisdicional.147

A alienação antecipada pode ser decretada de ofício pelo juiz ou a requerimento do Ministério Público em duas situações muito específicas, quais sejam: quando estiver sujeito a qualquer grau de deterioração ou depreciação e também em caso de dificuldade para a manutenção. Este é um problema que surge para o Poder Público: “o que fazer com tais bens enquanto não ocorre o trânsito em julgado de uma sentença condenatória, quando então haveria o perecimento desses bens em favor da união?”.148

Veja-se as definições: “Deteriorar, por sua vez, significa: tornar (-se) pior; sofrer transformação que corrompa a qualidade original; estragar”.149 Assim, quase todas as coisas naturais sofrem o efeito do tempo. E “depreciar” quer dizer: “reduzir preço ou valor de, desvalorizar”.150 E a intenção do legislador ao redigir tal instituto era exatamente esta, manter os valores, isto é, a preservação do valor dos bens.

A segunda possibilidade, que autoriza a alienação antecipada é a dificuldade para a manutenção do bem. Há coisas que pela sua natureza não podem ficar parados, estacionados em um lugar qualquer, e ainda que bem acondicionados, vez ou outra precisariam de uma manutenção periódica, e justamente esta manutenção poderia onerar demais o bem, e em caso da não manutenção o ser perecimento de forma parcial ou completa, daí então a necessidade da alienação antecipada.

Frise-se que o propósito neste caso é sempre a preservação do valor do bem. Assim, não há que se falar em alienação de bens que não sofrem o efeito deletério do tempo; mas que ao contrário, até valorizam-se, como seria o caso de uma coleção de obras de arte, quadros ou esculturas.151

A quantia apurada com a alienação será depositada em conta judicial, até o fim da ação penal, se o réu for absolvido por certo que estes valores serão devolvidos a ele.

Surge a questão da constitucionalidade de tal dispositivo, estaria ele violando o principio do devido processo legal, da presunção de inocência e o direito de propriedade? Cavalcante afirma que não:

O devido processo legal não é afrontado, considerando que a constrição sobre os bens da pessoa não é feita de forma arbitrária, sendo, ao contrário, prevista na lei que traz os balizamentos para que ela possa ocorrer. Não há violação ao princípio da presunção de inocência, considerando que este não é absoluto e não impede a decretação de medidas cautelares contra o réu desde que se revelem necessárias e proporcionais no caso concreto. Nesse mesmo sentido, não é inconstitucional a prisão preventiva, o arresto, o sequestro, a busca e apreensão, etc. O direito de propriedade, que também não é absoluto, não é vilipendiado porque o réu somente irá perder efetivamente o valor econômico do bem se houver o trânsito em julgado da condenação.152

O procedimento para a alienação antecipada de bens objeto de medidas cautelares tem previsão legal no art. 4º - B, acrescido pela lei 12.683/2012.

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Sobre o autor
Leomir Alves da Silva

Servidor do tribunal de Justiça do Paraná- Graduado em Direito- FESP-PR. Pós Graduado em Direito do Trabalho- FESP-PR. Pós Graduado em Filosofia-UFPR.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Leomir Alves. Lavagem de dinheiro: considerações sobre a Lei 9.613/1998 e as recentes modificações da Lei 12.683/2012. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7640, 1 jun. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/38205. Acesso em: 22 dez. 2024.

Mais informações

Monografia apresentada a Faculdade de Educação Superior do Paraná, como um dos requisitos para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob a orientação da Profa. Msc. Ana Carolina Elaine dos Santos.

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