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Algumas considerações acerca do inquérito policial

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5. Procedimento –

5.1 "Notitia Criminis" –

Dá-se o nome de notitia criminis (notícia crime) ao conhecimento espontâneo ou provocado, por parte da autoridade policial de um fato aparentemente criminoso, conforme destaca Capez [30]. É com espeque no conhecimento da notícia crime que a autoridade policial dá início ás investigações.

A doutrina, em razão de motivos didáticos, estabelece a seguinte classificação das notícias crimes:

a)de Cognição imediata ou direta – é também conhecida como notícia crime espontânea ou inqualificada. Ocorre quando a autoridade policial toma conhecimento direto do fato infrigente da norma por meio de suas atividades rotineiras, de jornais, da investigação feita pela própria Polícia Judiciária, por comunicação feita pela polícia preventiva ostensiva, pela descoberta ocasional do corpo de delito, por meio de denúncia anônima etc. A delação anônima (apócrifa) é também chamada de notícia inqualificada, recebendo, portanto, a mesma designação do gênero ao qual pertence.

b) de Cognição mediata ou indireta - também chamada de notitia criminis provocada ou qualificada, ocorre quando a autoridade policial toma conhecimento por meio de algum ato jurídico de comunicação formal do delito, como, por exemplo, a delatio criminis – delação (CPP, art.5º, inciso II, e §§ 1º, 3º e 5º), a requisição da autoridade judiciária, do Ministério Público (CPP, art. 5º, II) ou do Ministro da Justiça (CP, arts. 7º, § 3º, b, e 141, I, c/c o parágrafo único do art. 145), e a representação do ofendido (CPP, art. 5º, § 4º).

c) Cognição coercitiva – ocorre no caso de prisão em flagrante, em que a notícia do crime se dá com a apresentação do autor (CPP, art.302 e incisos). É modo de instauração comum a qualquer espécie de infração, seja de ação pública condicionada ou incondicionada, seja de ação penal reservada à iniciativa privada. Por isso, houve por bem o legislador tratar dessa espécie de cognição em dispositivo legal autônomo (CPP, art.8º).

Tratando-se de crime de ação pública condicionada, ou de iniciativa privada, o auto de prisão em flagrante somente poderá ser lavrado se forem observados os requisitos dos §§ 4º e 5º, do artigo 5º, do Código de Processo Penal.

Note-se, entrementes, que os delitos considerados de menor potencial ofensivo obedecem o procedimento determinado no parágrafo único, do artigo 69, da Lei nº9.099/95.

5.2. Instauração –

5.2.1. Instauração no Caso de Ação Pública Incondicionada (CPP, art.5º, I e II, §§ 1º, 2º e 3º).

Neste caso, o Inquérito pode ser iniciado por uma das formas seguintes:

a)de ofício [31]: a autoridade tem a obrigação de instaurar o inquérito, independente de provocação, sempre que tomar conhecimento imediato e direto do fato, por meio de delação verbal ou por escrito feito por qualquer do povo (delatio criminis simples), notícia anônima (notitia criminis inqualificada), por meio de sua atividade rotineira (cognição imediata), ou no caso de prisão em flagrante. O ato de instauração, que é a portaria, deverá conter o esclarecimento das circunstâncias conhecidas, como, por exemplo, a narração do fato e a individualização do indiciado (CPP, art. 5º, § 1º, alíneas a e b), e a capitulação legal da infração.

Note-se que a autoridade policial não poderá instaurar o inquérito se não houver justa causa, com, por exemplo, se o fato não configurar, nem em tese, ilícito penal. Se o fizer, o ato será impugnável pela via do habeas corpus (CPP, art. 648 e incisos). Contudo, o desconhecimento da autoria ou a possibilidade do sujeito ter agido sob a proteção de alguma excludente de ilicitude (CP, art. 23) não impedem, como é lógico, a instauração do inquérito.

b) Por requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público: O artigo 40 do Código de Processo Penal estabelece que: "Quando, em autos ou papéis de que conhecerem os juízes ou tribunais verificarem a existência de crime de ação pública, remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia".

Todavia, se não estiverem presentes os elementos indispensáveis ao oferecimento da denúncia, segundo Capez [32], a autoridade judiciária poderá requisitar a instauração de inquérito policial para a elucidação dos acontecimentos (CPP, art. 5º, inciso II).

Entretanto, os professores Aury Lopes Jr. [33], Geraldo Prado [34] e Geraldo Batista Siqueira [35] defendem posicionamento contrário, ainda minoritário, sustentando que com a promulgação da Constituição de 1988, na qual restou consagrado o sistema acusatório, conforme se vê no artigo 129, inciso I, a legitimidade para dar início à persecução penal e a titularidade do direito de ação foram conferidas exclusivamente ao Ministério Público, não podendo mais a autoridade judiciária dar início a persecutio criminis.

Portanto, ainda segundo os citados autores, tal inciso, do artigo 5º, do Código de Processo Penal não foi recepcionado pela Constituição Federal vigente.

Quanto ao Ministério Público, este poderá requisitar a instauração de inquérito quando conhecer diretamente dos autos ou papéis que evidenciem a prática de ilícito penal (CF, art. 129, VIII; CPP, art. 5º, II).

Convém assinalar, ainda, que, como sustenta o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho, nada obsta que a autoridade policial possa baixar a portaria, mesmo havendo requisição ou requerimento. Nessa hipótese, salienta o professor, "deverá haver menção àquela ou a este, na peça inaugural do inquérito" [36].

Por fim, a autoridade policial, embora não exista subordinação hierárquica, não pode se recusar a instaurar o inquérito, pois a requisição tem natureza de determinação, de ordem, conforme salienta Capez [37], sendo esta a melhor interpretação da lei processual, consoante a lição do Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [38], já que, no artigo 13, inciso II, do Código de Processo Penal, o legislador criou para a autoridade policial o dever de realizar as diligências requisitadas pelo Juiz e pelo Parquet, e seria, no mínimo contraditório, admitir que a autoridade policial deva cumprir as diligências requisitadas, mas não deva instaurar o inquérito, quando este for requisitado.

c) Delatio criminis: é a comunicação de um crime feita pela vítima ou qualquer do povo. A doutrina distingue entre a delação simples, consistente no mero aviso da ocorrência de um crime, sem qualquer solicitação (é uma simples comunicação), e a delação postulatória, em que se dá notícia do ato e se pede a instauração da persecução penal (a representação do ofendido, na ação pública condicionada).

O requerimento do ofendido deverá conter, sempre que possível: a) a narração do fato com todas as suas circunstâncias, b) a individualização do suspeito ou a indicação de seus sinais característicos, c) a exposição dos motivos da suspeição, e d) a indicação de testemunhas e outros meios de prova (CPP, art. 5º, § 1º, e alíneas).

Releva notar, ainda, que, caso a autoridade policial indefira o requerimento de abertura do inquérito, caberá recurso ao Chefe de Polícia (Secretário de Segurança Pública ou o Delegado Geral de Polícia, conforme a lei orgânica da Polícia de cada Estado).

Cumpre destacar que, como o despacho da autoridade policial que indefere o requerimento de abertura de inquérito não faz coisa julgada, como salienta o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [39], pois o instituto da res judicata é característico da jurisdição, poderá o requerente recorrer a qualquer tempo (a lei não fixa prazo), e, caso não seja "provido" seu recurso, poderá renová-lo, apresentando novos argumentos e indicações de prova.

Nada obsta também que o recorrente solicite à autoridade policial reconsideração de seu despacho, nem estará ele impossibilitado de, mesmo que o Chefe de Polícia vem negar provimento ao seu recurso, ingressar em juízo ou procurar o órgão do Ministério Público para relatar-lhe o fato, objetivando que este requisite a instauração de inquérito e sejam tomadas as providências que se fizerem necessárias (CPP, art. 27).

Note-se, por oportuno, que o código só permitiu à autoridade policial não instaurar o inquérito, quando se tratar de requerimento, ou seja, de pedido feito pelo ofendido ou quem tiver a qualidade de representá-lo (CPP, art. 5º, § 2º), não podendo, pois, a autoridade recusar-se a instaurar o inquérito tratando-se de requisição da lavra do Ministério Público (CPP, art. 5º, caput), como, aliás, já foi salientado linhas atrás [40]. Vale dizer, então, requisitar é uma exigência legal, enquanto que requerer é uma solicitação de algo permitido por lei.

Ressalte-se, ainda, que a autoridade policial, segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [41], poderá indeferir os requerimentos formulados, nas seguintes hipóteses: a) se já estiver extinta a punibilidade, b) se o requerimento não fornecer o mínimo indispensável para se proceder à investigação, c) se a autoridade a quem foi dirigido o requerimento não for a competente (lato sensu), d) se o fato narrado for atípico, e) se o requerente for incapaz.

Por outro lado, no caso dos crimes de ação penal pública condicionada, o requerimento assume a forma de autorização para o início da persecução penal, e recebe o nome de representação. Enquanto que, na ação penal privada, o inquérito não pode ser instaurado sem a solicitação de quem tenha qualidade para intentá-la, conforme o art. 5º, § 5º, do Código de Processo Penal.

Convém assinalar, ainda, que, além do ofendido, qualquer do povo, ao tomar conhecimento da prática de alguma infração penal em que caiba ação pública incondicionada, poderá comunicá-la verbalmente ou por escrito, à autoridade policial, e esta, verificando a procedência das informações, mandará instaurar o inquérito (CPP, art. 5º, § 3º), caso contrário o cidadão comunicante, isto é, o que presta a notícia crime, deverá ser indiciado, se for o caso, pela prática do crime de comunicação falsa de crime ou de contravenção (CP, art. 340), conforme acentua o Profº Julio Fabbrini Mirabete [42].

No que concerne a delação anônima (notitia criminis inqualificada), essa não deve ser repelida de plano, segundo Capez [43], sendo incorreto considerá-la sempre inválida; contudo, requer cautela redobrada por parte da autoridade policial, ainda segundo o autor, a qual deverá, antes de tudo, investigar a verossimilhança das informações.

Entrementes, há entendimento diverso, defendido inclusive em alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF 5ª Região), que sustenta a inconstitucionalidade do inquérito instaurado a partir de comunicação anônima (apócrifa) [44], uma vez que o artigo 5º, inciso IV, da Constituição Federal (Lei Complementar nº75/93, art. 6º, inciso XIV, e) veda o anonimato na manifestação de pensamento (STJ, RSTJ, 12/417), nesse sentido, veja-se o julgado abaixo:

"NOTITIA CRIMINIS" ANÔNIMA (TRF 5ª REGIÃO): "Padece de inconstitucionalidade o procedimento investigatório que se origine de expediente delatório anônimo (CF, art. 5º, IV)" (JSTJ, 12/417).

Aliás, segundo Aloisi e Mortara, citados pelo Profº Fernando da Costa Tourinho Filho, "a denúncia anônima não é uma denúncia no significado jurídico do termo, pelo que não pode ser tomada em consideração na lei processual penal" [45].

Insta assinalar que este último entendimento é, também, o do Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [46], que não admite a denúncia anônima sob o argumento de que o processo penal não pode se tornar escravo de delações muitas vezes inverídicas e motivadas por sentimentos mesquinhos, pois, em assim sendo, tanto restaria prejudicada a persecução penal contra os delatores que viessem a praticar alguns dos crimes inscritos nos artigos 339 (denunciação caluniosa) e 340 (Comunicação falsa de crime ou de contravenção) do Código Penal, quanto acabar-se-ia por criar na sociedade um clima geral de intranqüilidade, visto que qualquer cidadão, a qualquer momento, poderia ser acusado de algum crime, do qual nem sequer tem conhecimento, tendo, desta forma, ao final das investigações policiais, suas imagem e honra maculadas. Daí a razão, ainda segundo o aludido professor, de "o nosso CPP não acolher tal modalidade espúria de notitia criminis" [47].

Entretanto, como lembra o professor Júlio Gusmão, em aula ministrada no curso Jus Podivm, citando o professor José Frederico Marques, tal discussão perde em parte a sua importância, uma vez que nesse caso poderá a autoridade policial, de qualquer forma, baixar portaria e instaurar o inquérito policial de ofício, sem fazer alusão a denúncia anônima.

Por último, vale assinalar que a delação feita pelo cidadão, em regra, trata-se de mera faculdade [48], havendo, contudo, algumas pessoas que, em razão de seu cargo ou função, estão obrigadas a noticiar às autoridades a ocorrência de crimes de que tenham notícia do desempenho de suas atividades, ficando estas sujeitas ao disposto, conforme o caso, no artigo 66, incisos I e II da Lei de Contravenções Penais; artigo 269 do Código Penal; artigo 45 da Lei nº6.538/78; e artigos 104 e 105 da Lei de Falência.

5.2.2. Instauração no Caso de Ação Pública Condicionada (CPP, art.5º, § 4º).

A instauração do inquérito policial, no presente caso, pode dar-se por uma das formas a seguir aduzidas:

a) Mediante representação do ofendido ou de seu representante legal – de acordo com o artigo 5º, §4º do Código de Processo Penal, se o crime for de ação pública condicionada à representação do ofendido ou do se representante legal (CPP, art. 24), o inquérito não poderá ser instaurado senão com o oferecimento desta, ou seja, não se admite nessa espécie de ação a delatio criminis (CPP, art.5º, §3º), sendo este o entendimento de Fernando Capez [49].

Trata-se de manifestação do princípio da oportunidade, que informa a ação penal pública condicionada até o momento do oferecimento da denúncia (CPP, art. 25). Neste caso, o Ministério Público só poderá requisitar à autoridade policial a instauração de inquérito, se esta estiver acompanhada da representação.

No que a concerne à representação esta é uma manifestação da vontade da vítima ou de seu representante no sentido de autorizar o Estado o exercício do jus puniendi, ou seja, a apurar o fato aplicando a sanção cabível.

Já para Capez [50], a representação configura-se como uma simples manifestação de vontade da vítima, ou de quem legalmente a representa, no sentido de permitir que o Estado, por meio dos órgãos próprios da persecução penal, desenvolva as necessárias atividades administrativo-judiciárias tendentes às investigações da infração penal, à apuração da respectiva autoria e à aplicação da lei penal objetiva (CPP, art. 39, § 2º).

Por outro lado, segundo a técnica e precisa aula do Prof. Julio Gusmão, ministrada no curso Jus Podivm, a representação, assim como a requisição do Ministro da Justiça, é condição de procedibilidade da ação penal em juízo.

A representação pode ser feita pelo ofendido, por procurador com poderes especiais (CPP, art. 39, caput), e pelas pessoas do art 31 do CPP, quais sejam, o cônjuge, ascendentes, descendentes e irmãos, em razão das normas do parágrafo primeiro, do artigo 24 e do parágrafo único, do artigo 38, ambos do Código de Processo Penal.

Acrescente-se, ainda, que a representação deverá ser feita dentro de 6 (seis) meses a partir da data em que a pessoa que estiver investida do direito de representação vier a saber quem foi o autor do crime (CPP, art. 38, caput), ou, no caso do artigo 29 (ação penal privada subsidiária da pública), do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia, sendo esse prazo de natureza decadencial (CP, art. 103).

De outro lado, o direito de representação poderá ser exercido por escrito ou oralmente, mediante declaração que será prestada ou ao juiz, ou ao Ministério Público, ou à autoridade policial (CPP, art. 39, caput), sendo que tal representação, quando feita oralmente ou por escrito, sem assinatura devidamente autenticada do ofendido, de seu representante legal ou procurador, deverá ser reduzida a termo perante o juiz ou autoridade policial, presente o órgão do Ministério Público, quando a este houver sido dirigida (CPP, art. 39, § 1º), e, se tal representação contiver todos os elementos que habilitem o Ministério Público a promover a ação penal, este oferecerá denúncia no prazo de 15 (quinze) dias (CPP, art. 39, § 5º).

Ademais, se a representação for feita ao juiz, ou perante este reduzida a termo, será remetida à autoridade policial para que esta proceda a inquérito (CPP, art. 39, § 4º). Note-se que, quando a representação for feita perante o Juiz, e se com ela forem fornecidos outros elementos de prova que tornem dispensável o inquérito, cumprirá ao Magistrado, segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [51], encaminhá-la, juntamente com os demais elementos de convicção, ao órgão do Ministério Público, aplicando-se, por analogia, o artigo 40 do Código de Processo Penal.

De outro turno, a representação, sendo simples manifestação de vontade do ofendido ou de seu representante legal, no sentido de permitir o procedimento criminal, não está sujeita a fórmulas ou a termos sacramentais. Vejam-se os acórdãos abaixo que refletem tal entendimento:

"Prestada perante a Autoridade Policial, como foi, e reduzida a termo, vale perfeitamente. O essencial é o espírito que a ditou e que tenha sido manifestada a vontade de que a Justiça se movimente para as providências necessárias" (cf. D. A. Miranda, Repertório de jurisprudência, v.7, p.76).

"É exato, consoante reiterada jurisprudência, que a representação não precisa de formalidades especiais, nem requer terminologia sacramental" (D. A. Miranda, Repertório, cit., p.76)

Releva notar, ainda, que o ofendido poderá fazer tal representação, desde que seja maior de 18 (dezoito) anos. Não há disposição expressa nesse sentido, mas, como o artigo 34 do Código de Processo Penal confere ao ofendido maior de 18 (dezoito) anos o direito de queixa, por interpretação extensiva se infere que o maior de 18 (dezoito) anos, segundo o Profº Fernando da Consta Tourinho Filho [52], poderá, também, fazer a representação, pois quem pode o mais, que é a queixa, pode o menos, que é a representação.

Contudo, o Profº Luiz Flávio Gomes [53] sustenta posicionamento contrário, ainda minoritário, afirmando que a norma que regula o exercício do direito de representação é daquelas classificadas como mista ou híbrida, ou seja, que têm dentro de si, a um só tempo, conteúdo material e processual. E, sendo assim, como foi salientado no capítulo primeiro, a ela se impõem as regras de interpretação do direito material, não podendo, portanto, serem utilizadas nem a analogia in malla partem, nem a interpretação extensiva que tenha conseqüências nocivas ao réu.

Por conseguinte, segundo tal entendimento, somente o ofendido maior de 21 anos poderá exercer com total legitimidade o exercício do direito de representação.

Por outro lado, o maior de 18 (dezoito) anos, ainda segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [54], poderá exercer o direito de representação mesmo na hipótese de haver oposição de seu representante legal, e vice-versa, como se constata, ainda por interpretação extensiva, pelo parágrafo único, do artigo 50, do Código de Processo Penal.

Observe-se que, segundo o entendimento do professor Fernando da Costa Tourinho Filho [55], a incapacidade a que se refere à lei civil sofre uma exceção no Direito Processual Penal. Como indiciado, o menor de 21 (vinte e um) anos continuará sendo relativamente incapaz, tanto que os atos que deva realizar dentro do inquérito deverão ser assistidos pelo curador (CPP, arts. 15, 194 e 262). Mas, como vítima, poderá exercer o direito de queixa ou de representação, com ou sem assistência de seu representante legal e, até mesmo, contra vontade deste.

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Se o ofendido for menor de 18 (dezoito) anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, o direito de representação será exercido por quem legalmente o represente, nos termos do artigo 24 do Código de Processo Penal.

Não se infira, de tudo quanto até aqui exposto, que o representante legal não possa exercer o direito de representação se o ofendido for menor de 21 (vinte e um) anos e maior de 18 (dezoito). A lei concede tal direito, na hipótese do artigo 34 do Código de Processo Penal (interpretado extensivamente), tanto a um quanto a outro. Se um não fizer, o outro poderá fazê-lo, pouco importando que haja ou não oposição de um deles. A outra conclusão não se poderá chegar analisando-se o artigo 34 e o parágrafo único do artigo 50 do Código de Processo Penal.

Nesse sentido, aliás, é a redação da súmula nº594 do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabelece que "os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos, com independência, pelo ofendido ou por seu representante legal".

a)mediante requisição do Ministro da Justiça – Como o Código de Ritos silenciou como o inquérito policial, nesse caso, será iniciado, o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [56] sustenta que deva a requisição ministerial ser encaminhada ao Chefe do Ministério Público (Federal ou Estadual, conforme o caso), e este, então, se entender de necessidade as diligências requisita-las -á à autoridade policial.

Nessa hipótese, deve o promotor, ao requisitar o inquérito, encaminhar também a requisição ministerial, uma vez que, se na ação penal subordinada à representação, o inquérito sem ela não pode ser instaurado, pela mesma razão não o poderá também se não lhe for encaminhada a requisição.

Releva notar, por oportuno, que não há, nesta hipótese, prazo decadencial previsto em lei. Contudo, é certo que tal requisição não poderá ser proposta após o término do prazo prescricional do delito in casu.

A requisição ministerial é indispensável nos seguintes delitos: a) crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil (CP, art. 7º, §3º, b); b) crime contra a honra de Chefe de Governo Estrangeiro (CP, art. 145, § único); c) crime contra a honra do Presidente da República, desde que seja injúria, ou calúnia e difamação que não se configurem em crime contra a segurança nacional (Lei nº7.170/83, arts. 1º e 2º); d) crime contra honra de Ministro de Estado, Chefe de Estado ou Governo Estrangeiro e seus representantes diplomáticos, Ministros do Supremo Tribunal Federal, disciplinado pela Lei de Imprensa; e) crime de injúria cometido pela imprensa contra Presidente da República, Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente do Senado Federal e Presidente do Supremo Tribunal Federal, além de outros crimes previstos no Código Penal Militar.

5.2.3. Instauração no caso de Ação Privada –

Conforme o disposto no artigo 5º, § 5º, do Código de Processo Penal, tratando-se de crime de iniciativa privada, a instauração do inquérito policial pela autoridade pública depende de requerimento escrito ou verbal, reduzido a termo neste último caso, do ofendido ou de seu representante legal, isto é, da pessoa que detenha a titularidade da respectiva ação penal (CPP, art. 30 e 31). Neste caso, nem o Ministério Público, nem a autoridade judiciária poderão requisitar a instauração da investigação.

O inquérito, no caso de crime de iniciativa privada, pode ser instaurado mediante a iniciativa:

a) do ofendido (CPP, art. 5º, § 5º; art. 30);

b) seu procurador com poderes especiais (CPP, art. 44);

c) o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, no caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial (CPP, art. 31) e;

d) os representantes das fundações, associações, ou sociedades legalmente constituídas que tenham sido designados nos contratos ou estatutos, e, no silêncio destes, seus diretores ou sócios-gerentes, no caso de crime de iniciativa privada em que uma dessas pessoas jurídicas de direito privado seja vítima (CPP, art. 37).

Sendo o ofendido menor de 18 (dezoito) anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver representante legal, caberá ao seu representante legal requerer a instauração de inquérito e promover posteriormente a queixa, ou, se tiver em mãos elementos que o habilitem a promover a ação penal, poderá ingressar em juízo com a queixa-crime (CPP, art. 33), conforme o entendimento do Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [57].

Caso o ofendido seja menor de 21 (vinte e um) e maior de 18 (dezoito) anos, o requerimento tanto poderá ser feito por ele como pelo seu representante legal - STF, súmula nº594 (CPP, art. 34). Se um deles quiser fazê-lo e o outro se opuser, prevalecerá, segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [58], a vontade daquele que quiser instaurar o inquérito (CPP, art. 50, parágrafo único).

No que concerne a legitimidade da mulher casada para requerer a instauração de inquérito independente da outorga marital, toda a doutrina [59] é unânime em afirmar que o artigo 35 do Código de Processo Penal, já revogado pela Lei nº9.520/97, não foi recepcionado pela Constituição Federal, por colidir com o artigo 226, § 5º.

Quanto ao prazo para se requerer a instauração do inquérito, apesar de o Código de Ritos não possuir disposição expressa, o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [60], valendo-se do disposto no artigo 38, assevera que o ofendido deverá requerer a instauração do inquérito antes de se completar o semestre decadencial a que se refere o mencionado artigo, de molde a haver tempo suficiente para ingressar em juízo com a queixa dentro daquele prazo de 06 (seis) meses.

Contudo, pode o ofendido ou seu representante legal dispensar o inquérito e ingressar logo em juízo coma queixa, desde que já tenha reunido os elementos necessários para instruir a ação penal.

Convém assinalar, ainda, que o conteúdo do requerimento de instauração do inquérito será aquele disposto no artigo 5º, § 1º, e, apesar de a lei processual não dizer expressamente se a autoridade policial poderá indeferir ou não tal requerimento, já que o § 2º, do artigo 5º só se refere ao requerimento de que trata o inciso II, do mesmo artigo, o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [61] sustenta que, em alguns casos, como, por exemplo, se estiver extinta a punibilidade, nada impede que a autoridade policial o indefira, e, no caso de não ser ela a autoridade competente, afirma ainda o professor, nada obsta que se aplique, por analogia, o que dispõe o § 3º, do artigo 39, ou seja, o requerimento será encaminhado àquela que o for.

Encerrado o inquérito policial, os autos serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão, a iniciativa do ofendido ou d seu representante legal (CPP, art. 19).

5.2.4. Peças inaugurais do inquérito policial –

A portaria é a peça inaugural quando inquérito é instaurado ex officio (ação penal pública incondicionada).

No que concerne a qualquer espécie de infração penal, o inquérito poderá ser instaurado mediante o auto de prisão em flagrante (CPP, art. 8º). Veja-se a respeito a súmula nº145 do STF [62][63].

No que diz respeito aos crimes de ação penal privada e ação penal pública incondicionada, o inquérito poderá ser instaurado mediante requerimento o ofendido ou de seu representante.

No que tange aos crimes de ação penal pública incondicionada e condicionada (acompanhada de representação), o inquérito poderá ser instaurado mediante requisição do Ministério Público e, para alguns doutrinadores, da autoridade judiciária.

E, por fim, no que se refere aos crimes de ação penal pública condicionada, a instauração do inquérito poderá decorrer da representação do ofendido ou de seu representante legal, ou, ainda, de requisição do Ministro da Justiça.

5.2.4.1. Jurisprudência –

01) INQUÉRITO. INSTAURAÇÃO. CRIME EM TESE (STJ): "Justifica-se a concessão do writ requerido sob a alegação de falta de justa causa, se nem mesmo em tese, o fato imputado constitui crime, ou então, quando se verifica, prima facie, não configurada a participação delituosa do paciente" (JSTJ, 33/341).

02) INQUÉRITO. INSTAURAÇÃO. ECLUDENTE DE ILICITUDE (TJSP): "A antijuridicidade do fato só pode ser apreciada após a denúncia, não sendo lícito antes de seu oferecimento trancar-se o inquérito policial, sob a alegação de que a prova nele produzida induz à inexistência da relação jurídico-material, em verdadeiro julgamento antecipado do acusado" (RT, 590/334).

03) INQUÉRITO. INSTAURAÇÃO. AÇÃOPENAL PRIVADA (TACrimSP): "Em se tratando de infração onde a ação é de iniciativa privada, é inadmissível a requisição de instauração de inquérito policial por parte do Ministério Público" (RJDTACrimSP, 12/211).

5.2.5. Procedimento ou providências (ou diligências) –

Prestada a notícia crime e instaurado o inquérito pela autoridade policial, esta deverá, de acordo com o disposto no artigo 6º do Código de Processo Penal, empreender as diligências necessárias para demonstrar a materialidade e a autoria do delito.

Tais diligências serão adotadas de acordo com a utilidade que possam ter dentro das investigações policiais e serão determinadas, em regra, segundo o juízo de conveniência e oportunidade do delegado, sendo, por isso, um procedimento de difícil ritualização, uma vez que não tem uma ordem prefixada para a prática dos atos.

Quando se afirma que as diligências policiais serão, em regra, determinadas pela autoridade policial, é porque as diligências requisitadas pelo Ministério Público e pelo Juiz são ordens as quais deve aquela autoridade obrigatoriamente cumprir (CPP, art. 13, II), salvo quando forem frontalmente contra a lei, em obediência ao artigo 129, inciso VIII, da Constituição Federal de 1988.

Ressalte-se que o rol de diligências disposto no Código de Ritos tem natureza meramente exemplificativa, não estando a autoridade policial limitada a realizar apenas as previstas expressamente em lei, podendo determinar outras, desde que sejam relevantes para apuração do delito e de suas circunstâncias, não ofendam as garantias fundamentais da pessoa humana consagradas na Constituição Federal e não se revelem como expressão de abuso de poder (Lei nº4.898/65).

Assim, logo que a autoridade policial tiver conhecimento da prática de infração penal, a autoridade policial deverá as seguintes diligências, dentre outras:

a) dirigi-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e a conservação de coisas, até a chegada dos peritos criminais;

b) aprender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;

c) colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;

d) ouvir o ofendido, se possível;

e) ouvir o indiciado, observado o disposto nos artigos 185 usque 196 do Código de Processo Penal, tomando-se das declarações termo, que deverá ser assinado por 02 (duas) testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura;

f) proceder ao reconhecimento de pessoas e coisas e a acareação;

g) determinar, se for o caso, que se proceda a exame de corpo de delito e outras perícias;

h) ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;

i) averiguara a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuem para a apreciação de seu temperamento ou caráter;

j) e, desde que não contrarie a moralidade, a ordem pública ou ofenda a garantia constitucional prevista no artigo 5º, inciso LIII, da Constituição Federal, a reprodução simulada dos fatos.

Além dessas diligências, pode a autoridade policial determinar ou requerer a busca e apreensão (CPP, art. 240 usque 250), que, conforme o caso, pode ser: a) locus delicti (local do crime); b) domiciliar (somente possível com autorização judicial, velando-se pelo art. 5º, XI da CF) e pessoal (podendo ser realizado com ou sem mandado), quando a própria autoridade judiciária ou policial realizar a diligência (CPP, art. 245, § 1º).

Outras diligências que podem ser, também, empreendidas pela autoridade policial são: a) a representação junto à autoridade judiciária pela prisão preventiva (CPP, arts. 13, IV e 311) ou temporária (Lei nº7.960/89, art. 2º, caput), de acordo com a situação, do indiciado, b) o fornecimento às autoridades judiciárias das informações necessárias à instrução e julgamento do processo (CPP, art. 13, I), c) o cumprimento dos mandados de prisão expedidos pela autoridade judiciária (CPP, art. 13, III), e d) como não poderia deixar de ser, proceder à prisão em flagrante (CPP, art. 301).

Quem melhor pode fornecer elementos para o esclarecimento do fato é o ofendido. Deverá a autoridade notificá-lo para este fim, sendo que, se houver recusa, poderá ser determinada a sua CONDUÇÃO COERCITIVA, tal como permite o art. 201 do CPP.

Passemos, então, a um breve exame de cada uma dessas diligências.

a)CPP, artigo 6º, inciso I

A partir da Lei nº8.862/94, que modificou a redação do presente inciso, a autoridade policial deverá sempre, e não somente quando possível, dirigir-se ao local do crime, providenciando para que não se altere o estado de conservação das coisas, até a chegada dos peritos.

Tal regra, aliás, tem correspondência com o artigo 169 do Código de Processo Penal, o qual prescreve: "Para o efeito de exame do local onde houver sido praticada a infração, a autoridade providenciará imediatamente para que não se altere os estado das coisas até a chegada dos peritos, que poderão instruir seus lados com fotografias, desenhos ou esquemas elucidativos. Parágrafo único: Os peritos registrarão, no laudo, as alterações do estado das coisas e discutirão, no relatório, as conseqüências dessas alterações na dinâmica dos fatos".

Anote-se, por oportuno, que ocorrendo alguma alteração, sem licença da autoridade policial competente, no local do crime especialmente protegido por lei, estará configurado o delito previsto no artigo 166 do Código Penal (alteração de local especialmente protegido).

Contudo, como salienta Capez [64], em casos de acidente de trânsito, temos a exceção à regra, já que nessa hipótese, "a autoridade ou agente policial que primeiro tomar conhecimento do fato poderá autorizar, independentemente de exame do local, a imediata remoção das pessoas que tenham sofrido lesão, bem como dos veículos envolvidos, se estiverem na via pública prejudicando o tráfego" (Lei nº5.970/73, art.1º).

Observe-se, entrementes, que a alteração do inciso sob comento não foi, como destaca o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [65], para melhor, pois a supressão de expressões, como, por exemplo, "se possível" e "conveniente", acaba, a um só tempo, por inviabilizar as atividades da autoridade policial, já que o número de delegados é de longe menor que o número de delitos, bem como se torna, em alguns casos, de todo inútil, por desconsiderar os delitos que não deixam vestígio (delicta factis transeuntis), como, por exemplo, os crimes formais (ex: crimes contra a honra que forem consumados oralmente), nos quais é de todo despiciendo exigir que a autoridade policial dirija-se até o local do crime (CPP, art. 564, III, b).

c)CPP, artigo 6º, inciso II

O dispositivo ora em exame impõe à autoridade policial que a obrigação de apreender os objetos que tiverem relação como fato, após liberados pelos peritos criminais, fazendo-os acompanhar os autos do inquérito (CPP, art. 11).

Os instrumentos empregados na prática da infração deverão ser periciados a fim de se lhes verificar a natureza e a eficiência (CPP, art. 175), para que assim possa se determinar ou não a absoluta impropriedade do objeto, ou seja, se há ou não, no caso, a figura do crime impossível (CP, art. 17).

Note-se, ainda, que, se os instrumentos do crime consistirem em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito, estes serão perdidos em favor da União, segundo o artigo 91, inciso II, alínea a, do Código Penal, por ser este um dos efeitos da condenação, e, nesse caso, serão inutilizados ou recolhidos a museu criminal, se houver interesse na sua conservação (CPP, art. 124).

Todavia, antes analisarmos rapidamente a figura da busca e apreensão, também abrangida pelo presente dipositivo, é necessário ressaltar, de acordo com a lição do Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [66], que o presente inciso peca em sua redação ao utilizar-se da expressão "após liberados pelos peritos criminais", visto que, tomada esta a rigor, leva a situações desconcertantes e ridicularizantes, como, por exemplo, a de num Município, onde não houver peritos criminais disponíveis, ter a autoridade policial que ficar montando guarda daqueles objetos, muitas vezes durante dias, sem poder apreendê-los.

No que tange a busca e apreensão de que fala o artigo 6º, inciso II do Código de Ritos, esta poderá ser efetuada no local do crime, em domicílio, ou na própria pessoa (CPP, arts. 240 a 250).

Tratando-se de busca domiciliar, a Constituição Federal, no artigo 5º, inciso XI, prescreve que "a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial". Assim, as buscas domiciliares somente poderão ser realizadas, em regra, com a autorização do Juiz.

Em se tratando de busca pessoal, esta poderá ser realizada com mandado ou sem mandado. Se a própria autoridade realizara a diligência (Juiz ou Delegado), não haverá necessidade de mandado (CPP, art. 241). Sem mandado, também, quando a busca pessoal se faz durante a diligência domiciliar, ou então, no caso de prisão, ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo do delito (CPP, art.244).

O conceito de casa encontra-se determinado no artigo 150, §§ 4º e 5º, do Código Penal, ou seja, qualquer compartimento habitado, aposento habita do de ocupação coletiva e compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (Lei nº8.906/94, art. 7º, II), não se incluindo em tal definição a hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta, bem como a taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.

Em princípio, nada impede que a busca seja realizada em domingo ou feriado, pois até mesmo os atos processuais podem ser realizados nesses dias (CPP, art. 797). Todavia, quanto à hora a lei estabelece que as buscas domiciliares serão realizadas de dia. À noite não é possível. Embora haja discordância entre os autores em determinar o espaço de tempo considerado como noite admiti-se que seja o espaço de tempo entre as 06:00 e 18:00 horas. Já, para Pimenta Bueno, citado pelo Profº Fernando da Costa Tourinho Filho, "noite é período de tempo entre a entrada e saída do sol, ou seja, entre a aurora e o crepúsculo" [67], sendo esse o entendimento do STF e o que prevalece na doutrina, haja vista a dimensão continental do Brasil e as diversas linhas de fuso horário por que é cortado.

Apesar da atual Magna Carta nada dizer expressamente a respeito do período noturno, percebe-se pelo espírito de seu conteúdo garantidor que durante a noite a busca domiciliar só será possível, nos seguintes casos, segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [68]: a) com o consentimento do morador (CPP, art. 245, caput), b) no caso de flagrante delito, c) no caso de desastre, e d) para prestar socorro. Já durante o dia, a entrada é permitida não só nessas hipóteses, mas também por determinação judicial. Nesse sentido, aliás, é o disposto no artigo 150, § 3º, do Código Penal.

Se durante o dia houver oposição do morador em que seja realizada a busca, será arrombada a porta e forçada a entrada, procedendo-se, em seguida, a busca e apreensão (CPP, art.245, §§ 2ºe 3º), entretanto, a busca deverá ser procedida de modo a não se molestar os moradores mais do que o necessário para o êxito da diligência (CPP, art. 248).

Se durante o dia o morador não se encontrar em casa, qualquer vizinho, se houver e estiver presente, será notificado a assistir a diligência (CPP, art. 245, § 4º).

Releva notar, ainda, que pode haver apreensão sem busca, como ocorre, por exemplo, quando o indiciado apresente, voluntariamente, à autoridade policial o instrumento do crime ou qualquer objeto que interesse à prova, ou quando um terceiro, que tenha arrebatado das mãos do criminoso o instrumento do crime, tenha-o entregue á autoridade policial. Nessas hipóteses, cumprirá à autoridade policial determinar a lavratura de um auto de prisão de exibição e apreensão.

Por fim, no que tange à busca e apreensão, mais adiante iremos tecer comentários mais detalhados acerca da matéria.

c) CPP, artigo 6º, inciso III

O presente inciso impõe o dever a autoridade policial de colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias.

Sendo assim, a autoridade policial, apesar de conduzir, em regra, as diligências policiais conforme o seu juízo de conveniência e oportunidade, deverá estar atenta a não produzir prova que seja de todo inútil para apuração do fato criminoso e de sua autoria.

Além disso, é com base no inciso ora em exame que a autoridade policial poderá requerer a oitiva de testemunhas que tenham presenciado o fato criminoso (testemunha ocular) ou que tenha ouvido falar do delito (testemunha auricular). Para tanto, segundo a maior parte da doutrina [69], a autoridade policial poderá determinar a condução coercitiva da testemunha, do indiciado e do ofendido, no caso de entender necessário, valendo-se do disposto no artigo 218 do Código de Processo Penal. Nesse sentido e a jurisprudência do do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo:

INTERROGATÓRIO. CONDUÇÃO COERCITIVA (TACrimSP): "No poder legal dos delegados de polícia, iniludivelmente se encontra o de interrogar pessoa indiciada e inquérito, para tanto podendo mandá-la conduzir a sua presença, caso considere indispensável o ato e o interessado se recusa a comparecer" (RT, 482/357)

Contudo, note-se que o dispositivo citado só se refere expressamente à autoridade judiciária, havendo, por isso, entendimento diverso [70] que não admite a possibilidade de a autoridade policial poder determinar a condução coercitiva.

c) CPP, artigo 6º, inciso IV

Deverá a autoridade policial, quando possível, ouvir o ofendido, pois o sujeito passivo, de regra, é quem melhor poderá oferecer à autoridade policial elementos para o esclarecimento do fato.

Se, é certo que a palavra do ofendido apresenta valor probatório relativo, já que este tem interesse na relação jurídico-material, também é certo que sua palavra é de grande valia, pois se constitui no vértice de toda prova, segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [71], e, principalmente, nos crimes que não há testemunha.

Cumpre, assim, à autoridade policial, se possível, determinar a notificação do ofendido a fim de comparecer na Delegacia, em dia e hora designados, para ser ouvido. E, se o ofendido desatender à notificação, a autoridade policial poderá, segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho, determinar que esse pague a multa designada no artigo 453 do Código Procedimental, que seja conduzido coercitivamente (CPP, art. 201, parágrafo único), que seja instaurado contra ele inquérito para que se apure a possível prática do crime de desobediência (CP, art. 330), bem como que seja condenado a pagar as custas da diligência (CPP, art. 219).

Aliás, dependendo do caso concreto, poderá, até mesmo, a autoridade policial determinar a busca e apreensão do ofendido, nos termos do art. 240, § 1º, alínea g, do Código de Processo Penal. Contudo, na prática, tal providência quase sempre nem chega a acontecer, pois o próprio ofendido tem interesse em ver o seu agressor punido.

d) CPP, artigo 6º, inciso V

Deve o interrogatório do indiciado ser realizado, se possível (não tendo havido fuga, não sendo caso de autoria desconhecida), segundo as mesmas normas e garantias daquele levado a cabo pelo Juiz durante a instrução, ou seja, obedecendo o quanto disposto nos artigos 185 usque 196 do Código de Processo Penal, bem como às disposições constitucionais em torno da matéria (CF, art. 5º, LXIII e LXIV).

Note-se, contudo, que alguns dispositivos do Código de Processo Penal não foram recepcionados pela Constituição em vigor, como, por exemplo, o artigo 186, que, nos dias atuais, não tem mais nenhum razão de ser face ao direito do réu de se manter calado durante o interrogatório, conforme o artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal. Aliás, se assim desejar, o réu poderá, até mesmo, mentir, pois o ordenamento jurídico vigente não exige de qualquer pessoa que impute a si fato desabonador à sua conduta, em nome dos princípios da plenitude defesa, consagrado na Constituição Federal (CF, art. 5º, LV), e da dignidade humana (CF, art. 1º, inciso III).

Caso o indiciado não atenda a notificação para se submeter a interrogatório, deverá ele ser conduzido coercitivamente até a presença da autoridade policial, segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [72], não devendo, entretanto, submeter o réu a qualquer constrangimento ou coação durante o interrogatório, pois "ninguém será submetido à tortura nem tratamento desumano ou degradante" (CF, art. 5º, III), caso contrário restará configurado algum dos delitos previsto na Lei nº9.455/97.

O auto do interrogatório será subscrito pelo escrivão e assinado pela autoridade policial, pelo indiciado e por duas testemunhas que tenham apenas ouvido a leitura do interrogatório, não havendo necessidade de que estas estejam presentes durante o desenrolar do interrogatório (CPP, art. 5º, inciso V).

Por fim, se o indiciado não quiser, não puder ou não souber assinar tal será consignado em ata, conforme dispõe o art. 195, parágrafo único, do Código de Processo Penal.

Mais adiante, quando for analisado especificamente o interrogatório, serão aprofundadas as considerações em torno dele.

d) CPP, artigo 6º, inciso VI

No que concerne ao reconhecimento de coisas e pessoas, a autoridade policial, se entender por bem realizá-lo, deverá obedecer o quanto disposto nos artigos 226 a 228 do Código de Processo Penal.

Destarte, a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa ou coisa que deva ser reconhecida. Note-se, por oportuno, que tal pessoa só poderá ser ou o ofendido ou uma testemunha ocular.

Observe-se que pessoa ou coisa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la e do reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade policial, pela pessoa que reconheceu e por duas testemunhas instrumentárias (CPP, art.226, inciso IV).

Releva notar que o reconhecimento fotográfico tem, segundo José Frederico Marques, valor probatório relativo [73].

Por outro lado, no que tange à acareação, esta consiste no ato de se colocar face-a-face às pessoas que estão divergindo na narrativa do fato ou de alguma circunstância relevante para decisão da causa, reperguntando-se às mesmas acerca dos pontos de divergência (CPP, art. 229, parágrafo único), estando presente a autoridade policial.

Convém assinalar que à acareação será admitida entre acusados, entre acusado e testemunha, entre testemunhas, entre acusado ou testemunha e a pessoa ofendida e entre as pessoas ofendidas (CPP, art.229).

Ressalte-se, conforme sustenta o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [74], que o auto de acareação somente terá valor se a autoridade policial tiver o cuidado de, no final deste, fazer observações sobre as reações fisionômicas dos acareados, bem como a análise de sua compostura, coerência e firmeza.

Note-se que a acareação que deva ser realizada entre uma testemunha ou ofendido e o indiciado, poderá restar prejudicada, pois ao indiciado é garantido constitucionalmente o direito de silêncio. Além disso, deve-se observar que havendo acareação entre duas testemunhas, e somente nesse caso, a autoridade policial deverá advertir as mesmas da possível consumação do delito de falso testemunho (CP, art. 342).

e) CPP, artigo 6º, inciso VII

A autoridade policial deverá determinar a realização do exame de corpo de delito toda vez que a infração deixar vestígios (delicta factis permanentis), e, nesse caso, deverá determiná-la consoante o disposto nos artigos 158 usque 184 do Código de Processo Penal, não podendo, como anota o Profº Julio Fabbrini Mirabete [75], tal exame ser suprido pela confissão do indiciado (CPP, art. 158).

Veja-se que o exame de corpo de delito, que será mais adiante explorado, pode ser feito em um cadáver, numa pessoa viva, em um objeto e até mesmo em um documento. Portanto, por exame de corpo de delito ou corpus criminis deve-se entender todo e qualquer exame que se proceda nos elementos que formam o corpo do delito, vale dizer, que conferem materialidade ao delito, ou seja, o conjunto dos vestígios matérias deixados pelo delito.

Aliás, o exame de corpo de delito é tão importante que o Código de Processo Penal, no artigo 564, inciso III, alínea b, considera a sua não realização nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no artigo 167 (prova testemunhal subsidiária), como nulidade absoluta (CPP, art. 572, caput), ou como prefere o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [76], "a lei processual guindou o exame de corpo de delito à categoria de pressuposto processual de validade".

Certo é, também, como já mencionado, que a autoridade policial, ao contrário do que dispõe o artigo 14, não poderá indeferir requerimento da vítima ou do indiciado no sentido de que se realize o exame de corpo de delito, pois a norma do artigo 184 do Código de Processo Penal impõe que deva ser realizado o exame de corpo de delito, só podendo a autoridade policial indeferir o requerimento tratando-se de outra espécie de perícia.

Porém, não são apenas os exames de corpo de delito que podem ser realizados durante a feitura do inquérito policial, mais quaisquer outras perícias, as quais, a despeito da importância do exame de corpo de delito, não podem ser consideradas de pouca valia, uma vez que servem para esclarecer, elucidar ou aclarar a compreensão de algum fato ou circunstância relacionada com a persecução.

Entrementes, a autoridade policial, apesar da vasta gama de perícias que poderá determinar ao longo do inquérito policial, não pode proceder ao exame de sanidade mental do acusado por meio de sua própria e exclusiva autorização, devendo, para tanto, representar ao Juiz competente, consoante o disposto no artigo 149, parágrafo 1º (primeiro) do Código de Ritos.

Convém assinalar que todas as perícias, sejam ou não relativas ao exame do corpo do delito, deverão ser, obrigatoriamente, realizadas por 02 (dois) peritos, sejam oficiais ou não (Lei 8.862/94 com nova redação dada para o art. 159 do CPP), nesse sentido, veja-se a súmula nº361 do STF: "No processo penal, é nulo o exame realizado por um só perito, considerando-se impedido o que tiver funcionada anteriormente na diligência", ressalvado o disposto no artigo 22, § 2º, da Lei nº6.368/76.

Sem pretender fazer grandes incursões na matéria, por ora, os perito oficiais são aqueles que exercem função pública, com atribuições previamente determinadas em lei, enquanto que os não oficiais são pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior, escolhidas, de preferência, entre as que tiverem habilitação técnica relacionada à natureza do exame (CPP, art. 159, § 1º). Os primeiros não prestam compromisso de bem e fielmente desempenhar a função, pois já o fazem no ato de posse deste cargo público, ao passo que os outros devem compulsoriamente prestar tal compromisso, por ser esse uma formalidade essencial (CPP, art. 159, § 2º).

Ademais, sejam ou não oficiais, os peritos não podem ser indicados ou nomeados pelas partes, ainda que a perícia seja realizada em juízo, ou seja, encerrado o inquérito policial, sendo, portanto, a nomeação ato privativo da autoridade, seja policial, seja judiciária.

No entanto, há uma exceção a tal disposição normativa que é a consignada no artigo 177 do Código de Processo Penal, em que, no caso de ação penal privada, podem as partes por meio de acordo determinar que a nomeação dos peritos que seria feita, em princípio, no juízo deprecado, seja feita no juízo deprecante.

Por seu turno, sendo a perícia uma função social, não podem as pessoas nomeadas para tal encargo recusá-lo (CPP, art. 277, caput), sendo, no caso de recusa injustificada, a elas imposta multa, além de submetidas à condução coercitiva (CPP, art. 278, caput).

De outro lado, a autoridade poderá formular quesitos, conforme o disposto no artigo 176 do Código Procedimental, até o ato de diligência e deverá permitir, dentro do possível, que o indiciado, apesar de o inquérito não ter a natureza e as garantias do processo, formule também quesitos, principalmente nos casos em que as provas periciais dificilmente serão repetidas em juízo, sendo esse, por sinal, o comando do artigo 316 do Código de Processo Penal Militar.

f) CPP, artigo 6º, inciso VIII

A identificação é o processo usado para se estabelecer a identidade, conjunto de dados e sinais que caracterizam o indivíduo.

A identificação dactiloscópica é a comparação de impressões digitais. Este método de identificação possui a vantagem, segundo o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [77], de consistir em combinações identificadoras, perenes (não pode ser modificada por vontade do possuidor), intransmissíveis, imutáveis (desde o sexto mês de gestação até a putrefação) e diferentes (será necessário que se passem 4.660.337 séculos para que possa surgir na superfície da Terra duas pessoas com a mesma impressão digital), sendo, por isso, de uso mais prático e infalível que outros métodos como a oftalmografia (comparação das íris) ou o exame de DNA.

Devido à situação de constrangimento que pode gerar para o indiciado a submissão a qualquer método de identificação, a Constituição Federal de 1998 determinou que "o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei" (CF, art.5º, inciso LVIII), revogando assim a súmula nº568 do STF que determinava que "a identificação criminal não constitui constrangimento ilegal, ainda que o indiciado já tenha sido identificado civilmente", face à aplicação imediata do mencionado dispositivo constitucional (CF, art. 5º, § 1º), por se tratar, como lembra o Profº Julio Fabbrini Mirabete [78], de norma de eficácia plena até que o legislador infraconstitucional a restrinja. Entretanto, há julgados (HC 174.132/9, São Bernardo/SP, 2ª Câm. do TACrimSP) em sentido contrário, defendendo que o dispositivo constitucional aludido não é norma auto-executável. Este último entendimento é de longe o minoritário na jurisprudência.

Veja-se, a propósito, alguns entendimentos da jurisprudência em torno da matéria:

IDENTIFICAÇÃO CRIMINAL (TACrimSP): "O art. 6º, VIII, do CPP, que prevê a identificação criminal do indiciado pelo processo datiloscópico, sendo norma legal, não foi revogado pela nova Constituição Federal, que em seu art. 5º, LVIII. Ao se referir à prevalência da identificação civil, ressalta as hipóteses previstas em lei. Assim, a identificação datiloscópica deverá ser preservada quando indispensável para apurar a verdadeira identidade do indiciado, se o documento oferecido apresentar dúvidas quanto à sua identidade e mesmo se a cautela e o bom senso recomendam-na, quando a identificação civil for originária de outro Estado da Federação" (RJDTACrimSP, 1/202)

(STF) "Após a edição do texto constitucional promulgado em 05/10/88, o identificado civilmente não será submetido à identificação criminal, salvo exceções que a lei ainda não fixou" (RT, 647/350).

Antes da Lei nº 10.054/00, que veio a disciplinar especificamente a identificação criminal do indiciado, não havia disposição legal tratando da matéria, ficando a cargo de cada lei especial disciplinar as situações de que tratasse. E, nesse sentido, é que a Lei nº9.034/95, que veio a regular os meios operacionais para prevenção e repressão das ações criminosas organizadas, dispôs, em seu artigo 5º, que "as pessoas envolvidas com a ação praticada por organizações criminosas serão submetidas à identificação criminal, independentemente de já terem sido ou não identificadas civilmente".

Contudo, para dirimir as dúvidas a respeito do assunto foi editada a Lei nº 10.054/2000, que determina que "o civilmente identificado por documento original não será submetido à identificação criminal", exceto quando:

"I - estiver indiciado ou acusado pela prática de homicídio doloso; crimes contra o patrimônio praticados mediante violência ou grave ameaça; receptação qualificada; crimes contra a liberdade sexual ou crime de falsificação de documento público.

II - houver fundada suspeita de falsificação ou adulteração do documento de identidade.

III - o estado de conservação ou a distância temporal da expedição de documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais.

IV - constar de registros policias o uso de outros nomes ou diferentes qualificações.

V - houver registro de extravio do documento de identidade.

VI - o indicado ou acusado não comprovar, em quarenta e oito horas, sua identificação civil" [79].

No que tange à folha de antecedentes, também mencionada no presente inciso, o Profº Fernando da Costa Tourinho Filho [80] salienta que a autoridade policial deverá diligenciar para que essa seja anexada aos autos, pois tal providência será de grande valia para consideração de uma possível reincidência (CP, arts. 63 e 64) e de suas repercussões quando da consideração de uma circunstância agravante (CP, art. 61, I), da suspensão condicional da pena (CP, art. 77, I), além do livramento condicional (CP, arts. 83 a 90) e da suspensão condicional do processo (Lei nº9.099/95, art. 89, in fine).

g) CPP, artigo 6º, inciso IX

A averiguação acerca da vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, além de sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, bem como acerca de qualquer outro elemento que contribua para definir o caráter e temperamento deste, é considerado, por grande parte da doutrina [81], como providência salutar e de grande relevância para o processo, uma vez que auxiliará a autoridade judiciária a melhor fixar a pena, quando do proferimento da sentença, já que esta terá, de forma mais detalhada, ao seu alcance as circunstâncias judiciais estabelecidas no artigo 59 do Código Penal.

Contudo, conforme lembra o professor Alexandre Cruz, em brilhante aula ministrada no curso Jus Podivm, os professores Salo de Carvalho e Hamilton Bueno [82] sustentam que o presente dispositivo é de todo inconstitucional e dezarrazoado, por se tratar de critério subjetivo, deverás sujeito a discricionariedade da autoridade policial, por ser, também, critério perpétuo, pois não há limite, no tempo e no espaço, para o que essa autoridade convencione como vida pregressa, por ser critério negativo, uma vez que a autoridade, em regra, só estará atenta aos fatos passados que desabonem a conduta do indiciado, por ser critério de excessiva amplitude, visto que todo e qualquer fato pode ser considerado pela autoridade policial como pertinente ao seu caráter e temperamento, por ser de estrema relatividade, posto que o fato considerado como atinente à vida pregressa do indiciado, ou denotativo de seu caráter, pode não ser assim entendido, se examinado por outra autoridade e, por fim, e pelo mais importante dos motivos, por ofender o princípio constitucional penal da culpabilidade do fato, vez que o presente dispositivo se prende, desnecessária e desproporcionalmente, ao agente e a sua personalidade, em vez de se ater, única e exclusivamente, ao fato punível. Vale dizer, o Direito Penal, auxiliado pelo Direito Processual Penal, deve apurar e punir o fato criminoso e não o agente, pela só circunstância de ser ele quem é (teoria do etiquetamento ou da rotulação) [83].

Contudo, este último entendimento é, de longe, minoritário na doutrina.

h) CPP, artigo 7º - reprodução simulada

O artigo 7º do Código de Processo Penal determina que a autoridade policial possa proceder à reprodução simulada dos fatos para verificar a possibilidade da infração ter sido praticada de determinado modo. É a chamada reconstituição do crime, a qual, segundo o mesmo dispositivo, em princípio, só seria possível se não viesse a contrariar a moralidade ou a ordem pública.

Todavia, o Superior Tribunal Federal (STF) já proclamou abusiva a reconstituição do delito, por configurar constrangimento ilegal a iniciativa de obrigar o indiciado a participar desta reprodução, pois se a Constituição Federal assegura ao mesmo o direito de permanecer calado (art.5º, LXII), com muito maior razão, não pode este se ver obrigado a produzir prova contra si mesmo – nemo tenetur se detegere (RT, HC 64354, RT 624/372 e RTJ 127/461, TJSP, RJTJSP 431343 e RT 697/385). Nesse sentido é a Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

RECONSTITUIÇÃO SIMULADA. COMPARECIMENTO DO INVESTIGADO. OBRIGATORIEDADE (STF): "O suposto autor do ilícito penal não pode ser compelido, sob pena de caracterização de injusto constrangimento, a participar da reprodução simulada do fato delituoso. O magistério doutrinário, atento ao princípio que concede a qualquer indiciado ou réu o privilégio contra a auto-incriminação, resulta a circunstância de que é essencialmente voluntária a participação do imputado ao ato – provido de indiscutível eficácia probatória – concretizador da reprodução simulada do fato delituoso" (RT, 697/385).

Entretanto, para o Profº Julio Fabbrini Mirabete, a reprodução simulada não pode ser considerada, em todo e qualquer caso, como constrangimento ilegal, visto que se essa acabar por reforçar a tese da defesa e se o próprio réu espontaneamente desejar auxiliar a produção de tal prova não há porque entendê-la de tal forma, nem tão pouco, caso o réu se recuse a colaborar para sua realização, haverá de se falar na ocorrência do crime de desobediência (CP, art. 330), pois não se pode exigir do réu, em princípio, outra atitude (inexigibilidade de conduta adversa).

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Sobre o autor
Bernardo Montalvão Varjão de Azevedo

analista previdenciário do INSS, professor de Direito Penal e Processo Penal da Universidade Católica do Salvador (UCSal) e da Faculdade Baiana de Ciências (FABAC), pós-graduando em Ciências Criminais pela Faculdade Jorge Amado

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VARJÃO DE AZEVEDO, Bernardo Montalvão. Algumas considerações acerca do inquérito policial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 63, 1 mar. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3828. Acesso em: 22 dez. 2024.

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