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Direito de greve no serviço público

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            É bastante controvertida a doutrina pátria quando trata do direito de greve no serviço público. O presente trabalho não tem a pretensão de ser conclusivo sobre o assunto, mas busca informar a posição prevalente atualmente no ordenamento jurídico pátrio a respeito.

            Em princípio, impende conceituar o termo greve, que foi usado pela primeira vez em Paris, no final do Século XVIII, em decorrência das reuniões de desempregados e operários insatisfeitos com as condições de trabalho na Place de Grève, local onde se acumulavam gravetos trazidos pelo Rio Sena, daí o nome da praça e a origem etimológica do vocábulo.

            Por relevante, para que se desmistifique de uma vez o entendimento que o exercício de direito de greve, pelo menos no serviço público, é algo absoluto, intangível e reconhecido de forma universal pelas diversas ordens jurídicas alienígenas, cabe dar breve notícia da orientação adotada nos países que servem de referência na nossa construção constitucional.

            1. Estados Unidos da América - A constituição não trata de greve, nem de qualquer direito dos trabalhadores em geral, o que ficou a cargo da legislação ordinária. O Wagner Act e Taft-Hartley Law (1947) definem responsabilidade do sindicato, determina que a greve pode ser exercida pelo sindicato que congregar o maior número de trabalhadores de uma empresa ou atividade. Foram criadas as injuncions que são ordens judiciais proibitivas de greves. Para os funcionários públicos a greve é proibida sob pena de dispensa e proibição de recontratação por 3 anos(Lei Tafft-Hartley 1947).

            A Public Law 330 impôs severas penas a grevistas no serviço público federal(multa e prisão). Todo servidor deve fazer uma declaração em que renuncia ao direito de greve ao ingressar no serviço público.

            No âmbito estadual a grande maioria proíbe a greve no serviço público, salvo Alaska, Minesota, Montana,Oregon, Pensilvânia e Winsconsin.

            A arbitragem compulsória é a forma de resolver dissídios coletivos dos funcionários nos estados onde a greve é proibida.

            2. Alemanha - A Constituição assegura o direito a associação, mas é omissa quanto a greve. Por ter sindicatos fortes que de fato possuem representatividade, cabe a estes definir as regras para a greve(inclusive definir serviço essencial), que somente pode ser deflagrada quando esgotada todos procedimentos legais existentes para a autocomposição. São raras as paralizações.

            Para os funcionários públicos(beamter) existe proibição tácita do direito de greve, tendo o Tribunal Constitucional Federal já se posicionado no sentido que os funcionários estatutário não podem fazer greve, em razão dos princípios tradicionais do serviço público; Os beamter, contudo, podem ser sindicalizados. Por outro lado, aos empregados(angesstellte) e trabalhadores operários(arbeiter) tal direito é reconhecido, porém são vedadas greves políticas.

            3. Portugal - A Lei n.65, de 26 de agosto de 1977(art.12) assegura o exercício do direito de greve na função pública, especificando as atividades em que é proibida, vedando-a aos militares e estabelece as hipóteses de requisição civil, desde que não mantidas as atividades essenciais pelos grevistas. Neste caso o indivíduo terá direito apenas ao vencimento ou salário decorrente do contrato ou da categoria profissional.

            No Brasil, até a CF/88 a greve era proibida ao servidor público, a partir de então passou a ser reconhecido o direito de greve no serviço público nos termos do previsto no art.37, inc.VII, in verbis:

            " VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei complementar."

            Em consequência, a doutrina dividiu-se quanto a eficácia da referida norma. Celso Antônio Bandeira de Mello entende tratar-se de norma de eficácia contida, ao argumento que "a greve do servidor público era proibida e agora é prevista na própria Constituição, sendo, portanto, permitida. Se se condicionar o direito de greve do servidor público à edição de lei complementar, o trabalhador será privado do referido direito".

            No mesmo sentido leciona Antônio Alvares da Silva, asseverando que foi reconhecido " ao servidor público civil o direito de greve e não existindo a lei complementar referida no texto constitucional para definir-lhe os termos e limites, o direito será exercido de forma ilimitada", encontrando contenção apenas nas garantias constitucionais, nas leis de ordem pública, no ilícito civil e penal e nas disposições administrativas da Lei n. 8112/90.

            Contudo, a maioria dos doutrinadores posiciona-se no sentido de a norma insculpida no art. 37, inc. VII da CF/88 ter eficácia limitada. Em abono a tal posicionamento o STF, a quem cabe a interpretação da Constituição, manifestou-se em sede do julgamento do MI 20 - DF da seguinte forma:

            " EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO - DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO CIVIL - EVOLUÇÃO DESSE DIREITO NO CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO - MODELOS NORMATIVOS NO DIREITO COMPARADO - PRERROGATIVA JURÍDICA ASSEGURADA PELA CONSTITUIÇÃO (ART. 37, VII) - IMPOSSIBILIDADE DE SEU EXERCÍCIO ANTES DA EDIÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR - OMISSÃO LEGISLATIVA - HIPÓTESE DE SUA CONFIGURAÇÃO - RECONHECIMENTO DO ESTADO DE MORA DO CONGRESSO NACIONAL - IMPETRAÇÃO POR ENTIDADE DE CLASSE - ADMISSIBILIDADE - WRIT CONCEDIDO. DIREITO DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO: O preceito constitucional que reconheceu o direito de greve ao servidor público civil constitui norma de eficácia meramente limitada, desprovida, em conseqüência, de auto-aplicabilidade, razão pela qual, para atuar plenamente, depende da edição da lei complementar exigida pelo próprio texto da Constituição. A mera outorga constitucional do direito de greve ao servidor público civil não basta - ante a ausência de auto- aplicabilidade da norma constante do art. 37, VII, da Constituição - para justificar o seu imediato exercício. O exercício do direito público subjetivo de greve outorgado aos servidores civis só se revelará possível depois da edição da lei complementar reclamada pela Carta Política. A lei complementar referida - que vai definir os termos e os limites do exercício do direito de greve no serviço público - constitui requisito de aplicabilidade e de operatividade da norma inscrita no art. 37, VII, do texto constitucional. Essa situação de lacuna técnica, precisamente por inviabilizar o exercício do direito de greve, justifica a utilização e o deferimento do mandado de injunção. A inércia estatal configura-se, objetivamente, quando o excessivo e irrazoável retardamento na efetivação da prestação legislativa - não obstante a ausência, na Constituição, de prazo pré-fixado para a edição da necessária norma regulamentadora - vem a comprometer e a nulificar a situação subjetiva de vantagem criada pelo texto constitucional em favor dos seus beneficiários. MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO: A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de admitir a utilização, pelos organismos sindicais e pelas entidades de classe, do mandado de injunção coletivo, com a finalidade de viabilizar, em favor dos membros ou associados dessas instituições, o exercício de direitos assegurados pela Constituição. Precedentes e doutrina."

            Em suma, o STF entende que a norma que estabelece o direito de greve do servidor público é de eficácia limitada, portanto depende da edição de lei posterior a viabilizar o exercício do direito reclamado.

            Por se tratar de falta de norma regulamentadora a tornar viável o exercício de direito constitucional, o Pretório Excelso entende ser cabível, na hipótese, MI e ADI por omissão, tendo o sindicato legitimidade para a ação.

            De ver que, o MI não autoriza o Poder Judiciário a suprir a omissão normativa, nem tão pouco regulamentar editando ato necessário ao exercício de direitos, menos ainda a ordenar de imediato a prática de ato concreto para a satisfação do direito reclamado, conforme entendido no MI 168/RS, cuja ementa a seguir se transcreve:

            "MI 168 / RS

            Mandado de Injunção

            Relator(a):Min. Sepulveda Pertence

            Publicação: DJ Data-20-04-90

            Julgamento: 21/03/1990 - Tribunal Pleno

            Ementa : mandado de injunção. natureza. o mandado de injunção nem autoriza o judiciário a suprir a omissão legislativa ou regulamentar, editando o ato normativo omitido, nem, menos ainda, lhe permite ordenar, de imediato, ato concreto de satisfação do direito reclamado: mas, no pedido, posto que de atendimento impossível, para que o tribunal o faça, se contém o pedido de atendimento possível para a declaração de inconstitucionalidade da omissão normativa, com ciência ao órgão competente para que a supra. créditos judiciais contra a fazenda publica: pagamento parcelado (adct, art. 33): faculdade do poder executivo. o art. 33 do adct de 1988 nao outorgou direito ao credor da fazenda publica ao pagamento parcelado nele previsto, ao contrario, como faculdade do poder executivo competente, extinta com o transcurso do prazo decadencial de 180 dias sem decisão a respeito; a omissão dela, por conseguinte, não da margem a mandado de injunção. "

            Resta, contudo, ao Tribunal dar ciência ao Poder Legislativo da omissão normativa para que seja suprida, constituindo o Estado em mora para fins de indenização, conforme decidido no MI 283/DF:

            "MI 283 / DF

            Mandado de Injunção

            Relator(a):Min. Sepulveda Pertence

            Publicação: DJ Data-14-11-91

            Julgamento: 20/03/1991 - Tribunal Pleno

            Ementa - Mandado de injunção: mora legislativa na edição da lei necessária ao gozo do direito a reparação econômica contra a União, outorgado pelo art. 8., par. 3., ADCT: deferimento parcial, com estabelecimento de prazo para a purgação da mora e, caso subsista a lacuna, facultando o titular do direito obstado a obter, em juízo, contra a União, sentença liquida de indenização por perdas e danos. 1. O STF admite - não obstante a natureza mandamental do mandado de injunção (MI 107 - QO) - que, no pedido constitutivo ou condenatório, formulado pelo impetrante, mas, de atendimento impossível, se contém o pedido, de atendimento possível, de declaração de inconstitucionalidade da omissão normativa, com ciência ao órgão competente para que a supra (cf. Mandados de Injunção 168, 107 e 232). 2. A norma constitucional invocada (ADCT, art. 8., par. 3. - "Aos cidadãos que foram impedidos de exercer, na vida civil, atividade profissional especifica, em decorrência das Portarias Reservadas do Ministério da Aeronáutica n. S-50-GM5, de 19 de junho de 1964, e n. S-285-GM5 será concedida reparação econômica, na forma que dispuser lei de iniciativa do Congresso Nacional e a entrar em vigor no prazo de doze meses a contar da promulgação da Constituição" - vencido o prazo nela previsto, legitima o beneficiário da reparação mandada conceder a impetrar mandado de injunção, dada a existência, no caso, de um direito subjetivo constitucional de exercício obstado pela omissão legislativa denunciada. 3. Se o sujeito passivo do direito constitucional obstado e a entidade estatal a qual igualmente se deva imputar a mora legislativa que obsta ao seu exercício, e dado ao Judiciário, ao deferir a injunção, somar, aos seus efeitos mandamentais típicos, o provimento necessário a acautelar o interessado contra a eventualidade de não se ultimar o processo legislativo, no prazo razoável que fixar, de modo a facultar-lhe, quanto possível, a satisfação provisória do seu direito. 4. Premissas, de que resultam, na espécie, o deferimento do mandado de injunção para: a) declarar em mora o legislador com relação a ordem de legislar contida no art. 8., par. 3., ADCT, comunicando-o ao Congresso Nacional e a Presidência da Republica; b) assinar o prazo de 45 dias, mais 15 dias para a sanção presidencial, a fim de que se ultime o processo legislativo da lei reclamada; c) se ultrapassado o prazo acima, sem que esteja promulgada a lei, reconhecer ao impetrante a faculdade de obter, contra a União, pela via processual adequada, sentença liquida de condenação a reparação constitucional devida, pelas perdas e danos que se arbitrem; d) declarar que, prolatada a condenação, a superveniência de lei não prejudicara a coisa julgada, que, entretanto, não impedira o impetrante de obter os benefícios da lei posterior, nos pontos em que lhe for mais favorável".

            Fixado que o exercício do direito de greve pelo servidor público depende de regulamentação, o legislador constitucional enquanto ainda inexistente tal norma, posteriormente, através da EC n.019/98, modificou o art. 37, inc. VII da CF/88, que passou a ter a seguinte redação:

            " VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica."

            Em razão disto, passou-se a questionar se a Lei n. 7.783/89 haveria sido recepcionada pela a Constituição, há ser aplicada para a greve no serviço público.

            A resposta só pode ser negativa.

            É que, o fato de a Lei n. 7.783/89 definir o que sejam serviços essenciais e inadiáveis para a comunidade, não implica dizer que versa sobre serviços públicos.

            Além do que, se a época da edição da lei geral de greve, tal diploma não era a lei reclamada a regular a questão da greve no serviço público, não poderá agora o ser, ao simples argumento que o seu art. 16 restou revogado. A lei n. 7.783/89 não pode ser utilizada sequer por analogia.

            Específico(specificu) tem o sentido de relativo a, próprio de, especial. Daí o sentido da novel redação impressa ao inc. VII do art. 37 da CF/88, pela EC n.19/98, ou seja, há de haver lei ordinária própria em cada esfera da Administração Pública a regulamentar o exercício do direito de greve de seus servidores públicos.

            Neste sentido, Cármen Lúcia Antunes Rocha com precisão assevera:

            "Essa norma, modificada pela Emenda Constitucional n. 19/98, passa ao legislador infranconstitucional o tratamento do tema por meio de lei ordinária específica. Significa que o legislador ordinário não poderá cuidar do direito de greve no serviço público em diploma que não tenha como único objeto esse tema ou que possa considerara válido o exercício desse direito nos termos de lei vigente para a greve do setor privado, por exemplo. Quer dizer, não se tem a recepção da legislação sobre direito de greve de trabalhadores privados como uma regulamentação anterior aplicável ao setor público até que sobrevenha a lei mencionada no art. 37, inc. VII, porque ela não tem a especificidade ali requerida. Também não se pode aplicar por analogia, porque o constituinte reformador entendeu por bem definir que depende de uma especifidade legislativa, formal e material, a regulamentação do direito de greve do servidor."

            Com efeito, verifica-se que foi alterado o processo legislativo, que passa a referir-se a lei ordinária, ressaltando que a norma a ser criada terá que ser específica, ou seja tendo como único objeto o direito de greve no serviço público.

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            Destarte, cada ente da Federação deverá editar lei específica para regulamentar o exercício do direito de greve de seus servidores, pois a matéria é referente a servidor público não tendo a União competência privativa para legislar sobre o assunto.

            É que a lei específica, reclamada pelo comando constitucional, disporá sobre matéria de Direito Administrativo, já que trata de movimento paredista de servidor público, não cuida de matéria afeta ao Direito do trabalho, por conseguinte não se aplica o inc. I do art. 22 da CF.

            Resta patente, portanto, que é inaplicável o §1º, do art.9º da CF a complementar o art. 37, inc. VII, via de consequência impossível a aplicação da lei geral de greve aos servidores públicos.

            Faz-se mister não olvidar, a reforçar o porquê da não aplicação da Lei Geral de Greve ao servidor público, a natureza institucional do vínculo mantido entre este e a Administração pública, onde necessariamente todos os direitos, obrigações e vantagens, aí incluída a remuneração, decorrem de estipulação legal, a mitigar o exercício do direito de greve no serviço público.

            É que, a CF/88 não reconhece a validade de acordos ou convenções coletivas para o servidor público, a teor da norma contida no seu do §3º do art.39, até porque nem poderia fazê-lo, seja em razão dos diversos comandos constitucionais que vedam aumento de salário sem a respectiva lei (em sentido formal), mas principalmente e sobre tudo em razão da natureza do vínculo mantido entre o servidor e a administração.

            Quando muito o resultado das negociações resultaria numa pauta de intenções, para nortear a elaboração do projeto de lei referente ao aumento servidor a cargo do Chefe do Poder Executivo, que ainda seria sujeito a apreciação do poder legislativo.

            Em comento ao tema Cármen Lúcia Antunes da Rocha assim esclarece:

            "Greve é a ação coletiva, organizada e reivindicativa promovida com a paralização do exercício das atividades de todos os membros ou de uma parte dos membros de uma categoria profissional.

            ...........

            Ademais, a greve é de uma categoria profissional. Há que se considerar, então, que sobrevivem, na Administração Pública categorias profissionais diferentes, algumas inclusive tendo uma legislação a ser acatada pelas entidades públicas(como aquelas que dispõe de legislação específica preceituando piso salarial, período máximo de jornada diária, etc.), enquanto outras não são sequer reconhecidas como categoria específica( tais com aquelas que se referem aos "quadros gerais da Adm. Pub.", por exemplo). Logo a greve, e as soluções legalmente apresentadas como caminhos viáveis, hão de se coadunar com tais contingências profissionais ou categorizadas de forma singular

            ...........

            O servidor público, sujeito ao regime estatutário, que é positivado legalmente e que demanda que qualquer alteração de seus fatores, inclusive o remuneratório, se dê pela via da norma jurídica, não pode pretender que, de uma negociação levada a cabo exclusivamente com o titular do Poder executivo, por exemplo, possa-se extrair solução referente a valores, porque o Poder Legislativo terá participação imprescindível no desate do litígio instalado. Mas mesmo o exercício da função legiferante sujeita-se a princípios e regras constitucionais incontornáveis pelo legislador, pelo que há de se ater o movimento e sua solução aos comandos constitucionais, tais como os que se referem a leis orçamentárias, a leis restritivas do reajustamento e o limite de gastos das entidades com o pagamento de seus servidores, etc."

            Ademais, imperioso considerar a limitação das gastos com folha de pagamento impostas pela lei de responsablidade fiscal e a necessidade de previsão orçamentária para a realização de despesas, que sobremaneira inviabilizam de fato o atendimento das reivindicações de correntes da greve no serviço público, por mais justa que sejam.

            Aliás, recentemente (05/12/2002), o STF julgou improcedente a ADI n. 2726, a juizada pelo PSL contra o art. 3º da Lei Federal n. 10331/02, que dispõe sobre a revisão geral e anual das remunerações e subsídios dos servidores públicos federais dos três poderes, para reconhecer a dedução da revisão dos percentuais concedidos no exercício anterior, a impedir que determinadas categorias sejam duplamente beneficiadas por razões específicas, decisão judicial ou adiantamentos que não alcancaram todos, em atendimento ao princípio constitucional da isomonia.

            Por fim, impende esclarecer que aos empregados públicos regidos pela CLT, o exercício do direito de greve é permitido por aplicação da Lei Geral de Greve, porém lhes é vedado o atendimento das reivindicações através de convenção coletiva, se pertencerem a administração direta, autarquia ou fundação públicas, em razão da natureza jurídica pública destes e por imposição do §3º do art.39 da CF, que não remete ao inc. XXVI do art. 7ºda mesma norma, bem como em face do previsto no §1ºdo art. 61 também da CF.

            Com efeito, ainda que regidos pela legislação trabalhista, não seriam plenamente aplicáveis àqueles servidores as disposições da Lei n. 7.783/89, em virtude do princípio da legalide a que está sujeita a Administração Pública e da impossibilidade de concessão de vantagem pecuniária por meio de poder normativo da Justiça do Tabalho.

            Todavia, aos empregados das empresas públicas e sociedade de economia mista que explorem atividade economica, o exercício do direito de greve é amplo, pois ditos entes têm natureza privada, podem realizar negociação coletiva; desnecessário dizer que o dissídio é instaurado na Justiça do Trabalho.

            Porém, se "o exercício do direito de greve do servidor público, e mesmo o do empregado de empresa estatal prestadora de serviço público, não pode passar ao largo das características e das finalidades sociais dessa atividade.", ou seja, se a empresa pública prestar serviço público aplica-se o preceito constitucional do art. 37, inc. VII.

            Outro ponto de relevo, diz respeito ao desconto dos dias parados. A construção pretoriana dos tribunais superiores aponta no sentido da legitimidade da supressão da remuração do servidor durante os dias não trabalhados. Apenas para ilustrar, confira-se o teor da ementa do julgado exarado pelo STJ ao negar provimento a Recurso Ordinário em Mandado de segurança:

            " Ementa:

            - Constitucional. Direito de greve. Servidor público. Regulamentação. Lei Complementar. Descontaos dos dias não trabalhados.

            - A jurisprudência pretoriana vem se firmando no sentido de não ser auto-aplicável o direito inscrito no no art.37, VII, da Constituição Federal. Dependendo, para seu amplo exercício, regulamentação disciplinada em lei complementar.

            - Legitimidade do ato que promove o desconto dos dias não trabalhados.

            - Recurso Ordinário improvido.

            Decisão : Por unaminidade, negar provimento ao recurso."

            A seu turno, o STF analisando a questão, em que pese reconhecer o direito de greve do servidor público, também entendeu ser devido o desconto dos dias parados, pois o exercício do referido direito revela-se ilegal ante a ausência de norma regulamentar.

            Destarte, a Corte Suprema houve por bem deferir a suspensão da segurança anteriormente concedida, acolhendo o argumento da AGU, no sentido de que por não haver trabalho prestado a remuneração seria indevida, entender de forma diversa implicaria em reconhecer o enriquecimento sem causa dos grevistas. Verbis :

            "DESPACHO: Vistos, etc. A União requer a suspensão da segurança concedida liminarmente pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Gilson Dipp, no MS n.. 7.971 em favor do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior - ANDES, para o fim de determinar o repasse de verbas destinadas ao pagamento do salário dos docentes, nas respectivas universidades federais, em greve ha mais de trinta dias, relativamente ao mês de setembro de 2001. Alega a requerente descumprimento as formalidades processuais impostas pela Lei n.. 8.437/92, bem como a ocorrência de grave lesão a ordem publica e administrativa, uma vez que, tendo o Supremo Tribunal Federal assentado que a norma do art. 37, VII, da Carta Magna não e auto-aplicável, se torna. inviável o exercício do direito de greve pelos servidores representados pelo ANDES., circunstancia que autoriza a Administração a reter o repasse dos recursos correspondentes a folha de pagamento deles, enquanto perdurar a paralisação, sem que isso represente ofensa ao principio da autonomia universitária, previsto no art. 207 da mesma Carta. Em face da urgência reclamada, aprecio o pedido, após a manifestação da Procuradoria-Geral da Republica, observando, inicialmente, que. a competência do Presidente do STF, para conhecer do pedido de suspensão de segurança, resulta da fundamentação de natureza constitucional da causa. (AGRSS 302) e, nesse pedido,. não se examinam as questões da causa em que deferido o writ ou a liminar, mas, apenas, se ocorre, com tal deferimento, hipótese de risco de grave lesao a ordem, a saúde, a segurança e a economia publica. (AGRSS 341). Fixados esses parâmetros, deve-se considerar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do MI 20, Relator Ministro Celso de Mello, assentou que. o exercício do direito publico subjetivo de greve outorgado aos servidores civis só se revelara possível depois da edição da lei complementar reclamada pela Carta política. A lei complementar referida - que vai definir os termos e os limites do exercício do direito de greve no serviço publico - constitui requisito de aplicabilidade e de operatividade da norma inscrita no art. 37, VII, do texto constitucional.. Consequentemente, tendo a Corte fixado o entendimento de que a mencionada lacuna técnica inviabiliza o exercício do direito de greve dos servidores públicos, conclui-se que a falta deles ao trabalho, por esse motivo, nao pode ser abonada, com o pagamento dos respectivos vencimentos, sem que isso implique grave - e provavelmente irreversível - lesão a ordem administrativa das Universidades, conforme exposto pela requerente, principalmente levando-se em conta a extensão do movimento paredista, que envolve milhares de professores e perdura ha mais de trinta dias. Ante o exposto, e adotando o parecer do ilustre Procurador-Geral da Republica, defiro o pedido de suspensão de segurança ora requerido, ate o transito em julgado da decisão proferida nos autos principais. Comunique-se e publique-se. Brasília, 04 de outubro de 2001. Ministro ILMAR GALVÃO Vice-Presidente (art. 37, I, do RI/STF)"

            Inclusive, para aqueles que entendem ser aplicavél a questão a Lei Geral de Greve, nem assim melhor sorte colheriam os grevistas. É que o seu art. 7º determina expressamente que a greve implica na suspensão do contrato de trabalho, quer dizer não é obrigatória a prestação do serviço; não é obrigatório o pagamento de salários; o tempo de serviço não é contado.

            Outrossim, o Decreto n. 1.480/95 determina, no âmbito federal, que seja suspenso de ofício pela autoridade competente, o pagamento da remuneração do servidor grevista dos dias não trabalhados, da seguinte forma:

            " Art. 1º Até que seja editada a lei complementar a que alude o art. 37, inciso VII, da Constituição, as faltas decorrentes de participação de servidor público federal, regido pela Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, em movimento de paralisação de serviços públicos não poderão, em nenhuma hipótese, ser objeto de:

            I - abono;

            II - compensação; ou

            III - cômputo, para fins e contagem de tempo de serviço ou de qualquer vantagem que o tenha por base.

            § 1º Para os fins de aplicação do disposto neste artigo, a chefia imediata do servidor transmitirá ao órgão de pessoal respectivo a relação dos servidores cujas faltas se enquadrem na hipótese nele prevista, discriminando, dentre os relacionados, os ocupantes de cargos em comissão e os que percebam função gratificada.

            § 2º A inobservância do disposto no parágrafo precedente implicará na exoneração ou dispensa do titular da chefia imediata, sem prejuízo do ressarcimento ao Tesouro Nacional dos valores por este despendidos em razão do ato comissivo ou omissivo, apurado em processo administrativo regular. "

            De observar que muito se questiona a respeito da constitucionalidade de tal decreto, ao entendimento, diga-se equivocado, que criou-se uma forma de coação ao servidor para retorno ao serviço, diz-se, também, que seria espécie de decreto autônomo e haveria invasão de matéria reservada a lei.

            É preciso ter em mente que a greve possui natureza instrumental, onde os grevistas devem assumir o ônus da paralização, não se podendo admitir a penalização da população, do contribuinte que paga(caro) para ter direito a prestação(ainda que deficitária) do serviço público.

            Daí que, a autora Cármen Lúcia Antunes Rocha poderar com bastante pertinência:

            "Contudo, mais que em outros(direitos sociais), há que se cuidar para que a greve não seja transformada em manifestação puramente política ou, principalmente, político partidária, devendo-se ater à sua natureza de instrumento profissional de defesa de interesses não resolvidos por outras vias postas à disposição do trabalhador."

            Ora, o Decreto n. 1480/95, não esta a regulamentar o exercício do direito de greve dos servidores públicos, mas apenas disciplina um de seus efeitos decorrentes da só existência da previsão constitucional, qual seja a falta injustifica ao serviço. Injustificada porque é assente a impossibilidade do exercício, pelo menos de maneira legal, do direito de greve pelo servidor público até a edição de lei específica. Trata, portanto, de uma situação de fato existente na Administração que não pode ser desconsiderada pelo gestor público.

            É dizer: Até que venha a ser editada a lei de greve para o serviço público, cuida o Decreto n. 1480/95 de explicitar, em atenção ao inc. X, do art. 116 e inc.I, do art. 117 da Lei n. 8112/90, o alcance do art. 44, inc. I do mesmo diploma legal, in verbis :

            "art. 44 – O servidor perderá:

            I – a remuneração do dia em que faltar ao serviço, sem motivo justificado;"

            Tanto assim que o PL n. 6032/2002, que disciplina o direito de greve no serviço publico, cuida do assunto da seguinte forma:

            "Art. 3º Será suspenso de ofício, pela autoridade competente, o pagamento da rremuneração do servidor em greve, relativamente aos dias não trabalhados.

            §1º Declarada a legalidade da greve, será restabelecido o pagamento da remuneração, com efeitos retroativos à data de sua suspensão, ficando o servidor obrigado a repor os dias não trabalhados, mediante jornada diária acrescida de duas horas.

            §2º Declarada a ilegalidade da greve, é vedada a reposição do pagamento dos dias paralizados."

            Ademais, a Administração Pública em atendimento ao principio da legalidade, insculpido no caput do art. 37 da CF/88, está jungido ao cumprimento da lei em seu sentido amplo, ou seja, há que pautar seu comportamento pelo disposto nas normas jurídicas em vigor no ordenamento jurídico.

            Inclusive, a Corte Suprema instada a se pronunciar a respeito da constitucionalidade de Decretos estaduais, que versavam sobre matéria idência a contida no diploma federal referido, indeferiu pedido liminar em diversas ADI`s. Vale dizer, em razão da natureza dúplice da ação constitucional, firmou-se a constitucionalidade das normas impugnadas. Se não vejamos:

            "ADI 1696 / SE

            Relator(a): Min. Sepúlveda Pertence

            Publicação: DJ data-14-06-02

            Julgamento: 16/05/2002 - Tribunal Pleno

            EMENTA: Greve de servidor público: não ofende a competência privativa da União para disciplinar-lhe, por lei complementar, os termos e limites - e o que o STF reputa indispensável à licitude do exercício do direito (MI 20 e MI 438; ressalva do relator) - o decreto do Governador que - a partir da premissa de ilegalidade da paralisação, à falta da lei complementar federal - discipline suas conseqüências administrativas, disciplinares ou não (precedente: ADInMC 1306/BA,DJ30.6.95)."

            Portanto, é de se concluir que a atitude da Administração Pública resume-se a não remunerar os dias parados; não há obrigatoriedade de pagamento de salário porque não há trabalho; este é o ônus a ser assumido pelos paredistas.

            Por fim, cabe tratar da greve nas forças auxiliares, constituídas pelos militares e bombeiros militares dos Estados da Federação responsáveis policiamento ostensivo e preventivo( art. 144, §§6º e 5º da CF/88).

            Assim como ocorre com as Forças Armadas, os integrantes das corporações militares estaduais estão sujeitos ao princípio da hierarquia e disciplina, sendo-lhes expressamente vedado a realização de greve (art.142, §3º, IV c/c art.42, §1º da CF/88)em atenção a manutenção da ordem e da tranquilidade públicas, sujeitando os infratores ao previsto no Código Penal Militar( Título II – Dos crimes contra a autoridade ou disciplina militar, Capítulo I - Do motim e da revolta arts. 149 153).

            Portanto, a doutrina é únissona no endimento que ao militar é defeso o exercício de greve como forma de reivindicar direitos, ante a expressa disposição da CF, até porque a partir da EC n. 18/98, o militar não é mais definido como servidor público, a demonstrar claramente a intenção do legislador constituinte em dar àqueles regramento distinto destes últimos.

            Neste sentido, Cármen Lúcia Antunes Rocha bem esclare:

            "é de notar que, desde o texto originário da Constituição – mesmo, pois, quando se admitia a condição de servidor público genérica ao militar ( o que foi suprimido pela Emenda n.18/98, conforme antes salientado) – ao que então se chamava "servidor civil"é que se assegurava tal direito, vedada a greve pelos militares (art. 42, §5º, texto constitcional originário excluído pela Emenda n.18/98). A proibição não precisa mais ser feita, porque, como o militar não é mais definido, constitucionalmente, como servidor público e não lhe sendo assegurado o direito, está ele proibido."

            De considerar, ainda, em que pese o direito de greve no serviço público encontrar previsão constitucional, mesmo que posteriormente regulamentado por lei específica, se o seu exercício vier a causar dano ao cidadão, a Pessoa Jurídica de Direito Público a que o servidor grevista esteja vinculado responderá nos moldes do previsto no art. 36, §6º da CF/88.

            Em suma, podemos concluir, em apertada síntese, que a norma do art. 37, inc. VII da CF/88 é de aplicabilidade limitada, desprovida de auto-aplicabilidade. Sedimentou-se na jurisprudência o entendimento quanto a negativa do exercício do direito de greve do servidor público enquanto não vier a ser promulgada a lei mencionada constitucionalmente.

            E, apenas para arrematar o presente estudo, traz-se a lume o entendimento do Prof. Ives Granda da Silva Martins a respeito do tema greve no serviço público, que com a clareza e precisão que lhes são próprias acertadamente pondera:

            "Tenho entendido que o direito de greve é limitado às garantias outorgadas à sociedade pela Constituição. Odireito ao trabalho é maior que o direito de greve, e o direito do cidadão a ter serviço prestado por funcionário do Estado é maior que seu direito de greve.

            Ninguém é obrigado a ser servidor público. Se o for, entretanto, deve saber que a sua função oferece mais obrigações e menos direitos que na atividade privada. É que o servidor é antes de tudo um servidor da comunidade e não um servidor de si mesmo, sendo seus direitos condicionados aos seus deveres junto a sociedade."

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Sobre a autora
Aline Daniela Florêncio Laranjeira

advogada em Recife (PE)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LARANJEIRA, Aline Daniela Florêncio. Direito de greve no serviço público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 63, 1 mar. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3872. Acesso em: 21 nov. 2024.

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