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Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano.

Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001)

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01/04/2003 às 00:00
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Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios

O parcelamento do solo é instrumento indutor da urbanização, sendo realizado de forma espontânea pelo proprietário da terra, que planeja o parcelamento da gleba em lotes e submete o projeto à aprovação da prefeitura, visando a sua inscrição no Registro de Imóveis para alienação dos lotes a terceiros, transferindo ao domínio público as ruas e as áreas destinadas ao uso público de lazer e a equipamentos comunitários, além de implantar as obras de infra-estrutura necessárias à densidade populacional prevista, executadas de conformidade com as disposições legais vigentes, cumprindo, dessa forma, a primeira etapa da exigência constitucional, sendo que, após a edificação e futura utilização, em atendimento às normas urbanísticas, dará cumprimento à função social da propriedade.

A lei municipal específica, para a área indicada no plano diretor, nos termos do § 4 o do artigo 182 da CF e nos termos do artigo 5 o do Estatuto da Cidade, deverá estabelecer os usos permitidos, segundo predominância desejada, com intensidade de ocupação mínima e máxima, para estabelecer os parâmetros de controle da função social da propriedade. Deve-se ressaltar que o Estatuto da Cidade introduziu a utilização como obrigatoriedade compulsória de forma muito apropriada, pois, a utilização, ou seja, a atividade instalada na propriedade urbana, é atributo essencial para o estabelecimento das restrições urbanísticas e edilícias, as quais deverão ser atendidas para o pleno atendimento da função social.

As leis de parcelamento, uso e ocupação do solo estabelecem parâmetros mínimos e máximos relacionados com os diferentes tipos de assentamentos urbanos, visando, de um lado, ao controle populacional e, de outro, ao controle da ocupação e da área edificável, de forma a garantir uma distribuição eqüitativa e funcional da densidade compatível com a infra-estrutura e equipamentos instalados e previstos, para alcançar o pleno desenvolvimento de cada parcela territorial ou região, de forma harmônica com o desenvolvimento do conjunto do município, assegurados a preservação dos imóveis de interesse cultural, dos recursos naturais que valorizam a paisagem urbana e garantem qualidade ambiental.

Como fatores sociais estão compreendidos os resultados de análise dos dados demográficos, em especial a renda. Deve-se salientar, no entanto, que, nos pequenos municípios, a renda é representativa para o município como um todo. Nesse caso, a caracterização da provável faixa de renda da população, por parcela territorial do município, poderá ser feita através de outras variáveis, como a dimensão dos lotes, o tipo de edificação, o estado de conservação, a maior ou menor presença de espaços verdes privados e públicos, a predominância ou exclusividade de uso residencial, dentre outros. Como indicador, recomenda-se os de renda média para a aplicação desse instrumento.

Como fatores econômicos, estão relacionados à distribuição espacial das áreas de produção industrial, às áreas de maior concentração das atividades comerciais e de prestação de serviços e às áreas de uso misto, com densidade de ocupação média, que disponham de glebas, lotes ociosos e edificações subutilizadas ou não utilizadas, situadas em zonas adensáveis.

Como fatores de infra-estrutura, podem ser estabelecidos critérios de pontuação com incidência de maior valor para a rede de água, seguidos de valores decrescentes para o esgoto, a pavimentação e a iluminação pública.

A interação dos fatores decorrerá de ponderação atribuída a cada fator, segundo objetivos e prioridades estabelecidos nas simulações e cenários realizados para a formulação do plano diretor, que permitam identificar na estrutura urbana as áreas passíveis de parcelamento, edificação ou utilização compulsórios.

Finalidade do parcelamento, edificação ou utilização compulsórios

a) O principal objetivo é combater a retenção de glebas e lotes não edificados, dotados de infra-estrutura e serviços urbanos, visando à redução dos custos de urbanização e otimizando os investimentos públicos realizados.

A função social da gleba poderá ser cumprida, tanto pelo seu adequado parcelamento (loteamento ou desmembramento), com a destinação de parte da gleba para áreas públicas (vias, áreas verdes e áreas para equipamentos comunitários) e o restante em lotes para posterior edificação, quanto pela adequada utilização, realizada por meio da implantação de uso permitido e de grande efeito transformador na região, que poderá ser instalado na totalidade da gleba, como, por exemplo: shopping center, centro empresarial, supermercado ou até mesmo uma indústria não poluente, devendo, para tanto, a gleba estar voltada para via de circulação oficial e atender às condições estabelecidas pelos órgãos municipais responsáveis pelo controle de tráfego e ambiental, que poderão, inclusive, fazer exigências para reduzir os possíveis impactos, quer seja sobre o tráfego local, quer seja sobre os incômodos causados à vizinhança, devendo, para tanto, o proprietário apresentar estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) e, quando for o caso, estudo prévio de impacto ambiental (EIA).

b) Punir qualquer utilização em desacordo com a legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo, de forma a estimular o uso da propriedade urbana de conformidade com a sua função social.

• Outro desvio da função social da propriedade são as edificações de interesse de preservação histórico e arquitetônico não utilizadas e abandonadas.

• E, para reverter a situação de degradação, deve ser imputada a utilização ou a edificação compulsória à edificação não utilizada, em ruínas, que apresentem problemas de segurança, de forma cumulativa com as demais penalidades decorrentes do código civil e do código de edificações.

Cada município precisa verificar como estão estruturadas suas normas, pois alguns têm uma lei municipal de desenvolvimento urbano, às vezes coincidindo com a lei do Plano Diretor, que inclui as normas para parcelamento, uso e ocupação do solo; outros municípios têm leis separadas de Loteamento (ou parcelamento) e de Zoneamento (ou uso e ocupação do solo).

Praticamente, todas as leis municipais de zoneamento hoje em vigor fixam índices máximos de aproveitamento de terrenos, bem como outras restrições à ocupação, e não requisitos mínimos. Isso significa que essas normas precisam ser reavaliadas e complementadas.

Finalmente, o município precisa fixar em "lei específica" as condições e prazos para aplicar o IPTU progressivo no tempo nas áreas sujeitas à obrigação de parcelar, edificar e utilizar os imóveis.

Se for constatado, além disso, que os critérios de cálculo do IPTU convencional cobrado no município precisam ser revistos para dar efetividade ao parcelamento e edificação compulsórios, a reorganização da legislação municipal deverá incluir esse campo.

O resultado final disso seria a obtenção de uma "família" de textos legais coerentes, tratando das áreas urbanizáveis e não urbanizáveis, do parcelamento, uso e ocupação – inclusive o compulsório – do território municipal e da tributação dos imóveis urbanos.

Uma vez elaborados os textos dos projetos de leis municipais e a respectiva exposição de motivos, é essencial promover extensos esclarecimentos e debates dentro e fora da câmara municipal, pois os interessados têm o direito de refletir e opinar sobre:

- o que é a repartição não eqüïtativa dos encargos e benefícios da urbanização;

- o que é a retenção especulativa de imóveis vagos ou pouco utilizados e os prejuízos à sociedade decorrentes;

- o que se espera do IPTU progressivo no tempo e da eventual desapropriação com indenização em títulos da dívida pública.

Concluindo: se não há Plano Diretor, não pode haver a aplicação dos dispositivos supra-referidos, porém, mesmo assim, a função social dos imóveis urbanos deverá ser determinada pelo Poder Público municipal e realizada pelo proprietário.

Art. 42. O plano diretor deverá conter no mínimo:

I – a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência de infra-estrutura e de demanda para utilização, na forma do art. 5º desta Lei;

II – disposições requeridas pelos arts. 25, 28, 29, 32 2 35 desta Lei;

III – sistema de acompanhamento e controle.

O artigo 5º da Lei nº 10.275/2001 – Estatuto da Cidade, define quais são as diretrizes mínimas essenciais a um Plano Diretor, sobre as quais discorremos a seguir:

1. A delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência de infra-estrutura e de demanda para utilização.

O Estatuto da Cidade delimitou as competências das esferas legislativas e coube ao município legislar e prestar os serviços públicos de interesse local, suplementar a legislação federal e estadual, e promover adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, parcelamento e ocupação do solo urbano.

A maioria dos problemas residem na deficiente conceitualização dos problemas urbanos, como, por exemplo, deixar de considerar as demandas de habitação e serviços; coordenação deficiente entre agências governamentais, o setor formal, o informal e a comunidade, bem como a falta de recursos para execução de programas urbanos.

Através do zoneamento, o Poder Público controla o uso e as destinações possíveis de serem dadas ao território, além de ordenar as atividades urbanas que serão levadas a efeito através do uso adequado do solo. A cidade e as áreas urbanísticas serão repartidas em zonas através desse instrumento, atendendo à vocação do solo atingido pelo zoneamento.

Pelo zoneamento serão fixados os usos dos terrenos e edificações, objetivando a promoção da plena distribuição racional das populações nas diversas zonas cujo desenvolvimento se pretende alcançar e organizar.

E, ainda que o município fixe, quando possível, normas mais restritivas, o fará em atenção às suas peculiaridades.

E é aí, exatamente que entra a questão da definição das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência de infra-estrutura e de demanda para utilização.

É através do Plano Diretor que essas áreas devem ser definidas, sob pena de se tornarem inócuas suas aplicações.

2. O direito de preempção que confere ao Poder Público Municipal a preferência na aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares.

O Direito de Preempção permite ao Poder Público municipal a prerrogativa na obtenção de áreas estratégicas ao desenvolvimento da cidade, bem como a manutenção do preço do imóvel livre de processos especulativos de valorização fundiária e imobiliária. A articulação regional de municípios conurbados permitirá a gestão compartilhada de serviços e infra-estrutura, além de prever um desenvolvimento econômico integrado.

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Somente com a definição prévia das áreas de interesse do Município no desenvolvimento da cidade, poderá valer-se da prerrogativa do direito de preempção.

Assim como entre particulares, o Município poderá, em determinados casos e em locais previamente reconhecidos em lei como área de desenvolvimento ou área de interesse comunitário, valer-se do direito de preferência na aquisição de imóveis de particulares, colocados à venda pelo proprietário. O Município poderá, então, manifestar-se a respeito da aquisição ou não do imóvel, pelo valor colocado à venda pelo particular. Em caso de venda pelo particular por valor inferior ao oferecido ao Município, a venda poderá ser anulada, e arrematado o imóvel pelo Município, com pagamento pelo valor venal utilizado para fins de IPTU.

3. A regularização fundiária, a execução de programas e projetos habitacionais de interesse social, a constituição de reserva fundiária, o ordenamento e direcionamento da expansão urbana, a implantação de equipamentos urbanos e comunitários, a criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes, a criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de interesse ambiental, a proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico.

A partir da década de 1970, uma das principais características da dinâmica do crescimento intra-urbano no Brasil foi a distribuição espacial da população pobre. Houve uma significativa periferização dessa população em cidades de grande e médio porte, durante a última década, devido, entre outros fatores, às dificuldades das famílias de baixa renda em ter acesso à terra urbana. Isso resultou em acentuada proliferação de assentamentos humanos informais (favelas, mocambos, alagados e loteamentos clandestinos).

Nas áreas periféricas das aglomerações urbanas os problemas estão freqüentemente associados ao uso do solo e à pobreza, geralmente, agravados pelo aumento da favelização e pelo ímpeto da incorporação de novas áreas parceladas clandestinamente. Em sua maioria, situados em zonas de legislação restritiva à ocupação e à construção, esses loteamentos tornaram-se uma alternativa de habitação para a população mais pobre.

0 fenômeno da favelização é um processo nitidamente urbano e que se faz sentir de forma mais expressiva nas aglomerações urbanas e nos grandes centros urbanos. Grande parte das habitações, em geral situadas em áreas restritivas à ocupação, caracterizada por baixo padrão de qualidade e custo, tem sido produzida por um setor não estruturado, geralmente sem assistência direta do Poder Público.

os seguintes fatores:

a)tolerância ou falta de aplicação estrita de normas urbanísticas inacessíveis de uso do solo e construção;

b)capacidade do setor não estruturado de produzir uma variedade de tipos de habitação de baixo custo;

c)políticas urbanas e habitacionais que permitem aproveitar terrenos e possibilitam a oferta de materiais de construção de baixo custo para a população;

d)políticas que integram e consolidam áreas informais de ocupação à cidade formal, tais como as Zonas Especiais de Interesse social (ZEIS).

A cidade deve dar acesso, para cumprimento de suas funções sociais, a todos os que nela vivem, assegurando-lhes o direito "à moradia, aos equipamentos e serviços urbanos, transporte público, saneamento básico, saúde, educação, cultura, esporte, lazer, enfim, aos direitos urbanos que são inerentes às condições de vida na cidade".

As funções sociais da cidade devem espelhar o seu desempenho em relação à coletividade e à região em que esteja localizada. E o Plano Diretor será o instrumento básico que as espelhará.

4. A fixação de áreas onde poderá ser permitida alteração do uso do solo, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.

O artigo 28 do estatuto da cidade determina que o Plano Diretor poderá fixar áreas nas quais o direito de construir poderá ser exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico adotado, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.

Está evidenciado que sem a fixação de áreas e sem a definição do coeficiente de aproveitamento, a outorga onerosa não poderá ser aplicada. Para tanto, faz-se necessária a complementação da legislação federal pela legislação municipal. E assim será no tocante aos demais mecanismos que mencionamos.

5. As operações urbanas consorciadas

O artigo 32 dispõe que lei específica, baseada no Plano Diretor, poderá delimitar área para aplicação de operações consorciadas. Estas são definidas pelo § 1º do artigo e se compõem de um conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação de diversos segmentos da comunidade, com o objetivo de alcançar, em uma área, transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorizações ambientais.

6. A transferência do direito de construir.

O artigo 35 dá à lei municipal, baseada no Plano Diretor, a possibilidade de autorizar o proprietário do imóvel urbano, privado ou público, a exercer em outro local, ou alienar, mediante escritura pública, o direito de construir previsto no Plano Diretor ou em legislação urbanística decorrente, quando o imóvel for considerado necessário para: I – implantação de equipamentos urbanos e comunitários; II – preservação, quando o imóvel for considerado de interesse histórico, ambiental, paisagístico, social e cultural; III – servir a programas de regularização fundiária, urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda e habitação de interesse social.

7. O sistema de acompanhamento e controle.

Exigência do Estatuto da Cidade, toda a Lei do Plano Diretor será nula de pleno direito se não constar da mesma, expressamente, o sistema de acompanhamento e controle.

Isto se justifica em razão de que todo o fundamento do ordenamento da cidade repousa no fato da realização das aspirações da comunidade, da sociedade organizada. A elaboração do Plano Diretor, por si só, já configura a expressão do desejo da comunidade, pois todos os seus passos devem ser antecipados de audiências públicas, onde a participação da comunidade é condição sine qua non.

A Lei assim aprovada, resguardará a vontade da população, as aspirações de qualidade de vida do Município, as metas a serem seguidas para alcançar os objetivos da população, que opinou em todos os aspectos e situações surgidas durante a sua feitura.

Por este motivo, sua execução também deve ter o mesmo acompanhamento democrático, o mesmo tratamento dado à sua elaboração, sob pena de ser considerada inconstitucional.

Para fins de promoção do desenvolvimento urbano, destacamos, a seguir, algumas possibilidades abertas pela definição das exigências fundamentais de ordenação da cidade que configuram a função social da propriedade urbana:

• definição de áreas urbanas adensáveis e não adensáveis, segundo a disponibilidade de infra-estrutura urbana, associada à definição de parâmetros mínimos e máximos de utilização, para evitar a ocupação urbana de áreas não suficientemente equipadas, bem como a retenção especulativa de imóveis vagos ou subutilizados em áreas urbanas dotadas de infra-estrutura;

• definição de áreas especiais para proteção ambiental ou para proteção de patrimônio cultural, associada à autorização para transferência do seu potencial construtivo, possibilitando a realização desse potencial e de seu valor em outro local;

• definição de áreas especiais destinadas à habitação de interesse social, para exigir sua urbanização ou ocupação compulsórias, para essa finalidade, sob pena de imposto territorial ou predial progressivo ou até de desapropriação, com pagamento em títulos da dívida pública;

• autorização para outorga de direitos de construir, com sua contrapartida de interesse social como fonte de novos recursos financeiros para habitação de interesse social, ou para equipamentos de infra-estrutura urbana, ou para programas de reurbanização;

• realização de estudos de impacto ambiental de empreendimentos de porte significativo e exigência de reparação dos eventuais impactos sobre o ambiente urbano como fonte de novos recursos para infra-estrutura urbana, além da eventual contrapartida por danos a interesses difusos.

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Sobre a autora
Vania Kirzner

consultora jurídica, coordenadora na implantação de legislação municipal relativa ao Estatuto da Cidade

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KIRZNER, Vania. Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano.: Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 64, 1 abr. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3899. Acesso em: 18 abr. 2024.

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