Licença parental: instrumento de efetivação da igualdade de gênero no âmbito familiar e trabalhista

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15/05/2015 às 17:36
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3. LICENÇA PARENTAL COMO MECANISMO DE INSERÇÃO DO HOMEM NO BEM-ESTAR FAMILIAR E DE COMBATE À DISTINÇÃO DE GÊNEROS NO MERCADO DE TRABALHO

A transição para a parentalidade é um momento complicado para a mãe e, principalmente, para o pai, que passa de filho a pai sem nenhum treino ou educação anterior. A mulher, no entanto, desde criança está acostumada a ajudar na criação de seus irmãos, primos ou vizinhos mais novos e até treinam a maternidade com suas bonecas.

Conforme aduz Ferreira,

O exercício afetivo da paternidade tão cobrado dos homens e, ao mesmo tempo, cobrado por alguns homens, é algo inédito na história da humanidade. Nunca houve uma sociedade onde fizesse parte da formação (ou mesmo obrigação) do homem desenvolver a habilidade de cuidar de crianças. Essa sempre foi uma tarefa de mulheres! O que pretendemos é uma verdadeira revolução! (SILVEIRA, 1988, p.34, apud FERREIRA, 2002, p.28).

O novo perfil de pai é aquele que despreza a figura paterna que teve, pois sente falta da participação masculina na sua vida e tende a dar ao seu filho o amor ausente da sua jornada infantil. Badinter descreve que este:

É um homem oriundo das classes médias ou altas, que se beneficia de uma formação e de uma renda mais elevada que a média. Tem uma profissão liberal que lhe permite, bem como à sua mulher, dispor livremente de seu tempo e rejeita a cultura masculina tradicional. A maioria se diz em ruptura com o modelo de sua infância e não quer, por nada, reproduzir o comportamento do pai, considerado “frio e distante”. Eles almejam “reparar” sua própria infância. Finalmente, vivem com mulheres que não têm vontade de ser mães em tempo integral. (BADINTER, 1992, p. 172 apud GOMES E RESENDE, 2004).

A participação materna no desenvolvimento da criança é assunto pacificado, não restam dúvidas. Já o pai, que é o primeiro ser que a criança conhece após a mãe e como qual tenta se relacionar, ainda é tema debatido:

É esta a presença que irá facilitar à criança a passagem do mundo da família para o da sociedade. Será permitido o acesso à agressividade, à afirmação de si, à capacidade de se defender e de explorar o ambiente: ‘as crianças bem paternizadas sentem-se seguras em seus estudos, na escolha de uma profissão ou na tomada de iniciativas pessoais’ (CORNEAU, 1991, p. 28, apud GOMES e RESENDE, 2004).

Assim, se o pai participou ativamente do período gestacional e se responsabilizou cumulativamente com mãe na educação e cuidado com o filho, essa figura antes distante passa a ser parte do ambiente privado do recém-nascido. “A função e o vínculo que o pai estabelece com a criança se iniciam durante a gravidez, com expressivos envolvimentos, emocionais e comportamentais”, através:

Da preocupação e da ansiedade com a gravidez, com o bebê e com a sua chegada ao ambiente familiar; do apoio material e emocional prestado à gestante; da sua participação em diversas atividades relativas à gestação como consultas pré-natais, grupos de pais, preparação do quarto do bebê, etc; e a partir da sua interação com o bebê em conversas e carinhos com a barriga da mãe (WALDOW, 2007, p. 34).

Diante disso, a ausência paterna reverbera negativamente na mãe e “a maneira como ela vive a gravidez e a maternidade, para o desenvolvimento psíquico, social e cognitivo do bebê, assim como para a relação que a mãe estabelece com a criança”. Continua Amann-Gainoitti et al., apud Gonçalves:

[...] Ao considerarem as novas perspectivas acerca da paternidade, que os homens possuem habilidades eficientes para exercerem o papel paterno. De acordo com os autores, os pais sabem observar o comportamento do bebê, sabem interpretar os sinais e sabem fornecer as respostas a esses sinais, nos termos e momentos adequados (GONÇALVES, 2002, p. 68).

Estudo feito por Amata e Gilbreth, demonstra não existir diferenciação no relacionamento entre pais e filhos que vivem, ou não, sob o mesmo teto. Ou seja, o amor paterno não está sujeito a frequência do contato e, sim, com o amor (Gonçalves, 2002, p.69), o qual é criado desde a gestação.

O pai estimula o bebê com encorajamentos de maior competitividade e independência, a interação é mais incitante do que com a mãe, tanto pelos contatos físicos quanto pela utilização de brinquedos, principalmente se o filho for um menino (FERREIRA, 2002, p. 33). As mães interagem mais emocionalmente, demonstram a valorização do sentimento e constrói isso para o mundo externo familiar.

Por isso os dias “que se seguem ao nascimento podem se tornar importantes como o início de um processo de conscientização da paternidade” (FIGUEIREDO, 1993, p. 158).

A sociedade, portanto, precisa se reorganizar e adequar-se para receber esse novo papel masculino, inclusive positivando no ordenamento jurídico esse comportamento de igualdade entre os gêneros. Sintetiza, assim, a verdadeira importância da licença parental na formação de uma família bem consolidada e socialmente estruturada.

Assim, a licença parental traria maior responsabilização de ambos os pais na educação e mantença social e emocional dos filhos. Essa licença, obviamente, se estenderia não só aos filhos naturais, biológicos, mas, também, aos adotivos. Em casos de adoção, a licença se destina para a proteção e cuidado da criança ou do adolescente, “longe de ser um benefício para o homem e para a mulher que adota, trata-se de instrumento que se presta a aproximar adotantes e adotados num período inicial de transição, em que o estágio de convivência está aflorado” (LAMENZA, 2002, p.02).

Além do mais, no que tange ao mercado de trabalho, a distinção é fato notório, representado, inclusive, pelo mais novo estudo do IBGE, no qual se verificou que as mulheres ganham cerca de 70% da renda dos homens.

Segundo a pesquisa, o rendimento médio mensal das mulheres foi calculado em R$ 983, enquanto a dos homens foi de R$ 1.392.

A diferença variou de 70,3% na região Sul (R$ 1.045 para as mulheres e R$ 1.486 para os homens) a 75,5% na região Norte (R$ 809 das mulheres contra R$ 1.072 dos homens).

Os percentuais da parcela feminina também foram maiores que os da masculina nas classes sem rendimento (43,1% e 30,8%), até meio salário mínimo (8% e 4,6%) e até um salário mínimo (21,5% e 20,8%) (FOLHA ONLINE, 2011b).

Mesmo com o direito e garantia fundamental à isonomia (art. 5°, I, CRFB/88) e com a vedação de diferença de salários, de exercício, de funções e de critério de admissão por motivo de sexo (art. 7°, XXX, CRFB/88), a realidade é divergente do ordenamento e a abolição das desigualdades se torna uma tarefa árdua, revestida de várias facetas.

Logo, impondo à mulher a concessão apenas da licença maternidade pelo período de 120 (cento e vinte) dias (entendido, contudo, como necessário), discrimina a sua ambição trabalhista. Já que o seu cônjuge, pai de seu filho, possui concessão ínfima perante a dela.

Por essas razões que a concessão da licença parental minimizaria as distinções entre os gêneros no ambiente do trabalho, já que ambos gozam de licenças com caráter e tempo equivalentes. Claro que a licença exclusiva da mãe para descanso não poderia ser suprimida, apenas se conceberia uma licença para o gozo conjunto, após as licenças individuais serem gozadas.

Precisa-se ter em mente que a criação dessa nova licença, especificamente, não será um direito meramente trabalhista gozado e, sim, um reconhecimento para a construção de uma entidade familiar (direito social), adjunto a uma paternidade responsável.

A licença parental traria a igualdade material (aquela de fácil percepção e não apenas aquela posta no direito) tanto almejada entre homens e mulheres e seria um instrumento real e efetivo da verdadeira igualdade entre os gêneros, tanto no âmbito familiar quanto no trabalhista.


CONCLUSÃO

As mulheres buscaram durante toda a sua história reconhecimento profissional. Elas eram incumbidas da vida privada (doméstica) e os homens, da preservação do seu compromisso profissional para cuidar do bem-estar financeiro da sua família.

O ingresso da mulher no mercado de trabalho trouxe grandes reflexões teóricas e práticas na nossa sociedade pela busca incansável da igualdade no tratamento dos direitos trabalhistas.

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A legislação estudada mostra o fomento e a aprovação da trabalhadora, através de concessões que preservam sua identidade biológica e respeitam sua necessidade de participar da população economicamente ativa. Todavia, as normas não acompanharam as transformações por inteiro ao segregar o pai do ambiente familiar. Eis que as leis infraconstitucionais se preocuparam em garantir os direitos trabalhistas às empregadas, contemplando com a estabilidade às gestantes e licença maternidade (por até 120) e para os pais, doaram apenas a licença paternidade de 5 (cinco) dias.

Em contrapartida, se percebeu, através deste estudo, que os homens se envolvem cada vez mais com o trabalho doméstico. A conscientização do dever na educação e no cuidado com os filhos foi se fixando no pensamento masculino, principalmente após a entrada da mulher no mercado de trabalho.

Diante disso, analisando essas modificações sociais familiares, o Senador Antônio Carlos Valadares elaborou o Projeto de Lei n. 165 de 2006, ainda em tramitação no Congresso Nacional. A proposta desenvolve a criação da licença parental, seguindo os padrões internacionais. Essa licença concede aos pais, em conjunto, um período de 04 (quatro) meses de afastamento do trabalho para cuidarem dos filhos de até 6 (seis) anos de idade.

A igualdade entre homem e mulher, por meio da parentalidade, é um princípio basilar das Constituições mundiais, por dar o equilíbrio na vida profissional e familiar, dividindo todos os encargos. Essa licença, na ideologia da Comunidade Europeia, é um direito indisponível e essencial para a mantença da família, se sobrepondo, inclusive, aos direitos trabalhistas e às relações entre os Estados-membros.

Tanto que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) lançou preceitos nesse sentido desde 1981, com a Convenção n. 156 e a Recomendação n. 165, reconhecendo a igualdade de oportunidades entre os trabalhadores e trabalhadoras nas responsabilidades com seus filhos dependentes, a fim de evitar discriminações.

Portanto, para desenfrear a distinção de trabalhadores e trabalhadoras em contratações, tarefas e empregos; uma tarefa de combate seria a aprovação dos direitos na paridade da concessão da licença de proteção à maternidade e à paternidade. Com a positivação, os empregadores deixariam de segregar os trabalhadores, já que todos gozariam dos mesmos direitos. Além de não prejudicar os interesses dos trabalhadores, a empresa também não se lesaria, pois as verbas seriam pagas pelo Instituto Nacional de Seguridade Social e receberiam incentivos fiscais.

Entretanto, não poderá ser um ponto fixado na legislação, o governo deverá promover ações afirmativas de creches e lugares dignos para a amamentação e cuidados da criança no ambiente empresarial ou próximo a ele, pois o aleitamento é necessário para uma vida saudável do bebê.

Nesse norte, se o projeto for aprovado, amenizará a discriminação de gênero no mercado de trabalho e instituirá, por definitivo na legislação, a corresponsabilidade familiar.

É inequívoco que os maiores beneficiados da construção da igualdade serão os filhos, sejam eles naturais ou adotivos, uma vez que o poder familiar atual é o dever conjunto dos pais, em igualdade de condições, incumbindo a eles o sustento, a guarda e a educação.

O Estado e a sociedade, portanto, precisam se reorganizar e adequar para receber esse novo papel masculino, inclusive positivando no nosso ordenamento jurídico esse comportamento de igualdade entre os gêneros para promover o bem-estar da entidade familiar. Sintetiza, dessa forma, a verdadeira importância da licença parental na formação de uma família bem consolidada e socialmente estruturada.

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Sobre a autora
Dhuanne Sampaio Galvão

Servidora Pública do Ministério Público Estadual de Santa Catarina

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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