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Medidas Provisórias: instrumento de governabilidade

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01/04/2003 às 00:00
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ALTERAÇÕES SIGNIFICATIVAS

O artigo 57 trata das reuniões ordinárias do Congresso Nacional. O Congresso Nacional deverá reunir-se, anualmente, de 15 de fevereiro a 30 de junho e de 1º de agosto a 15 de dezembro. O modo pelo qual se processarão essas sessões está descrito nos parágrafos desse dispositivo.

O § 6º dispõe sobre a convocação extraordinária. Esta far-se-á pelo Presidente do Senado Federal, em caso de decretação de estado de defesa ou de intervenção federal, de pedido de autorização para a decretação de estado de sítio e para o compromisso e a posse do Presidente e do Vice-Presidente da República.

O Presidente da República e os Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal farão a convocação extraordinária, em caso de urgência ou interesse público relevante. Neste caso, também, deverão fazê-lo, se houver requerimento da maioria dos membros de ambas as Casas.

O § 7º, modificado pelas EC 19/99 e EC 32/2001, comanda que, nessa sessão, o Congresso somente deliberará sobre a matéria para a qual foi convocado, ressalvada a hipótese prevista no § 8º (inclusão automática das medidas provisórias na pauta de convocação), vedado o pagamento da parcela indenizatória em valor superior ao subsídio mensal.

Essa convocação é obrigatória, e não discricionária, segundo se depreende da redação dessas disposições. O verbo é usado no presente do indicativo. Não há como recusar seu comando imperativo. Se não for feita, a autoridade estará descumprindo o dever inerente ao cargo. Assim, também, entende Manoel Gonçalves Ferreira Filho. 12

O citado § 8º não deixa margem a dúvidas. Destaca que, se houver medidas provisórias em vigor na data dessa convocação, estas serão automaticamente incluídas na pauta de convocação.

É um corretivo necessário e tem produzido resultados positivos. Evitar-se-ão as célebres caronas e os atropelos tão comuns devido ao congestionamento das pautas. E obriga o legislador não se furtar de deliberar sobre as medidas provisórias, que agora têm disciplina adequada.


ARTIGO 246 DA CONSTITUIÇÃO

Em atenção à ordem expressa no artigo 246, com a redação dada pelas Emendas Constitucionais 6 e 7, de 1995, e, em seguida, pela Emenda 32, de 2001, verbis: "É vedada a adoção de medida provisória na regulamentação de artigo da Constituição, cuja redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada entre 1º de janeiro de 1995 até a promulgação desta emenda, inclusive", o Pretório Excelso resolveu questão, sumamente aflitiva, com relação à constitucionalidade de medida provisória que regula artigo da Constituição em que alguns dos parágrafos e incisos não foram alterados por emenda constitucional, a partir de 1995, embora o fossem o caput e alguns incisos, como é o caso do artigo 37, pois alguns incisos e parágrafos não foram sequer molestados por nenhuma alteração.

Na ADIMC 2125-DF, o Relator Ministro Maurício Corrêa ponderou, com pleno êxito, que as modificações introduzidas no artigo 37 da CF, pela EC 19/98, mantiveram inalterada a redação do inciso IX, que cuida da contratação de pessoal por tempo determinado na Administração Pública, e, portanto, não macularam o referido dispositivo.

Eis que não vislumbrou qualquer inconstitucionalidade formal. Conclui o acórdão que "ato legislativo consubstanciado em medida provisória pode, em princípio, regulamentá-lo, desde que não tenha sofrido essa disposição nenhuma alteração por emenda constitucional a partir de 1995".

O Supremo já havia enfrentado questão idêntica, na ADIN 1518, relatada pelo Ministro Octavio Gallotti, sustentando o mesmo entendimento.

A modalidade de licitação por pregão instituída pela Medida Provisória MP 2026, de 4 de maio de 2000 13, foi inquinada de inconstitucional por renomados juristas, porque o caput do artigo 37 foi efetivamente alterado, após as Emendas Constitucionais 6 e 7, de 1995; todavia o inciso XXI continuou imaculado, não tendo recebido qualquer correção.

Vale dizer: não se lhe aplica o artigo 246. Isto por que o princípio inserto no citado inciso (XXI) tem vida própria, não se miscigenando, absolutamente, com os preceitos emendados.

O artigo 246 proíbe, de forma cristalina, a adoção de medida provisória, na regulamentação de artigo constitucional, cuja redação tenha sido modificada por emenda. Efetivamente, modificou-se a redação do caput e de alguns incisos e parágrafos, mas não de todos. Não do inciso XXI.

Ora, não cabe ao intérprete restringir onde a lei não restringe. Embora o texto constitucional se refira a artigo, no caso, o artigo 37, o inciso XXI, como referido, tem autonomia plena e vida própria. Basta ler-se seu conteúdo.

Carlos Maximiliano, com fonte em Endlich, ensina que a Carta Maior tanto prevê no presente como prepara o futuro, não devendo ater-se a uma técnica de interpretação estreita, senão extrair-se a compreensão que torne efetivos e eficientes os grandes princípios de governo, ao invés de os tornar vazios. 14

Prossegue o douto doutrinador, citando Willoughby, na sua lição imorredoira: "sempre que for possível, sem fazer demasiada violência às palavras, interprete-se a linguagem da lei com reservas tais que se torne constitucional a medida que ela institui, ou disciplina". 15

O Deputado Jutahy Magalhães propusera a supressão do artigo 246 da Constituição, por não haver necessidade de mantê-lo, após a regulamentação das medidas provisórias. Reconhece, ainda, que a medida provisória devia, realmente, ser mantido, por ser indispensável à governabilidade. 16


MEDIDAS PROVISÓRIAS ANTERIORES À EMENDA

Todas as medidas provisórias, editadas em data anterior à da publicação desta Emenda, continuam em vigor até que outra as revogue, explicitamente, ou o Legislativo sobre elas se manifeste definitivamente.

Pode-se até dizer, metaforicamente, que viverão para sempre, não importa sobre que matérias disponham, proibida ou não, ex vi do artigo 2º da EC 32/2001. Foi-lhes confiada vida eterna ou nem tanto!

O texto é claro. Essas medidas provisórias vigorarão até que outra as revogue de maneira explícita. Portanto, a revogação terá que ser expressa (sic), por meio de ato provindo do Presidente da República, na qualidade de legislador. Entretanto, a Emenda também atribui competência ao Congresso Nacional para sobre elas deliberar, de modo definitivo.


REVOGAÇÃO EXPRESSA OU INCOMPATIBILIDADE

Uma questão interessante foi proposta por Ricardo Gueiros Bernardes Dias 17. Indaga qual a solução, se medida provisória ulterior não revogar expressamente a editada antes da EC 32, mas tratar da mesma matéria de forma diferente e incompatível sem revogá-la expressamente?

Não haverá qualquer dificuldade na solução desse problema, se aplicarmos o § 1º do artigo 2º da Lei de Introdução ao Código Civil.

Reza essa disposição: "A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior".

Sem dúvida, a Lei de Introdução ao Código Civil tem inteira aplicação, visto que se trata de lei sob condição resolutiva, segundo mansa e pacífica doutrina e torrencial jurisprudência" e submete-se às mesmas normas da lei.

O artigo 2° da Emenda Constitucional nº 32 realmente quer que medida provisória ulterior revogue explicitamente a medida provisória editada em data anterior, todavia o intérprete deve encontrar uma saída viável para situações não previstas, como na hipótese aventada acima.

O texto legal deve ser interpretado inteligentemente, de modo que não conduza ao absurdo, segundo o pensamento sábio de Carlos Maximiliano, ou, na palavra lapidar do Ministro Sálvio de Figueiredo, a interpretação das leis é obra de raciocínio, mas também de sabedoria e bom senso, não podendo o julgador ater-se exclusivamente aos vocábulos, senão aplicar os princípios que informam as normas positivas.

Maria Helena Diniz, em seu magistério, ensina que a revogação pode ser expressa ou tácita. É tácita quando há incompatibilidade entre a lei nova e antiga, em virtude de a lei nova regular parcial ou totalmente a matéria tratada pela anterior, ainda que esteja omitida a expressão revogam-se as disposições em contrário, por ser supérflua, dispensável 18.

Alguns diriam que, por óbvias razões, deveriam aquelas medidas provisórias ficar limitadas no tempo ou, então, ser apagadas do mundo jurídico, se estiverem em desacordo com a Constituição, com a redação dada pela EC 32.

Não obstante, a fórmula encontrada, insculpida, no artigo 2º da citada Emenda, na realidade, procura resguardar situações jurídicas constituídas e dar plena segurança às relações jurídicas, em consonância com os princípios maiores da Lei Máxima.


OBJETO DA MEDIDA PROVISÓRIA

O legislador preferiu enunciar o que não pode ser objeto da medida provisória. Por via de conseqüência, tudo que não estiver vedado poderá ser objeto de medida provisória. Estas restrições assemelham-se às encontradas, por exemplo, no direito alemão, espanhol, português, argentino e chileno.

O § 1º do artigo 62 da Lei Maior disciplina, com rigor, quais matérias não serão objeto de medida provisória. Na redação originária deste artigo, não havia qualquer constrição 19, salvo se se tratasse de matéria penal, em consonância com a doutrina e a jurisprudência da Corte Maior 20. Também estão vedados projetos de lei aprovados pelo Congresso Nacional, pendentes de sanção ou veto.

Com isso, evitar-se-á que o Poder Executivo, alegando urgência, relevância ou estado de necessidade, faça incursão pela via, antes permitida. A Emenda Constitucional é casuística e não admite interpretação elástica.

A medida provisória não poderá absolutamente versar sobre matéria relativa a:

  1. Nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e Direito Eleitoral.

  2. Também essa matéria é proibida pela maioria dos Países que permitem ao Executivo a utilização desse instrumento legislativo. 21

  3. Direito Penal Processual Penal e Processual Civil.

  4. PROCESSO TRABALHISTA E PROCESSO TRIBUTÁRIO

    A indagação que se faz é se a proibição de o Presidente da República editar medida provisória sobre direito processual penal e processual civil também abrange matéria processual trabalhista e processual fiscal.

    A matéria vedada está expressamente prevista na Emenda. Esta não se refere a direito processual trabalhista, nem a processo fiscal, de sorte que não há nenhum impedimento para ser tratada por medida provisória, tanto é verdade que, quando o legislador quer restringir, ele o faz expressamente, como ocorre com as proibições impostas nos §§ 1º e 2º do artigo 62. Era, aliás, a tese que sempre esposamos.

    No passado, quando não havia qualquer proibição, entendíamos, com o aval do Supremo, que a medida provisória podia disciplinar qualquer matéria, exceto a penal. E, para impor restrição, quanto à sua abrangência, foi necessária a Emenda, com a indicação do que não pode ser objeto da medida provisória. 22

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  5. Organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros.

  6. As Constituições de diversos países também se opõem a que esta matéria seja regulada por decretos emergenciais, sendo bastante rigorosas neste ponto. 23

  7. Planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º.

  8. O caput desta norma (artigo 167), impõe condições para início de programas ou projetos, realizações de operações de crédito, abertura de crédito suplementar e outras mais citadas nesse dispositivo.

    Entretanto, admite o § 3º expeça o Presidente da República medida provisória, se se tratar de abertura de crédito extraordinário para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, tais como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, observado o disposto no artigo 62, ou seja, a ocorrência de relevância e urgência e desde que aquela não invista contra a compatibilização e adequação financeira. Esse dispositivo (§ 3º) casa-se perfeitamente com as exigências do caput do artigo 62.

  9. Detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro.

  10. Jamais poderá repetir-se, por meio de medida provisória, a ilegalidade perpetrada pelo Governo do Presidente Collor, que subtraiu, da noite para o dia, os recursos de milhões de pessoas, mercê de engenhosas e satânicas teorias econômicas, cujos efeitos maléficos até hoje assolam o País. Este caminho está definitivamente barrado, graças a esse dispositivo.

    Não advogamos, em tempo algum, que as medidas provisórias não pudessem versar sobre matéria econômica; entretanto, sua abusiva e indiscriminada utilização pelos governantes, sem o menor critério ou respeito aos parâmetros constitucionais, transformou esse instrumento em faca de dois gumes.

    O juiz Sena Rebouças, do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, citado por Marcelo Figueiredo, mostra com veemência até que ponto pode conduzir a "irresponsabilidade de autoridades irresponsáveis." 24

    O Poder Judiciário tornou-se o receptáculo de milhares e milhares de ações propostas pelos administrados que se viram espoliados de seus direitos e haveres. Isto ocorreu desde os primeiros planos econômicos, após a Carta de 1988, em parte porque o Poder Legislativo não utilizou sua prerrogativa maior de barrar, no seu nascedoiro, as medidas provisórias que atentassem contras os pressupostos essenciais impostos pelo caput do artigo 62.

  11. Reservada a lei complementar

  12. O legislador incluiu a lei complementar nessa constrição, impedindo que matéria reservada à lei complementar pudesse ser disciplinada por medida provisória, mas não devia fazê-lo, pois aquela está incluída, na expressão Lei, como bem anotou o deputado Jutahy Magalhães, afirmando em seu voto que basta o Congresso atentar para o que estabelece o artigo 69, segundo o qual "as leis complementares serão aprovadas por maioria absoluta". 25

    Sempre defendemos que matéria, objeto de lei complementar, poderia ser veiculada através de medida provisória, obedecendo-se, em Plenário, por ocasião de sua votação, ao quorum necessário – maioria absoluta (art. 69. CF/88), 26 já que a lei, no Texto Constitucional, abrange tanto a lei ordinária, quanto a lei complementar, o que exsurge de uma interpretação sistemática e harmônica do texto.

    Essas conclusões acham-se superadas, com a promulgação da citada Emenda Constitucional. Note-se, porém, que para restringir seu campo foi necessária uma emenda constitucional.

  13. já disciplinada por projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção pelo Presidente da República.

  14. Foi muito feliz o legislador, ao fazer esta constrição, pois permitir que o Executivo legisle sobre matéria, que faz parte de projeto de lei pendente apenas de sanção, é faltar com o respeito a um dos Poderes maiores da República.

    O Deputado Luiz Carlos Hauly, contudo, apresentara uma emenda que, afinal, não vingou, no sentido de não proibir a edição de medida provisória sobre objeto de veto pendente de apreciação do Congresso Nacional.

    Cita, como exemplo, fato que ocorreu com a MP 1890/67, de 22 de março de 1999, que regulamentou as mensalidades escolares. Prossegue advertindo que, com o veto a três dos artigos do projeto de lei de conversão, ocorreu a vacância de norma legal que permitia o cálculo do valor das mensalidades.

    Esta omissão foi suprida, desde logo, pela edição da MP 1968, fixando novas regras atualmente em vigor (sic). 27

  15. Repete regra introduzida pelas Emendas nº 6 e 7, de 1995, atualizando a data e alterando o artigo 246, vedando a adoção de medidas provisórias na regulamentação de artigo da Constituição cuja redação tenha sido modificada por Emenda promulgada entre 1º de janeiro de 1995 até a promulgação da presente Emenda. 28

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Sobre o autor
Leon Frejda Szklarowsky

Falecido em 24 de julho de 2011. Advogado, consultor jurídico, escritor e jornalista em Brasília (DF), subprocurador-geral da Fazenda Nacional aposentado, editor da Revista Jurídica Consulex. Mestre e especialista em Direito do Estado, juiz arbitral da American Association’s Commercial Pannel, de Nova York. Membro da membro do IBAD, IAB, IASP e IADF, da Academia Brasileira de Direito Tributário, do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, da International Fiscal Association, da Associação Brasileira de Direito Financeiro e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário. Integrou o Conselho Editorial dos Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, da Editora Revista dos Tribunais, e o Conselho de Orientação das Publicações dos Boletins de Licitações e Contratos, de Direito Administrativo e Direito Municipal, da Editora NDJ Ltda. Foi co-autor do anteprojeto da Lei de Execução Fiscal, que se transformou na Lei 6830/80 (secretário e relator); dos anteprojetos de lei de falências e concordatas (no Congresso Nacional) e autor do anteprojeto sobre a penhora administrativa (Projeto de Lei do Senado 174/96). Dentre suas obras, destacam-se: Execução Fiscal, Responsabilidade Tributária e Medidas Provisórias, ensaios, artigos, pareceres e estudos sobre contratos e licitações, temas de direito administrativo, constitucional, tributário, civil, comercial e econômico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Medidas Provisórias: instrumento de governabilidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. -92, 1 abr. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3956. Acesso em: 22 dez. 2024.

Mais informações

Este trabalho é a síntese de um capitulo de nosso livro Medidas Provisórias – Instrumento de governabilidade, Editora NDJ, São Paulo, 2003, no prelo. Também publicado na Revista Jurídica Consulex 148, de 15 de março de 2003.

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