Após a Decisão TCU Nº 900/99, de 1º/12/99, referente ao Processo TC - 001.602/99-3, publicada no DOU, Seção 1, em 17/12/99, julgando Representação do MPT da 13ª Região contra redistribuição por reciprocidade entre servidores do TRT/PB e TRT/PE, alguns administradores públicos vêm se posicionando contrariamente à realização de redistribuições (permutas) entre servidores.
Entretanto, ao analisarmos a referida decisão e a recente Portaria MP nº 57/2000, do Ministério do Planejamento, de 14 de abril de 2000, publicada no DOU, de 17 de abril de 2000, regulamentando a redistribuição de cargos, ocupados ou vagos, é mister que façamos algumas considerações.
Data Vênia, o TCU emitiu posicionamento referente a um caso concreto e específico, quanto à interpretação da Lei 8.112/90, art. 37, § 1º, tomando por base a representação do eminente Procurador do Trabalho da 13ª Região, DR. Márcio Evangelista de Freitas e o parecer do Procurador-Geral do TCU, DR. Lucas Rocha Furtado; ainda que assim não fosse, as decisões do TCU não têm força de lei, não podendo sobrestar pleito de servidores públicos permitido por lei, mormente quando preenchidos todos os requisitos legais.
O Procurador do Trabalho da 13ª Região, Dr. Márcio Evangelista, ofereceu representação posicionando-se contrário à prática de redistribuições por reciprocidade, no âmbito da Justiça Trabalhista, alegando o seguinte:
1- a prática caracteriza transferência de servidores;
2 - não se destinou ao atendimento de interesse público, visando apenas a satisfação de interesses particulares dos requerentes;
3 - não se comprovou a equivalência de vencimentos;
4 - não foi efetivada "ex ofício", sendo esta "a única forma permitida pela Lei 8.112/90, art. 37, § 1º, com redação alterada pela Lei 9.527/97";
5 - em momento algum ficou demonstrada a necessidade do serviço, ou que a redistribuição sob exame se propunha ao "ajustamento de lotação" ou demais exigências do art. 37, § 1º, do referido dispositifvo legal.
Acompanhando o posicionamento do Ministério Público do Trabalho da 13ª Região, o Procurador-Geral do TCU, expressa o seu posicionamento , argumentando que:
1 - "o § 1º do art. 37, da Lei 8.112/90, limita a redistribuição às hipóteses do ajustamento de lotação ou de força de trabalho às necessidades do serviço";
2 - a redistribuição aplica-se exclusivamente no interesse da Administração;
3 - a permuta só pode ocorrer se ficar demonstrado o inequívoco interesse da Administração.
O Ministro Guilherme Palmeira, relator do referido Processo no TCU, assim se pronunciou, textualmente:
"A chamada redistribuição por reciprocidade, pois, nada mais é do que uma dissimulação do antigo instituto da transferência, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, em 19/12/95 (MS nº 22.148-8/DF, in DOU de 07/02/96) e definitivamente banido de nosso ordenamento jurídico pelas Lei 9.527/97. Logo, não há como admitir sua subsistência no âmbito da Administração Pública.
Esta Corte, em nome da segurança Jurídica e da presunção de constitucionalidade das normas legais, tem admitido a manutenção das tranferências efetivada até 23/05/97, data da Resolução nº 46, do Senado Federal, que suspendeu a eficácia dos dispositivos da Lei 8.112/90 que tratavam daquele instituto (Decisão 112/99 2ª Câmara). Após esta data, o Tribunal tem determinado a anulação de todos os atos irregularmente praticados, com o consequente retorno dos servidores envolvidos aos seus órgãos de origem".
Data vênia, o simples fato da redistribuição rechaçada pelo TCU ter sido iniciada por requerimento dos servidores interessados, não significa que visa apenas a atender interesses particulares e que não atende ao interesse público, pois nada impede que a Administração manifeste o seu interesse a qualquer tempo, seja logo após o requerimento dos interessados, como no caso julgado pelo TCU, ou no decorrer do processo; não existe dispositivo legal que especifique o momento exato em que a Administração deva se pronunciar sobre o seu interesse.
Nesse sentido, este TRE/PB tem jurisprudência pacífica a respeito do assunto, da qual colaciono os seguintes julgados, mutatis mutandis aplicáveis ao caso:
"ADMINISTRATIVO. REDISTRIBUIÇÃO COM PERMUTA DE SERVIDORES. ÓRGÃOS DO JUDICIÁRIO FEDERAL. INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO CARACTERIZADO. EQUIVALÊNCIA DE CARGOS E VENCIMENTOS. DEFERIMENTO DO PEDIDO.
Opera-se a redistribuição com permuta de servidores, com observância aos requisitos do art. 37, da Lei 8.112/90.
Entre órgãos do mesmo Poder.
Equivalência funcional e de vencimentos dos funcionários e no interesse da Administração. Atendidos os requisitos legais, poderá ser concedida a redistribuição mediante pedido do servidor".
(Acórdão nº 29.859, Processo TRE/PB nº 117/97 classe 13, julgado em 12/08/97, Relator Juiz Marcelo Figueiredo Filho).
"PEDIDO. REDISTRIBUIÇÃO ENTRE SERVIDORES. Requerentes pertencentes ao quadro geral de pessoal do mesmo Poder. Atendimento aos preceitos contidos no art. 37 da Lei 8.112/90, com redação dada pela Lei 9.527/97. Deferimento do pedido.
É de se deferir pedido de redistribuição entre servidores, quando atendidos os requisitos explicitados na legislação disciplinadora da matéria".
(Acórdão nº 30.913, Processo TRE/PB nº 393/99 classe 13, julgado em 13/agosto/99, requerente Ricardo Sérgio Schimitz e Silvino Camelo Londres, Relator Juiz Josias Gomes dos Santos Neto, Revista de Julgados do TRE/PB/ 1999, páginas 284/290).
"PERMUTA DE FUNCIONÁRIOS. Deferimento.
- Observados os requisitos legais, defere-se o pedido de permuta de ."
(Acórdão nº 29.959, Processo TRE/PB nº 359/98 Classe 13, julgado em 17/março/98, requerente - Luiz Marcio de Sá Leite, Relator Des. Wilson Pessoa da Cunha, Revista de Julgados do TRE/PB/1998, página 40).
Quanto à necessidade do serviço, não se pode contestar a grande carência de servidores no serviço público federal, haja vista o elevado número de servidores requisitados de outras repartições públicas federais, estaduais e municipais, ou mesmo sem qualquer vínculo profissional , que ocupam a s funções comissionadas por mera "competência familiar" de que se vale a Administração Pública para viabilizar o seu funcionamento e a efetiva prestação de serviços à população brasileira.
Por outro lado, a Lei nº 9.784/99, que regula o procedimento administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, afasta qualquer dúvida quanto à forma de se iniciar um processo de redistribuição, quando afirma expressamente, em seu art. 5º , que "o processo administrativo pode iniciar-se de ofício ou a pedido do interessado", senão vejamos:
Lei nº 9.784/99:
Art . 5º - O processo administrativo pode iniciar-se de ofício ou a pedido de interessado.
Portanto, evidente a vontade expressa do legislador de assegurar ao servidor público federal o direito de iniciar o procedimento administrativo, apenas acionando a Administração, num caso concreto, não podendo se interpretar a lei de forma diferente para o instituto da redistribuição; assim, não só a redistribuição como qualquer outro pleito administrativo pode ser requerido a pedido de servidor interessado, nos termos do dispositivo legal acima transcrito.
Portanto, a questão central está na interpretação do TCU quanto a Lei 8.112/90, art. 37, § 1º, com as alterações introduzidas pela Lei 9.527/97; a redação anterior do aludido dispositivo legal dizia expressamente que a redistribuição seria exclusivamente ex officio, porém, com o advento da Lei 9.527/97, ficou patente a intenção do legislador de ampliar o leque de possibilidades no instituto da redistribuição, pois na nova redação da Lei 8.112/90, art. 37, § 1º, o que era exclusivamente ex officio, agora será "ex officio para ajustamento de lotação" e demais hipóteses previstas no referido dispositivo legal, senão vejamos:
Redação anterior:
Art. 37 (...)
§ 1º - "A redistribuição dar-se-á EXCLUSIVAMENTE para ajustamento de quadros de pessoal às necessidades dos serviços, inclusive nos casos de reorganização, extinção ou criação de órgão ou entidade".
Redação atual, dada pela Lei 9.527/97:
Art. 37 (...)
§ 1º - "A redistribuição será EX OFÍCIO para ajustamento de lotação e da força de trabalho às necessidades dos serviços, inclusive nos casos de reorganização, extinção e criação de órgão ou entidade".
Assim, a nova redação do dispositivo legal acima transcrito não impede que a redistribuição seja requerida "a pedido" dos servidores, quando não se tratar dos casos especificados na lei, uma vez que a Administração poderá manifestar se tem ou não interesse a qualquer tempo; entretanto, o processo só será efetivado com a manifestação expressa e inequívoca do interesse da Administração, devidamente fundamentado.
Ademais, não se confundem as expressões exclusivamente com ex officio, nem tampouco se pode confundir interesse da Administração com iniciativa da Administração.
A iniciativa da Administração não é exigida quando a redistribuição não se enquadrar nas hipóteses da Lei 8.112/90, art. 37, § 1º ; o que sempre se exige é o interesse da Administração, legítimo e incontestável, emanado de autoridade competente.
Por outro lado, o Procurador-Geral do TCU, em respeitável parecer, vislumbra ainda uma hipótese em que a redistribuição de cargos será permitida:
"...salvo se eventualmente demostrado o inequívoco interesse da Administração, voltado especificamente para ajustamento de lotação ou força de trabalho às necessidades do serviço..."
Além de todo o exposto, recentemente, o Governo Federal, através do Ministro do Planejamento, Martus Tavares, expediu Portaria nº 57/2000, de 14/abril/2000, publicada no D.O. U., de 17/abril/2000, que regulamenta as redistribuições de cargos no âmbito dos Ministérios, de onde se infere que:
1- A Redistribuição de cargos no serviço público federal, prevista no art. nº 37, da Lei nº 8.112, de 11/12/90, deve ser utilizada como um instrumento de política de pessoal voltado para o ajustamento/redimensionamento da força de trabalho dos diversos órgãos (número de servidores e de cargos vagos).
2- A Redistribuição consiste na transferência do cargo, ocupado ou vago, de um órgão ou entidade para outro.
3- Existem algumas condições legais, previstas no Regime Jurídico Único, para que as redistribuições se efetivem. Entre elas:
A- A análise da redistribuição tem que ser subordinada ao estrito interesse da administração pública;
B - Ela não pode gerar aumento de remuneração do servidor não pode gerar aumento de despesa;
C - O cargo do servidor a ser redistribuído tem que ser compatível com a complexidade e responsabilidade relativas às atividades e os planos de cargos e salários do órgão que irá recebê-lo;
D - O servidor não pode ser enquadrado em outro cargo de plano de carreira para o qual se exija concurso público específico.
4- Nova condição, entretanto, passa a ser exigida para a efetivação de uma redistribuição: ela terá, obrigatoriamente, que ser compensada por uma contrapartida de cargo seja ocupado ou vago. Assim, se um servidor for redistribuído para um determinado órgão, este terá, obrigatoriamente, que redistribuir um cargo, ocupado ou vago, para o órgão que está cedendo o servidor, originariamente, e do mesmo nível exigido de escolaridade.
5- A portaria de redistribuição, inclusive, terá que ter a assinatura dos dirigentes dos dois órgãos envolvidos, sob pena de ser invalidada pela Secretaria de Recursos Humanos. Não será exigida contrapartida apenas quando a redistribuição se der para formação de um quadro de pessoal em órgão ou entidade que está sendo criado ou, a critério da SRH/MP, quando o cargo a ser redistribuído for de órgão extinto.
Isto Posto, concluímos que o instituto da redistribuição, criado para servir de instrumento de política de pessoal voltado para o ajustamento/redimensionamento da força de trabalho dos diversos órgãos públicos federais, nos termos da Lei 8.112/90, art. 37, com redação alterada pela Lei 9.527/97, continua em vigor, não tendo sido revogado por qualquer dispositivo legal, constituindo um direito do servidor de pleiteá-lo e da Administração deferi-lo, caso tenha interesse, nos termos da Portaria MP nº 57/2000, de 14/abril/2000, e em conformidade com a Decisão TCU Nº 900/99, de 1º/dezembro/1999, que a meu ver não proíbe - mesmo porque o TCU não tem competência para tanto - mas apenas limita a utilização descontrolada e desvirtuada do objetivo para o qual foi criado o instituto da redistribuição, previsto no art. 37, da Lei 8.112/90.
As decisões de Tribunais de Contas não têm força de lei, mas apenas caráter de fiscalização e orientação da gestão administrativa, não podendo prevalecer sobre dispositivo legal em pleno vigor, nem tampouco constituir obstáculo a pleito de servidores que preencham todos os requisitos legais.
Por fim, entendo que o processo de redistribuição pode ser iniciado "a pedido" ou "ex-officio", porém, caso iniciado ex-officio, torna-se plenamente viável, além de afastar todas as objeções do TCU àquele instituto legal, pois ficaria inequívoco o interesse da administração.