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O crédito financeiro do ICMS: art. 20, § 1º, da Lei Complementar n° 87/96.

Bens de uso, consumo e ativo permanente e o seu regime no IVA do Mercado Comum Europeu

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01/04/2003 às 00:00
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V – O SISTEMA DO IVA NO MERCADO COMUM EUROPEU E SEUS REFLEXOS NO ICMS

Com a formação do Mercado Comum Europeu, houve a necessidade de uniformizar a legislação tributária dos países membros. Assim, nos termos da Primeira Directiva IVA, de 11 de abril de 1967, os estados-membros começaram a substituir os seus sistemas gerais de impostos indiretos por um sistema comum de Imposto sobre o Valor Acrescentado, como tributo indireto, plurifásico, não-cumulativo e neutro. O objetivo consistia em conseguir a transparência na "desoneração de imposto" das exportações e no "reoneramento" das importações no comércio interno da CEE. Com isso, o Conselho das Comunidades Européias elaborou a 6ª Directiva (77/388/CEE, de 17 de maio de 1977), que procedeu à uniformização da base tributável do imposto a aplicar em todos os estados-membros da CEE, vale dizer, cobrasse o IVA sobre as mesmas transações. [33]

Portugal, um dos membros da CEE, teve de reformular seu sistema de tributação indireta para se adequar ao novo regime que se impunha. Em 01/01/1986, passava-se do imposto de transações – IT, – imposto único, de difícil controle e com uma base tributável exageradamente reduzida [34] para o IVA – um imposto geral sobre o consumo, que se aplica em todas as fases do circuito econômico por que passam os produtos até ao consumidor final. Nessa linha, vários países também adotam esse tributo. [35]

A título ilustrativo, a tributação sobre o consumo foi largamente utilizada em Portugal desde o século XIV, com o nome de "sisas correntes". Em 1832, foi abolido o antigo imposto português sobre o consumo – o das sisas correntes [36], sob a justificativa de que os impostos indiretos eram tidos por alheios a critérios de "justiça tributária" [37]. Assim, em 1966, fundados no duplo motivo de aumento das despesas públicas e da perda de receitas alfandegárias, implementou-se em Portugal o Imposto de Transacções – IT, – que, vinte anos depois, veio a ser substituído pelo IVA. [38]

Neste contexto, consubstancia-se relevante conceituar a expressão valor agregado ou acrescentado, como preferem os portugueses. O professor Saldanha Sanches observa que essa expressão é oriunda da Ciência Econômica, que visa a impedir a dupla contagem dos produtos intermédios usados na produção de outros produtos: para que não se incluísse na medição do produto interno bruto o valor do pão e também o da farinha com que o pão é produzido. [39]

Em síntese, o IVA pode ser assim caracterizado: (a) imposto indireto, plurifásico, não-cumulativo e neutro; (b) tributação do consumo total, alargando-se o fato gerador das transmissões de bens e das prestações de serviços, como p.ex., se o bem utilizado da empresa foi para uso próprio do seu titular, do pessoal ou foi para fins alheios à mesmaserviço prestado que gera débito) consoante artigos 3º e 4º do Código do IVA; (c) adota o princípio do país do destino, onde o imposto é cobrado no país em que a mercadoria é consumida; [40] (d) permite o exercício do direito ao crédito (direito à dedução), embora sujeito a limitações, conforme artigos 19, 20 e 21 do Código do IVA c/c artigos 19, 20 e 21 do RITI – Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias. À vista disso, o regime do IVA apresenta uma estrutura que toca em diversos pontos do ICMS, mas distanciando-se do mesmo em várias regras e na abrangência do fato gerador.

No ponto que nos interessa, o direito ao crédito (direito à dedução) no IVA sofre restrições [41] que existem para assegurar a tributação sobre o valor agregado ao produto, oriundo da atividade principal do contribuinte. Este é o primeiro argumento. [42] O valor agregado ao produto é o decorrente da atividade principal do contribuinte, pois é essa força que faz o produto ser impulsionado até o consumo. Aplicando ao Brasil, entende o Min. Nelson Jobim, do STF, que a não-cumulatividade pressupõe que o ICMS tenha incidido no mesmo bem que voltará a circular por força da atividade - fim do contribuinte, in verbis:

AG-361024 / RJ Relator Min. NELSON JOBIM DJ, 19/11/2001. Julgamento 21/08/2001 O STF fixou orientação: "IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS - PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE - OBJETO. O princípio da não-cumulatividade visa a afastar o recolhimento duplo do tributo, alcançando hipótese de aquisição de matéria-prima e outros elementos relativos ao fenômeno produtivo. A evocação é imprópria em se tratando de obtenção de peças de máquinas, aparelhos, equipamentos industriais e material para a manutenção." (RE 195.894, MARCO AURÉLIO, DJ, 16/02/01); "TRIBUTÁRIO. PRETENDIDO CRÉDITO RELATIVO AO ICMS INCIDENTE SOBRE A ENERGIA ELÉTRICA CONSUMIDA EM ESTABELECIMENTO COMERCIAL. Descabimento. "Não implicará crédito para compensação com o montante do imposto devido nas operações ou prestações seguintes, a entrada de bens destinados a consumo ou à integração no ativo fixo do estabelecimento" (art. 31, II, do Convênio ICMS n° 66/88).Se não há saída do bem, ainda que na qualidade de componente de produto industrializado, não há falar-se em cumulatividade tributária. Recurso não conhecido."(RE 200168, ILMAR, DJ, 22/11/96). O acórdão recorrido não divergiu. Está na ementa: "Não há ofensa ao princípio da cumulatividade se o bem tributado é consumido no próprio estabelecimento, não se destinando à comercialização ou à utilização em processo de produção de novos bens. A aplicação da compensação prevista no artigo 155, § 2º, I, da CF pressupõe que o ICMS tenha incidido no mesmo bem que voltará a circular por força da atividade fim do autor." (fl. 72). Correta a decisão agravada. Nego seguimento ao agravo. Publique-se. Brasília, 21 de agosto de 2001.

Nessa longarina, caminhamos ao segundo argumento. Não se pode importar acriticamente o instituto do crédito financeiro vigente no IVA para o sistema do ICMS, sem se fazer as devidas correções. O IVA busca tributar todo o consumo, tanto nas transmissões de bens [43] quanto nas prestações de serviços. [44] O ICMS não tributa todo o consumo. O IVA e ICMS se diferenciam na sua essência, que é a base tributável. Vale dizer, a abrangência do fato gerador do IVA é maior do que a do ICMS. É consideravelmente maior o número de mercadorias e de serviços atingidos. [45] Logo, não se pode aplicar o mesmo princípio a impostos diversos. No regime do IVA, à medida que existem mais serviços sendo tributados na saída ao consumo, inevitavelmente haverá o correspondente aumento dos débitos. Assim, todo serviço prestado gera um débito, inclusive se o bem utilizado da empresa foi para uso próprio do seu titular ou foi para fins alheios à mesma (artigo 4º, item 02, do Código do IVA) e até mesmo nas prestações de serviço a título gratuito.

O primeiro efeito é que esses fatos geradores geram débitos ao IVA, sem, contudo, terem correspondência de débitos no ICMS. Aqui, inexistem essas hipóteses de incidência. Por exemplo: Empresa fabricante de produto químico (atividade-fim). O contribuinte, quando deseja se creditar do ICMS na aquisição de material de propaganda de seu produto (atividade-meio), está gerando um crédito sem o correspondente débito. No IVA, a utilização desse material de propaganda gera um débito a ser compensado com o crédito, originando um saldo de IVA a pagar.

O segundo efeito é que, caso isso pudesse ser feito no ICMS, esses fatos iriam gerar direito ao crédito sem o correspondente débito. Desta sorte, a coluna de créditos cresceria sem aumento dos débitos. Essa operação tem reflexos diretos na arrecadação do ICMS, violando, por assim dizer, o pacto federativo na repartição das receitas tributárias, artigo 158 da CF/88 (federalismo fiscal). [46]


VI – O ARTIGO 20 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 87/96 E A ADOÇÃO LIMITADA DO CRÉDITO FINANCEIRO

De certo que o leitor já percebeu a impossibilidade de se importar acriticamente o instituto do crédito financeiro vigente no IVA ao nosso ICMS. Não são todas as despesas financeiras que dão direito ao crédito. A abrangência do fato gerador do IVA impede a importação acrítica de suas regras, especialmente quando não há correspondência no ICMS. Ademais, há expressa restrição sobre os bens de uso e consumo ou ativo permanente adquiridos e utilizados para fins alheios ao do estabelecimento. [47] Logo, torna-se necessário definir o que sejam bens de uso/consumo ou ativo permanente para se compreender a restrição.

Os bens de capital quando utilizados nas atividades-fim da empresa geram créditos visando à renovação do parque industrial e melhoria na competitividade do produto brasileiro nos mercados interno e externo. Este sistema tributário tem por finalidade possibilitar a capitalização da empresa para que possa fazer novos investimentos na substituição de máquinas e equipamentos desgastados pelo uso, ou ultrapassados na tecnologia. [48]

Desta sorte, os bens destinados ao ativo permanente caracterizam-se por sua finalidade em manter o funcionamento da atividade empresarial. O artigo 179, inciso IV, da Lei n° 6.404/76, determina que se classifique na conta de ativo imobilizado: "os direitos que tenham por objeto bens destinados à manutenção das atividades da companhia e da empresa, ou exercidos com essa finalidade, inclusive os de propriedade industrial ou comercial". São todos os bens de permanência duradoura, visando ao funcionamento normal da sociedade e de seu empreendimento. [49]

Paralelamente, os bens de uso e consumo assumem a função de manutenção dos bens do ativo imobilizado. Possuem, como característica, o tempo de vida útil inferior a um ano. Esses materiais de pouca duração exercem a missão de manter a vida útil dos bens destinados à atividade empresarial. Por exemplo: o óleo e a graxa das máquinas de fabricação de uma empresa de tecidos. Pela sua característica de rápida substituição no prazo inferior a um ano, os bens de consumo são classificados no ativo circulante, na conta estoque, como materiais auxiliares. [50]

O argumento final está na limitação que o IVA faz aos créditos na aquisição de bens utilizados em atividades alheias à empresa. O interessante é que essa hipótese gera, em regra, débito de IVA, mas não gera crédito em alguns casos. Não é qualquer bem de capital que gera direito ao crédito, apenas os que são destinados ao exercício da atividade profissional, consoante artigo 21, nº 2, alínea a do Código do IVA. Ou seja, o ICMS foi buscar no IVA a regra do crédito financeiro, adotando a mesma restrição no artigo 20, § 1º, da LC n° 87/96. O próximo item se destina a demonstrar o argumento final, estudando o conceito da expressão "alheios à atividade da empresa".

VI.1 – OS LIMITES AO CRÉDITO FINANCEIRO PELO CONCEITO DE MERCADORIAS OU SERVIÇOS ALHEIOS À ATIVIDADE DO ESTABELECIMENTO – ARTIGO 20, § 1º, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 87/96

O artigo 20, § 1º, da Lei Complementar nº 87/96 estabelece que: "Não darão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento." Determina, também, exemplificativamente, uma hipótese de mercadoria alheia à atividade do estabelecimento, os veículos de transporte pessoal, no mesmo molde do IVA, artigo 21, item 01, do seu Código. A incerteza do significado e alcance deste dispositivo, gerada pela timidez legislativa, deixa à doutrina elaborá-los e à jurisprudência aplicá-los.

De todo exposto acima, podemos concluir que a mercadoria será considerada alheia à atividade do estabelecimento quando não fizer parte da atividade-fim [51] da empresa, vale dizer, quando integrar as atividades-meio [52] da empresa. Como, por exemplo, o computador que desenha a propaganda para vendas de refrigerante, uma vez que é uma atividade-meio que auxilia a atividade principal da empresa na fabricação de bebidas. O contribuinte adquiriu esse bem na qualidade de consumidor final e não como prestador de serviços de publicidade.

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A norma que traz essa restrição adota o princípio da tributação sobre o valor agregado oriundo da força desprendida da sua atividade principal. Essa é a mens legis. A interpretação teleológica deste dispositivo comprova o alcance do princípio nos tributos sobre o consumo. O propósito da empresa em fabricar certo produto é que faz nascer uma das fases da circulação econômica. É essa força produtiva que faz devolver o produto ao mercado. É ela quem dá saída à mercadoria, impulsionando-a desde a fabricação até o consumo. Por isso ser importante os conceitos de operação e circulação econômica. Como bem ressaltou o Min. Nelson Jobim, a mercadoria volta a circular por força da atividade-fim do contribuinte. Sem ela, não há que se falar em circulação econômica.

O que define valor agregado é a atividade principal da empresa, pois a finalidade é, na sua fase do ciclo econômico, acrescentar valor ao produto dentro daquilo a que ela se propôs fazer. Vale dizer, nos limites do objetivo social da empresa. Por exemplo: Se a empresa é indústria de calçados que se destina essencialmente a fabricar sapatos, então esse é o valor que se agrega ao produto final, decorrente de sua força-motriz principal. Caso a empresa queira fazer propaganda desse produto mediante utilização de bens próprios, estará realizando uma atividade fora de seus objetivos sociais. Pelo nosso sistema jurídico, sobre essa prestação não incide ISS. E, também, não podem gerar crédito de ICMS os bens adquiridos para alcançar esse objetivo, tais como veículo, material, roupas e combustível. Haveria o desvirtuamento do objeto social da empresa se houvesse o crédito sem o correspondente débito. Nesses serviços não há débito, pois não há saída.

Esse acúmulo de atividades-meio provoca a concentração vertical [53] das empresas. Processo já definido acima, em que se desejou evitar com o uso de tributos não-cumulativos. O contribuinte, além de executar a atividade que lhe pertence, onde toda a força de produção está voltada, começa a realizar outras atividades diferentes da sua, desejando com isso se creditar dos bens adquiridos para esta atividade auxiliar da principal. Efeito: multiplicam-se as fases de agregação de valor dentro da empresa, sem a correspondente tributação.

Essas atividades, em regra, devem ser prestadas pelo setor terciário da economia. São elas executadas normalmente pelas empresas prestadoras de serviços. Exemplos de empresas desse setor com os bens de capital utilizados em suas atividades-fim: (a) empresa de transporte usa bens de capital como caminhão, combustível, óleo, graxa, parafuso, peças de reposição; (b) empresa de propaganda e marketing usa automóveis, gráfica, computadores de última geração, papel especial, canetas, tintas em geral; (c) empresa de limpeza usa sabão, vassoura, palha de aço, pano de chão, balde, saco plástico, detergente; (d) empresa de acondicionamento usa rolo de plástico, rolo de papel, máquinas de embalagem; (e) empresa de alimentação usa forno, panela, óleo de cozinha, gás, louças; (f) empresa de diversão usa aparelhos de ginástica, mesa de massagem, aparelhos de videokê, câmara de vídeo, mesa de pingue-pongue, mesa de bilhar, videogame, gamão, xadrez; (g) empresa de informática usa papel, impressora, computadores, cadeira, mesas; (h) escritório de advocacia usa cadeira, mesas, fichários, computadores, armários; (i) clínica de médicos usa estetoscópio, camas, aparelho de raio-x, aparelho de pressão, ultra-som, ressonância magnética; (j) empresa de alojamento usa lençóis, toalhas, beliche, camas, colchão, travesseiro.

Todas essas atividades estão sendo executadas internamente nas empresas do setor secundário [54] da economia. A diferença se encontra na finalidade da atividade, se principal ou auxiliar. Isto demonstra que as empresas do setor secundário estão concentrando em sua sede atividades do setor terciário. Pretendem com isso se creditar do imposto na aquisição de bens destinados às atividades do setor terciário, que estão fora do seu objetivo empresarial. Por exemplo, todos esses bens são considerados alheios à atividade de fabricar cerveja e refrigerante. Logo, não geram créditos de ICMS. São custos de fabricação do produto. Esses bens têm a função de auxiliar a atividade principal de empresas de fabricação, industrialização ou comercialização. Elas optam por executar, conjuntamente, a atividade-fim e a atividade-meio. Não há proibição legal que as impeça. No entanto, não cabe o crédito do imposto referente aos bens de uso/consumo ou ativo permanente, por estarem divorciados da atividade-fim do estabelecimento. Ocorre que estão sendo eles apropriados indevidamente como créditos de ICMS, provocando aumento na coluna de créditos sem o correspondente débito. Com esse acúmulo de atividades-meio na empresa, deixa-se de fomentar o setor terciário da economia, não gerando emprego nem renda. Essa vedação tem a função de evitar a quebra do princípio essencial de funcionamento tanto do IVA quanto do ICMS: a tributação sobre o valor agregado decorrente da atividade principal do contribuinte.

Por fim, apresentaremos um exemplo prático para melhor elucidar a matéria. Empresa fabricante de salgados e biscoitos [55] deseja se creditar do imposto na aquisição de combustível destinado a frota própria de caminhões, que realizam a distribuição do produto. Se o combustível pudesse gerar direito ao crédito, deveria também gerar direito ao débito o serviço prestado na utilização de bens da empresa para uso próprio do seu titular ou para fins alheios à mesma, conforme adota o regime do IVA. Porque (a) o combustível é bem de consumo utilizado em atividade alheia do contribuinte; (b) no regime do IVA esse combustível também não gera direito ao crédito e, acima de tudo, ele gera um débito pela prestação de serviços efetuada para fins próprios ou para fins alheios à atividade da empresa. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de MG, in verbis:

APELAÇÃO CÍVEL Nº 000.185.587-3/00 - COMARCA DE UBERLÂNDIA - APELANTE: (...) APELADO: FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS EMENTA: ICMS - CRÉDITO - APROVEITAMENTO INDEVIDO - USO E CONSUMO. A empresa que, não exercendo como atividade econômica a prestação de serviços de transporte, adquire pneus, câmaras de ar, óleo combustível e lubrificante para emprego em sua frota própria de veículos transportadores, não pode aproveitar como crédito o ICMS pago naquela operação, pois como consumidora final foi que adquiriu aquelas mercadorias. (...) Ao adquirir pneus, câmaras de ar, óleo combustível e lubrificante para emprego em sua frota própria de veículos transportadores, fê-lo a apelante como consumidora final, e não como prestadora de serviço de transporte, atividade econômica que não exerce, nem tampouco figura no rol dos seus objetivos societários. Com inteira pertinência e acerto lê-se no relatório subscrito pelo AFTE Ademar Inácio da Silva, por cópia acostado aos autos, fls.156/163-TJ. "Segundo consta da relação das notas fiscais, são pneus, câmaras de ar, óleo combustível e lubrificantes para emprego em sua frota de veículos. Como a empresa, ao efetuar o transporte de mercadorias vendidas a terceiros, o faz em seu próprio nome, não se pode admitir a existência formal de prestação de serviços. Esta só se caracteriza em relação a terceiros. A prestação vincula-se a um contrato, ainda que informal, presumindo sempre uma relação bipolar. Ninguém presta serviço para si próprio. Assim, quando a autuada transporta as mercadorias que vende em veículos seus, não nasce a figura da prestação. O fato de possuir frota própria para transporte de mercadorias vendidas sob cláusula CIF não a transforma em empresa transportadora. Os veículos são bens do ativo imobilizado. As mercadorias entradas para consumo nesse transporte, ou manutenção dos veículos, afiguram-se de uso/consumo do estabelecimento, não ensejando, ipso facto, suas entradas, crédito de ICMS. Apenas as empresas transportadoras, e como tal inscritas, podem se creditar do tributo pago na aquisição desses insumos e tão só na proporção dos serviços prestados sujeitos à incidência do imposto." (grifo nosso).

Podemos, ainda, citar outros exemplos, como: (a) empresa que fabrica material cosmético desejando se creditar do imposto referente a materiais de propaganda e expositor display de acrílico; (b) empresa que fabrica produtos químicos desejando se creditar do imposto na aquisição de televisão, rádio, aparelhos de lazer, automóvel de propaganda; (c) empresa que fabrica óleo combustível desejando se creditar do imposto na compra de balança, aparelhos de musculação, ar condicionado, cavaquinho, aparelho de som, cafeteira elétrica, aparelho de videokê, computadores e automóveis. Em todos esses casos, as empresas figuram na qualidade de consumidoras finais. Por essa razão é que não cabe a aplicação do crédito financeiro ao ICMS nos mesmos moldes do IVA, como pretendem os contribuintes. São impostos parecidos, mas com regras diferentes.

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Sobre o autor
André Luiz Carvalho Estrella

procurador do Estado do Rio de Janeiro, advogado, membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESTRELLA, André Luiz Carvalho. O crédito financeiro do ICMS: art. 20, § 1º, da Lei Complementar n° 87/96.: Bens de uso, consumo e ativo permanente e o seu regime no IVA do Mercado Comum Europeu. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 64, 1 abr. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3980. Acesso em: 28 mar. 2024.

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