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Breve análise da nova lei dos domésticos (Lei Complementar 150 de 1° de junho de 2015)

28/06/2015 às 16:14

Resumo:


  • Em 2 de abril de 2013, a Emenda Constitucional 72 entrou em vigor, ampliando os direitos trabalhistas dos empregados domésticos, como limite de jornada e adicional noturno.

  • No dia 1º de abril, a Lei Complementar 150 foi sancionada, regulamentando a Emenda Constitucional e estabelecendo direitos específicos para os empregados domésticos.

  • A nova legislação abrange aspectos como jornada de trabalho, férias, rescisão contratual, registro de horas trabalhadas e a criação do Simples Doméstico para recolhimento de tributos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A Lei Complementar 150 trouxe aos domésticos um grande número de novos direitos trabalhistas. Este trabalho tem como condão explicar quais direitos foram conquistados com o advento da nova lei.

Em 2 de abril de 2013, entrou em vigor a Emenda Constitucional 72, que modificou o Parágrafo Único do art. 7º da Constituição, aumentando consubstancialmente o rol de direitos trabalhistas dos empregados domésticos, dando-lhes, por exemplo, limite máximo de jornada de trabalho e adicional noturno. Entretanto, muitos desses direitos não foram disponibilizados individualmente, necessitando de uma lei que os regulamentasse.

Eis que no último dia 1º, após mais de dois anos de discussão no Congresso Nacional, foi sancionada a Lei Complementar 150, que regulamenta a Emenda Constitucional e, por consequência, os direitos nela conquistados.

Primeiramente, mister é salientar o que é o empregado doméstico. Para o art. 1º da lei complementar supramencionada, empregado doméstico é aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal, de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana. Optou o legislador em aplicar a lei apenas àqueles que comparecem à residência do empregador por período superior a 2 dias, deixando de fora o trabalhador eventual, que vai à residência da pessoa normalmente uma vez por semana, recebendo pelo dia – o chamado “diarista”.

Alguns direitos trabalhistas, como a jornada de trabalho (art. 2º), hora extra (art. 2º, § 1º), contrato em tempo parcial (art. 3º), registro de CTPS (art. 9º), intervalo intrajornada (art. 13) e extrajornada (art. 15), INSS (art. 20) e FGTS (art. 21), dentre outros, estão delimitados da mesma forma que já se encontram na CLT, para os empregadores rurais e urbanos. Outros, como o contrato por tempo determinado (art. 4º) e férias (art. 17) estão escritos praticamente da mesma forma que na CLT, com exceção de alguns detalhes. Devido às particularidades de alguns contratos de empregados domésticos, que, por exemplo, necessitam repousar no local de trabalho – como as governantas e os caseiros -, não se pode atribuir direitos trabalhistas, como as férias, da mesma forma que nos contratos comuns. Estes, mesmo de férias, poderão repousar normalmente no local de trabalho (art. 17, § 5º), já que ali é, praticamente, sua residência, uma vez que repousa normalmente no local. Além disso, não será considerado hora trabalhada as que os domésticos se encontrarem na residência sem trabalhar – dormindo, a título de exemplo (art. 2º, § 7º). Já no tocante aos contratos por tempo determinado, poderá haver não apenas no caso de experiência (art. 4º, I), mas também para substituir outro empregado doméstico, que se encontra, por exemplo, gozando de suas férias anuais (art. 4º, II).

Outros direitos já são completamente novos aos empregados domésticos, especificados e diferenciados conforme as peculiaridades normais do contrato de trabalho e do serviço prestado. Os contratos dos domésticos poderão ter suas jornadas, por permissão legal e acordo entre ambos, acrescidos das 8 normais para 12 horas, com intervalo de outras 36 ininterruptas, podendo ter a faculdade de indenizar o intervalo intrajornada ao invés de concedê-lo (art. 10). A tentativa de o legislador estabelecer em lei, de forma completamente anômala, o regime de 12 por 36 a qualquer outra atividade (art. 10, § 2º), foi acertadamente vetada pela presidente, eis que foge ao assunto da lei.

Outra modificação completamente nova trazida pela Lei Complementar 150 foi o seu art. 22, que retira a possibilidade dos empregados domésticos de receberam multa de 40% sobre o montante do FGTS nas dispensas imotivadas, obrigando, todavia, os empregadores a depositarem, mensalmente, 3,2% da remuneração do mês anterior – além do montante do FGTS -, na conta do empregado, que será entregue ao empregado doméstico na sua dispensa, se imotivada.

A terceira grande modificação trazida pelo legislador infraconstitucional foi o art. 27 e seu parágrafo único, que trouxe novo rol de motivos para dispensa por justa causa e rescisão indireta, afastando a aplicação dos art. 482 e 483 da CLT, embora alguns incisos daqueles sejam idênticos ou parecidos com estes. Outros, porém, como submeter a maus tratos idoso, enfermo, pessoa com deficiência ou criança sob cuidado direto ou indireto do empregado, para justa causa, (art. 27, I) ou empregar violência doméstica, de qualquer tipo, à mulher empregada, para rescisão indireta (art. 27, Parágrafo Único, VII), – de forma acertada, a fim de se evitar a ofensa física, moral, patrimonial ou até mesmo sexual à empregada, pelo(a) empregador(a) – são completamente novos, não existindo situação idêntica na CLT.

A Lei Complementar 150 também trata dos empregados domésticos que necessitam acompanhar os seus empregadores em viagem – como as secretárias -, determinando ser apenas horas trabalhadas as efetivamente laboradas no período, desconsiderando as demais, além de poder compensar as horas extras em outro dia (art. 11, caput). Entretanto, tais horas, ainda que não extras, serão acrescidas de, no mínimo, 25% sobre o valor da hora comum (art. 11, § 2º), podendo ser convertido tal valor em banco de horas, a ser utilizada a critério do empregado (art. 11, § 3º).

Dois outros direitos são imprescindíveis frisar: o primeiro deles diz respeito ao art. 18, que abrange de forma mais completa o art. 462 da CLT, para os empregados rurais e urbanos, deixando claro ser vedado ao empregador doméstico efetuar descontos no salário do empregado por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia, bem como por despesas com transporte, hospedagem e alimentação em caso de acompanhamento em viagem. Não se pode, portanto, descontar da governanta ou do caseiro, por exemplo, a alimentação destes ou o fato de dormirem na residência, pois os custos do negócio serão sempre do empregador, e nunca do empregado. O outro direito citado é no tocante ao registro das horas trabalhadas, que deve ser feito por qualquer meio idôneo (art. 12), para controle de horas – sendo, portanto, ônus do empregador, em futuros processos judiciais, comprovar a não existência de horas extras laboradas – aplicando-se, analogicamente, o inciso I da Súmula 338 do Tribunal Superior do Trabalho.

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Mas não apenas nos direitos trabalhistas inovou a Lei Complementar 150. O Capítulo II da dita lei instituiu o Simples Domésticos – uma alusão ao Simples das micro e pequenas empresas (Lei Complementar 123), em que o empregador doméstico recolherá todos os seus tributos em uma única taxa (art. 34). Assim, o empregador doméstico pagará o FGTS e os 3,2%, contribuição previdenciária do empregado e dele, como empregador, imposto de renda do empregado – se incidir sobre o salário do mesmo -, além de 0,8% para financiar seguro contra acidente de trabalho em uma única taxa, não necessitando pagar várias – uma para a Caixa Econômica Federal, outra para o INSS, e assim por diante; facilitando a vida do empregador doméstico.

Além disso, a Lei Complementar 150, em seu art. 46, além de revogar a antiga Lei dos Domésticos (Lei 5.859/72), revogou também o inciso I do art. 3º da Lei 8.009/90, que trata da impenhorabilidade do bem de família. Para esta lei, o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, salvo nas hipóteses do art. 3º, que, dentre outras, dizia que “em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias”. Ou seja, até o advento da LC 150, o empregado doméstico não possuía direitos trabalhistas como os empregados rurais e urbanos. Porém, possuíam a faculdade de penhorarem o bem de família de seus empregadores para pagamento do débito trabalhista ou previdenciário. Com a equiparação dos direitos dos empregados domésticos com os demais, retirou-se – acertadamente, diga-se de passagem – tal facilidade para pagamento de seus créditos.

Por fim, como dificilmente alguma lei brasileira é apenas acerto, deve-se analisar o art. 21 e seu parágrafo único, que diz respeito ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, o FGTS, dos empregados domésticos. Segundo o caput do referido artigo, “é devida a inclusão do empregado doméstico no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), na forma do regulamento a ser editado pelo Conselho Curador e pelo agente operador do FGTS, no âmbito de suas competências, conforme disposto nos arts. 5° e 7° da Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990, inclusive no que tange aos aspectos técnicos de depósitos, saques, devolução de valores e emissão de extratos, entre outros determinados na forma da lei.”. O parágrafo único do dito artigo determina que só será necessário pagar o FGTS do doméstico quando entrar em vigor o regulamento referido no caput. De extremo mal gosto a escolha do legislador, pois, além de poder demorar anos para se regulamentar o caput do art. 21 – o que levaria à perda de direito por parte dos empregados domésticos -, ainda poderá fazer confusão aos empregadores domésticos, que sempre deverão analisar quando entrará em vigor o dito regulamento, ou, caso estes sejam maliciosos, poderão negar o direito aos seus empregados, sob a alegação da desnecessidade de pagamento – por força do parágrafo único – e o mesmo nem procurar os seus direitos na Justiça do Trabalho, por acreditarem fielmente na palavra de seus empregadores – ou, na melhor das hipóteses, entupir o Judiciário com demandas para pagamento do FGTS não pago.

A Lei Complementar 150 foi sancionada pela Presidente da República e já entrou em vigor no dia seguinte, devendo ser aplicada (com exceção do art. 21, pelo motivo supra) a todos os contratos de trabalho doméstico. É lei deve ser respeitada. E, finalmente, após anos de luta dos empregados domésticos – mesmo após o advento da Emenda Constitucional 72 -, os mesmos finalmente foram equiparados aos empregados rurais e urbanos, ainda que com certas diferenças, devido às particularidades de seus contratos de trabalho. Mas a última senzala finalmente foi fechada, como disse o presidente do Senado, Renan Calheiros.

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Sobre o autor
Rodrigo Picon

Formado em Direito pelo Instituto Tancredo de Almeida Neves e pós-graduado em Direito Penal Econômico Aplicado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Rodrigo Picon é advogado, regularmente inscrito pela Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais, escritor e contista. Atua nas áreas criminal, empresarial, penal econômica, tributária, difusos e coletivos e de adequação à Lei Geral de Proteção de Dados. É autor dos livros "Direitos Difusos e Coletivos" e "Código Penal Comentado".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PICON, Rodrigo. Breve análise da nova lei dos domésticos (Lei Complementar 150 de 1° de junho de 2015). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4379, 28 jun. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/39888. Acesso em: 27 dez. 2024.

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