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Incidência do ICMS no comércio eletrônico

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01/04/2003 às 00:00
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2 A TRIBUTAÇÃO FRENTE AO COMÉRCIO ELETRÔNICO

O crescimento incontestável do comércio eletrônico propicia a realização das mais diversas operações com conteúdo econômico, que agregam valor no processo de circulação de bens e prestação de serviços, não mais atrelado necessariamente às características físicas das coisas. Tais características pressupõem a tributação mediante impostos.

Contudo, a realidade virtual pressupõe que qualquer pessoa, física ou jurídica, em qualquer parte do mundo, pode acessar um site e através dele realizar as mais diversas operações que envolvam tanto bens quanto prestação de serviços. A partir daí, não se pode afirmar categoricamente quem é o consumidor, qual o local da transação, onde está estabelecido o fornecedor, qual o país (ou países) envolvido, qual a legislação incidente, se a operação realizada envolveu ou não uma mercadoria ou um serviço. Enfim, todos os conceitos necessários para verificarmos a incidência ou não de determinado tributo, com essa nova economia tornam-se inócuos.

Cabe aqui, então, perguntar: a legislação brasileira existente está preparada para captar a capacidade contributiva manifestada através desses novos meios? Quais as principais dificuldades envolvidas? Os conceitos tradicionais de mercadoria, serviço, local, estabelecimento, são adequados para viabilizar a ação do Fisco? Como se dará a fiscalização? Como os demais países estão enfrentando essa nova realidade? Qual a implicação para a soberania do Estado?

Não temos a pretensão de dar uma solução a tais perguntas, até mesmo porque o assunto é por demais complexo e envolve o estudo de novas concepções e teorias, muito provavelmente não em nível de cada país, individualmente, mas possivelmente em blocos. Também não cremos que se possam propor soluções segmentadas, mas discutir a nova economia à luz de um novo Direito, que englobe não só os avanços da nova tecnologia, mas o fenômeno da globalização com todas as suas implicações. Nossa proposta consiste apenas em expor aspectos da legislação interna vigente, confrontando-os com o novo paradigma e adicionando elementos à discussão já existente.

2.1 A Legislação Brasileira e o Comércio Eletrônico

Tanto no Brasil como em outros países, a legislação não tem acompanhado o ritmo crescente do desenvolvimento tecnológico, principalmente se considerarmos o impacto que as tecnologias de informação têm provocado na sociedade globalizada.

A legislação brasileira, no que tange à transmissão e registro de informação é inadequada e ultrapassada porque não contempla o comércio eletrônico. Inclusive os projetos de Lei em discussão na Câmara dos Deputados não contemplam o e-commerce. A legislação existente, em alguns casos, impõe restrições, ao exigir a necessidade de documentos "escritos" ou "assinados" ou ainda a apresentação de originais para certos atos jurídicos, ignorando ou até mesmo negando efeito jurídico, validade e eficácia à informação apenas porque esta se encontra na forma eletrônica. O Brasil, por exemplo, já responde por 88% do comércio eletrônico da América Latina, com o maior número de varejistas online cadastrados (307), seguido pelo México (com 50), e com vendas online em torno de US$ 160 milhões por ano, em toda a América Latina.

No Brasil, a Internet surgiu em 1995, com a publicação da Norma Nº 4 do Ministério das Comunicações, que regula o uso de meios da rede pública de telecomunicações para o provimento e utilização de serviços de conexão à Internet. Trata-se, portanto, de atividade mais recente que o Código de Defesa do Consumidor (1990) e bem mais atual que o Código Comercial (1850). Essa Norma conceitua Internet como "nome genérico que designa o conjunto de redes, ou meios de transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre computadores, bem como o software e os dados contidos nestes computadores". Esse conceito evidencia a idéia de meio de comunicação, como o telefone e fax.

Luís Henrique VENTURA, em artigo publicado, faz, entre outras considerações, questionamentos interessantes e até o momento sem resposta por parte dos legisladores, tais como: "Seria legal ou conveniente que se cobrasse tributo por utilização da Internet? Afinal a Internet é uma via pela qual se realizam atividades comerciais. Seria possível a instituição de um pedágio eletrônico? E como fiscalizar a tributação de compra e venda de bens e serviços totalmente realizada pela Internet?" Em relação ao papel do governo, pensa o referido autor que, entre outras ações de caráter geral, deve ter a preocupação de informar e educar, oferecendo infra-estrutura moderna e de ponta; coibir o mau uso da Rede e divulgar amplamente as regras que norteiam o uso da mesma.

FERNANDEZ, apresenta exemplos que, por si só, demonstram a complexidade do tema tributário no comércio eletrônico. Segundo ele, "hoje é possível a qualquer um de nós associarmo-nos a um sueco, para produzir algo na Malásia, com a auditoria de uma firma suíça, com co-financiamento americano e japonês. A partir daí pergunta-se: Onde é o fato gerador? Onde é que começa e onde é que acaba? Quem deve o quê?" Através de exemplos como esses se verifica que são problemas que não apresentam soluções instantâneas, mas certamente demandam estudos aprofundados e urgentes por parte não apenas dos órgãos governamentais, mas também da sociedade civil organizada.

Ainda em termos de legislação, além da Norma Nº 4/95, existem as Resoluções nº 1 e 2/98 do Comitê Gestor Internet do Brasil, vinculado à Secretaria de Política de Informática e Automação do Ministério da Ciência e Tecnologia, que tratam apenas de regras de registro de domínio, delegando competência para registro e fiscalização à FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.

A situação de vários países membros da união Européia, no campo do comércio eletrônico, não é muito diferente da do Brasil; ou seja, estão todos na fase de elaboração de projetos de lei, em sua maioria baseados na Lei Modelo da UNCITRAL – United Nations Commission on International Trade Law, de 1996. A UNCITRAL é uma comissão especial da ONU – Organização das Nações Unidas – que trata de legislação comercial internacional e que elaborou e tem divulgado uma lei modelo de comércio eletrônico, utilizada como base para os estudos de diversos países. Por ter caráter internacional, visa promover a uniformização de sua aplicação e a observância do Princípio da Boa-Fé. Contudo, aborda questões mais relativas ao contrato eletrônico (forma, validade, requisitos, etc.), tempo e lugar de envio de mensagem, entre outros aspectos, sem estabelecer, no entanto, regras claras sobre tributação.

O Projeto de Lei brasileiro, de Nº 672/99, de autoria do senador Lúcio Alcântara, prevê o reconhecimento jurídico das mensagens eletrônicas e determina as maneiras pelas quais elas devem ser conservadas quando a lei exigir que as informações constem por escrito. Estabelece ainda que a oferta e aceitação de contratos podem ser feitas por mensagens eletrônicas e que elas serão expedidas e recebidas nos locais onde o remetente e o destinatário têm seus estabelecimentos. Atualmente o projeto encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça, com parecer favorável à aprovação.

Tramita ainda na Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Nº 1589/99 do deputado Luciano Pizzato, também versando sobre a mesma matéria, embora de forma mais detalhada, que trata da validade jurídica dos documentos eletrônicos, prevendo ainda a certificação digital dos mesmos, via notário, o que lhe daria fé pública. O referido projeto foi apensado ao PL Nº 1.483/99, que institui a fatura eletrônica e a assinatura digital (assinatura criptográfica) nas transações eletrônicas. A Comissão Especial de Comércio Eletrônico da Câmara dos Deputados está realizando audiências públicas sobre o tema.

Contudo, ambos os projetos não esclarecem questões de grande implicação econômica e social no campo da tributação, como por exemplo: qual o território que tem a competência para tributar, onde é o local da prestação de serviços, quando é fato gerador do ICMS e quando é do ISS, o que é software para fins de tributação, como tributar os estabelecimentos virtuais, a remuneração do provimento ao acesso, hospedagem de site, assinatura de jornais e revistas eletrônicos, provimento do espaço, etc.

São todas questões cruciais e que permanecem à margem das discussões legislativas no Brasil, ainda sem respostas, e sem as quais dificilmente poder-se-á falar em tributação na internet. Muito embora existam comissões de estudo debatendo o tema, como é o caso da Comissão Técnica Permanente do CONFAZ, que formou grupo específico para debater o comércio eletrônico, além de um grupo de trabalho do comércio eletrônico criado no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio – MDIC, o consenso em torno do assunto é extremamente difícil, inclusive entre os Estados, como veremos adiante.

No Brasil, o sistema tributário vigente encontra amparo na Constituição Federal, ou seja, a relação jurídica tributária, a par de mostrar-se sempre ex lege, é uma relação jurídica que se dá sob a Constituição e de forma direta, estabelecendo verdadeiros princípios que permeiam e influenciam todas as outras regras que lhe são subordinadas. No dizer de CARVALHO , a constituição brasileira é "também um subsistema, o mais importante, que paira, sobranceiro, sobre todos os demais, em virtude de sua privilegiada posição hierárquica, ocupando o tópico superior do ordenamento e hospedando as diretrizes substanciais que regem a totalidade do sistema jurídico nacional."

Considera ainda o autor que "em Direito, utiliza-se o termo "princípio" para denotar as regras de que falamos, mas também se emprega a palavra para apontar normas que fixam critérios objetivos, além de ser usada, igualmente, para significar o próprio valor, independentemente da estrutura a que está agregado e, do mesmo modo, o limite objetivo sem a consideração da norma." Dentro desses critérios, podemos observar que um princípio constitucional estabelece verdadeiramente uma norma, um valor e um limite objetivo. Portanto, toda e qualquer legislação infraconstitucional que pretenda definir regras sobre o comércio eletrônico, deverá estar inserida nesses limites.

Portanto, no ordenamento jurídico, a lei maior é o fundamento de validade de todo o sistema tributário, o que, no entanto, possibilita diversas construções interpretativas, dando azo à inúmeras discussões, não poucas vezes dirimidas pelo poder judiciário.

Os Estados e o Distrito Federal receberam, pelo art. 155, II, da Constituição Federal, a competência para instituírem, além de outros tributos, o ICMS – Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação.

"Art.155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

I-transmissão "causa mortis" e doação, de quaisquer bens ou direitos;

II-operações relativas á circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

III-propriedade de veículos automotores."

Do acima exposto destaca-se que somente o poder constituinte pode atribuir competência tributária, restando ao legislador infraconstitucional o dever de editar normas que disciplinem as matérias tributárias.

A par da fixação de competência do artigo 155, CF/88, a Constituição estabeleceu limitações ao poder de tributar. A partir desses princípios ou normas fundamentais tributárias, existem normas infraconstitucionais complementares ao ICMS, cujo objeto é determinado pela lei maior.

O sistema tributário tem previsão legal no Código Tributário Nacional, instituído pela Lei 5.172/66, e recepcionado pela Constituição Federal de 1988. Dividido em dois livros, o primeiro trata do sistema tributário nacional, enquanto o segundo versa sobre normas gerais de direito tributário. Embora surgido como lei ordinária, hoje é tido como lei complementar ratione materiae, uma vez que versa sobre matérias privativas de lei complementar.

Para o objetivo do presente estudo, iremos nos ater somente ao que respeita ao imposto sobre circulação e serviços de qualquer natureza – ICMS. Dispõe o artigo 16 do CTN:

"Art. 16. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte".

Os impostos no CTN estão agrupados por áreas econômicas, sendo que o ICMS é imposto indireto, pois recai sobre o consumo, sendo de âmbito estadual. Absorveu ainda três impostos especiais sobre energia elétrica, combustíveis e lubrificantes e minerais, bem como serviços de transporte e comunicações que antigamente eram de competência da União e agora passaram a ser considerados como mercadoria.

Ainda dentro da chamadas Leis Complementares que possuem o ICMS como objeto, encontramos o Decreto-Lei Nº 406/68, modificado sucessivamente pelo Decreto-Lei Nº 834/69 e pela Lei Complementar Nº 56/87, que trata da incidência do ICMS sobre mercadorias fornecidas com prestação de serviços tributados pelo ISS – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios. Temos ainda a Lei Complementar Nº 24/75, que regula a forma como, mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais são concedidos e revogados e a Lei Complementar Nº 65/91, que define produtos semi-elaborados.

A Lei Complementar Nº 87/96 repetiu o já disposto no texto constitucional e foi editada em cumprimento ao disposto no artigo 155, § 2º, inciso XII da CF/88, que determina caber à lei complementar estabelecer normas gerais sobre o ICMS (fixar alíquotas, base de cálculo, fato gerador, determinar o sujeito passivo, etc.).

Embora não seja norma tributária, a Medida Provisória é instrumento previsto na Constituição Brasileira e muitas vezes usado (indevidamente) com efeito de norma tributária. A esse respeito, em brilhante exposição, OLIVEIRA demonstra seu desprezo pela funesta figura da MEDIDA PROVISÓRIA, em aparente digressão, mas no entanto de fundamental importância dentro do contexto das competências tributárias. Ora, se as normas de competência tributária nada mais são do que instrumental financeiro, com respaldo popular dado somente ao Poder Legislativo, para a independência dos entes políticos, não possui, o Poder Executivo, legitimidade popular para criar normas destinadas à implementação de tributos. Muito menos quando os cria através de medida prevista no artigo 62 da CF/88.

CARVALHO, a respeito da Medida Provisória refere que a mesma exige a simultaneidade de ambos os requisitos assinalados pelo legislador para que possa ser produzida: urgência e relevância. Muito embora ambos estejam presentes, ao admitirmos que tributos sejam criados ou majorados através de Medidas Provisórias, estamos na verdade protraindo sua legitimação para momento posterior ao de sua cobrança, ou seja, para quando o Congresso Nacional converter em lei o ato do Executivo. Caso não o faça no tempo previsto de 30 dias e a medida provisória seja reeditada (e normalmente, é o que acontece), duplamente ilegítimo torna-se o ato, pois além de ser vedado pelo princípio constitucional da anterioridade, não possui o Executivo amparo popular no mandato para o qual foi eleito.

Importante salientar que, de todas as normas tributárias acima relacionadas, nenhuma delas abrange o contexto da chamada "nova economia", haja vista que todas trabalham com o conceito tradicional do que seja comércio, mercadoria, estabelecimento, etc., conceitos estes que necessitam revisão para que possam abranger o novo tempo virtual, sem maiores dubiedades.

2.2 A Regra Matriz de Incidência

Por regra matriz de incidência tributária pode-se entender uma norma de conduta com o objetivo de provocar determinados comportamentos nos sujeitos passivos do gravame tributário. Em extenso estudo sobre o tema, CARVALHO denomina a regra matriz de incidência como norma tributária em sentido estrito, com a finalidade de estabelecer a incidência fiscal. Usando terminologias como hipótese tributária para descrever a construção de linguagem prescritiva geral e abstrata, denomina de fato jurídico tributário a sua projeção factual.

A hipótese tributária é norteada por três critérios: material, espacial e temporal. O critério material designa um comportamento pessoal que encerra um fazer, um dar, ou simplesmente um ser. Exemplificando, teríamos um comportamento do sujeito passivo como: vender mercadoria, industrializar produtos, ser proprietário de imóvel, auferir renda, etc. O aspecto material seria formado por um verbo seguido de seu complemento.

O critério espacial vincula-se a regras jurídicas que expressam o local exato onde o fato ocorreu, para que irradie os efeitos que lhe são próprios. No caso do ICMS, o critério é bem genérico: seja qual for o lugar em que o fato ocorreu, se dão por propagados seus legítimos efeitos, coincidindo o critério espacial com o âmbito de validade territorial da lei.

Por critério temporal o autor entende o grupo de indicações contidas na norma e que possibilitam o conhecimento do preciso instante em que o fato descrito passou a ter existência jurídica; ou seja, quando surge o direito subjetivo para o Estado e o dever jurídico para o sujeito passivo.

O conseqüente da norma tributária em sentido estrito (regra matriz de incidência), estipula a regulação de conduta, prescreve direitos e obrigações para os sujeitos, ativo (Estado) e passivo (pessoa física ou jurídica, privada ou pública, de quem se exige a prestação), e identifica o objeto do vínculo obrigacional, (aquilo que se espera do sujeito passivo). O critério pessoal identifica os sujeitos, enquanto o critério quantitativo refere-se aos fatores – base de cálculo e alíquota - que possibilitam a determinação do quantum debeatur.

A Lei Complementar 87/96, em seu artigo 1º, dispõe:

"Art. 1º - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior."

Percebe-se que o referido artigo nada mais é do que transcrição de norma contida na Constituição Federal, pois a competência é dada pela lei maior, não podendo ser restringida ou ampliada por lei hierarquicamente inferior. Também no artigo 2º, inciso I, dispõe:

"Art. 2º. O imposto incide sobre: I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares."

Mas qual o alcance da expressão "circulação de mercadorias"? NETO, analisando o conceito acima, assevera que o inciso I contém dois tipos: o genérico, que alcança maior parte das operações e para as quais não há disposição expressa, e o específico, relativo à parte final do inciso. Segundo o autor, o negócio mercantil do tipo genérico é o mais comum, incidindo em todas as operações de consumo que transmitam ou não a propriedade ou a posse.

Já COELHO assegura que esta é tese superada, pois somente terá relevância jurídica a operação que acarrete a circulação de mercadoria como forma de transmissão de domínio. "O imposto não incide sobre a mera saída ou circulação física que não configure real mudança de titularidade do domínio".

Já NICHOLAS afirma que o advento da Internet pressupõe uma nova definição para o termo "circulação de mercadorias", como hipótese de incidência do ICMS. Ou seja, a circulação agora não precisa necessariamente ser física, pois se na Internet o espaço é virtual (e, aduzimos, existe), o fato de as mercadorias serem virtuais, não se materializando no mundo físico, nem por isso deixam de ser mercadorias e nem deixam de circular entre vendedores e compradores.

2.3 Os Conceitos Clássicos e sua Inadequação

2.3.1 Conceito de mercadoria

O termo "mercadoria" define a base da tributação pelo ICMS. Seu significado literal é "aquilo que é objeto de comércio". GRECO considera que há 30 anos o direito brasileiro utiliza o termo como "coisa móvel objeto de mercancia", com amplitude inalterável pelo artigo 110 do CTN. Ou seja, "no regime da CF-88 e desde que adotado o conceito clássico, somente poderão ser alcançadas pelo ICMS operações relativas à circulação de "coisas móveis objeto de mercancia".

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Como se pode ver, este é conceito adequado em uma realidade em que o valor é atribuído apenas a objetos materiais. Ainda segundo GRECO, mercadoria pode ser identificada a partir de três diferentes critérios, a saber:

Em função da natureza de determinados objetos: seguindo esta linha, adota-se a divisão clássica entre bens corpóreos e incorpóreos, onde os primeiros seriam aqueles que podem ser tocados, tangíveis, captados pelos

sentidos humanos; os incorpóreos seriam os criados pelo Direito. Rapidamente verifica-se que esta linha de pensamento não satisfaz a necessidade de conceito abrangente que o termo mercadoria deve ter para abarcar os diversos bens informáticos. Tomando-se como exemplo o software, este não se enquadra em bem corpóreo e tampouco na categoria de bem incorpóreo, pois não é mera criação do Direito.

Tipo de atividade exercida ou da qualificação subjetiva de alguém: dentro desta ótica, mercadoria é tudo aquilo passível de ser negociado por um comerciante ou que seja objeto da atividade empresarial. Também não satisfaz, porque desloca a análise para o subjetivo (a pessoa a quem o bem está relacionado), além de não ter a mesma amplitude que o significado acima.

Tudo aquilo que seja objeto de um determinado mercado: este é um significado puramente econômico, pois apoiado na simples existência de um mercado, abrangendo aí inclusive cotações e mercados de futuros, por exemplo.

Buscando o sentido que resulta da constituição e analisando o tipo de critério utilizado por esta, o autor conclui que há evidente deficiência no que concerne às novas realidades geradas pela informática. A Constituição Federal, ao atribuir competências, qualifica determinados bens sobre os quais incidirão outros impostos que não o ICMS (bens imóveis, por exemplo); para estes bens, portanto, e para fins de tributação do ICMS, eles forçosamente terão que ser considerados com significado semântico diverso de "mercadoria". Da mesma forma que os bens imóveis, também as operações de crédito, câmbio, seguros, relativas a títulos e valores mobiliários não podem ser consideradas mercadorias para efeitos de ICMS porque sobre elas incide o IOF – imposto sobre operações financeiras. Pela mesma razão também devem ser excluídos os bens tributáveis pelos Municípios.

A conceituação e os critérios adotados para definir o que é mercadoria para efeitos de incidência de ICMS serão de vital importância para o comércio eletrônico, haja vista que incluirão ou excluirão bens desse gravame. Em item específico discutiremos a questão do software, cabendo lembrar que atualmente, dependendo da linha adotada para definir mercadoria, tal bem é ou não passível de tributação pelo Estado, o que está dando margem à intensa discussão doutrinária.

No tocante às operações mercantis realizadas via Internet, envolvendo bens tangíveis (que podem ser captados pelos sentidos humanos), nada há que impeça a tributação, segundo análise de ABREU e PRADO. A aquisição de um livro, um CD, um automóvel, caracterizam típicas operações de circulação de mercadorias, podendo haver incidência do ICMS. Assim, quando um brasileiro compra um CD ou livro de outro país, via Internet, os impostos estaduais e federais são recolhidos no momento em que o produto passa pela alfândega. Os problemas surgem quando são comercializados bens e serviços virtuais, como músicas, livros eletrônicos, software, quando são prestadas consultorias, ou ministrados cursos à distância.

Como já mencionado acima, muito embora sejam conceituados como mercadoria, não integram a materialidade da competência para instituir o ICMS, porque sobre elas recai o IOF, como disposto no artigo 153, V da CF/88. Pela mesma razão, bens utilizados nas prestações de serviços tributáveis pelo ISS e constantes da lista anexa à Lei Complementar Nº 56/87 não são passíveis de tributação pelo ICMS.

Portanto, mercadoria abrange tanto bens corpóreos (tangíveis) quanto os bens incorpóreos (intangíveis). Contudo, a problemática se apresenta justamente quando tentamos enquadrar as novas criações da tecnologia dentro dos parâmetros clássicos. Atualmente, o "virtual" possui valor próprio, independente de seu suporte físico, implicando necessariamente na decorrência de direitos e deveres. O que tem interesse jurídico é a própria informação, o software, e não o CD, o disquete ou o próprio hardware em que ele se encontra. GRECO, a esse respeito, relata exemplo bastante ilustrativo em que renomado professor (Nicholas Negroponte), ao chegar em determinada empresa portando seu laptop, foi-lhe solicitado o valor do mesmo para efeitos de seguro. Ao dizer que valia dois milhões de dólares, deixou perplexo o funcionário responsável, assegurando este que um laptop valeria no máximo dois mil dólares. Efetivamente sim, respondeu-lhe o professor, mas as informações nele contidas (software, banco de dados, etc.) valeriam seguramente os dois milhões de dólares sugeridos. E acrescenta ele:

"Esta é a grande mudança. O valor não está mais atrelado necessariamente às características físicas das coisas. As informações, mensagens, dados, instruções, softwares, etc., adquiriram valor próprio, independente dos átomos de que é formado seu meio físico, valor este muitas vezes superior aos respectivos átomos. Isto se estende não apenas a valores de softwares, mas alcança o valor que possuem bancos de dados, registros financeiros de operações bancárias, registros contábeis, etc."

"Ou seja, há uma dupla mudança: por um lado, a informática deu vida a novos bens (softwares, bancos de dados); por outro lado, bens clássicos assumiram nova feição (virtual) em razão dos avanços da tecnologia e da informática (basta lembrar os chamados "livros eletrônicos")."

Pelo acima exposto, fica clara a insuficiência do atual conceito de mercadoria, posto que este não alcança nada que não seja bem corpóreo, embora haja manifestação de capacidade contributiva, pressuposto dos impostos, nos novos bens negociados via comércio eletrônico. Como fazer para "reinterpretar" o conceito de mercadoria, sem ferir o disposto na Constituição? GRECO sugere reformular a norma atributiva de competência do atual ICMS, adotando conceito de forma a abranger os bens incorpóreos, "objeto de mercancia", em sua feição atual. Isso implicaria em emendar a constituição e alterar a LC 87/96? Seria este o melhor caminho?

2.3.2 Conceito de serviços

Analisando o conceito tradicional de serviço como um tipo de atividade que demanda esforço humano, GRECO afirma que vivemos, no âmbito tributário, sob um "regime de lista de atividades", exemplificado pela lista de serviços tributáveis pelo ISS veiculada pela Lei Complementar 56/87, que reafirma o critério básico onde se tributa porque alguém "faz" algo, remetendo à idéia de trabalho realizado por alguém.

O mundo moderno trouxe outra realidade, onde o critério da atividade soma-se ao da utilidade para atribuir valor ao serviço, com ênfase no usuário e não mais na atividade. Por esse motivo, GRECO afirma que "utilizar o conceito de serviço (como expressivo de uma atividade) para fins de qualificação da matéria tributável é também deixar à margem da tributação significativa parcela da atividade econômica exercida no mercado e que é formada pelo fornecimento de utilidades, no mais das vezes imateriais e que resultam de atividades novas, não alcançadas pelo conceito tradicionalmente utilizado".

Novamente temos uma insuficiência de conceitos tributários perante a nova realidade. O exemplo do home banking, trazido pelo autor é relevante: tanto os custos (equipamento e ligações telefônicas) quanto de atividade (digitação) são por conta do usuário. No entanto, por ser considerado de utilidade para o cliente faz com que este pague pelo serviço. O que é relevante para o cliente não é mais a atividade, mas a utilidade que irá obter.

Em função dessa nova realidade, GRECO sugere uma alteração na norma constitucional atributiva de competência tributária, substituindo o conceito de serviço pelo de utilidade, mais abrangente e consentâneo com o momento atual. Diz ainda o Autor que a diferenciação entre "valor adicionado" e "valor agregado" também possui relevância na medida em que este último é importante para fins de tributação pelo ICMS. Por "valor adicionado" podemos entender o acréscimo de uma utilidade a um bem já existente; o valor está atrelado à utilidade fornecida, e não ao seu preço ou trabalho desenvolvido. Adicionar um valor pode significar apenas que se viabilizou uma nova utilidade ou mais ampla, a alguém, sem necessariamente ter havido aumento de preço.

O artigo 61 da Lei Nº 9.472/97, caput, que revogou o artigo 10 da Lei 9.295/96, que tratava do mesmo assunto, conceitua assim o serviço de valor adicionado:

Art 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações."

RADOS, define "valor agregado" a serviços/produtos de informação como "o reconhecimento do benefício alcançado pelo cliente versus o recurso empregado para realizar uma atividade ou ainda o incremento de facilidade para atender uma necessidade ou resolver um problema." Acrescenta ainda que agregar valor a serviço/produtos de informação consiste na integração de recursos tecnológicos e humanos com a finalidade de melhorar o ciclo de informação, trazendo agilidade e eficácia ao mesmo.

A priori, não verificamos diferença semântica substancial entre os dois conceitos; ao contrário, ambos podem ser considerados sinônimos, como o faz Aurélio B. de HOLANDA, ao definir :

Adicionado: juntar, acrescentar, somar..

Agregar: acumular, juntar, reunir.

Possivelmente GRECO faça tal diferenciação apenas como forma de chamar a atenção para a limitação da definição contida no artigo 61 da Lei 9.472/97. Tal diferença ou a inexistência dela, será de vital importância quando discutirmos, mais adiante, a possibilidade ou não de incidência do ICMS no serviço de provedor de acesso à Internet.

2.3.3 Conceito de local da prestação de serviços

A definição de local para efeitos de prestação de serviço possui importância pelo aspecto espacial da competência tributária. Para fins de impostos como o ICMS, o critério espacial deverá coincidir com o âmbito de competência do Estado ou Distrito Federal, em que a norma seja válida.

A problemática gerada pelas novas atividades desenvolvidas pode ser verificada através do seguinte exemplo: imagine-se que determinada pessoa jurídica, no Rio Grande do Sul, acesse um site que disponibilize determinado serviço. A empresa responsável pelo site está sediada no Rio de Janeiro, mas conectada a um computador central em São Paulo e cujo responsável pela prestação direta do serviço resida no Paraná. O local para efeitos de tributação será onde se encontra fisicamente o computador que hospeda a home page, ou o do estabelecimento físico da empresa responsável ou ainda o local do beneficiário do serviço?

Em tese, há dois critérios para tributar tal serviço: ou no local da empresa (sede) ou no local do estabelecimento beneficiado pelo serviço. Se o critério utilizado for o da atividade, a tributação dar-se-á no local onde os prestadores tiverem seu estabelecimento permanente (outra dificuldade a ser transposta); se for o da utilidade, onde estiver o cliente. Por aí se pode imaginar as modificações na arrecadação de cada Estado, dependendo do critério a ser adotado.

Discorrendo sobre o tema, GRECO considera que a circunstância de o provedor hospedar o site possui relevância na medida em que esse aspecto pode ser interpretado de três maneiras diversas:

- Site visto como uma mera vitrine, forma de publicidade, sem qualquer autonomia ou qualificação jurídica própria;

- Site visto como extensão do estabelecimento do prestador de serviços;

- Site visto como um novo estabelecimento do prestador de serviços, separado do estabelecimento físico, se adotarmos o conceito de que este é o local onde uma empresa exerce sua atividade.

Nas duas primeiras hipóteses, será considerado local para efeitos de tributação, o do estabelecimento físico do fornecedor. Na terceira hipótese, onde se encontrar o provedor. Ainda, se for utilizado o critério da utilidade, o local será onde estiver o cliente.

Novas dificuldades para o Fisco podem ser acrescentadas, se imaginarmos que o computador, ou mesmo o estabelecimento físico da empresa, esteja localizado em outro estado ou em outro país. Caso o outro Estado ou país entender que também tem direito de tributar, poderá haver bi-tributação, ou ainda a possibilidade de nenhum deles tributar, dada a complexidade do assunto.

O autor complementa ainda que se o site não for uma mera vitrine da empresa, mas através dele realizarem-se negócios ou prestarem-se serviços, a atividade em si estaria sendo realizada naquele local, reunindo elementos que permitiriam considera-lo estabelecimento. Faz menção ainda ao artigo 12 do Decreto Lei nº 406/68, que estabelece que o serviço considera-se prestado no local do estabelecimento do prestador, havendo julgados, no entanto, com entendimento diverso, devendo o imposto ser cobrado no Município onde ocorra a prestação de serviço. Porém, esse critério somente poderá ser aplicado se houver elementos suficientes que comprovem a prestação do serviço em determinado local. Na ausência dos mesmos, aplica-se a regra geral em que local é onde se encontra o estabelecimento do prestador. Assim manifestou-se o STJ:

"Embora a lei considere local da prestação de serviços, o do estabelecimento prestador (art. 12 do DL 406/68), ela pretende que o ISS pertença ao município em cujo território se realizou o fato gerador. É o local da prestação de serviços que indica o município competente para a imposição do tributo (ISS). Para que não se vulnere o princípio constitucional implícito que atribui àquele o poder de tributar as prestações ocorridas em seu território. Precedentes do STJ."

2.3.4 ICMS e estabelecimento virtual: jurisdição na Internet

A Lei que disciplina o ICMS – LC 87/96 – estrutura grande parte da disciplina relativa ao fato gerador do imposto a partir da noção de estabelecimento, motivo pelo qual discutiremos inicialmente o que se entende hoje por tal conceito e se este se aplica ao comércio eletrônico.

O parágrafo 3º do artigo 11 da Lei Complementar 87/96 assim define "estabelecimento":

"§ 3º. Para efeito desta Lei Complementar,estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias, observado ainda, o seguinte:

I – na impossibilidade de determinação do estabelecimento, considera-se como tal o local em que tenha sido efetuada a operação ou prestação, encontrada a mercadoria ou constatada a prestação;

II – é autônomo cada estabelecimento do mesmo titular;

III – considera-se também estabelecimento autônomo o veículo usado no comércio ambulante e na captura do pescado;

IV – respondem pelo crédito tributário todos os estabelecimentos do mesmo titular."

Estabelecimento, portanto, não se confunde com Pessoa Jurídica, constituindo-se em mera extensão desta, haja vista tratar-se de uma ficção jurídica, ao passo que o estabelecimento existe de forma concreta, através do local, instalações e aparelhos necessários ao desenvolvimento das atividades. Existe de forma concreta no mundo dos fatos e independentemente de forma legal.

O estabelecimento tem a função de determinar o espaço jurídico no qual a pessoa, responsável pelo pagamento do imposto, desenvolve sua atividade sujeita ao ICMS, não importando se as atividades são exercidas em caráter temporário ou permanente, desde que caracterizem o fato gerador.

O inciso I prevê a possibilidade de a administração, em casos de procedimentos ilegais, e na não localização do estabelecimento, resguardar seus direitos pela existência da mercadoria indevidamente circulada, ou pelos meios utilizados na prestação do serviço ilegalmente praticado.

O inciso II aborda a questão dos preços de transferência, onde ocorrem algumas divergências doutrinárias. CARVALHO entende que "a colocação feita por este inciso está em consonância com a linha adotada nesta lei complementar no sentido de autorizar a cobrança do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte." Registra ainda que o inciso IV está redigido de forma a confirmar a relatividade dessa autonomia, quando dispõe que todos os estabelecimentos de um mesmo titular respondem pelo crédito tributário. As transações entre empresas do mesmo grupo, com as Intranets, serão enormemente afetadas, com sérios obstáculos à fiscalização.

Um dos pontos centrais para a incidência ou não do ICMS no comércio eletrônico é verificar o correto enquadramento do site. Pode ser ele considerado um estabelecimento?

CASTRO, em artigo publicado na rede, analisa o assunto sob os seguintes aspectos: um estabelecimento físico lembra a noção de ponto, que não exigiria uma localização geográfica, posto que cada site possui um endereço próprio na rede, podendo ser encontrado e identificado através de um endereço eletrônico. O cerne da definição legal prevista no artigo 11, § 3º da LC 87/96, requer uma operação de compra e venda, o que não seria empecilho, haja vista que muitos sites estão habilitados tecnicamente para isso. A cláusula "bem como onde se encontrem armazenadas as mercadorias", caso considerássemos "mercadoria" as atualmente comercializáveis via Internet, conduz à aceitação de site como estabelecimento sempre que possível o download de arquivos lá hospedados.

Contudo, ressalva que, dada a inexistência de legislação que regule os aspectos como registro fiscal, procedimentos de fiscalização, solução de eventuais conflitos de competência, entre outros, os sites devem ser considerados meras extensões dos estabelecimentos físicos já registrados perante as autoridades fiscais.

Também é importante conceituarmos o que seja "estabelecimento" pela importância vital que este possui na determinação da capacidade tributária de uma pessoa jurídica não constituída legalmente, mas que opera em um país. Ou seja, o site de uma pessoa jurídica sediada em determinado país, mas localizado em servidor ou provedor situado em outro país. A OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, no Modelo de Convenção de 1977, atualizado em 1992, artigo 5º, assim definiu estabelecimento permanente:

"Para os efeitos da presente Convenção, a expressão "estabelecimento permanente" significa um lugar fixo de negócios, mediante o qual uma empresa realiza toda ou parte de sua atividade."

ASIAIN refere que o Comitê de Assuntos Fiscais da OCDE entende que tal conceito aplica-se ao comércio eletrônico, embora tenha sido criado grupo técnico para debater o tema. Nesse grupo, houve a defesa por parte de alguns, do seguinte raciocínio: posto que o computador é distinto do software (web site), e que o site não pode ser considerado um estabelecimento permanente e ainda que o computador não é operativo sem ele, o computador não pode constituir um estabelecimento. Outros ainda entenderam que um servidor não possui mais identidade que qualquer outro meio de comunicação, como o telefone, o fax ou um banco de dados.

A todos esses argumentos, ASAIN rebate da seguinte forma: o primeiro raciocínio não prevê uma análise concreta do que seja um servidor carregado com seu software e o que pode produzir, desde onde está localizado, pois usam analogicamente a idéia de que somente pessoas com poderes para concluir contratos podem constituir um estabelecimento permanente. Se os empregados de um estabelecimento não possuem poderes para fechar contratos, não o caracterizam como tal, devendo-se analisar as funções cumpridas por tais empregados. Assim, tanto um computador vazio, quanto um edifício vazio, não permitem definir um estabelecimento permanente.

Ao segundo raciocínio refuta nas seguintes bases: se o equipamento de comunicação localizado em outro país é propriedade do usuário (que não está no negócio das telecomunicações), a razão de não ser um estabelecimento permanente não é porque não há um lugar fixo de negócios, mas sim porque a atividade desenvolvida ali é preparatória ou auxiliar, e não vai além disso.

Acerca da definição de site como estabelecimento permanente, a OCDE divulgou texto com estudos do acima referido Grupo de Trabalho, concluindo que aquele não pode constituir, por si mesmo, um estabelecimento permanente, pois lhe falta presença física em algum lugar. Unicamente pode ser assim considerado um servidor carregado com software, fixado em algum lugar determinado, e dependendo das funções ali desenvolvidas. Isso impede configurar um estabelecimento permanente quando o computador não pertence ao dono da web-site, pois este é alugado de uma empresa provedora de serviços internet.

Além disso, devem os servidores permanecer fixados em determinado lugar por um período mínimo de tempo e serem operados por pessoas. Entende ASIAIN que tal pensamento é ilógico, pois as características do negócio não a admitem. Até porque existem os contratos concluídos pelo próprio computador, em que este, previamente programado para emitir propostas, as envia a outro, que as aceita, atendidos certos requisitos. Juridicamente, não há diferença substancial entre este tipo de contrato e o tradicional, pois em ambos há manifestação de vontade, só que pré-ordenada, no primeiro caso. Muitas vezes, portanto, as operações se produzem sem a intervenção dos representantes da empresa.

GRECO, em ampla explanação sobre a questão do site como estabelecimento virtual, e à luz da disciplina do ICMS, define aquele como "um conjunto de instruções executadas por um computador que exibe, na tela de quem o acessa, determinadas informações, imagens, etc., bem como, em certas hipóteses, permite que o visitante colha ou forneça dados, solicite providências, busque maiores esclarecimentos, etc." A partir daí, o autor traça quatro realidades distintas:

- o site enquanto tal e os softwares que se encontram acessíveis através do site ou podem ser obtidos mediante download;

- o computador que hospeda este site;

- a pessoa jurídica (por exemplo, provedor de hospedagem) que coloca "no ar" o site, tornando-o acessível aos internautas; e

- o conteúdo disponibilizado no site, que o autor não analisa para não extrapolar o tema por ele abordado.

Essas realidades acima listadas, compõem variáveis que, relacionadas entre si, formam composições distintas. Exemplifica dizendo que uma pessoa jurídica pode ser a titular do site, enquanto outra é a proprietária do computador em que ele está instalado e uma terceira pode ser a que hospeda o site, colocando-o no ar. Pode ainda ocorrer de apenas uma pessoa jurídica estar nas três posições. Podem ainda existir casos em que uma pessoa jurídica ocupe duas das três posições, como por exemplo um provedor (titular do site) que também presta serviços de hospedagem de sites de terceiros, armazenados no servidor do provedor. Há duas pessoas jurídicas e um computador.Visíveis para o usuário são o hospedeiro e o site.

Outra composição possível, semelhante à anterior, quando o provedor, além de hospedar o site de um terceiro, permite que o titular do site ajuste suas funções e o opere, à distância, agregando ainda um serviço de e-mail, possibilitando que o titular do site e os visitantes troquem correspondência através dele, provedor. Ainda em uma outra hipótese, uma pessoa jurídica é titular do servidor e do site. Contrata com um provedor X apenas para que ele informe no seu site (do provedor), o endereço eletrônico (link) dele ( Y - titular do servidor), de modo que o internauta, ao clicar no link é redirecionado para o servidor de Y. Há neste caso, dois computadores, duas pessoas jurídicas e dois sites, dois locais distintos, podendo dar impressão ao internauta que acessou um único site.

Esses exemplos citados por GRECO são meramente ilustrativos, como salienta o próprio autor, posto que várias outras composições podem surgir com o avanço tecnológico. Portanto, pelo visto acima, a titularidade do site pode ser de quem possua endereço eletrônico ou de quem não o possua de modo permanente, mas utiliza o serviço de hospedagem de um terceiro.

Importante ressalva faz o autor quando diz que sequer o ".br" colocado ao final de um endereço lógico garante que o site esteja armazenado em equipamento que esteja fisicamente em solo brasileiro. Significa apenas que o titular daquele endereço está cadastrado no órgão competente de registro de endereços eletrônicos. Nessa verdadeira "virtualidade" encontra-se a maior dificuldade de adequação ao conceito comercial de estabelecimento, elemento essencial para submeter determinada atividade/renda à legislação de um Estado.

Reportando-nos ao conceito visto acima de "estabelecimento", conforme disposto na LC 87/96, desmembrando o § 3º do artigo 11, devemos ainda definir o que seja local, privado ou público, próprio ou de terceiro, onde pessoa jurídica exerça sua atividade, onde se encontrem armazenadas mercadorias. Sobre "local", aludimos ao já exposto no item 3.3. No que tange à natureza do site, se pública ou privada, para efeitos de ICMS não possui maior interesse, pois em ambos os casos há atendimento do previsto na Lei. Também quanto a ser "próprio ou de terceiro", possibilidade concreta em se tratando de sites, como vimos acima, a norma contempla ambas as possibilidades.

No que se refere ao requisito de exercício da atividade da pessoa jurídica, a LC 87/96 não faz nenhuma exigência de ordem objetiva (local onde se encontrar o centro de decisão da PJ, ou as máquinas e equipamentos) ou subjetiva (onde estiverem os funcionários). Nos sites inteligentes, como visto acima, o centro de deliberação da atividade empresarial, no que respeita ao relacionamento com o cliente, está sendo exercido no site e pelo site, o que leva GRECO a afirmar que é possível o entendimento de que este requisito também é atendido.

Quanto ao requisito de armazenamento de mercadorias, em se tratando de bens tangíveis, obviamente que inaplicável ao site; contudo, em relação aos softwares, se considerados mercadorias, acontece o contrário, pelo fato de o site poder armazená-lo, fazer download, armazenar jogos, músicas, etc. Ou seja, como diz o autor acima referido, "nesta hipótese, se o site não configurar um estabelecimento em função dos requisitos previstos na primeira parte do dispositivo, então irá configurá-lo em função de sua segunda parte." Assevera ainda que, mesmo se o caput do § 3º do artigo 11 não enquadrar o site como estabelecimento, isso poderá ocorrer pelo inciso I, uma vez que nos casos de sites inteligentes a operação foi realizada no site e também nesse local é que o software para download pode ser encontrado.

Também para efeitos de tributação de ICMS, e no que se refere à comercialização de bens tangíveis, o site pode ser visto de três diferentes maneiras, ainda seguindo a tese adotada por GRECO :

"a) pode corresponder a um mero veículo de divulgação do produto junto ao público em geral. Nesta hipótese, a atividade é só indiretamente relevante para a operação sujeita a ICMS, sendo semelhante a outras formas de publicidade que já existem;

b) ser um site que recebe pedidos de interessados na compra de determinados bens que o seu titular oferece para venda. Aqui também, a atividade desenvolvida no âmbito do site, pelo seu caráter eminentemente passivo, assemelha-se a uma mera caixa de correspondência sem que o titular esteja, positivamente, realizando a atividade de promover a circulação de mercadorias;

c) além de receber os pedidos do interessado, o site pode ser o que se denomina um "site inteligente", pois não se limita a, passivamente, receber mensagens, mas tem condições de, por si, acolher o pedido, responder ao interessado confirmando seu recebimento, verificar a disponibilidade da mercadoria, emitir a ordem de expedição para o cliente, avisar o cliente do prazo estimado para a entrega e receber o pagamento mediante o uso de cartão de crédito ou emitir um comprovante para pagamento bancário. Além disso, o site pode emitir documentos, tais como recibos, tickets, etc. Nesta hipótese, o contrato de compra e venda de mercadoria (típico fato gerador do ICMS) é celebrado no próprio site que funciona como o "ambiente" escolhido pelas partes para realizar tal operação".

A conclusão a que chega GRECO, após a extensa análise feita, é de que determinados sites, com características peculiares e funções bem definidas, satisfazem os requisitos da LC 87/96, significando com isso que a lei estadual pode vir a prever que tais sites sejam considerados estabelecimentos para fins de ICMS. Tal conclusão não implica que a legislação atual seja automaticamente aplicável, mas apenas que, materialmente, há espaço para tal disciplina, com regulação prévia através de Lei Complementar disciplinando sobre conflito de competência, como já mencionado no item 3.3 deste estudo. Usando-se o mesmo exemplo lá mencionado, pode-se afirmar que todos os Estados, ao mesmo tempo, podem entender que o fato ocorreu em seu território, dependendo do elemento de conexão adotado.

A simples existência fática dessa conexão é suficiente para instaurar um conflito de competência entre os Estados, e "isto significa que definir o elemento de conexão para fins de identificação da lei estadual aplicável e, além disto, definir a eficácia territorial das leis estaduais para o fim de alcançarem operações realizadas através de sites inteligentes é matéria típica prevista no artigo 146, I da CF-88 que supõe a edição de lei complementar para dispor a respeito."

Pelo acima exposto, entende o autor que apenas após edição de tal lei poderão os Estados considerar os sites como estabelecimentos para fins de ICMS, ressalvando que, caso todos os elementos acima apontados estejam presentes no mesmo Estado, não há óbice para tal enquadramento.

2.4 Enquadramento do Software

Um dos pontos de maior controvérsia acerca dos bens virtuais disponíveis para comercialização via Internet encontra-se na natureza jurídica do software. A discussão gira em torno de saber se tal bem é mercadoria ou serviço e, por conseqüência, se sobre as transações remuneradas que os envolvem, incidem ICMS ou ISS ou ainda a possibilidade de não incidir imposto algum.

Por software, podemos entender um termo genérico que designa programas de computador e algumas vezes também dados, em oposição a hardware. Todos os sistemas computacionais são constituídos por hardware (partes físicas de um sistema de computadores) e software, sendo que o primeiro realiza tarefas e operações, sob o controle de uma seqüência de instruções fornecidas pelo software. Este último comumente é usado como sinônimo de programa que, em conjunto, constituiriam o sistema operacional de um computador.

Como consiste em um conjunto de instruções em linguagem de máquina, não é captado pelos sentidos humanos, daí não ser considerado bem corpóreo. Da mesma forma, não pode ser entendido como construção do Direito, pois se encontra no plano material e, conseqüentemente, não é atingido pelo conceito clássico de bem incorpóreo. Assumindo-se um novo sentido para essa definição tradicional, poder-se-ia dizer que bem incorpóreo seria tudo aquilo que não é bem corpóreo, independente de ser ou não construção do Direito. Este parece ser o sentido adotado pela Sexta Diretiva da União Européia.

A base semântica do termo mercadoria utilizado para atribuir competência tributária ao ICMS, encontra-se no artigo 191, do Código Comercial. Dispõe o artigo 191, parte final, enumeração de bens incorpóreos – ações de companhia, títulos de fundos públicos e papéis de crédito comerciais. Se partirmos do pressuposto de que tal enumeração possui caráter exemplificativo, tal norma abrangeria o software. Entretanto, se considerarmos que tal dispositivo não deixa claro se pretendeu efetivamente alcançar novas figuras, sua ampliação interpretativa colidiria com o artigo 108, § 1º do CTN (veda o uso da analogia para efeitos tributários).

LUNARDELLI, reportando-se ao artigo 191 do extinto Código Comercial considera como critério definidor do conceito de mercadoria, a característica de estar o objeto relacionado a uma compra e venda, sendo pelo menos um dos partícipes comerciante e como critério acessório o fato deste objeto ser ou não bem corpóreo. Segue-se daí que o software, negociado como mercadoria, dentro dos critérios antes fixados, pode ser considerado como mercadoria para efeitos de tributação do ICMS.

O autor ainda faz referência às posições adotadas pelo Supremo Tribunal Federal, no concernente à matéria. Em Recurso Extraordinário, a Suprema Corte entendeu que as normas pertinentes ao ICMS poderiam onerar qualquer negócio jurídico que tivesse consistência econômica e, por objeto, a transferência de mercadorias entre comerciantes, industriais e produtores, independente de caracterizar-se o negócio como compra e venda mercantil, ou não.

Posteriormente, em julgados mais recentes, o STF adotou o mesmo critério para justificar a tributação do ICMS nas operações com software. Considerou a Suprema Corte que, muito embora os programas de computador sejam produtos tipicamente intelectuais, sujeitos à concessão de uso, quando negociados em larga escala pelos seus titulares (que assumiriam a condição de comerciantes), submeter-se-iam à tributação pelo ICMS. Ou seja, a figura de cessão de uso não é suficiente para descaracterizar o bem como "mercadoria". A questão que surge é saber se esta cessão de uso equivale ou não à "locação de bem móvel", prevista no item 79 da lista anexa da LC 56/87 e sobre o qual recairia o ISS. Assim decidiu o STF:

"RE: questão constitucional: âmbito de incidência possível dos impostos previstos na Constituição: ICMS e mercadoria. Sendo a mercadoria o objeto material da norma de competência dos Estados para tributar-lhe a circulação, a controvérsia sobre se determinado bem constitui mercadoria é questão constitucional em que se pode fundar o recurso extraordinário. Programa de computador ("software"): tratamento tributário: distinção necessária. Não tendo por objeto uma mercadoria, mas um bem incorpóreo, sobre as operações de "licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador" "matéria exclusiva da lide", efetivamente não podem os Estados instituir ICMS. Dessa impossibilidade, entretanto, não resulta que, de logo, se esteja também a subtrair do campo constitucional de incidência do ICMS a circulação de cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e comercializados no varejo — como a do chamado "software de prateleira" (off the shelf) — os quais, materializando o corpus mechanicum da criação intelectual do programa, constituem mercadorias postas no comércio."

Pode ainda o software ser relacionado a uma prestação de serviço específico relativo ao processamento e a programação de dados, itens especificados nos números 22 e 24 da lista anexa à LC 56/87, o que autorizaria incidência de ISS? ABREU e PRADO sugerem que a solução de tal divergência deve ser encontrada analisando-se o entendimento dos Tribunais Superiores acerca da questão. O STF, como vimos acima, em Recurso Extraordinário, reconheceu que o software produzido em grande escala, que denominou de software de prateleira, visando à comercialização, está sujeito ao ICMS. Tal diferenciação, ao limitar a incidência do referido imposto ao software de prateleira, traz outras dificuldades para a tributação do e-commerce no que tange à comercialização do software pago, via Internet, por intermédio de download, realizado exclusivamente de forma eletrônica, sem qualquer desdobramento físico.

Nesses julgados do STF, em que pese terem partido de Turmas e não do Pleno, gerando efeitos apenas para as partes envolvidas e sendo ainda passível de modificação por outras Turmas e até pelo Pleno, podem ser encontradas incongruências, como pondera CASTRO:

"Com efeito, se somente a mercadoria, como bem corpóreo, pode sofrer a incidência do ICMS, então, no "software de prateleira", composto pela base física e pelas instruções de programação (em arquivos magnéticos), a tributação estaria recaindo sobre o substrato material. Ocorre que o valor da base física é ínfimo, praticamente desprezível, na composição final do preço do produto exposto à venda. Portanto, a incidência tributária efetivamente deve ser dirigida para a parte predominante e substancial do "software de prateleira", ou seja, os programas residentes nos arquivos magnéticos. Como afirmamos, a conclusão está correta. Sobre o "software de prateleira" deve incidir o ICMS. A incidência, no caso, se dá sobre as instruções, os programas ou mesmo os arquivos magnéticos ali presentes, na forma padronizada para uso pelo destinatário final."

Contrariamente às opiniões acima, TEIXEIRA assevera que sobre as operações mercantis com software deve incidir o ISS – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência municipal, instituído pela Constituição Federal, artigo 156, inciso III. Entende que o programa de computador está classificado como serviços nos itens 22 e 24 da Lista de Serviços anexa à LC 56/87, sendo inconsistente também a diferenciação – feita pelo STF - entre software de prateleira e próprio, posto que ambos são produção da mente humana, trabalho intelectual. Logo, "intangível em sua essência e intransferível em sua consistência operacional". E continua:

"Como se vê, o ambiente tributário é hostil ao ICMS até mesmo pela gênese conceitual de seu fato gerador. Mais difícil ainda é aceitar como válida a premissa de que um "programa- padrão" – que em nada difere de um "programa - específico" – possa assumir pretensa condição de materialidade, somente pelo volume de seu consumo e por sua característica genérica, ainda que para alcançar efeitos fiscais. Não é fácil sustentar tal posição perante a lógica, a razão e a letra da lei."

Despreza, ele, a possibilidade de incidir o ICMS pelo fato de ter este tributo a obrigatoriedade de troca de titularidade do bem como fato gerador. Embasa sua afirmação na Lei 7.646/87, artigo 27, in verbis:

"Art. 27. A exploração econômica de programas de computador, no País, será objeto de contratos de licença ou de cessão, livremente pactuados entre as partes, e nos quais se fixará, quanto aos tributos e encargos exigíveis no País, a responsabilidade pelos respectivos pagamentos."

Amparando-se em ensinamentos de Geraldo Ataliba, assevera que a incidência do ICMS é sobre operações e não sobre o fenômeno da circulação, conseqüência do fato gerador do tributo, que é a operação. Cita dois julgados do STJ, no mesmo sentido.

"Tributário - ISS - programas de computador - Lei 7.649, art. 27- Decreto-lei 406/68, lista de serviços - item 24.

1. Os sistemas de computação, constituídos de programas, exprimem o resultado de atividade intelectual, de sorte que configuram bem imaterial e não mercadoria, a afastar a hipótese de incidência do Icms.

2. A exploração econômica de programa de computador, mediante contratos de licença ou de cessão, sujeita-se a cobrança do ISS (item 24, da lista de serviços, anexa ao decreto-lei 406/68).

3. Recurso desprovido."

Diante de divergências aparentemente insuperáveis, GREGO propõe duas formas de solução para o problema. Na primeira visão, que privilegia valores como propriedade e liberdade, típicas do Estado de Direito, segundo a qual o Poder Público está limitado pela Lei, o software, "seja quando apresentado agregado a um suporte físico, seja quando transferido independente de um disquete ou CD-ROM, não estaria abrangido pelo âmbito de incidência de um imposto que vise atingir operações realizadas com "mercadorias".

Contudo, se assim fosse, sobre as vendas de músicas em discos, fitas ou CDs também não poderia recair ICMS, posto que produto intelectual, o que não acontece. E ainda, a criação de um modelo de veículo novo, por exemplo, deixa de ser um processo de criação intelectual apenas porque pode ser tocado?

Por outro lado, se o critério adotado partir dos princípios que formam um Estado de Direito e que vão além dos valores de liberdade e propriedade, alcançando a igualdade e a solidariedade que, "no campo tributário, encontra na capacidade contributiva sua diretriz básica", pode-se atribuir interpretação que alcance a finalidade da norma e sua função nas relações sociais.

Ressalva o autor que o impasse colocado extrapola o conteúdo técnico, sendo em verdade uma opção ideológica (valoração de valores) que supõe uma maneira de conceber o Estado e seu relacionamento com os indivíduos. Portanto, e dentro dessa visão, o software pode ser considerado como mercadoria, se for objeto de atividade empresarial, exercida no e para o mercado. Nesta hipótese, não importa se o software é apresentado em um meio físico (disquete ou CD) ou seja transmitido via download (sem suporte físico), estaria abrangido pela materialidade da competência tributária do ICMS.

Como se pode verificar, este é um debate que extrapola os limites tributários e jurídicos, invadindo o campo político e demonstrando, uma vez mais, a necessidade urgente de decisões por parte do Legislativo, de forma a resguardar os interesses do Fisco, na medida em que estes representam os interesses de toda uma coletividade, mas também preservando os interesses individuais. A tributação no comércio eletrônico é polêmica e está longe de um consenso e ainda outra questão soma-se a esse amplo debate, que é a da tributação incidente sobre o serviço de provimento de acesso à Internet, que passaremos a tratar.

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Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARASUOL, Eliana Mara Soares. Incidência do ICMS no comércio eletrônico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 64, 1 abr. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3992. Acesso em: 22 dez. 2024.

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