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Direito eleitoral e reforma política:

Sugestões legais, jurisprudenciais e culturais à ótima concretização dos direitos de candidatura e de voto

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10/07/2015 às 10:49
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III - REFORMAS JURISPRUDENCIAIS E CULTURAIS DO E NO DIREITO ELEITORAL

O direito eleitoral devido a estrutura da nossa justiça eleitoral e do modo como ela tem procurado desincumbir sua  missão nos últimos 15 anos, tornou-se um direito fortemente “jurisprudencializado”. Um direito que para o seu escorreito entendimento e devida aplicação exige do operador jurídico que acompanhe as inúmeras mudanças que a jurisprudência “positiva” em cada eleição.

Além de uma legislação fragmentária que tornou inócua muitas disposições do velho Código Eleitoral de 1965, o direito eleitoral sofre a mudança não só da jurisprudência, mais de outro fenômeno encontrável somente na justiça eleitoral: o caráter inovador primário de muitas resoluções do TSE, que alteram, ao talante discricionário de 07 ministros sem investidura popular, o próprio direito positivo. As críticas a essa tendência arredia ao Direito Constitucional brasileiro, expusemos em nosso artigo Abuso do Poder Regulamentar e TSE: contas eleitorais rejeitadas e quitação eleitoral - as eleições de 2012 (reflexos do “moralismo eleitoral”). Resenha Eleitoral – Revista Eletrônica do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, n. 3, jan./jun de 2012, acesso em 28.07.13.

Algumas “mudanças jurisprudenciais” já foram sugeridas no capítulo antecedente, e agora apontaremos outras, assim como indicaremos os pontos para “reforma cultural” em torno do direito eleitoral, para se prestigiar ótima concretização legislativa e judicial dos direitos fundamentais de candidatura e de voto.

17º- Mudança na interpretação retrocessiva quanto ao direito de voto, relativamente à ideia de se aplicar o artigo 81, § 1º, da CF[62], quando houver dupla vacância, por causa eleitoral, nos dois últimos anos de mandato, das chefias de executivo: hoje a regra que vigora, a depender do que estiver positivado nas Leis Orgânicas Municipais, é de que haja eleição indireta, quando a vacância ocorrer no último biênio, e direta, quando se der no primeiro. E o momento para se levar em conta é o da primeira decisão judicial tomada cassando registro, diploma ou mandato, ainda que suspensa por cautelares ou efeito ex legem. Decisão recente do TSE fixou (não sabemos para até quando valerá tal entendimento...) o critério da decisão judicial sancionadora, se prolatada no primeiro biênio ou segundo, levará a eleição direta ou indireta, respectivamente[63]. Há uma proposição de alteração jurisprudencial do Ministro Dias Toffoli no sentido de que até o terceiro ano, ocorrendo vacância por causa eleitoral, a eleição deverá ser direta.[64]

18º- Mudança da visão da justiça eleitoral e do ministério público (mudança da pré-compreensão) de que justificam suas existências pelo número de registros que indeferem ou pelo quantum de registros, diplomas ou mandatos que cassam. A propaganda da justiça eleitoral divulgada em 2014, pelo TSE e MP, parte de um pressuposto triste: a política é o espaço da corrupção, os candidatos são, em regra, corruptores, e o eleitor um hipossuficiente destituído de capacidade de escolha moral, facilmente corrompível.

19º- Interpretação das leis materiais e processuais eleitorais no sentido crescente de maior concretização dos direitos políticos de candidatura e voto como direitos fundamentais. Colocação no devido lugar, a partir desses direitos fundamentais, da ideia ludibriante de moralidade das eleições, vida pregressa e modelação moral do voto do eleitor. Cuidado com o neofascismo decorrente do moralismo eleitoral e da relativização do direito positivo pela moral.

20º- Abandono de falsas ideias: do pré-conceito do “candidato inimigo”[65], do “eleitor infante” e da “demonizacão da democracia representativa”. Abandono dos neofascismos involuntários, retomados nas práticas institucionais por falta de perspectiva histórica e por esquecimento dos ideais de liberdade e respeito às garantias legais, constitucionais e convencionais conquistadas.

21º- Olharmos para a história das democracias ocidentais e para o direito de voto e de candidatura como direitos fundamentais que asseguram a protetividade de todos os demais direitos, como nos demonstrou a história de Mandela e África do Sul, a luta pelas diretas já no Brasil e mesmo as lutas de Martin Luther King pelo direito de voto dos negros na década de 50 e 60 nos EUA. E como nos ensina o riquíssimo texto, componente do novo evangelho do direito eleitoral brasileiro, de Néviton Guedes, ao comentar os artigos 14 a 16, da Constituição Federal:

“Com razão já se disse que os demais direitos inseridos numa Constituição, ainda que mais básicos, seriam ilusórios se o direito de participar das decisões políticas fundamentais da comunidade nacional não for assegurado. Nos Estados Unidos, por exemplo, já em 1886, a Suprema Corte daquele país pôde afirmar a qualidade de direitos fundamentais aos direitos políticos, precisamente, porque neles reconheceu, em última e mais elevada instância, a salvaguarda e defesa de todos os demais direitos. Portanto, não parece haver dificuldade em se aceitar que tanto o direito de votar como o de ser votado são daqueles direitos essenciais à preservação dos demais direitos fundamentais (como preferem os norte-americanos, preservative of all rights).” [66]

22º- Curarmo-nos, enquanto sociedade, da esquizofrenia política reinante: queremos o melhor da política e dos políticos, mas quem de nós se lança para política ou para ela aconselha que seus filhos a adentrem, ou a mocidade em geral a procure. A mídia e a opinião pública desenham ao País um quadro catastrófico da política e dos políticos, igualando todos os mandatários pelo pior critério de avaliação possível. Necessidade de se estimular de que os políticos que amam o ofício nele permaneçam e estímulo para que novas lideranças apareçam no cenário político e partidário. Desinteligência sobre o espaço da política na vida republicana: queremos política, mas não queremos fazê-la, vivê-la ou cooperar com ela. Fazemos pouco e pedimos muito.

23º- Abandonarmos a ideia de que a moralização da política se dê por repressão a partir do Direito Eleitoral. De que o Direito Eleitoral deverá curar as insuficiências dos processos de improbidade e penais criminais para excluir da vida pública pessoas que não mereçam a chancela popular por práticas ilícitas.

24º- Conscientizarmo-nos que o foco para a mudança é a educação, e a educação para servir a República, a educação cívica e civilizatória, com a divulgação dos valores do constitucionalismo e da democracia para todas as classes sociais, plasmando a consciência coletiva para valorizar as instituições republicanas, sem atitudes que enalteçam a democracia retoricamente, mas que, em termos pragmáticos, a enfraqueçam.


IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sem esgotar todos os aspectos que a temática tratada poderia suscitar, procuramos trazer ao Direito Eleitoral proposições que operadores do direito e legisladores devem atentar. As ideias expostas constituem pontos de sugestão ao Congresso Nacional, ao TSE e a OAB, para serem refletidos quando da reforma política de nosso Direito Eleitoral Positivo. Sobre tais itens nossa opinião pública e nossos juízes eleitorais, assim como nossos legisladores devem refletir a fundo, tanto de lege lata, quando de lege ferenda, colocando-os na agenda política nacional. Pois é necessário tanto reformas na postura hermenêutica do judiciário eleitoral quanto na legislação eleitoral. Reformas que preservem a efetividade do direito de candidatura e assegurem estabilidade ao decidido pelas urnas populares, com maior respeito ao direito político fundamental de voto. Judiciário, legislador e sociedade civil precisam contabilizar com mais vagar e preocupação o real valor desses dois direitos políticos fundamentais pilares de nossa democracia representativa.


V – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico [Teoria dell’ordinamento giuridico]. Trad. Cláudio de Cicco e Maria Celeste C. J. Santos. São Paulo/Brasília: Polis/UnB, 1989. 184 p.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional, 6 ed., Coimbra, Almedina, 1993,  p. 372.

COSTA, Adriano Soares da. Instituições de Direito Eleitoral. 9ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2013.

---. “Breves notas sobre o quinquídio decadencial das representações do art. 96 da lei eleitoral”, acesso em 29.06.15, 08:32, http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tre-pr-revista-parana-eleitoral-n060-2006-adriano-soares-da-costa.

---. “A sanção de inelegibilidade e o trânsito em julgado (a nova "inelegibilidade processual"). http://adrianosoaresdacosta.blogspot.com.br/2011/03/sancao-de-inelegibilidade-e-o-transito.html. Publicação de 26.03.2011, acesso em 30.06.15, 13:13h.

ESPINDOLA, Ruy Samuel. Democracia participativa: autoconvocação de referendos e plebiscitos pela população. Análise do caso brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3153, 18 fev. 2012. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/21124>. Acesso em: 18 fev. 2012.

---. A Constituição como garantia da democracia. O papel dos princípios constitucionais. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3146, 11 fev. 2012. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/21059>. Acesso em: 11 fev. 2012.

--- A Lei Ficha Limpa em revista e os empates no STF. O dilema entre o politicamente correto e o constitucionalmente sustentável. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2711, 3 dez. 2010. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/17925>. Acesso em: 1 maio 2011.

---. STF, insegurança jurídica e eleições em 2012: até quando o embate entre moralistas e constitucionalistas em torno da lei ficha limpa? Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2827, 29 mar. 2011. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/18790>. Acesso em: 2 maio 2011;  

----. Lei Ficha Limpa estadual e limites constitucionais de sua produção legislativa. Análise da inacessibilidade a cargos em comissão por condenados por improbidade administrativa sem trânsito em julgado: o caso da lei catarinense. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3051, 8 nov. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20385>. Acesso em: 8 nov. 2011;

----. Abuso do poder regulamentar e TSE: contas eleitorais rejeitadas e quitação eleitoral. As eleições de 2012 (reflexos do “moralismo eleitoral”). Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3228, 3 maio 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21674>. Acesso em: 6 maio 2012.

---. Justiça Eleitoral contramajoritária e soberania popular. A democrática vontade das urnas e a autocrática vontade judicial que a nulifica. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3382, 4 out. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22745>. Acesso em: 5 out. 2012.

---. Princípios constitucionais e atividade jurídico-administrativa: anotações em torno de questões contemporâneas. Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, n. 02, jul./dez. 2003, p. 393-426.

---. A Constituição como Garantia da Democracia: o papel dos Princípios Constitucionais. Revista de Direito Constitucional e Internacional. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política. São Paulo: Revista dos Tribunais/Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, ano 11, abr./jun. 2003, n. 44, p 75/86.

---. Princípios e retorno do pêndulo – crítica ao chamado neoconstitucionalismo. Revista Interesse Público. Belo Horizonte: Fórum, n. 87, ano 16, set./out. 2014, p. 63-67.

---. Conceito de Princípios Constitucionais: elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada. 2º ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. 288 p.

GUEDES, Néviton. Quem só pode se defender dos fatos acaba sendo atingido pelo Direito, publicação de 24.09.14, 20:47 h., acesso em 17.02.15, 14:00 h., http://www.conjur.com.br/2014-set-23/constituicao-poder-quem-defender-fatos-acaba-sendo-atingido-direito.

---. Comentários aos artigos 14 a 16. in: - SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK, Lênio, et all. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina/IDP, 2014. p. 655-689.

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito [Reine Rechtslehre]. Trad. João Baptista Machado. 3. ed. São Paulo : Martins Fontes, 1991. 371 p.

KING, Martin Luther. “Nos deixem votar” in: - “Os melhores discursos de Martin Luther King: um apelo à consciência.”, editado no EUA por Clayborne Carson e Kris Shepard, trad. Sergio Lopes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006, 179 p, p. 49-54.

LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 2. ed. [Methodenlehre der Rechtswissenschaft]. Trad. de José Lamego. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. 620 p.

MAZZUOLI, Valério. O Controle de Convencionalidade das Leis. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

MENDES, Gilmar Ferreira. Questões Fundamentais de Técnica Legislativa, inserido na Revista Trimestral de Direito Público, nº 01, 1993, p. 262-263.

PEREGRINO, Marcelo Ramos. O controle de convencionalidade da lei da ficha limpa - direitos políticos e inelegibilidades. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2015.

---. Direito Eleitoral do Inimigo. Site empório do direito, publicado em 11.04.15, acesso em 30.06.15, 14:12h., http://emporiododireito.com.br/direito-eleitoral-do-inimigo-por-marcelo-peregrino/.

SANTOS, Rodrigo Valgas dos. Procedimento Administrativo nos Tribunais de Contas e Câmaras Municipais – contas anuais, princípios e garantias constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2006.


Notas

[1] Este artigo foi finalizado em 30.06.15. Seu esboço inicial serviu de base para palestra apresentada na XXII Conferência Nacional dos Advogados, em 20 de outubro de 2014, no Rio de Janeiro, em painel sobre “Reforma Política Democrática e Direito Eleitoral”. O produto ampliado, aprofundado e final será apresentado ao V Congresso de Ciência Política e Direito Eleitoral do Piauí, que ocorrerá em Teresina, nos dias 06, 07 e 08 de agosto de 2015, como fundamento à exposição intitulada "Direito Eleitoral e Direitos Políticos Fundamentais: reformas necessárias à uma concretização constitucionalmente adequada."

[2] Remetemos ao leitor para nosso artigo que tematiza democracia representativa e democracia participativa: Democracia participativa: autoconvocação de referendos e plebiscitos pela população. Análise do caso brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3153, 18 fev. 2012. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/21124>. Acesso em: 18 fev. 2012. E também ao que trata de democracia e sua relação com os princípios constitucionais: A Constituição como garantia da democracia. O papel dos princípios constitucionais. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3146, 11 fev. 2012. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/21059>. Acesso em: 11 fev. 2012.

[3] No último lustro produzimos uma série de artigos que tematizam, criticamente, muitos dos aspectos salientados nesse breve introito: A Lei Ficha Limpa em revista e os empates no STF. O dilema entre o politicamente correto e o constitucionalmente sustentável. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2711, 3 dez. 2010. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/17925>. Acesso em: 1 maio 2011; STF, insegurança jurídica e eleições em 2012: até quando o embate entre moralistas e constitucionalistas em torno da lei ficha limpa? Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2827, 29 mar. 2011. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/18790>. Acesso em: 2 maio 2011;  Lei Ficha Limpa estadual e limites constitucionais de sua produção legislativa. Análise da inacessibilidade a cargos em comissão por condenados por improbidade administrativa sem trânsito em julgado: o caso da lei catarinense. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3051, 8 nov. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20385>. Acesso em: 8 nov. 2011; Abuso do poder regulamentar e TSE: contas eleitorais rejeitadas e quitação eleitoral. As eleições de 2012 (reflexos do “moralismo eleitoral”). Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3228, 3 maio 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21674>. Acesso em: 6 maio 2012. Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/21674/abuso-do-poder-regulamentar-e-tse-contas-eleitorais-rejeitadas-e-quitacao-eleitoral#ixzz1u4OY6zDe; Justiça Eleitoral contramajoritária e soberania popular. A democrática vontade das urnas e a autocrática vontade judicial que a nulifica. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3382, 4 out. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22745>. Acesso em: 5 out. 2012.

[4] Vale ler esse discurso, publicado no Brasil, com edição  de coletânea “Os melhores discursos de Martin Luther King: um apelo à consciência.”, editado por Clayborne Carson e Kris Shepard, trad. Sergio Lopes, pela Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2006, 179 p. O discurso “Nos deixem votar”, encontra-se nas páginas 49-54.

[5] Como registro, indicamos o seguinte precedente: ED-AgR-REspe - Embargos de Declaração em Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 18354 - Itapira/SP - Acórdão de 04/06/2013 - Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA - Dje 1/7/2013. Ementa: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. SUPRESSÃO, SEM EFEITOS MODIFICATIVOS. 1. (...) DE ACORDO COM A JURISPRUDÊNCIA MAJORITÁRIA DESTE TRIBUNAL APLICADA NAS ELEIÇÕES DE 2012, O NÃO PAGAMENTO DE MULTA ELEITORAL ENSEJA O RECONHECIMENTO DA FALTA DE QUITAÇÃO ELEITORAL, E QUE TAL PROVIDÊNCIA, APÓS O PEDIDO DE REGISTRO, NÃO AFASTA O ÓBICE À CANDIDATURA, POR NÃO SE TRATAR DE CAUSA DE INELEGIBILIDADE. 2. (...) O CONCEITO DE QUITAÇÃO ELEITORAL ESTÁ PREVISTO NO § 7º DA REFERIDA DISPOSIÇÃO LEGAL E ABRANGE TANTO AS MULTAS DECORRENTES DAS CONDENAÇÕES POR ILÍCITOS ELEITORAIS QUANTO ÀS PENALIDADES PECUNIÁRIAS DECORRENTES DE AUSÊNCIA ÀS URNAS. (...).”

E, com base nesse entendimento, tomemos em conta o valor da multa ao eleitor faltoso as urnas, como explica o site do TRE-SC, http://www.tre-sc.gov.br/site/eleitores/informacoes/arquivo/2012/junho/artigos/multas-eleitorais/index.html, acesso em 11.02.15, 10:01 h, que revela o seguinte: Valores atuais das multas eleitorais -

Situação

Valor mínimo (R$)

Valor máximo (R$)

Valor máximo x10 (R$)

Eleitor faltoso (art. 7º, C.E.)

1,05

3,51

35,14

[6] Conforme Código Eleitoral, artigo 7º, caput:  “O eleitor que deixar de votar e não se justificar perante o juiz eleitoral até 30 (trinta) dias após a realização da eleição, incorrerá na multa de 3 (três) a 10 (dez) por cento sobre o salário-mínimo da região, imposta pelo juiz eleitoral e cobrada na forma prevista no art. 367. (Redação dada pela Lei nº 4.961, de 1966).”

[7] Esse inaceitável entendimento foi aplicado até a eleição de 2012, sofrendo mutação positiva no ano de 2014: “ELEIÇÕES 2014. RECURSO ORDINÁRIO. QUITAÇÃO ELEITORAL. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL. CABIMENTO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. MULTA. AUSÊNCIA ÀS URNAS. FORMALIZAÇÃO DO PEDIDO DE REGISTRO. PAGAMENTO POSTERIOR. ART. 11, § 10º, DA LEI Nº 9.504/97. INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. REGISTRO DEFERIDO. (...). 2. O pagamento de multa eleitoral após a formalização do registro, desde que ainda não esgotada a instância ordinária, preenche o requisito da quitação eleitoral, por também ser aplicável o art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97 às condições de elegibilidade, e não apenas às causas de inelegibilidade (Precedente: REspe 809-82, Rel. Min. Henrique Neves, em sessão de26.8.2014). 3. Em respeito ao princípio da segurança jurídica, não se abarca esse entendimento jurisprudencial aos registros de candidatura que se refiram a casos anteriores ao pleito de 2014.(...).” RO - Recurso Ordinário nº 52552 - Campo Grande/MS Relatora Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, j. 03/09/2014

[8] Vejam suas palavras que explicam o conceito crítico de moralismo eleitoral:

“Já há algum tempo tenho chamado a atenção para o que denominei de "moralismo eleitoral", um fenômeno perigoso que tem invadido a cidadela da jurisprudência eleitoral. (...). O moralismo eleitoral transforma todos os debates jurídicos eleitorais em debates morais e - o que é tanto pior! - sempre no compromisso de interditar o mais que possível que os políticos sejam... políticos. Há sempre um sentimento embutido nessa lógica: entrou na política, bandido é. E, na ânsia de higienização da política, deseja-se acabar com os políticos, o que nada mais é do que selar o fim da própria democracia. E, nessa concepção de mundo, esqueceram de um pequeno detalhe: o expurgo a ser feito deveria ser através do voto, salvo em casos extremos de crimes adrede positivados. Mais, em uma era da entronização acrítica do "fichalimpismo", o moralismo eleitoral reina absoluto, sem compromisso nenhum com o direito positivo vigente. É a justiça de mão própria togada, armada do direito achado na rua.

Trata-se de uma marcha insana de muitos em defesa do moralismo eleitoral, para a instauração de uma democracia sem votos, sem eleitor. Uma visão ingênua, casuística, em certo sentido reacionária. É a tentativa de construção de uma democracia tutelada, ao fim e ao cabo, de uma democracia sem previsibilidade, em que a segurança jurídica é um mal a ser combatido, em que as garantias individuais não passam de um estorvo pequeno burguês.

É isso, afinal, do que se trata: o moralismo eleitoral não respeita a Constituição Federal nem o ordenamento jurídico. Trata-se, pois, de uma adulteração da interpretação das normas jurídicas eleitorais pela aplicação de critérios acentuadamente morais, muitas vezes em aberta divergência com o próprio ordenamento jurídico posto. Em nome de princípios defendidos por determinadas minorias (ou mesmo maiorias, pouco importa) afasta-se a aplicação de determinada norma jurídica positivada, recriando antidemocraticamente o próprio ordenamento jurídico, sem observar os meios próprios para tanto. Esse fenômeno crescente de, a partir de uma leitura principiológica da Constituição, enfraquecer a própria positividade das normas infraconstitucionais ao ponto limite de deixarem elas de ser vinculativas para o aplicador, passou a ser sentido de modo alarmante na leitura que vem se fazendo de relevantes questões eleitorais .

O moralismo eleitoral parte normalmente de uma compreensão equivocada da teoria da inelegibilidade, que se põe a serviço de um certo justiçamento antidemocrático, ainda que movido pelas melhores intenções. Não há dúvidas que é necessário depurarmos as nossas instituições, porém essa é uma tarefa complexa, que não se esgota em medidas irrefletidas, movidas por um certo voluntarismo, que de tanto simplificar os problemas apenas cria novos problemas.

Ora, em uma democracia, quem deve afastar o mau político é o eleitor pelo voto. O critério de definição? Cabe ao eleitor definir. Porém, essa minoria não acredita na democracia, não acredita no eleitor: prefere, então, criar critérios de exclusão previamente. Antidemocraticamente. (...). Ah, mas o eleitor é analfabeto, dirão alguns. Ah, mas o eleitor vende o voto, dirão outros. Certo, então proibamos o pobre e o analfabeto de votar. Quem terá coragem de abertamente defender essa tese absurda? Ninguém, por evidente. Então, fingem defender a democracia, quando na verdade pretendem é criar, às avessas, uma espécie de sufrágio censitário. O eleitor vai votar, é certo, mas em uma lista antes já submetida a um processo de higienização ideológica. A isso chamo de moralismo eleitoral, essa forma fundamentalista de aplicação de uma certa moral ao processo eletivo.

Mas o hipermoralismo eleitoral não quer saber o que é juridicamente sustentável ou não; interessa a sua sanha macartista, ainda que a Constituição seja desrespeitada.  Este é o ponto: estamos sempre criando atalhos para sustentar essas normas inconstitucionais, mas com apelo popular, conferindo, assim, ao ordenamento jurídico um tratamento bizarro, sem pé nem cabeça, alimentando a insegurança jurídica. É disso que se trata. A mim me parece que não podemos negociar a aplicação adequada da Constituição; devem-se evitar soluções casuísticas que, ao final, se voltarão contra a própria sociedade.” (Instituições de Direito Eleitoral, 9 ed., Fórum, p. 16-17)

[9] Por todos, ver: KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito [Reine Rechtslehre]. Trad. João Baptista Machado. 3. ed. São Paulo : Martins Fontes, 1991. 371 p; LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 2. ed. [Methodenlehre der Rechtswissenschaft]. Trad. de José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. 620 p; BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico [Teoria dell’ordinamento giuridico]. Trad. Cláudio de Cicco e Maria Celeste C. J. Santos. São Paulo/Brasília: Polis/UnB, 1989. 184 p.

[10] Atualmente este prazo vai até a data da diplomação, cf. art. 73, § 12º, da Lei 9.504/97, o que pode ocorrer até 19 de dezembro, pelo calendário eleitoral do TSE, ou seja, dois meses e meio depois da eleição concluída, o que permite um “armazenamento tático” dos adversários do candidato eleito. No passado, uma saudável jurisprudência eleitoral, estimulada pelo então Ministro Cesar Peluso, chegou a especificar que em 05 dias, contados do conhecimento provado ou presumido do fato, perderia o interesse de agir o proponente da demanda eleitoral, para coibir referidas “táticas”. Ver TSE Ac. nº 748, Questão de Ordem em Recurso Ordinário, Rel. Min. Luiz Carlos Lopes Madeira, publicado no DJ de 26/08/2005, p. 174: “Representação eleitoral. Condutas vedadas. Lei nº 9.504/97, art. 73. Questão de ordem. Acolhimento. – O prazo para o ajuizamento de representação por descumprimento das normas do art. 73 da Lei das Eleições é de cinco dias, a contar do conhecimento provado ou presumido do ato repudiado pelo representante. – Recurso ordinário. Representação. Intempestividade. Recurso desprovido”. Vale registrar que o Mestre Adriano Soares da Costa, em notável artigo, combateu “a forma jurídica” como foi instituído esse prazo: “Breves notas sobre o quinquídio decadencial das representações do art.96 da lei eleitoral”, acesso em 29.06.15, 08:32, http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tre-pr-revista-parana-eleitoral-n060-2006-adriano-soares-da-costa. Concordamos com as críticas de Soares da Costa quanto a forma, mas referendamos as preocupações postas na motivação da questão de ordem que suscitou o acórdão do TSE no R.O. n. 748, de 2005.

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[11] Atualmente é assim: art. 41-A, § 3º, da Lei 9.504/97: “A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009).”

[12] Em seu afamado Instituições de Direito Eleitoral, 9ª ed., Belo Horizonte, Fórum, 2013, p. 304:

“... a AIJE apenas pode ser ajuizada contra candidato beneficiado por abuso de poder econômico, abuso de poder político, uso indevido dos meios de comunicação social etc., na forma do caput do art. 22 da LC n. 64/90. Se a ação deve ter, obrigatoriamente, como um dos sujeitos passivos, o candidato beneficiado pelo abuso de poder, além de quem lhe deu causa – se não foi apenas ele próprio -, resta claro, de uma luminosidade solar, que não pode ser a AIJE proposta contra quem ainda não tenha sido indicado em convenção partidária e pedido de registro de sua candidatura, qualificando-se como pré-candidato oficial.

Por essa razão, com supedâneo em nosso direito positivo, entendo que a AIJE deve ser proposta contra fatos ilícitos ocorridos após o pedido de registro de candidatura, podendo ser manejada até a diplomação.

Sendo assim, temos que advertir que o abuso de poder econômico ou abuso de poder político praticado antes do pedido de registro de candidatura, além daquelas inelegibilidades não reputadas constitucionais, devem ser atacadas pela ação de impugnação de registro de candidatura, sob pena de preclusão. A AIRC é a ação própria, concebida pelo ordenamento jurídico, para fustigar os fatos geradores de inelegibilidade ocorridos antes do pedido de registro de candidatura, inclusive, e com maioria de razão, aqueles previstos pela Lei Complementar n. 64/90, de escalão infraconstitucional, mercê da possibilidade legal de sua preclusão.”

[13] “RECURSO ESPECIAL. ARGUICAO DE ABUSO DE PODER POLITICO E ECONOMICO. IMPUGNACAO AO REGISTRO. PRAZO DECADENCIAL. EXTINCAO DO PROCESSO. ART. 3 DA LC 64/90. EM SE TRATANDO DE ALEGACAO DE ABUSO DO PODER POLITICO E ECONOMICO, QUE TERIA OCORRIDO EM PRACA PUBLICA, A VISTA DE TODOS, ANTES DO REGISTRO, E MESMO DA ESCOLHA DOS CANDIDATOS A SENADOR, A GOVERNADOR E A VICE-GOVERNADOR, E FORA DE DUVIDA QUE, NAO TENDO ELA SIDO VEICULADA POR MEIO DE IMPUGNACAO AO REGISTRO DAS RESPECTIVAS CANDIDATURAS, VERIFICOU-SE A DECADENCIA, RAZAO PELA QUAL OUTRO NAO PODERIA TER SIDO O DESFECHO DA REPRESENTACAO SERODIAMENTE MANIFESTADA, SENAO A EXTINCAO DO PROCESSO.  RECURSO NAO CONHECIDO. (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 12676, Acórdão nº 12676 de 18/06/1996, Relator(a) Min. JOSÉ BONIFÁCIO DINIZ DE ANDRADA, Relator(a) designado(a) Min. ILMAR NASCIMENTO GALVÃO, Publicação: RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 8, Tomo 2, Página 119 DJ - Diário de Justiça, Data 16/08/1996, Página 28134 )”

[14] Atualmente, nos processos registros, não se admite isso, como demonstra o seguinte julgado:

“ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. Recurso Especial. REGISTRO DE CANDIDATURA INDEFERIDO. DEPUTADO ESTADUAL. AUSÊNCIA DE DOCUMENTO INDISPENSÁVEL. JULGAMENTO CONVERTIDO EM DILIGÊNCIA. IRREGULARIDADE NÃO SANADA. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO COM O RECURSO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. FUNDAMENTOS NÃO INFIRMADOS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. 1. A ausência de certidão criminal da Justiça Estadual de 1º grau "da circunscrição na qual o candidato tenha o seu domicílio eleitoral", exigida no art. 27, inciso II, alínea b, da Res.-TSE nº 23.405/2014, mesmo após a abertura de prazo para a sua apresentação, implica o indeferimento do pedido de registro de candidatura. 2. Admite-se, nos processos de registro de candidatura, a apresentação de documentos até a instância ordinária ainda que tenha sido anteriormente dada oportunidade ao requerente para suprir a omissão, não sendo possível conhecer de documentos apresentados com o recurso especial. Precedentes. (...).” (Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 45540 - Rio De Janeiro/RJ - Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, j. 30/10/2014).

[15] “Rejeição de contas e fato superveniente à interposição do recurso especial. O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, reafirmou o que foi decidido no julgamento do REspe nº 263-20, em 13.12.2012, no sentido de que os fatos supervenientes à propositura da ação, que influenciem no resultado da lide, só podem ser considerados até o julgamento em segundo grau de jurisdição, não sendo possível a arguição destes em sede de recurso especial. Na espécie vertente, o candidato obteve provimento do recurso de revisão pelo Tribunal de Contas, que passou a considerar regulares com multa as contas reexaminadas. Entretanto, a decisão favorável foi superveniente à interposição do recurso especial eleitoral e não afastou a inelegibilidade do candidato. Nesse entendimento, o Tribunal, por unanimidade, desproveu o agravo regimental. Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº 112-28, Mineiros/GO, rel. Min. Nancy Andrighi, em 7.2.2013.”

[16] “Concessão de liminar afastando condenação por improbidade administrativa e prazo para consideração das causas supervenientes ao registro que afastam a inelegibilidade. (Extraído do Informativo nº 25/2014.)  O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral, por maioria, assentou que a concessão de liminar, até a data da diplomação, suspendendo os efeitos de condenação por improbidade administrativa, causa do indeferimento de candidatura, constitui fato superveniente a permitir o registro do candidato. Ressaltou o Colegiado ser caso de aplicação da norma constante do art. 26-C da Lei Complementar nº 64/1990, que preconiza: O órgão colegiado do tribunal ao qual couber a apreciação do recurso contra as decisões colegiadas a que se referem as alíneas d, e, h, j, l e n do inciso I do art. 1º poderá, em caráter cautelar, suspender a inelegibilidade sempre que existir plausibilidade da pretensão recursal e desde que a providência tenha sido expressamente requerida, sob pena de preclusão, por ocasião da interposição do recurso. Destacou que, estando em curso o processo eleitoral e não havendo trânsito em julgado da decisão de indeferimento do registro de candidatura, cabe conhecer provimento judicial liminar deferido após as eleições, que afasta a causa de indeferimento do registro do candidato. Enfatizou ainda que o conhecimento de fatos supervenientes ao pedido de registro tem sido admitido por este Tribunal nas hipóteses de reconhecimento de inelegibilidade, motivo pelo qual haveria razão para conhecê-los nos casos de afastamento da inelegibilidade. Vencida a Ministra Maria Thereza, que rememorava entendimento deste Tribunal no sentido de ser a data das eleições termo limiar para serem considerados no processo de registro de candidatura fatos posteriores ao pedido, alteradores da condição de elegibilidade do candidato. O Tribunal, por maioria, acolheu os embargos de declaração, com efeitos modificativos, para deferir o registro de candidatura do embargante, nos termos do voto do relator. Recurso Ordinário nº 294-62, Aracaju/SE, rel. Min. Gilmar Mendes, em 11.12.2014.”

[17] Exemplo emblemático: o tempo de contagem da inelegibilidade, se ânuo, na forma posta no Código Civil ou se por ano cheio. Oscilou a Corte entre essas orientações, e, “ultimamente”, vigora o primeiro entendimento, depois de “indas e vindas”. Entendimento mais ajustado a uma interpretação liberal, no sentido de que restrições a direito devem receber interpretação restritiva, e nunca ampliativa, como era o caso defendido na ideia de “ano cheio”. Vingou então a interpretação liberal: conta-se o ano da data da última eleição.

[18]“ELEIÇÕES 2014. RECURSO ORDINÁRIO. QUITAÇÃO ELEITORAL. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL. CABIMENTO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. MULTA. AUSÊNCIA ÀS URNAS. FORMALIZAÇÃO DO PEDIDO DE REGISTRO. PAGAMENTO POSTERIOR. ART. 11, § 10º, DA LEI Nº 9.504/97. INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. REGISTRO DEFERIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, aplica-se o princípio da fungibilidade, para receber como especial o recurso ordinário interposto contra acórdão de TRE que verse sobre condição de elegibilidade. In casu, quitação eleitoral. 2. O pagamento de multa eleitoral após a formalização do registro, desde que ainda não esgotada a instância ordinária, preenche o requisito da quitação eleitoral, por também ser aplicável o art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97 às condições de elegibilidade, e não apenas às causas de inelegibilidade (Precedente: REspe 809-82, Rel. Min. Henrique Neves, em sessão de26.8.2014).3. Em respeito ao princípio da segurança jurídica, não se abarca esse entendimento jurisprudencial aos registros de candidatura que se refiram a casos anteriores ao pleito de 2014. 4. Recurso provido, para deferir o registro de candidatura.” RO - Recurso Ordinário nº 52552 - Campo Grande/MS Relatora Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, j. 03/09/2014

[19] Ver nosso artigo, para aprofundar esses aportes críticos: “Justiça Eleitoral contramajoritária e soberania popular. A democrática vontade das urnas e a autocrática vontade judicial que a nulifica”. Revista Brasileira de Direito Eleitoral. RBDE. Belo Horizonte: Fórum, ano 5, n. 8, jan./jun, 2013.

[20] Conforme Código Eleitoral: “Art. 22. Compete ao Tribunal Superior: I - Processar e julgar originariamente: (...). j) a ação rescisória, nos casos de inelegibilidade, desde que intentada dentro de cento e vinte dias de decisão irrecorrível, possibilitando-se o exercício do mandato eletivo até o seu trânsito em julgado. (Incluído pela  LCP nº 86, de 1996).”

[21] “Artigo 8º - Garantias judiciais, 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, (...) 2. (...). toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: (...). f) direito da defesa de inquirir as testemunhas presentes no Tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas que possam lançar luz sobre os fatos; (...)”.

[22] Lei complementar 64/90, artigo 22: “V - findo o prazo da notificação, com ou sem defesa, abrir-se-á prazo de 5 (cinco) dias para inquirição, em uma só assentada, de testemunhas arroladas pelo representante e pelo representado, até o máximo de 6 (seis) para cada um, as quais comparecerão independentemente de intimação”.

[23] Decreto nº 592 de 5 de julho de 1992.

[24] “Art. 71. Encerrada a discussão, o Presidente tomará o voto do Relator e, em seguida, o dos demais Juízes, respeitada a antiguidade a partir do Relator, sendo aquele o último a votar. § 1º Na hipótese de ausência de Juiz ou nos casos de impedimento, suspeição, vaga ou licença médica, e desde que inviável a convocação de suplente, se a votação encerrar em empate prevalecerá o ato ou a decisão impugnada, ressalvado o disposto no § 2º do art. 57 deste Regimento Interno.”

[25] Código de Processo Penal: “Art. 615.  O tribunal decidirá por maioria de votos.  § 1o  Havendo empate de votos no julgamento de recursos, se o presidente do tribunal, câmara ou turma, não tiver tomado parte na votação, proferirá o voto de desempate; no caso contrário, prevalecerá a decisão mais favorável ao réu.”

[26] “Prefeito itinerante” e segurança jurídica – 11 – “Desta feita, sobrelevou que a importância fundamental do princípio da segurança jurídica para regular o transcurso dos processos eleitorais plasmar-se-ia no postulado da anterioridade eleitoral, positivado no art. 16 da CF (“A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”). Então, as decisões do TSE que implicassem alteração de jurisprudência, no curso do pleito eleitoral ou logo após o seu encerramento, não incidiriam de imediato no caso concreto e somente possuiriam eficácia sobre outras situações no pleito eleitoral posterior. Finalizou que a decisão do TSE em tela, apesar de ter asseverado corretamente que seria inelegível para o cargo de prefeito o cidadão que exercera por 2 mandatos consecutivos cargo de mesma natureza em município diverso, não poderia retroagir a fim de alcançar diploma regularmente concedido a vencedor das eleições de 2008 para prefeito de outra municipalidade. Aquilatou que se deveria assegurar a conclusão do mandato a ele. Por fim, assentou, sob o regime da repercussão geral, que: a) o art. 14, § 5º, da CF, interpretar-se-ia no sentido de que a proibição da segunda reeleição seria absoluta e tornaria inelegível para determinado cargo de Chefe do Poder Executivo o cidadão que já cumprira 2 mandatos consecutivos (reeleito uma única vez) em cargo da mesma natureza, ainda que em ente da federação diverso; e b) as decisões do TSE que acarretassem mudança de jurisprudência no curso do pleito eleitoral ou logo após o seu encerramento não se aplicariam imediatamente ao caso concreto e somente teriam eficácia sobre outras situações em pleito eleitoral posterior.  RE 637485/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 1º.8.2012. (RE-637485)”

[27] “Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

[28] “XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;”

[29] [29]“ELEIÇÕES 2014. RECURSO ORDINÁRIO. QUITAÇÃO ELEITORAL. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL. CABIMENTO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. MULTA. AUSÊNCIA ÀS URNAS. FORMALIZAÇÃO DO PEDIDO DE REGISTRO. PAGAMENTO POSTERIOR. ART. 11, § 10º, DA LEI Nº 9.504/97. INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. REGISTRO DEFERIDO. (...) 2. O pagamento de multa eleitoral após a formalização do registro, desde que ainda não esgotada a instância ordinária, preenche o requisito da quitação eleitoral, por também ser aplicável o art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97 às condições de elegibilidade, e não apenas às causas de inelegibilidade (Precedente: REspe 809-82, Rel. Min. Henrique Neves, em sessão de26.8.2014). 3. Em respeito ao princípio da segurança jurídica, não se abarca esse entendimento jurisprudencial aos registros de candidatura que se refiram a casos anteriores ao pleito de 2014. 4. Recurso provido, para deferir o registro de candidatura.” RO - Recurso Ordinário nº 52552 - Campo Grande/MS Relatora Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, j. 03/09/2014

[30] Conforme excerto do aresto proferido nos Embargos de Declaração no Recurso Especial Eleitoral n° 670-73.2012.6.24.0088 - Blumenau - SC, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, j. 21.05.15.

[31] “ELEIÇÕES 2014. REGISTRO DE CANDIDATURA. RECURSO ORDINÁRIO. INELEGIBILIDADE. ALÍNEA G. REJEIÇÃO DE CONTAS. TRIBUNAL DE CONTAS. PREFEITO. ORDENADOR DE DESPESAS. CARACTERIZAÇÃO. (...). 2. Nos feitos de registro de candidatura para o pleito de 2014, a inelegibilidade prevista na alínea g do inciso 1 do art. 10 da LC n° 64, de 1990, pode ser examinada a partir de decisão irrecorrível dos tribunais de contas que rejeitam as contas do prefeito que age como ordenador de despesas. 3. Entendimento, adotado por maioria, em razão do efeito vinculante das decisões do Supremo Tribunal Federal e da ressalva final da alínea g do art. 10, 1, da LC n° 64/90, que reconhece a aplicação do "disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição". 4.Vencida neste ponto, a corrente minoritária, que entendia que a competência para julgamento das contas do prefeito é sempre da Câmara de Vereadores. (...).”

[32] No entendimento mais benéfico (à candidatura) anterior se entendia que para o caso de Chefes do Executivo, como os Prefeitos Municipais, o título oriundo de julgamento final de tribunal de contas, que tenha rejeitado as contas, não se prestava para embasar alegação de inelegibilidade contra. Ou melhor, entendia-se, como regra geral, que somente os julgamentos realizados e ultimados pela Câmara de Vereadores poderiam gerar inelegibilidade. A viragem “maléfica”, no curso da eleição, e retroativa, foi a que mudou tal entendimento para entender que qualquer julgamento efetivado pelo Tribunal de Contas, que não a título de parecer prévio, é apto a embasar adução de inelegibilidade.

[33] Apenas para ilustrar nossa crítica, apontamos que 03 meses e 08 dias antes, faltando apenas 45 dias para o início do período eleitoral, vigorava este entendimento no TSE: “RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. PREFEITO. REJEIÇÃO DAS CONTAS PELO TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL. CAUSA DE INELEGIBILIDADE. JULGAMENTO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL. COMPETÊNCIA DA CÂMARA DE VEREADORES. PRECEDENTES. AGRAVOS REGIMENTAIS DESPROVIDOS. 1. À exceção das contas relativas à aplicação de recursos oriundos de convênios, a competência para o julgamento das contas prestadas por prefeito, inclusive no que tange às de gestão relativas a atos de ordenação de despesas, é da respectiva Câmara Municipal, cabendo aos Tribunais de Contas tão somente a função de emitir parecer prévio, conforme o disposto no art. 31 da Constituição Federal.(...).. (AgR-REspe n. 658-95.2012.620.0015, Acórdão de 20/05/2014, Relatora Min. Laurita Hilário Vaz - original sem grifo).”

[34] Em agravo regimental a decisão foi reformada somente após a eleição, para se deferir o registro, mas por outro fundamento e não o que advogado a violação ao artigo 16, da CF. E isso custou a falência da candidatura a deputado, pois as pesquisas indicavam em prol do concorrente um número 60% superior ao registrado nas urnas, antes do indeferimento pelo TSE, que ocorreu 14 dias antes das eleições. Flagrante caso de intervenção indireta da Justiça eleitoral no resultado das eleições!

[35] Conforme “Quem só pode se defender dos fatos acaba sendo atingido pelo Direito“, publicação de 24.09.14, 20:47 h., acesso em 17.02.15, 14:00 h., http://www.conjur.com.br/2014-set-23/constituicao-poder-quem-defender-fatos-acaba-sendo-atingido-direito:

“(...) no direito brasileiro, especialmente nos processos acusatórios — na ação penal e de improbidade administrativa —, tem-se admitido a condenação do acusado com base em dispositivo diverso do que foi proposto na petição inicial; tudo sob a consideração de que o acusado se defende dos fatos, não da norma que os qualifica, partindo-se da premissa de que a sua condenação com base em norma diversa da apontada na inicial não lhe prepara qualquer prejuízo, nomeadamente, diante dos princípios do contraditório e da ampla defesa.

O que fundamenta essa orientação jurisprudencial, contudo, agora podemos dizê-lo, é a crença de que haveria sempre uma clara distinção entre a atividade de delimitar os fatos e aquela outra, em que eles são classificados ou definidos juridicamente. Ou seja, persiste a crença, divulgada sem contestação, de que o juízo sobre os fatos não compromete o juízo sobre a sua qualificação jurídica (juízo sobre normas), e vice-versa.  

Entretanto, como veem, a estarem corretas as premissas que introduziram o presente artigo, no mínimo, devemos tomar a sério essa antiga orientação de nossos tribunais de que, em nenhuma circunstância, o acusado sairá prejudicado pelo fato de o magistrado, ao final do processo, conferir aos fatos que lhe são imputados uma classificação jurídica diferente daquela que foi expressamente sugerida na inicial e que, o que é mais grave, foi tomada em consideração durante toda a instrução do processo. (...).

Contudo, (...), a partir de H-G Gadamer, juristas como Konrad Hesse, têm acentuado que, na atividade de qualificação dos fatos, o mais certo é que ocorra um verdadeiro círculo hermenêutico, em que o intérprete seleciona a norma a partir do fato colhido na realidade, mas, da mesma forma, o fato é selecionado tendo em consideração uma prévia antecipação da norma que se pretende aplicar. Se isso é verdade, não é difícil perceber que, no mais das vezes, o acusado tenderá — durante toda a instrução probatória — defender-se não apenas dos fatos puros, mas dos fatos como foram qualificados pelo autor. Aliás, em processo judicial e no âmbito do direito, não existem fatos puros, mas fatos qualificados por uma ou outra norma.

O autor não imputa “fatos puros” ao acusado. Diversamente, são-lhe imputados fatos previamente destacados da realidade à luz de abstrata consideração ou qualificação normativa. Descrição de fatos no direito é, em primeiro lugar, descrição ou imputação jurídica de fatos. 

(...).

Entretanto, no que tange ao fato ao qual se dirige uma norma, para que se possa isolá-lo do mundo da vida com as características que têm importância para a aplicação do direito, há de se perceber e descrevê-lo com a ajuda do Tatbestand  hipotético da norma. De outro lado, na exata dedução de Alexy, essas características relevantes do fato podem oferecer motivo para, no caso concreto, não se aplicar a norma que inicialmente se tinha diante dos olhos, assim como para precisar, ou rejeitar algumas marcas distintivas do próprio Tatbestand normativo, ou mesmo para acrescentar-lhe alguns indícios antes considerados como não relevantes. Dá-se aqui o instrutivo ir e vir de perspectiva de que nos falava K. Engisch, isto é, para compreender e delimitar o caso concreto, carecemos da perspectiva da norma; para compreender a norma, precisamos da perspectiva no fato.

Assim, não obstante se reconheça que o acusado deva se defender dos fatos, o certo é que ele se defenderá dos fatos como foram qualificados pelo próprio autor. (...). A exceção de classificação normativa abertamente indevida e teratológica, o mais certo é que o acusado se defenderá, durante toda a instrução probatória, dos fatos como juridicamente descritos e qualificados pelo autor.

Atento a isso, em posição contrária à nossa jurisprudência, tem o Tribunal Constitucional alemão emprestado especial homenagem ao princípio da não-surpresa processual, não aceitando que qualquer condenação seja imposta ao acusado sem que antes ele possa falar dos motivos de fato e de direito que, ao final, concretamente servirão de base à sua condenação. Cumpre ao Tribunal, portanto, não lhe surpreender com condenação baseada em fatos, ou normas de direito, que não foram indicadas na ação inicialmente admitida pelo órgão julgador.

(...).

No Brasil, também já encontra repercussão entre ilustradas vozes o princípio da não surpresa em matéria de processo acusatório. Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero acentuam o direito à segurança do cidadão, precisamente, na suas relações com o poder judiciário, especialmente, em respeito ao princípio do contraditório e ampla defesa. De fato, “por força dessa nova conformação da ideia de contraditório, a regra está em que todas as decisões definitivas do juízo se apoiem tão somente em questões previamente debatidas pelas partes, isto é, sobre matéria debatida anteriormente pelas partes. Em outras palavras, veda o juízo de ‘terza via’. Há proibição de decisões surpresa (Verbot der Überrachungsentscheidungen).”

[36] “Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: (...).  VII - realizar, em ano de eleição, antes do prazo fixado no inciso anterior, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos nos três últimos anos que antecedem o pleito ou do último ano imediatamente anterior à eleição.”

[37] “Art. 74.  Configura abuso de autoridade, para os fins do disposto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, a infringência do disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal, ficando o responsável, se candidato, sujeito ao cancelamento do registro ou do diploma.       (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009).”

[38] Para deixarmos bem vincado o exemplo prático vivido, destacamos trecho de nosso arrazoado:

“Em todo o curso do processo, desde o aforamento da inicial, ocorrida em 04.09.12 até a prolação do parecer da procuradoria regional eleitoral, dado em 21.11.12, o debate se deu sobre fatos, provas e temas unicamente subsumidos ao artigo 73, VII, da Lei 9.504/97, ou seja, tratou-se de conduta vedada relativa ao limite de gastos com publicidade no ano da eleição. Como a doutrina eleitoral entende “conduta vedada” como espécie de “abuso do poder político”, a inicial e o debate forense de primeiro grau trataram “abuso” nesta perspectiva, e nunca sob o prisma do  74-LGE c/c 37§, 1º, CF.

E houve na narrativa da inicial, com o claro propósito de tentar salientar a gravidade da conduta vedada, a mera alusão de que a publicidade traria proveitos eleitorais aos representados. Todavia, nunca, em nenhum momento, apresentou a inicial causa petendi estribada no artigo 74, da lei 9.504/97, que remete ao artigo 37§ 1º, da CF. Nem descreveu fatos e provas tendentes a demonstrar a ocorrência de ilícitos subsumíveis ao 74, como fez, surpreendentemente, o aresto regional, em verdadeiro “emendatio libelli” desautorizada pelo direito processual eleitoral – e sententia debet esse conformis libello!

A inicial fora tão precisa em sua argumentação e causa petendi única, que demonstra seu específico objetivo as fls. 13, que sempre e unicamente era e é reconhecer a inelegibilidade dos recorrentes no artigo 73, VII, da Lei 9.504/97 (aduzido as fls. 02 e 19), ao citar expressamente o artigo 1º, I, letra “j”, da C 64/90, alterada pela LC 135/10, que dispõe: “os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou do diploma, pelo prazo de 8 anos.”

A inicial, além de não valorar os fatos e nem delinear sua imputação de ilícito eleitoral de acordo com o artigo 74 da lei 9.504/97, que remete ao artigo 37, § 1º, da CF, e trata de abuso de poder político com publicidade promocional do nome, símbolo de candidato ou partido político, deixou de demonstrar tal objetivo, quando silenciou, igualmente, sobre o dispositivo próprio da lei de inelegibilidades, que seria o artigo 1º, I, letra “d”: “os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes; (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010).”

[39] “Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.”

[40] “Art. 1º, I:  (...) m) os que forem excluídos do exercício da profissão, por decisão sancionatória do órgão profissional competente, em decorrência de infração ético-profissional, pelo prazo de 8 (oito) anos, salvo se o ato houver sido anulado ou suspenso pelo Poder Judiciário;  (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010); (...). o) os que forem demitidos do serviço público em decorrência de processo administrativo ou judicial, pelo prazo de 8 (oito) anos, contado da decisão, salvo se o ato houver sido suspenso ou anulado pelo Poder Judiciário; (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010); (...) q) os magistrados e os membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente por decisão sancionatória, que tenham perdido o cargo por sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos;(Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010).”

[41] “Art. 1º, I, g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição; (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010).”

[42] Referimos ementa de petição advocatícia que apresentamos em contrarrazões a recurso ordinário do MP junto ao TSE, nos autos de n. 52.604/SC:  “IMPOSSIBILIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO GERAR INEGIBILIDADE – EFEITO EXCLUSIVO DO PROCESSO JUDICIAL DE ÍNDOLE PENAL - VIOLAÇÃO AO PACTO DE SAN JOSE DA COSTA RICA EM SEUS ARTIGOS 23, 1.b e 2., PELA PRODUÇÃO DA ALÍNEA “G”, DO INCISO I, ARTIGO 1º, DA LEI COMPLEMENTAR 64/90 (REDAÇÃO ALTERADA PELA LC 135/10) – NECESSIDADE DE CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE A SER EXERCIDO, NA FORMA DIFUSA, PERANTE A JUSTIÇA ELEITORAL – JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA A REFERENDAR A TESE – NECESSIDADE DE MANTENÇA DO DEFERIMENTO DO REGISTRO, COM AFASTAMENTO, NO CASO CONCRETO, DA ALÍNEA “G”, PARA SE GARANTIR EFETIVIDADE AO DIREITO POLÍTICO FUNDAMENTAL (E CONVENCIONAL) DE CANDIDATURA.” Isso tudo deduzido com base na profunda obra já referida, de Marcelo Ramos Peregrino.

[43] Art. 1º, I, g: são inelegíveis, para qualquer cargo,  “os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição;(Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010).”

[44] Ver MAZZUOLI, Valério. O Controle de Convencionalidade das Leis. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

[45] Conforme lição de seu livro:

“iii) A caracterização do procedimento enquanto processo, se realizado em contraditório, pode mitigar uma adequada visão da processualidade administrativa. A variedade de procedimentos dentro da Administração não implica uma gradação de importância, no sentido de considerar certos procedimentos mais importantes que outros, pois todos os procedimentos traduzem o exercício da função administrativa, ainda que de um modo diferenciado na forma pela qual se exteriorizam; a noção procedimental vai além da simples noção de litígio, sendo mais adequada na seara administrativa a terminologia procedimento.

iv) Para nós, procedimento é gênero no qual os procedimentos (em sentido estrito) e os processos (ocorrentes no âmbito judicial) são espécies. Os processos judiciais guardam peculiaridades que os distinguem dos procedimentos, embora comunguemos da idéia de uma processualidade ampla que ocorre em todas as funções estatais.

v) Essa visão procedimental tem importante repercussão nos procedimentos de julgamentos de contas públicas, pois as atividades e as funções dos tribunais de contas veiculam-se, fundamentalmente, pela via procedimental. De conseguinte, a processualidade nas cortes de contas, sem exceção, realiza a função administrativa e de controle que lhes é peculiar, devendo resguardar ao máximo os direitos e as garantias fundamentais das partes. Assim, presentes os litigantes ou acusados, não há que negar-se o contraditório e a ampla defesa, sob fundamento de que se está diante de procedimento e não de processo, até porque tal imposição decorre da Constituição e não de querelas terminológicas.” in Rodrigo Valgas dos Santos. Procedimento Administrativo nos Tribunais de Contas e Câmaras Municipais – contas anuais, princípios e garantias constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 229/230.

[46] “Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: (...) II - prevalência dos direitos humanos.”

[47] “Art. 5. (...) § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.” (sublinhamos!)

[48] “Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.”

[49] “Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...). VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional.”

[50] “A Controladoria Geral da República é órgão com matiz constitucional integrante do chamado Poder Cidadão que é exercido pelo Conselho Moral Republicano. Este poder está incumbido da prevenção investigação e sanção dos fatos que atentem contra a ética pública e a moral administrativa, dentre outras atribuições. (...)”. (nota da obra de Marcelo Peregrino)

[51] “Artigo 9º - Princípio da legalidade e da retroatividade - Ninguém poderá ser condenado por atos ou omissões que, no momento em que foram cometidos, não constituam delito, de acordo com o direito aplicável. Tampouco poder-se-á impor pena mais grave do que a aplicável no momento da ocorrência do delito. Se, depois de perpetrado o delito, a lei estipular a imposição de pena mais leve, o delinquente deverá dela beneficiar-se.”

[52] Como demonstra o item 12 da ementa de seu voto relatorial não majoritário nesse capítulo, na ADC n. 30: “12. A extensão da inelegibilidade por oito anos após o cumprimento da pena, admissível à luz da disciplina legal anterior, viola a proporcionalidade numa sistemática em que a interdição política se põe já antes do trânsito em julgado, cumprindo, mediante interpretação conforme a Constituição, deduzir do prazo posterior ao cumprimento da pena o período de inelegibilidade decorrido entre a condenação e o trânsito em julgado.”

[53] “A sanção de inelegibilidade e o trânsito em julgado: a nova "inelegibilidade processual"

(...).

Cunho a expressão inelegibilidade processual para denominar a inelegibilidade que decorre exclusivamente do ônus do tempo do processo, sendo a sua causa e razão de ser gerar uma sanção processual indireta pelo manejo de recursos inerentes ao devido processo legal (due process of law), criando assim limitações gravosas e antidemocráticas ao pleno exercício da pretensão à tutela jurídica e ao livre acesso ao Poder Judiciário.

A inelegibilidade processual seria decorrente da decisão de órgão colegiado, enquanto durar o processo, sem direito a uma espécie de detração eleitoral para o cômputo da inelegibilidade material de 8 anos. Essa inelegibilidade processual seria, portanto, um desestímulo ao uso dos meios recursais próprios, em verdadeira negativa de acesso ao Judiciário: recorrer seria um ônus insuportável para quem tivesse a inelegibilidade decretada por um órgão colegiado.

Sem juízo de constitucionalidade, se fôssemos aplicar a LC 135 a secas, teríamos alguns exemplos graves de inelegibilidade da LC 64/90, com a redação da LC 135:

Art. 1º, I, "e": soma das seguintes inelegibilidades: (a) inelegibilidade a partir da decisão condenatória do órgão colegiado, enquanto durar o processo penal (inelegibilidade processual); (b) inelegibilidade enquanto durar o cumprimento da pena de natureza penal, decorrente da suspensão dos direitos políticos; e (c) inelegibilidade de 8 anos após o cumprimento da pena.

Art.1º, I, "l": a soma das seguintes inelegibilidades: (a) inelegibilidade a partir da decisão condenatória do órgão colegiado, enquanto durar o processo por improbidade que decretou a suspensão dos direitos políticos (inelegibilidade processual); (b) inelegibilidade enquanto durar o cumprimento da pena de suspensão dos direitos políticos; e (c) inelegibilidade de 8 anos após o cumprimento da pena.

Note-se que, em hipótese de inelegibilidade decorrente de ilícitos não-eleitorais (condenação criminal transitada em julgado, v.g.), há agora a criação de uma inelegibilidade cominada potenciada de natureza processual, como gravíssimo ônus para inviabilizar o acesso ao Poder Judiciário e tornar inviável ou insuportável o manejo de recursos processuais, ainda que viáveis, firmes e sérios.

No caso da condenação criminal, se o recurso contra a decisão condenatória, proferida por órgão colegiado, tiver um resultado demorado (digamos, 5 ou 10 anos), a inelegibilidade processual, somada ao cumprimento da pena (acaso improvido o recurso) e à inelegibilidade de 8 anos após o cumprimento da pena, poderá levar a uma sanção total de inelegibilidade de mais de 30 anos, o que nada mais é do que o degredo político.

Aqui, parece-me, será o ponto correto a ser debatida a inconstitucionalidade da inelegibilidade processual sem que haja sequer uma detração, uma subtração daquela inelegibilidade material de 8 anos. O correto, o constitucional, seria a LC 135 ter previsto a aplicação da inelegibilidade de 8 anos desde a decisão de órgão colegiado, como execução imediata. Mas criar um inelegibilidade de natureza meramente processual, como terrível ônus do processo, é uma solução legislativa fascista, criminosa e estapafúrdia.

Sim, um caso para a psiquiatria forense, como afirmou o Min. Gilmar Mendes.

Desse modo, chamo a atenção para as seguintes conclusões:

(a) a sanção de inelegibilidade pode ter execução imediata, desde a decisão de órgão colegiado, exceto nos casos proibidos pela Constituição (condenação criminal e improbidade administrativa);

(b) a inelegibilidade processual, enquanto durar o tempo do processo, é inconstitucional, viola o princípio da proporcionalidade/razoabilidade e impede o acesso frutuoso ao Poder Judiciário; e

(c) a solução constitucional adequada teria sido a LC 135 ter previsto a execução imediata da inelegibilidade cominada potenciada de 8 anos (sem, portanto, postergá-la para o trânsito em julgado e absurdamente criando uma inelegibilidade cominada potenciada de natureza processual).”

[54] Essa preocupação nos ocorreu depois que atuamos em um complexo processo judicial eleitoral, no qual eram 05 réus, acusados por múltiplos e diversos fatos, que não guardavam relação de pertinência entre eles. Tratava-se do pleito de 2012, de AIJE discutindo desde o 41-A, passando pelo 73, da lei 9.504/97, até abuso do poder político e econômico. O cúmulo subjetivo e objetivo fora abusivo. Registramos essa preocupação em petição cautelar apresentada ao TSE em prol de apenas um dos réus, nosso constituinte: “Insta dizer que houve indevido cúmulo subjetivo e objetivo de ações em um mesmo processo judicial eleitoral, feito de forma abusiva pelo d. Ministério Público Eleitoral, pois pelas circunstâncias de lugar, tempo e ação, o que se imputa a C., absolutamente nada tem haver com a imputação aos demais réus. Isso onerou por demais a sua situação processual, e colocou, indevidamente, no mesmo leito processual situações absolutamente distintas, tanto material quanto processualmente falando. Essa confusão ocasionada pela digna acusação eleitoral cível toldou, por certo, a devida análise do caso de C., como distinto dos demais. Prova desta confusão é que o despacho que inadmitiu seguimento ao Resp na origem, (...), não distingui a diferença entre as teses recursais de C. e dos demais réus, teses que, processuais e materiais, demonstram essa distinção crucial, olvidada pelas instâncias ordinárias desta especializada justiça. Por certo, se C. tivesse tido um processo somente para ele, o resultado, desde o primeiro grau, lhe teria sido absolutório (...).” Essa cautelar foi autuada como AC Nº 67566, distribuída por dependência à Ministra do TSE Laurita Vaz, que a deferiu para reintegrar o requerente em seu mandato de vereador, em decisão monocrática de 19.08.14.

[55] A preocupação com o número de fatos e testemunhas respectivas nos chegou ao advogarmos em prol de réus em ação judicial eleitoral com 38 imputações e 04 partes passivas distintas. Trabalhamos desde a contestação até o recurso ordinário, que foi provido, acolhendo nossa tese de nulidade por cerceamento de defesa em face da limitação ilegal do número de testemunhas. Em nosso arrazoado recursal deduzimos as seguintes questões, que iluminam, reflexamente, a presente proposição legislativa:

“Outra nulidade que macula o trâmite desta AIJE desde a audiência de instrução e julgamento, diz respeito a manifestamente ilegal limitação a 12 (doze) do número de testemunhas ouvidas em audiência para cada parte, independentemente da quantidade de fatos, partindo-se da equívoca premissa de que todos os 04 Investigados seriam uma única parte.

(...).

Contudo Excelências, a limitação importou em grave cerceamento de defesa que fere o direito de qualquer acusado de não ser condenado sem que a autoridade julgadora lhe garanta, em igualdade de condições com a acusação (que imputou 38 fatos e subfatos!), os meios aptos e suficientes de provar sua inocência, garantia esta que integra o alicerce principal dos direitos subjetivos previstos na Constituição delineados a partir dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5°, LIV e LV).

(...).

O prejuízo patenteia-se, embora a nulidade seja absoluta e dispense sua demonstração, pela razão de que os Recorrentes restaram condenados pela r. sentença recorrida sem que todos os fatos, circunstâncias e documentos da inicial pudessem ser regularmente contrapostos, em virtude da limitação das testemunhas.

(...).

O segundo motivo a ditar a insustentabilidade da r. decisão, é que a própria dicção do inciso V, do art. 22 da LC 64/90 deixa claro que o número máximo de testemunhas que a lei prevê (seis) é para cada parte, isto é, para cada representante ou representado, com o que mostra-se ilegal querer considerar os Demandados (em número de 4) como sendo uma única parte. Isto é, a própria literalidade da regra, tomada pela r. sentença como fundamento da legalidade da limitação, em verdade nos traz elemento crucial a evidenciar a impropriedade da medida.

Isto fica ainda mais claro se tomarmos em conta a redação do §1º, do art. 26 da Resolução do TSE n. 23.367/11, que diz: “As testemunhas deverão ser arroladas pelo representante, na inicial, e pelo representado, na defesa, com o limite de 6 para cada parte, sob pena de preclusão” (grifo nosso).

(...).

Terceiro motivo: é evidente que o legislador não estabeleceu um número instransponível de 06 testemunhas a serem arrolados pelas partes independentemente do número de infrações imputadas, pois isso inviabilizaria o direito fundamental dos acusados ao efetivo contraditório e a ampla defesa – pois colocaria sobre os ombros do Acusador a medida e a extensão do direito de defesa dos Acusados. Assim, basta ampliar as acusações, com cúmulo objetivo de ações em mesmo processo eleitoral, que o direto de defesa dos acusados diminui na mesma proporção!

Assim, numa representação que indicasse mais de 6 fatos distintos (no caso concreto são aproximadamente 38 imputações), não poderia o acusado contar sequer com uma testemunha por fato, pois, seguindo-se aquela inconstitucional interpretação, o número de seis testemunhas jamais poderia ser ultrapassado, ainda que sejam muitas as questões a serem elucidadas.

(...).

Ademais, se considerarmos que cada uma das 38 imputações poderia, em tese, ter dado azo a uma demanda eleitoral independente, ninguém contestaria o fato de que nesta hipótese cada acusado poderia arrolar até 06 testemunhas de acordo com o art. 22, V, da LC 64/90.

Vale dizer, fosse um único fato imputado teria o acusado a chance de arrolar até 06 testemunhas para contrapô-lo com efetividade. Todavia, tendo decidido a Coligação Recorrida cumular vários fatos numa única demanda, ainda assim estariam os Réus limitados a 12 testemunhas, com o que se teria a seguinte regra: quanto maior for o número de condutas atribuídas aos representados na inicial, menor será o número de testemunhas para rebatê-las.

Portanto, como de fato já havíamos alertado, a audiência de instrução (...) e agora também a r. sentença que nela se baseou, é nula de pleno direito. Isto porque o que se limitou foi o número de testemunhas e não o número de fatos a serem discutidos. (...).”

O recurso foi provido através do acórdão 29.340, do TRE-SC, prolatado nos autos de R.E. 631-60.2012.6.24.00, em 02.07.14. Ao depois ainda ouve a interposição de dois embargos declaratórios, ambos providos (acórdãos 29.409 e 29.991), para esclarecer os efeitos processuais das nulidades decorrentes dessa limitação ilegal do número de testemunhas.

[56] “i) os que, em estabelecimentos de crédito, financiamento ou seguro, que tenham sido ou estejam sendo objeto de processo de liquidação judicial ou extrajudicial, hajam exercido, nos 12 (doze) meses anteriores à respectiva decretação, cargo ou função de direção, administração ou representação, enquanto não forem exonerados de qualquer responsabilidade;”

[57] Para a compreensão do discurso estruturante sobre princípios constitucionais ver nossos: Conceito de Princípios Constitucionais: elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada. 2º ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. 288 p. e Princípios constitucionais e atividade jurídico-administrativa: anotações em torno de questões contemporâneas. Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, n. 02, jul./dez. 2003, p. 393-426. Para uma visão dos princípios como garantidores da democracia ver nosso A Constituição como Garantia da Democracia: o papel dos Princípios Constitucionais. Revista de Direito Constitucional e Internacional. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política. São Paulo: Revista dos Tribunais/Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, ano 11, abr./jun. 2003, n. 44, p 75/86. E para um olhar crítico sobre o uso e abuso dos princípios ver nosso Princípios e retorno do pêndulo – crítica ao chamado neoconstitucionalismo. Revista Interesse Público. Belo Horizonte: Fórum, n. 87, ano 16, set./out. 2014, p. 63-67.

[58] Rico ler as lições de J. J. Gomes Canotilho, em seu  Direito Constitucional, 6 ed., Coimbra, Almedina, 1993,  p. 372:

“O princípio da determinabilidade das leis reconduz-se, sob o ponto de vista intrínseco, a duas idéias fundamentais. A primeira é de exigência de clareza das normas legais (...). A segunda aponta para a exigência de densidade suficiente na regulamentação legal, pois um ato legislativo que não contém uma disciplina suficientemente concreta (= densa, determinada) não oferece uma medida jurídica capaz de:

“- alicerçar posições juridicamente protegidas dos cidadãos [como é  garantia definição de inelegibilidades por lei complementar];

“- constituir uma norma de atuação para a administração [como garantia de legalidade dos atos judiciais que deferem ou não registro às candidaturas nas eleições geridas, administrativa e judicialmente, pela justiça eleitoral];

“- possibilitar, como norma de controlo, a fiscalização da legalidade e a defesa dos direitos e interesses dos cidadãos.”

[59] “Registro de candidatura - Contas rejeitadas - (...). Possibilidade de a Justiça Eleitoral verificar se as irregularidades são insanáveis, mesmo havendo decisão do Tribunal de Contas e da Câmara Municipal desaprovando as contas. (...). Não-aplicação do mínimo constitucional da receita de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino - Irregularidade que não acarreta inelegibilidade. Recurso conhecido e provido. RESPE - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 16433 - Cananéia/SP, Relator Min. FERNANDO NEVES DA SILVA, j. 05.09.2000.”

“AGRAVOS REGIMENTAIS. RECURSO ESPECIAL. DECISÃO AGRAVADA ALINHADA COM A JURISPRUDÊNCIA DO TSE. 1. A falta de aplicação do percentual mínimo em educação não gera inelegibilidade. Precedentes.(...). Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 30169 - Nova Serrana/MG, Relator Min. EROS ROBERTO GRAU, j. 28.04.2009.”

[60]“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. REGISTRO DE CANDIDATURA.INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LEI COMPLEMENTAR 64/90. AUSÊNCIA DE APLICAÇÃO DO PERCENTUAL MÍNIMO DE 25% EM EDUCAÇÃO (...). DESPROVIMENTO. 1. A rejeição de contas do agravante em virtude da não aplicação do percentual mínimo de 25% exigido no art. 212 da CF/88 configura irregularidade insanável e ato doloso de improbidade administrativa, incidindo a inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC 64/90 (REspe 246-59/SP, de minha relatoria, PSESS de 27.11.2012).(...). AgR-REspe - Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 7486 - General Salgado/SP, Relatora Min. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, j. 29.11.2012.”

“ELEIÇÕES 2014. REGISTRO DE CANDIDATURA. INDEFERIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO. REJEIÇÃO DE CONTAS. NÃO APLICAÇÃO DO MÍNIMO EXIGIDO CONSTITUCIONALMENTE EM EDUCAÇÃO. IRREGULARIDADE INSANÁVEL E CONFIGURADORA DE ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART. 1º, I, G, DA LC Nº 64/90. INOVAÇÃO RECURSAL. INADMISSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A não aplicação do mínimo constitucional exigido na área de educação consubstancia irregularidade de natureza insanável e configuradora de ato doloso de improbidade administrativa, atraindo, bem por isso, a inelegibilidade inserta no art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90.2. In casu, neguei seguimento ao ordinário considerando que a não aplicação do mínimo constitucional exigido na área deeducação caracteriza irregularidade insanável e configuradora de ato doloso de improbidade administrativa, enquadrando-se na inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90. (...) Agravo Regimental em Recurso Ordinário nº 178285 - Belo Horizonte/MG - Relato Min. LUIZ FUX, j. 11.11.2014.”

[61] Conforme Gilmar Ferreira Mendes em seu texto “Questões Fundamentais de Técnica Legislativa”, inserido na Revista Trimestral de Direito Público, nº 01, 1993, p. 262-263:

“Alguns princípios constitucionais balizam a formulação das disposições legais. Do princípio do Estado de Direito e de alguns postulados dele derivados podem-se inferir alguns requisitos que devem nortear a elaboração de atos normativos.

“O princípio do Estado de Direito exige que as normas jurídicas sejam dotadas de alguns atributos, tais como precisão, ou determinabilidade, clareza, densidade suficiente para permitir a definição das posições juridicamente protegidas e o controle de legalidade da ação administrativa.

(...).

“O princípio da segurança jurídica, elemento fundamental do Estado de Direito, exige que as normas sejam pautadas pela precisão e clareza, permitindo que o destinatário das disposições possa identificar a nova situação jurídica e as consequências que dela decorrem. Devem ser evitadas, assim, as formulações obscuras, imprecisas, confusas ou contraditórias.

(...).

“Esse princípio está sintetizado, na Constituição (art. 5º, II), pela seguinte fórmula:

‘Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.’

“Os postulados do Estado de Direito, da Democracia (art. 1º) e o princípio da reserva legal (Cf. art. 5º, II) impõem que as decisões normativas fundamentais sejam tomadas pelo legislador.

(...).

“A doutrina assinala, majoritariamente, que há delegação indevida quando se permite ao regulamento inovar inicialmente na ordem jurídica, atribuindo-se-lhe a definição de requisitos necessários ao surgimento de direito, dever, obrigação ou restrição. (...).

“É verdade que a identificação de uma delegação legislativa indevida, em virtude da adoção de cláusula de conteúdo abdicatório ou demissório, há de ser feita em cada caso. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal fornece, todavia, elementos para que se estabeleça uma orientação mais ou menos segura sobre o assunto.

“Embora considerasse nulas as autorizações legislativas incondicionadas ou de caráter demissório, a doutrina dominante sempre entendeu legítimas as autorizações fundadas no enunciado da lei formal, desde que do ato legislativo constassem os standards, isto é, ‘os princípios jurídicos inerentes à espécie legislativa.’ Esforçando-se por sistematizar esse entendimento, afirma Carlos Maximiliano que seriam inconstitucionais as leis cujo conteúdo se cingisse ao seguinte enunciado:

‘O Poder Executivo é autorizado a reorganizar o Tribunal de Contas.”

Aceitam-se, porém, como legítimas fórmulas que enunciem, v. G.:

‘Fica o Poder Executivo autorizado a reorganizar o Ensino Superior, sobre as seguintes bases: 1) só obtêm matrícula os bacharéis em letras diplomados por ginásios oficiais; 2) (...)’.

“Na elaboração da lei devem ser evitados as autorizações legislativas puras ou incondicionadas, de nítido e inconfundível caráter renunciativo. Elas representam inequívoca deserção da obrigação de deliberar politicamente e podem caracterizar afronta ao princípio da reserva legal.” (grifos nossos)

[62] “Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga. § 1º - Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei. § 2º - Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de seus antecessores.”

[63] “Cassação de diploma e realização de novas eleições”. O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, assentou que a vacância dos cargos de chefe do Executivo e vice decorrente de cassação de diploma se efetiva juridicamente com a sentença condenatória, mesmo que esta os mantenha cautelarmente no exercício do múnus público, aguardando decisão de instância superior. Afirmou ainda que, sendo a sentença prolatada no primeiro biênio do mandato, cabe realização de eleições diretas, caso a Constituição ou lei orgânica do ente federativo adote a mesma norma prevista no art. 81 da Constituição da República.(...). ” Mandado de Segurança nº 219-82, Presidente Tancredo Neves/BA, TSE, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 2.6.2015 – fonte: Informativo TSE – Ano XVII – nº 8, Brasília, 1º a 14 de junho de 2015.

[64]“Entendo que, em respeito aos primados do regime democrático e da soberania popular, mesmo diante da eventual previsão da LOM pela realização de eleições indiretas, o pleito deva ser realizado sob a forma direta caso a dupla vacância decorrente de decisão da Justiça Eleitoral ocorra nos 3 (três) primeiros anos do mandato, evitando-se tal modalidade apenas no último ano.

A meu ver, outro aspecto relevante diz com a origem da dupla vacância, pois, em se tratando de eleições suplementares determinadas pela Justiça Eleitoral, cabe a esta estabelecer o modo como se fará o pleito, o que afasta, em definitivo, a incidência do art. 81, § 1º, da Carta Política. 

Diante desse quadro, a solução mais ponderada, segundo penso, é suspender, tão somente, a realização das eleições indiretas, mantendo-se no cargo o Presidente da Câmara Municipal, porquanto, consoante afirma o próprio requerente, já houve a alteração da titularidade do Poder Executivo desde 31.3.2015 (fl. 344). Na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, as sucessivas alternâncias na chefia do Poder Executivo devem ser evitadas, porquanto geram insegurança jurídica e descontinuidade administrativa.

A questão relativa à modalidade da eleição suplementar - direta ou indireta - trata-se de matéria relevante que está em discussão nos autos do AgR-MS nº 222-71/PR, levado a julgamento na sessão de 19.3.2015, ocasião em que pedi vista antecipada dos autos, estando, portanto, ainda pendente de final apreciação pelo Plenário deste Tribunal.” j. monocrático dia 28.04.15, AC Nº 23536, Brusque-SC.

[65] Interessante ler o instigante artigo de Marcelo Ramos Peregrino, “Direito Eleitoral do Inimigo”, publicado no site empório do direito em 11.04.15, http://emporiododireito.com.br/direito-eleitoral-do-inimigo-por-marcelo-peregrino/

[66] Em seus comentários aos artigos 14 a 16 in: - SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK, Lênio, et all. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina/IDP, 2014, p. 660.

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Sobre o autor
Ruy Samuel Espíndola

Advogado publicista e sócio-gerente integrante da Espíndola e Valgas Advogados Associados, com sede em Florianópolis/SC, com militância nos Tribunais Superiores. Professor de Direito Constitucional desde 1994, sendo docente de pós-graduação lato sensu na Escola Superior de Magistratura do Estado de Santa Catarina e da Escola Superior de Advocacia da OAB/SC. Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Santa Catarina (1996). Atual Membro Consultor da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da OAB/Federal e Membro da Comissão de Direito Constitucional da Seccional da OAB de SC. Membro efetivo da Academia Catarinense de Direito Eleitoral, do Instituto Catarinense de Direito Administrativo e do Octagenário Instituto dos Advogados de Santa Catarina. Acadêmico vitalício da Academia Catarinense de Letras Jurídicas na cadeira de número 14, que tem como patrono o Advogado criminalista Acácio Bernardes. Autor da obra Conceito de Princípios Constitucionais (RT, 2 ed., 2002) e de inúmeros artigos em Direito Constitucional publicados em revistas especializadas, nacionais e estrangeiras. Conferencista nacional e internacional sobre temas jurídico-públicos. [email protected], www.espindolaevalgas.com.br, www.facebook.com/ruysamuel. 55 48 3224-6739.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Direito eleitoral e reforma política:: Sugestões legais, jurisprudenciais e culturais à ótima concretização dos direitos de candidatura e de voto. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4391, 10 jul. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/40696. Acesso em: 25 abr. 2024.

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