A legitimidade do Congresso Nacional e a reformação que deve anteceder a reforma política

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07/07/2015 às 23:48
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Questionável a legitimidade do Congresso Nacional na implementação de qualquer reforma quando existe um Senado com três representantes para cada Estado e uma Câmara de Deputados com limites mínimo e máximo de representação.

RESUMO:O Congresso Nacional, formado pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados, não representa adequadamente a maioria do povo brasileiro, o que contradiz o princípio fundamental da República de que é do povo que emana todo o Poder do Estado. A ideia do bicameralismo está ultrapassada, pois os Senadores, que deveriam representar os Estados Membros e o Distrito Federal, são da mesma forma que os Deputados eleitos pelo voto popular; ademais, o Parlamento está entre os mais dispendiosos do mundo e, da mesma forma que os partidos políticos, são mal avaliados pela opinião pública. Assim, é necessária uma reformação que confira legitimidade à atuação do Poder Legislativo, para que somente depois sejam iniciadas reformas no sistema político.

ABSTRACT:The National Congress, formed by the Federal Senate and the House of Representatives, does not adequately represent the majority of the brazilian people, which contradicts the fundamental principle of the Republic that is the people that emanates throughout the State Power. The idea of bicameralism is outdated, for the Senators, who should represent the United States and the Federal District are the same as the Representatives Members elected by popular vote; moreover, Parliament is among the most expensive in the world and in the same way that political parties are poorly evaluated by public opinion. Thus, a reformation is necessary to confer legitimacy to the actions of the Legislative Power, so that only after reforms are initiated in the political system.

PALAVRAS- CHAVE: Congresso Nacional; Reforma Política; Senado Federal; Federação; Câmara dos Deputados; Extinção do Senado; Representação Proporcional. 

KEYWORDS: National Congress; Political Reform; Federal Senate; Federation; House of Representatives; Extinction of the Senate; Proportional Representation.

SUMÁRIO:1- Introdução; 2- Democracia; 2.1- Da elite dirigente; 2.2- Da democracia brasileira; 2.3- Da soberania popular; 3- Da Federação; 3.1- Da autonomia dos Estados e Municípios; 4- Do Congresso Nacional; 4.1- Do custo do Congresso; 4.2- Do Senado Federal; 4.2.1- Da importância da Câmara Alta; 4.2.2- Dos suplentes; 4.3- Da Câmara dos Deputados; 4.3.1 Da representação proporcional; 4.4- Das emendas ao orçamento; 5- Conclusão.   


1. INTRODUÇÃO

A atual discussão sobre reforma política caminha a passos largos de temas proeminentes à consolidação do Estado Democrático de Direito pretendido pelos constituintes de 1988. Basicamente, as propostas estão relacionadas ao fim da reeleição aos ocupantes do Poder Executivo, à doação de recursos por pessoas físicas e jurídicas, à cláusula de barreira, ao fim das coligações proporcionais, dentre outros temas (GOIS; PEREIRA, 2014) que, embora importantes, não constituem o núcleo que poderia, e deveria, representar a temática fundo da reforma política nacional.

Dessarte, não se discute a essência da Federação, que é a autonomia dos Entes que a compõem, tampouco a adequada representação do Poder Legislativo que, no plano Federal, é constituído pela Câmara Alta, com representantes dos Estados e do Distrito Federal, e pela Câmara Baixa, com representantes da população.

Temas dessa envergadura antecedem, de forma lógica, quaisquer outros assuntos, por mais relevantes que possam parecer. Como salientado em voto no STF pelo Ministro Barroso (2014, p. 39), é imprescindível a reforma do sistema político para que a população se sinta verdadeiramente representada pelos que exercem atividades em nome do interesse coletivo.

Há um descompasso evidente entre a premissa constitucional segundo a qual o poder do Estado emana do povo, reconhecido como princípio fundamental (parágrafo único do art. 1º) e a avaliação da população sobre as instituições que deveriam simbolizar a soberania popular. Em pesquisa do IBOPE (2013) sobre a confiança inspirada por instituições, das 22 que compunham a lista o Congresso Nacional e os partidos políticos obtiveram as duas piores colocações.

Sem inspirar confiança na população, e sem representar adequadamente a sociedade no Parlamento Federal, carece o Congresso Nacional da legitimidade necessária para implementar reformas no Estado, como a autonomia dos Entes Federados e, principalmente, a proporcionalidade na composição do Poder Legislativo, pressupostos indispensáveis à posterior reforma política. 


2. DEMOCRACIA

Para Fernandes (2013, p. 291), conceituar “democracia é simplesmente uma tarefa hercúlea”, pois se o foco for “em sua etimologia, nos referiríamos ao ‘governo do povo’, mas mais que isso, seria correto afirmar que democracia é uma lógica na qual o povo participa do Governo e do Estado”. Daí porque Silva (2013, p. 127-128) aponta que a definição de democracia é histórica:

Não sendo por si um valor-fim, mas meio e instrumento de realização de valores essenciais de convivência humana, que se traduzem basicamente nos direitos fundamentais do homem, compreende-se que a historicidade destes a envolva na mesma medida, enriquecendo-lhe o conteúdo a cada etapa do evolver social. Mantido sempre o princípio básico de que ela revela um regime político em que o poder repousa na vontade do povo. Sob esse aspecto, a democracia não é um mero conceito político abstrato e estático, mas um processo de afirmação do povo e de garantia dos direitos fundamentais que o povo vai conquistando no correr da história (SILVA, 2013, p. 128).

Adverte Fernandes (2013, p. 291), contudo, que hodiernamente a ordem jurídica deve consagrar “instrumentos não apenas de democracia direta- plebiscito e referendo- como de democracia indireta- eleição de representantes que concorrerão aos cargos políticos”, assentando, contudo, que não basta a escolha dos atores políticos, mas também “uma proteção constitucional” que resguarde “a superioridade da Constituição; a existência de direitos fundamentais”; a “legalidade das ações estatais; um sistema de garantias jurídicas e processuais”. Nesse sentido Luigi Ferrajoli (2006, p. 8), que destaca duas concepções antagônicas sobre democracia: “a primeira, que a identifica essencialmente com sua dimensão política, ou seja, com a vontade da maioria”, e “a segunda, que a identifica, ao contrário, pelo menos em seu paradigma constitucional contemporâneo, com a vontade da maioria, limitada e vinculada com aquele complexo de princípios e direitos que se encontram rigidamente estabelecidos nas cartas constitucionais”. Para o jurista italiano, a primeira concepção representa um conceito formal de democracia, “porquanto fundada na legitimação dos poderes políticos atendendo exclusivamente a formas e procedimentos idôneos para garantir que as decisões produzidas sejam expressão direta ou indireta da vontade popular, independentemente de seu conteúdo”, e a segunda concepção um conceito substancial, porque resulta da “legitimação daqueles mesmos poderes, não somente sobre a forma representativa e majoritária das decisões”, mas também pela “substancial conformidade de seu conteúdo com os direitos de liberdade e com os direitos sociais constitucionais estabelecidos, e que nenhuma maioria, nem sequer por unanimidade, pode violar ou deixar de satisfazer” (FERRAJOLI, 2006, p. 8). E o professor elucida:

Conforme a imagem simplificada proposta para a primeira concepção, democracia consistiria, por conseguinte, na onipotência da maioria, identificada com a soberania popular. Disto deriva uma grande quantidade de corolários: a desqualificação das regras e dos limites pelo Poder Executivo, expressão da maioria, e –por tanto- da separação de poderes e das funções de controle e garantia do Judiciário e do próprio Parlamento; a ideia segundo a qual o consenso da maioria legitima qualquer abuso; o rechaço, em suma, daquele sistema de mediações, de limites, de contrapesos e de controles que formam a substância daquilo que poderíamos denominar “democracia constitucional”; e se alcança, sobretudo, uma conotação plebiscitária e antiparlamentar de democracia, que encontra sua expressão mais apropriada no presidencialismo, vale dizer, na delegação de funções a um chefe, assumido como expressão direta da soberania popular. (FERRAJOLI, 2006, p. 8)

2.1 DA ELITE DIRIGENTE

Para Peter Bachrach (1967, p. 20), “Todas as teorias da elite repousam em duas premissas: primeiro, que as massas são intrinsecamente incompetentes e, segundo, que são, pior, seres ingovernáveis e desenfreados, com uma proclividade a minar a cultura e a liberdade”. Nesse sentido Ferreira Filho (1972, p. 29), ao dispor que a “democracia que é possível na realidade consiste no governo de uma minoria democrática”, qual seja, “por uma elite formada conforme a tendência democrática, renovada de acordo com o princípio democrático, imbuída do espírito democrático, voltada para o interesse popular: o bem comum”.

Esse pensamento era partilhado por Gurgel (1975, p. 95) que, ao discorrer sobre a tarefa da elite na promoção do bem comum, estabeleceu que esse processo deveria acontecer

[...] mediante um processo de “interação” com a massa. Auscultando o povo, as elites nacionais identificam seus anseios e aspirações. Possuindo um maior conhecimento da realidade histórico-cultural e dos dados conjunturais, elas têm uma visão mais elaborada dos autênticos interesses nacionais. Cabe-lhes, assim, interpretar os anseios e aspirações, difusos no meio ambiente, harmonizando-os com os verdadeiros interesses da Nação e com o Bem Comum, apresentando-os, de volta, ao povo que, desse modo sensibilizado, poderá entender e adotar os novos padrões que lhe são propostos.

Todavia, Silva (2013, p. 129) repudia esse pensamento de elite democrática, “que é fora de dúvida uma expressão contraditória”, aduzindo que esse conceito “foi também a doutrina da segurança nacional que fundamentou o constitucionalismo do regime militar que a atual Constituição suplantou”. O autor é categórico:

É equívoco pensar que esse chamado “elitismo democrático” se contenta com a tese de governo da minoria, que se limita a sustentar um “elitismo de dirigentes”. Coerente com sua essência antidemocrática, o elitismo assenta-se em sua inerente desconfiança do povo, que reputa intrinsecamente incompetente. Por isso sua “democracia” sempre depende de pressupostos notoriamente elitistas, tais como de que o povo precisa estar preparado para a democracia, de que esta pressupõe certo nível de cultura, certo amadurecimento social, certo desenvolvimento econômico, e reclama que o povo seja educado para elas, e outros semelhantes que, no fim das contas, preparam os fundamentos doutrinários do voto de qualidade e restritivo.

A contradição é evidente, pois supõe que o povo deve obter tais requisitos para o exercício da democracia dentro de um regime não democrático; que as elites devem conduzi-lo a uma situação que justamente se opõe aos interesses delas e as elimina. Teremos, enfim, a singularidade de aprender a fazer democracia em um laboratório não democrático.

Ora, em verdade, a tese inverte o problema, transformando, em pressupostos de democracia, situações que se devem ter como parte de seus objetivos: educação, nível de cultura, desenvolvimento, que envolva melhoria de vida, aperfeiçoamento pessoal, enfim, tudo se amálgama com os direitos sociais, cuja realização cumpre ser garantida pelo regime democrático. Não são pressupostos desta, mas objetivos. Só numa democracia pode o povo exigi-los e alcançá-los. (SILVA, 2013, p. 129- 130)

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2.2 DA DEMOCRACIA BRASILEIRA

O Brasil constitui, nos termos do art. 1º da Carta Política, um Estado Democrático de Direito, e no parágrafo único desse dispositivo, componente dos princípios fundamentais constitucionais, está posto que é do povo que emana todo o poder do Estado. Fernandes (2013, p. 288- 289) leciona que, na tradição lusitana, o termo democrático é utilizado para adjetivar Direito, e não o Estado, daí porque Portugal constitui um Estado de Direito democrático, “Contudo, o art. 1º da atual Constituição da República brasileira fez uso da outra expressão, muito possivelmente para realçar a ruptura com a postura autocrática assumida pelo Estado brasileiro a partir de 1964”. Para José Afonso da Silva (2013, p. 121), “A configuração do Estado Democrático de Direito não significa unir formalmente os conceitos de Estado Democrático e Estado de Direito”, mas sim estabelecer um novo conceito, onde se “leva em conta os conceitos dos elementos componentes, mas os supera na medida em que incorpora um componente revolucionário de transformação do status quo”, que já nasce proclamado e fundado, e “não como mera promessa de organizar tal Estado”.

Esse novel conceito de Estado Democrático de Direito, bem como dos valores que o fundamentam, devem ser interpretados a partir da ideia básica de que a titularidade do Poder que legitima a atuação estatal é do povo. Como anota Binenbojm (2006, p. 441), “O povo é a autoridade última e primeira em uma democracia”. Na verdade, como destaca Agra (2012, p. 127), diversos são os exemplos na atualidade de governos legitimados apenas teoricamente pelo povo, lembrando que, “ao início do terceiro milênio, a legitimidade popular se tornou um dogma intransponível, mesmo transformada em ordenamento semântico”. Durante muitos anos esse conceito teve força meramente formal, daí o pensamento constitucionalista atual, que pugna por conferir-lhe força material.

Essa alteração conceitual impõe ao intérprete das normas constitucionais a extração de efeitos à luz de um Estado Democrático de Direito. Do contrário, estaria violado o escopo pretendido pelos constituintes de 1988 e, talvez, se equipararia à letra morta dos dispositivos encontrados em constituições pretéritas, solapados de efeitos concretos, como o presente no § 1º do art. 1º da Constituição de 1967, cuja redação foi repetida na Carta oriunda da Emenda Constitucional nº 1, de 1969, de que “Todo o poder emana do povo e em seu nome é exercido”; ora, no Brasil de 1964 a 1985 houve uma sucessão de governos militares, e de forma alguma o dispositivo constitucional externava efeitos concretos, pois não havia democracia, tampouco Estado de Direito, e muito menos respeito aos direitos humanos fundamentais. Da mesma forma a Constituição dos Estados Unidos do Brasil, outorgada em 1937, que na parte final do seu art. 1º dispunha que “O poder político emana do povo e é exercido em nome dele e no interesse do seu bem-estar, da sua honra, da sua independência e da sua prosperidade”; durante seu interregno, de 1937 a 1945, denominado Estado Novo, havia um governo ditatorial.

De fato, não se pode admitir, “no estágio atual do constitucionalismo, palavras e expressões elencadas na Lei Maior desprovidas de resultado prático e efetivo, ainda mais quando expressam fundamentos principiológicos da República” (POLÍZIO JÚNIOR, 2014, p. 99). Como leciona Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 958-959), princípio constitui “mandamento nuclear de um sistema”, funcionando como “verdadeiro alicerce”, que alcança as diversas normas “compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico”. O professor é taxativo:

Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.

Isso porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçada. (MELLO, 2010, p. 959)

Dessarte, aos conceitos de Estado Democrático de Direito, presente no caput do art. 1º da Constituição Federal, e no de soberania popular, do parágrafo único daquele dispositivo, reconhecidos como princípios fundamentais pelos constituintes de 1988, é necessário sempre buscar um sentido mais consentâneo à evolução do constitucionalismo. Como lembra Barroso (2013, p. 288-289):

O novo direito constitucional [...] tem sido referido, por diversos autores, pela designação de neoconstitucionalismo. O termo identifica, em linhas gerais, o constitucionalismo democrático do pós-guerra, desenvolvido em uma cultura filosófica pós-positivista, marcado pela força normativa da Constituição, pela expansão da jurisdição constitucional e por uma nova hermenêutica. Dentro dessas balizas gerais, existem múltiplas vertentes neoconstitucionalistas. Há quem questione a efetiva novidade dessas ideias, assim como seus postulados teóricos e ideológicos. Mas a verdade é que, independentemente dos rótulos, não é possível ignorar a revolução profunda e silenciosa ocorrida no direito contemporâneo, que já não se assenta apenas em um modelo de regras e de subsunção, nem na tentativa de ocultar o papel criativo de juízes e tribunais. Tão intenso foi o ímpeto das transformações que tem sido necessário reavivar as virtudes da moderação e da mediania, em busca de equilíbrio entre valores tradicionais e novas concepções. (destaques no original)

2.3 DA SOBERANIA POPULAR

Em que pese o reconhecimento constitucional, na condição de princípio, de que é do povo que emana a totalidade de Poder do Estado, “os partidos políticos e os exercentes de cargos eletivos do Poder Legislativo e do Poder Executivo comumente são mal avaliados pela população. Seria como se houvesse um hiato entre a sociedade e os que são eleitos para representá-la e seus respectivos partidos” (POLÍZIO JÚNIOR, 2014, p. 94).

Moisés (2013, p. 202) aponta a corrupção política como “um dos problemas mais severos e complexos enfrentados por novas e velhas democracias”, lembrando que frauda “o princípio da igualdade política inerente à democracia”, porque não só permite aos que dela se utilizam “obter ou manter poder e benefícios políticos desproporcionais aos que alcançariam pelos modos legítimos e legais de competir politicamente”, como também “distorce a dimensão republicana da política moderna, porque faz as políticas públicas resultarem não do debate e da disputa aberta entre projetos diferentes, mas de acordos de bastidores que favorecem interesses espúrios”. O autor completa:

A conduta irregular de líderes e de partidos políticos também compromete a percepção das pessoas sobre as vantagens da democracia em comparação às suas alternativas, pois, ao fazer crer que tal conduta é parte da rotina usual tanto do regime democrático como do autoritário, ela desqualifica os mecanismos adotados pelo primeiro para controlar o abuso do poder e para garantir a soberania dos cidadãos. Em contrapartida, ao desqualificar a relação dos cidadãos com os Estados democráticos, ela compromete a cooperação social e afeta negativamente a capacidade de coordenação dos governos para atender às preferências dos eleitores. Os seus efeitos influenciam, portanto, tanto a legitimidade quanto a qualidade da democracia, ao comprometer o princípio segundo o qual nesse regime ninguém está acima da lei, e contribui para o esvaziamento dos mecanismos de responsabilização dos governos (accountability vertical, social e horizontal). (MOISÉS, 2013, p. 202) (grifei)

Nesse sentido o pensamento de Luís Roberto Barroso (2014, p. 39), manifestado por ocasião do seu voto no julgamento do sétimo embargos infringentes oposto na Ação Penal nº 470, pelo STF:

Logo no início da minha participação neste julgamento, fiz três observações: a primeira foi uma crítica à centralidade do dinheiro no sistema político brasileiro, com custos estratosféricos das campanhas majoritárias e proporcionais. A segunda, a de que tal sistema, além do seu déficit democrático, era indutor da criminalidade. E penso que tal diagnóstico foi confirmado pela recorrente sucessão de escândalos políticos que continuam a aparecer em todos os níveis da Federação, sem distinção de partidos, indo de um lado a outro do espectro político. E a minha terceira observação, ao início deste julgamento, foi a de que a imensa energia jurisdicional despendida no julgamento da ação penal nº 470 terá sido em vão se nós não produzirmos uma profunda reforma política capaz de baratear o custo das eleições, dar maior autenticidade ao sistema partidário e ajudar na formação de maiorias consistentes no Congresso Nacional. Ao retomar esta última fase do julgamento, eu reitero essas convicções, e destaco que nada de relevante aconteceu, ou parece estar em vias de acontecer, em relação à reforma do sistema político. Por essa razão continuamos a viver um abominável espetáculo de hipocrisia, em que todos apontam o dedo para todos, enquanto muitos procuram manter ocultos os seus cadáveres no armário. Pior que tudo, temos um sistema político que não atrai vocações, não mobiliza a juventude, compreensivelmente afastada pelo medo do contágio das práticas aqui denunciadas e condenadas. Vivemos a derrota do idealismo, diluído no argentalismo e na criminalidade política. (grifei)

Em que pese o desejo de mudança externado nas diversas manifestações populares ao longo de 2013 (GRIPP, 2013), houve reeleição da presidente da República (DIAP, 2014, p. 10); com relação aos Congressistas, o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar- DIAP, aponta que dos 513 Deputados Federais, 387 (75,44%) disputaram a reeleição, dos quais 274 conseguiram renovar os mandatos (2014, p. 13), e das 27 vagas que seriam renovadas no Senado (1/3 do total), 10 Senadores tentaram a reeleição e 5 conseguiram renovar os mandatos (2014, p. 14). Por outro lado, a confiança da população nos partidos políticos e no Congresso Nacional apresentam reiterados índices diminutos em diversas pesquisas, como a elaborada pelo IBOPE (2013), na qual se analisa o Índice de Confiança nas Instituições (ICI) entre os anos de 2009 e 2013:

                        

2009

2010

2011

2012

2013

Família

90

91

90

91

90

Amigos

67

69

68

70

67

Brasileiros de modo geral

59

60

60

59

56

Vizinhos

59

59

59

61

57

Corpo de bombeiros

88

85

86

83

77

Igrejas

76

73

72

71

66

Forças armadas

71

69

72

71

64

Meios de comunicação

71

67

65

62

56

Empresas

61

60

59

57

51

Organizações civis

61

61

59

57

49

Polícia

52

52

55

54

48

Bancos

61

58

57

56

48

Escolas públicas

62

60

55

55

47

Poder judiciário/ justiça

52

53

49

53

46

Presidente da república

66

69

60

63

42

Governo federal

53

59

53

53

41

Eleições/ sistema eleitoral

49

56

52

47

41

Governo do seu município

53

50

47

45

41

Sindicatos

46

44

44

44

37

Sistema público de saúde

49

47

41

42

32

Congresso nacional

35

38

35

36

29

Partidos políticos

31

33

28

29

25

GERAL

60

60

58

57

50

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Sobre o autor
Vladimir Polízio Júnior

Professor, advogado e jornalista. Membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/SP, 33ª Subseção de Jundiaí. É especialista em direito civil e direito processual civil, em direito constitucional e em direito penal e direito processual penal. Mestre em direito processual constitucional. Doutor em direito pela Universidad Nacional de Lomas de Zamora, Argentina. Pós-doutor em em Cidadania e Direitos Humanos pelo Ius Gentium Conimbrigae da Universidade de Coimbra, Portugal. Autor de artigos e livros, como Novo Código Florestal, pela editora Rideel, Lei de Acesso à Informação: manual teórico e prático, pela editora Juruá, e Coleção Prática Jurídica, por e-book, com 4 volumes: Meio Ambiente e os Tribunais, Crimes contra a Vida e os Tribunais, Crimes contra o Patrimônio e os Tribunais, e Liberdade de Expressão e os Tribunais.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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