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A citação por hora certa e a citação por edital na nova sistemática processual penal

28/07/2015 às 10:38

Resumo:


  • A citação é um ato processual que dá ao acusado conhecimento da acusação feita contra ele, permitindo que ele se defenda.

  • A falta de citação pode levar à nulidade do processo, conforme estabelecido no Código de Processo Penal.

  • A citação pode ser real (feita pessoalmente) ou ficta (quando se presume que o acusado teve conhecimento da acusação).

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Apresentamos, neste estudo, as modalidades de citação diante da sistemática do processo penal brasileiro, com atenção especial à discussão quanto à constitucionalidade da citação por hora certa.

 - A citação como ato processual obrigatório

 A citação é o ato processual que dá ao acusado conhecimento da acusação que lhe é feita, a fim de que possa se defender.

 É conseqüência da falta de citação a nulidade pleno iure do processo, em infração à imposição categórica do artigo 564, III, do Código de Processo Penal.

É que a citação é pressuposto processual de existência de uma relação processual. Se não houver,  não há que falar em processo, muito menos em processo válido.

 A citação pode ser real ou ficta. A primeira é a realizada na pessoa do próprio denunciado, tendo ele conhecimento do fato de seu chamamento. É ficta a citação quando se presume que o acusado tenha tido esse conhecimento.

 A citação real pode ser: por mandado, requisição, precatória (quando o réu se encontra fora do território de jurisdição do juiz processante) ou rogatória(se expedida para cumprimento no exterior).

 Como tal o mandado de citação deve, acima de tudo, especificar a acusação feita ao réu para que ele possa se defender sem qualquer surpresa. Para isso deve-lhe ser entregue a contrafé. Isso porque a citação é uma garantia individual, dentro do que se especifica como o devido processo legal, pois é peça indispensável para o acusado tomar conhecimento da denúncia e preparar a sua defesa.

 Com a citação forma-se a relação jurídica processual, tem-se a litispendência, a prevenção (que fixa a competência do juiz em face de outro, quando todos forem igualmente competentes).

 No processo penal, a citação é ato do juiz, que se faz, em regra, através do oficial de justiça. Assim, não há citação telefônica ou por via postal, no processo penal (RT, 457:436, 517:362).

 A regra é a citação real, a exceção a citação ficta. Isso porque o oficial de justiça deve procurar o réu nos endereços constantes da denúncia e só depois será caso de citação ficta.

 Há de se falar em citações especiais: a do militar (artigo 358 do CPP) e do preso (artigo 360 do CPP), sempre através de requisição à autoridade administrativa competente.

 Tal a importância da revelia que, se o réu é citado regularmente e não comparece, sem justificação, aos atos do processo, será considerado revel. De toda ordem, à luz do devido processo legal, o processo prosseguirá com seu defensor.

 Todavia, a revelia, no processo penal, não tem os efeitos existentes para o processo civil. Não gera a confissão, uma vez que se está diante do status libertatis.

 A revelia desaparece com o comparecimento do réu.

 - A citação real por mandado: Faz-se a citação por mandado quando o réu estiver no território sob a jurisdição do juiz que determinou fosse expedido. É feita pessoalmente, na pessoa do próprio acusado. São requisitos para essa espécie de citação: o nome do juiz; o nome do réu; sua residência; o lugar, o dia e a hora em que ele deve comparecer a juízo; a subscrição do escrivão e a rubrica do juiz.

 O oficial de justiça deve certificar-se de que a pessoa encontrada seja, efetivamente, o citando. Para isso deverá exigir-lhe que exiba comprovante de identidade, como se prescreve no artigo 239, parágrafo único, do Código de Processo Civil, para as intimações. O oficial lerá na íntegra o mandado, pedindo-lhe, ao final, que nele aponha a nota de ciente e lhe oferecerá a contrafé. O oficial lavrará certidão, contendo a narrativa de todo o desenrolar do ocorrido, esclarecendo se o citando se negou a apor a nota de ciente e se aceitou ou não a contrafé (reprodução fiel do mandado que se destina a ser entregue ao citando).

 Por certo, a inexistência de citação levará à nulidade do feito. No entanto, a presença espontânea do denunciado levará à cessação desta.

 - A citação ficta ou por edital: A redação original do Código de Processo Penal se ocupava dessa espécie de citação, exigindo-se: a) que o réu não seja encontrado; b) oculta-se para não ser citado; c) é inacessível o lugar onde se encontra; d) é incerta a pessoa que tiver de ser citada (quando não se conhece a sua identidade por inteiro ou sua qualificação); e) estiver no estrangeiro em lugar sabido ou não, mas a infração for afiançável. O artigo 361 do Código de Processo Penal prescreve que a prova de não ter sido encontrado o citando é a certidão do oficial de justiça, que deve abster-se de lavrar a certidão de ausência sempre que lhe restar ainda um lugar onde provavelmente puder encontrar o acusado. À vista dessa certidão, será expedido, então, o edital citatório com prazo de quinze dias. No entanto, a lei, com sua redação original, ditava que o prazo já não será este, mas o de cinco dias, quando o acusado se ocultar. As exigências para o edital, que deve ser publicado na comarca onde houver imprensa e fixado no fórum, são impostas pelo artigo 365 do Código de Processo Penal. Dessa forma, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido da exigência da publicação do edital em jornal local unicamente nas Comarcas em que haja imprensa oficial (HC 55.991, DJU de 19.05.78, pág. 3485). A citação por edital, com a necessária publicação em jornal local, pressupõe a existência na Comarca, de imprensa oficial. Caso exista periódico sem essa natureza, de publicação oficial, a formalidade é dispensável (RHC 55.503, DJU de 18.8.78). Contra, entendendo haver nulidade absoluta: RT 516/281. A falta de afixação do edital no local de costume não é causa de nulidade, desde que publicado pela imprensa (STJ, RHC 4.050, DJU de 31.10.94, pág. 29.510).

 Já entendeu o Supremo Tribunal Federal que não é nula a citação por edital que indica o dispositivo da lei penal, embora não transcreva a denúncia ou queixa, ou não resuma os fatos em que se baseia.

 A incorreção no nome do citado acarreta nulidade absoluta (STF, HC 75.743, 2ª Turma, relator Ministro Maurício Corrêa, RT 752/523).

 A falta de indicação, de forma clara e inequívoca, do dia em que o réu deve comparecer em juízo, nos termos das orientações do Supremo Tribunal Federal, anula a ação penal a partir da citação (RTJ 75/406). É caso de nulidade absoluta. O edital deve fixar dia certo, expresso em número do calendário.

 Já se decidiu que a lei processual não exige que, antes de proceder a citação por edital, o juiz oficie à Polícia e aos presídios para saber se o citando, dado como em lugar incerto e não sabido, está preso (Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, RT 521/434 e 592/353).


-  A Lei 9.271/96

 A Lei nº 9.271, de 17 de abril de 1996, modificando o artigo 366 do Código de Processo Penal, determina que, se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada de provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar a prisão preventiva, nos termos do disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal.

 São requisitos da suspensão da ação penal: a) a citação por edital (CPP, artigo 361 a 363 do CPP); b) que o réu não tenha comparecido em juízo para o interrogatório; c) que não haja advogado constituído nos autos. Tais condições são simultâneas.

Tendo em vista que se trata de norma de conteúdo misto – penal (suspensão da prescrição) e processual penal (suspensão do processo), tornou-se jurisprudência pacífica, do que se lê, dentre outros, do Recurso Especial 171.125 – SP, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 4 de outubro de 1999, que  a Lei 9.271, de 17 de abril de 1996, não retroage. 

Interessante é a questão do limite do tempo da suspensão. É certo que a lei não o diz.

É conhecida  a posição de Paulo Rangel (Direito Processual Penal, 20ª edição, São Paulo, Atlas, pág. 902) no sentido de que o prazo de suspensão deve ser o tempo da prescrição da infração penal, regulado pelo máximo da pena privativa de liberdade prevista in abstrato, do que se lê do artigo 109, caput, do Código Penal.

Não apresentada a defesa escrita e não constituído defensor, o juiz deverá aplicar o disposto no artigo 366 do Código de Processo Penal, suspendendo-se o processo e o curso do prazo prescricional, sem prejuízo da produção de provas urgentes, e, se for o caso, pois não é obrigatório, a decretação da prisão preventiva, se previstos os requisitos previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal.

De toda ordem, causa preocupação  a aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal, a partir da redação que lhe deu a Lei 11.719/08, sem limite temporal, ficando o seu termo final do prazo suspensivo para a data em que o réu comparece em juízo, levando a triste exposição desses processos à ação do tempo, ficando expostos nas prateleiras das varas criminais, em evidente ofensa à efetividade do processo.

Daí,  foi correta a posição tomada pelo Superior Tribunal de Justiça ao editar a Súmula 415, em dezembro de 2009, tendo o Ministro Arnaldo Esteves Lima, como Relator, a Terceira Seção daquela Corte aprovou o seguinte enunciado:"O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada."

Vamos a um exemplo: Em se tratando de homicídio, o prazo prescricional da pretensão punitiva é de 20 (vinte) anos, segundo o artigo 109, I, do CP. O magistrado deverá sustar a ação penal por tal prazo máximo. Se, passados esses vinte anos, o réu não for encontrado, o prazo prescricional, que havia sido interrompido com o recebimento da denúncia (artigo 117, I, do CP) e, em seguida, suspenso (artigo 366 do CPP), voltará a correr pelo tempo restante, isto é, onde parou no momento da suspensão do processo.

Tal não ocorre na nova lei da lavagem do dinheiro.

Disciplina o artigo 2º, § 2º, que, no processo por crime previsto na nova lei, não se aplica o disposto no artigo 366 do Código de Processo Penal, devendo o acusado que não comparecer nem constituir advogado ser citado por edital, prosseguindo-se o feito até o julgamento, com a nomeação de defensor dativo.Já dizia Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal Comentado, São Paulo, ed. Revista dos Tribunais, 10ª edição, pág. 707) que, nos processos que apuram crimes de lavagem de dinheiro, a citação por edital não impede o curso procedimental, possibilitando o julgamento do mérito. Tal se justificaria em face da gravidade dos delitos em questão e da necessidade de se bloquear e confiscar os bens ilícitos obtidos através da lavagem do dinheiro.

É certo que houve uma tentativa de modificação do artigo 366, caput, do Código Penal, segundo a redação da Lei 11.719/08, que não vingou diante do veto presidencial, que não foi afastado, permanecendo íntegro o texto anterior.

Fica a lição de Eugênio Pacelli de Oliveira (Curso de Processo Penal, São Paulo, Atlas, 16ª edição, pág. 607), para quem, comparecendo o réu, em qualquer tempo, deverá o juiz dar prosseguimento ao processo, cumprindo-se o disposto no artigo 394 e seguintes do Código de Processo Penal. Assim, a teor do artigo 396, parágrafo único, do Código de Processo Penal, o prazo para a defesa do réu citado por edital somente começaria a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado e do defensor constituído.

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 A decisão judicial que suspende o processo é interlocutória mista, sendo cabível o recurso em sentido estrito, por analogia ao artigo 581, XVI, do Código de Processo Penal. Diversa, contudo, é a posição de Paulo Rangel (obra citada, pág. 905), que vê o remédio processual adequado na apelação, a teor do artigo 593, II, do Código de Processo Penal.


 -  A Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008: 

 Tal norma foi editada com o evidente propósito de regulamentar, no processo penal, uma série de providências, à luz do que chamamos devido processo legal em sentido processual.

 Nessa linha, tem-se que a doutrina brasileira (cito, por exemplo, Rogério Lauria Tucci e José Rogério Cruz e Tucci, Constituição de 1988 e Processo, São Paulo, 1989, pág. 15; Carlos Roberto de Siqueira Castro, O devido processo legal, pág. 34) tem empregado tal expressão na enumeração das seguintes garantias: a) direito à citação e ao conhecimento da acusação; b) direito a um rápido e público julgamento; c) direito ao arrolamento de testemunhas e á notificação das mesmas para comparecimento perante os tribunais; d) direito ao procedimento contraditório; e) direito de não ser processado, julgado ou condenado por alegada infração às leis ex post facto; f) direito à plena igualdade entre acusação e defesa; g) direito contra medidas ilegais e busca e apreensão; h) direito de não ser acusado nem condenado com base em provas ilegalmente obtidas; i) direito à assistência judiciária, inclusive gratuita; j) privilégio contra a autoincriminação. 

 O devido processo legal descreve a possibilidade efetiva de a parte ter acesso à justiça, deduzindo a pretensão e defendendo-se do modo mais amplo possível.

 Para isso a necessidade de que a citação, seja real ou ficta, seja cercada de todas as garantias constitucionais.

 - Artigo 362 do Código de Processo Penal: Verificado que o réu se oculta para não ser citado, o oficial de justiça certificará a ocorrência e procederá à citação com hora certa na forma estabelecida nos artigos 227 a 229 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil. O parágrafo único estabelece que completada a citação por hora certa, se o acusado não comparecer, ser-lhe-á nomeado defensor dativo.

 A citação por hora certa era prevista no Código de Processo Civil de 1939, artigo 171, e é encontrada no direito comparado no Código de Processo Civil Português, artigo 240; Código de Processo Civil francês, artigos 655 a 658; Código de Processo Federal da Argentina, artigo 339, segunda parte; e no Código de Processo Civil Federal do México (artigo 117).

 Trata-se de um incidente próprio do cumprimento do mandado e não modalidade distinta. Essa é a lição de Egas Muniz (Comentários ao Código de Processo Civil, volume II, 2ª edição, Rio de Janeiro, Forense, pág. 260). Não seria, pois, uma modalidade distinta.

 Ora, em cumprimento ao mandado, o oficial de justiça deverá procurar o citando em seu domicílio ou residência. Não o encontrando, informar-se-á da hora em que ali costuma estar, voltando a procurá-lo. Ainda não o encontrando, retornará a procurá-lo pela terceira vez. Inútil a procura, e suspeitando de que o réu se oculta para não ser citado, procederá a sua citação com hora certa. Faz-se a citação com hora certa quando já fundada a suspeita de que o réu se oculta para impedir a diligência.

 Por óbvio, a procura de alguém em sua residência apenas surtirá efeito se o oficial aí comparecer em horas nas quais seja presumível nela se encontrar a pessoa procurada. Por certo, não haverá indícios de que o citando está se ocultando, se o oficial de justiça só o procurar, no horário de expediente em repartição ou local onde comanda atividade autônoma, em sua residência. O Tribunal de Justiça de São Paulo, acórdão no Agravo 49.370 (Revista dos Tribunais, 188/305), considerou inadequada a procura do citando em seu escritório, em vez de sua residência.

 Lembro a lição de Pontes de Miranda no sentido de que não se trata de modalidade de citação, diversa da citação por mandado. É exceção à pessoalidade da citação.

 Assim, há duas condições para que o oficial de justiça delibere fazer a citação por hora certa: a) haja por três vezes procurado o réu, em seu domicílio ou residência, sem encontrá-lo; b) haja suspeita de ocultação (artigo 227 do Código de Processo Civil). Bem leciona Moacir Amaral Santos (Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 2º volume, 17 ª edição, pág. 173), para quem, daquela condição não resulta esta. Bem poderá se dar a procura por três vezes, sem que daí resulte aquela suspeita. Esta deverá nascer de outros motivos mais aquele.

 Ocorrendo as duas condições, o oficial de justiça deverá "intimar a qualquer pessoa da família, ou em sua falta a qualquer vizinho, que, no dia imediato, voltará, a fim de efetuar a citação, na hora que designar" (artigo 227 do Código de Processo Civil). Ficará um intermediário, pessoa da família, da casa ou vizinho, com a incumbência de comunicar ao citando que o oficial de justiça voltará no dia seguinte, em hora certa, para efetuar a citação. Tal intimação poderá ser feita, na falta de familiar, a um amigo que ali também resida ou freqüente, a um empregado doméstico, que ali, diariamente, execute serviço. Entende-se que esse dia seguinte poderá ser um feriado, um domingo. Isso porque o artigo 172, § 2º, do Código de Processo Civil determina que a citação poderá ser realizada, em casos excepcionais, mediante a autorização expressa do juiz, em domingos ou feriados ou em dias úteis, fora do horário normal, obedecido o artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal), direito fundamental, que determina que a casa é asilo inviolável e o terceiro só poderá penetrar durante o dia com expressa ordem judicial. De toda sorte, o horário estabelecido entre 6 horas até 20 horas é próprio de ato interno, a teor do artigo 172, caput, do Código de Processo Civil. A realização de citação no sábado, que não é feriado, é mera irregularidade (RT 500/242). Mas, vou mais adiante: noite, para efeito da disciplina processual penal, é quando o sol se põe,  um conceito que é de natureza geofísica. Esse é o limite a ser estabelecido para a prática de atos processuais penais. Como bem disse Guilherme de Souza Nucci (Prisão e liberdade, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, pág. 35), dia é o período de exposição solar, que independe de horários artificiais, como o horário de verão.

 Encontrando-o, citar-lo-á pessoalmente, conforme na citação por mandado (Código, artigo 228, 226). Não o encontrando o oficial de justiça procurará informar-se da ausência (artigo 228 do Código de Processo Civil). Se dessas informações se desfizer a suspeita de ocultação, prejudicada estará a citação com hora certa; não destruída a suspeita, o oficial de justiça dará por feita a citação, ainda que o citando se tenha ocultado em outra comarca (Código de Processo Civil, artigo 228, § 1º, do Código de Processo Civil).

 Se não se convencer de que tenha havido ocultação, o oficial não ultimará a citação, podendo prosseguir nas diligências para encontrar o réu e citá-lo pessoalmente, até mesmo com hora certa, se tais fatos justificarem a suspeita ou recolher o mandado, certificando não ter podido cumpri-lo por ignorar o paradeiro do citando.

 Feita a citação, o oficial de justiça lavrará certidão circunstanciada do ocorrido, deixando da citação contrafé com pessoa da família ou com qualquer vizinho, conforme o caso, declarando-se o seu nome, pessoa essa que poderá não ser a mesma a quem se pôs a hora certa.

 A citação com hora certa é presumida ou ficta, pois presume-se que pessoa da família ou o vizinho dê ao citando conhecimento do ocorrido e lhe entregue a contrafé.

 O escrivão deverá, obrigatoriamente, cumprir os ditames do artigo 229 do Código de Processo Civil, pois logo que devolvido a cartório o mandado cumprido, confirme a citação ao citado, e envie carta, telegrama ou radiograma, dando-lhe de tudo ciência.

 Pouco importa que a comunicação do escrivão chegue, ou não, ao efetivo conhecimento do citando, pois o essencial é que seja enviada para seu endereço.

 Já entendeu o Superior Tribunal de Justiça que a remessa pelo escrivão de carta, telegrama ou radiograma, dando ciência ao réu da citação feita por hora certa, é requisito obrigatório desta modalidade de citação e sua inobservância gera nulidade (Recurso Especial nº 468.249/SP, Ministra Nancy Andrighi e ainda Recurso Especial nº 280.215/SP, 5ª Turma, Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 13.08.2001).

 A certidão de intimação feita pelo Oficial de Justiça terá fé pública e presunção iuris tantum.

  Há entendimento de que a sistemática da citação por hora certa será regida pelo princípio da instrumentalidade das formas de modo que devem ser reputados válidos os atos que cumpram a sua finalidade essencial. Mister, todavia, que se lembre que tal hipótese de citação que se diferencia da citação pessoal deve ser feita com todas as cautelas.

 Na citação por hora certa o prazo para a contestação começa a fluir da juntada do mandado e não do comprovante de recepção da correspondência do escrivão (Recurso Especial nº 8.633 – Minas Gerais, relator Ministro Waldemar Zveiter, DJ de 27.05.1991). Diverso se dá com relação a citação por edital, quando o prazo para defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído (artigo 396, parágrafo único do CPP, com a nova redação dada pela Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008).

Porém, no processo penal, temos a posição a ser seguida em face da redação da Súmula 710 do Supremo Tribunal Federal, onde se lê que, no processo penal, contam-se os prazos da data da intimação e não da juntada aos autos do mandato ou da carta precatória. Sendo assim, citado por hora certa, o prazo para o oferecimento da resposta, pois o réu é citado, não mais para comparecer a interrogatório (que fica para o final do procedimento ordinário), mas para tal ato de defesa, inicia-se na data do ato citatório e não mais das providências posteriores do artigo 229 do Código de Processo Penal.

A expedição da carta, telegrama ou radiograma, não interfere na contagem do prazo para a resposta escrita, cujo início se tem em razão da data designada pelo oficial para o novo comparecimento, com a entrega da contrafé.Se o citado por hora certa não oferecer defesa, deverá o juiz nomear defensor a ele, para a apresentação de defesa escrita, no prazo de 10 (dez) dias, como se lê do artigo 396-A do Código de Processo Penal.

É certo que Eugênio Pacelli de Oliveira (obra citada, pág. 605) faz crítica a tal redação do artigo 362, parágrafo único do Código de Processo Penal. Diz ele: "Comparecer onde e quando, se o mandato é para apresentação de defesa escrita?". Ora, nada impede que, comparecendo, antes da audiência de instrução prevista, após o recebimento da peça acusatória, seja renovado o prazo para a defesa escrita.

 É nula a citação por hora certa se o oficial de justiça deixa de consignar na certidão os horários em que realizou as diligências (Recurso Especial nº 468.249 – SP, DJ de 1.9.2003, pág. 219). Nessa mesma linha de pensar tem-se decisão em RT 494/107. Estamos diante de citação ficta, presumida, que exige que ao réu seja dado curador especial (artigo 9º, II, do Código de Processo Civil). Tal profissional é importante inclusive para a produção das chamadas provas urgentes determinadas para a fiel condução do processo. Em hipótese alguma resultará em efeito da revelia.

No caso em estudo, citado por hora certa e não comparecendo, o juiz providenciará a nomeação do defensor dativo ou remeterá o caso para o patrocínio da Defensoria Pública. Essa a correta solução encontrada por Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal Comentado, 10ª edição, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, pág. 701).

Ainda é Guilherme de Souza Nucci (obra citada, pág. 701) que entende possível que a citação por hora certa pode valer-se da suspensão do processo, pois não se pode, para ele, dar prosseguimento a instrução, valendo-se dessa espécie de citação ficta. Mas, não ocorrerá, pois não há analogia em malam partem, suspensão da prescrição.  Disse ele que, no processo penal, com maior razão do que as premissas existentes no processo civil, do que se lê do artigo 9º, II, do Código de Processo Civil, não se pode dar prosseguimento a uma instrução valendo-se de uma espécie de citação ficta.

Dir-se-ia que em relação a citação por  hora certa não haverá suspensão do processo, nos moldes do artigo 366 do Código de Processo Penal, que fica apenas para a citação por edital. A realização da citação por hora certa permitiria o prosseguimento do processo sendo nomeado defensor dativo, se o acusado não comparecer (artigo 362, parágrafo único).

Poder-se-ia dizer: há evidente inconstitucionalidade na previsão inserida no artigo 362 do Código de Processo Penal, por violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, pois a ampla defesa abrange, além da defesa técnica, a chamada autodefesa, que fica prejudicada, em face da continuidade do processo, cujo procedimento citatório foi tomado por hora certa.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu, por meio de votação no Plenário Virtual, a existência de repercussão geral no Recurso Extraordinário 635.145, em que se discute a constitucionalidade ou não da citação por hora certa prevista no Código de Processo Penal.

 A nova Lei 11.719 revoga os antigos incisos I e II do artigo 363, não sendo mais possível citação por edital, nas hipóteses em que é inacessível, em virtude de epidemia, de guerra ou por outro motivo de força maior, o lugar onde se encontra o réu e quando incerta a pessoa que tiver de ser citada. Fica a pergunta: se houver tal calamidade, qual o caminho a seguir?

 Daí, porque o artigo 363 do Código de Processo Penal determina, em seu parágrafo primeiro, que, não sendo encontrado o acusado, será procedida a citação por edital.

Comparecendo o acusado citado por edital, em qualquer tempo, o processo observará o disposto nos artigos 394 e seguintes do Código de Processo Penal, a teor do parágrafo quarto.

 Com isso cercam-se de todas as circunstâncias a citação ficta de modo a dar ao acusado a garantia do contraditório.

 A teor do artigo 2º do Código de Processo Penal a lei processual penal se aplicará imediatamente, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.

 É o principio da aplicação imediata da lei processual. Não se trata de retroatividade. Tal assertiva leva em conta a ilação de que a nova norma mais prudentemente instrumentaliza uma garantia constitucional, a benefício da defesa do acusado, que deve ser ampla e sem qualquer condicionamento.

 Na linha exposta por Magalhães Noronha (Curso de Direito Processual Penal, 1979, 11ª edição, São Paulo, Ed. Saraiva,   pág.12 e 13), se conclui que os processos em andamento, quando entrou em vigor a Lei, tiveram duas partes distintas: uma realizada sob o regime da lei ab-rogada; outra, que foi disciplinada pela nova Lei. Compete ao juiz, aplicando as novas normas, conciliar as duas fases, cuidando para que as garantias fornecidas pela lei posterior pudessem ser aplicadas no processo em curso, sem molestar os atos anteriormente realizados. 

 Com tal raciocínio, ver-se-á que processos que antes ficavam suspensos, face a revelia do réu, em citação do edital, agora, fora a hipótese dele não ser encontrado, poderão ter continuidade, a bem do interesse público da ágil solução da lide, que é um direito da sociedade.

 A utilização da citação por hora certa no processo penal é mais uma contribuição visando a tornar efetivo o principio da duração razoável do processo (artigo 5º, LXXVIII, da Constituição Federal). Aliás, não é desconhecido que, diante de tal instituto, o réu apresenta defesa técnica, por memorais, e inclusive exercita o ônus de recorrer.

Pois bem: se há, sem dúvida ponderável, agilização dos processos, com a aplicação do instituto da citação por hora certa, no processo penal, de outra parte, há inestimável dúvida com relação a sua constitucionalidade. A uma, porque haveria cerceamento para própria defesa diante da continuidade do feito, uma vez que o acusado tem o direito de ser pessoalmente informado da acusação que lhe é imputada, para proceder a sua defesa; a duas, porque compromete a sua autodefesa.

Observa-se que aqui não se pode garantir que o réu, diante da citação por hora certa, tenha verdadeiro conhecimento da demanda contra si ajuizada.

O mais prudente seria, diante da citação por hora certa, suspender-se o processo, nos moldes do artigo 366 do Código de Processo Penal. Não estamos, como no processo civil, diante de direitos disponíveis.

Não é de outra forma que Ivan Luís Marques da Silva (Citação por  hora certa no processo penal) aponta que o principio da ampla defesa somente é respeitado de forma ampla com a presença, no decorrer da ação penal, da defesa técnica e da autodefesa, pois, faltando uma dessas modalidades, estará mitigado o princípio. 

É certo que a autodefesa, não podendo ser imposta ao acusado, é considerada renunciável por esse. Entretanto tal renunciabilidade não significa que seja considerada dispensável pelo juiz. Assim, o cerceamento da autodefesa, como que decepando a possibilidade do acusado colaborar com o seu defensor para a apresentação de suas razões defensivas, redunda, por certo, em sacrifício de sua própria defesa.

O não exercício dessa autodefesa vem a mutilar a formação do convencimento do juiz que se faz no interrogatório, que, além de meio de prova, é meio de defesa, e no direito à presença, que se exercita na possibilidade do acusado tomar posição, a todo momento, apresentando argumentações e provas produzidas pela imediação com o juiz, as alegações e as provas.

Em análise conclusiva, Christiany Pegorari Conte (Aspectos relevantes acerca da citação no novo processo penal), aduz que parece inconstitucional a previsão do artigo 362 do Código de Processo Penal, por violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, pois a ampla defesa abrange a defesa técnica e a autodefesa, ficando esta última nitidamente prejudicada, em face da continuidade do processo, mesmo depois da citação por hora certa.

Se há falta de ampla defesa, há nulidade absoluta, a teor da Súmula 523 do Supremo Tribunal Federal. São afrontados os artigo 5º, inciso LV, e o artigo 8º, item 2, alínea "b", da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

 O acusado tem o direito de ser pessoalmente informado da acusação que lhe é imputada para, desta forma, exercer, plenamente, sua defesa, algo que não se coaduna com a citação por hora certa.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. A citação por hora certa e a citação por edital na nova sistemática processual penal . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4409, 28 jul. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/41068. Acesso em: 22 dez. 2024.

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