A liberdade de imprensa à luz da Constituição Federal de 1988

28/07/2015 às 00:13

Resumo:


  • A liberdade de imprensa é um bem da sociedade que exige mobilização constante e firme posicionamento diante de ameaças.

  • O direito à liberdade deve existir no plano da consciência, permitindo escolhas em diversas áreas da vida.

  • A imprensa desempenha um papel fundamental na democracia, informando a população e garantindo a transparência dos atos públicos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A liberdade de imprensa e a democracia encontram-se em posição de reciprocidade.

A liberdade de imprensa é um bem da sociedade, antes mesmo de ser um direito de profissionais e de empresas ligadas a essa atividade e por sua própria natureza, exige mobilização constante, vigilância permanente e firme posicionamento diante de fatos que representam ameaça ou que efetivamente a atinjam. Mesmo nas sociedades que se governavam por um princípio democrático, as liberdades públicas, tal como as que temos hoje, não existiam, mesmo porque a idéia de indivíduo, como ente diferenciador da sociedade que o envolve, foi uma lenta aquisição da sociedade.

O direito de ser livre deve existir no plano da consciência, ninguém é livre se não pode fazer a sua própria escolha em matéria de religião, de política ou sobre aquilo que vai ou não acreditar, ou se é forçado a esconder seus sentimentos ou a gostar do que os outros gostam, contra a sua vontade. Sendo assim, a liberdade de pensamento, de opinião e de sentimento faz parte o direito à liberdade, que deve ser assegurado a todos os seres humanos (DALLARI, 2004).

A questão da liberdade se impõe constantemente ao homem. É um tema de amplitude inesgotável. A origem etimológica da palavra liberdade está relacionada à palavra latina Libertas, empregada pelos romanos para diferenciar os escravos e prisioneiros dos cidadãos. Para Aristóteles, a liberdade humana se opõe ao que é condicionado externamente (necessidade) e ao que acontece sem escolha deliberada (contingência). O termo liberdade engloba ação, “é livre aquele que possui o princípio de agir ou não agir, ou seja, aquele que é causa interna de seu agir. A concepção aristotélica de liberdade é o princípio que o homem possui para optar entre múltiplas possibilidades. A liberdade é um ato livre da vontade inclinada pela razão. A razão sustenta a vontade e lhe dá conselhos que esta pode ou não aceitar. Este ato de aceitar ou não é um ato de liberdade. A liberdade é concebida como ausência de constrangimentos externos ou internos, como capacidade da vontade de agir livremente. A mediania é a virtude, isto é, o meio termo, a justa medida. A liberdade seria o equilíbrio da conduta pessoal: equilíbrio interior das emoções e o equilíbrio exterior das paixões. A liberdade será ética quando estiver em harmonia com a direção apontada pela razão. E a liberdade, neste sentido torna-se uma virtude da condição humana.

Já para o dicionário básico de filosofia a liberdade tem o significado de: “Condição daquele que é livre. Capacidade de agir por si mesmo, autodeterminação, independência, autonomia”. (JAPIASSÚ E MARCONDES, 1991, p.163). A liberdade indica um estado, uma qualidade da pessoa humana. Norberto Bobbio trata a liberdade com relação ao tema Igualdade e Justiça. Para ele a “liberdade é o valor supremo do indivíduo em face do todo, enquanto a justiça é o bem supremo do todo enquanto composto das partes” (BOBBIO, 1997, p. 16). Sendo assim, a cada ato responsável e consciente do homem e na sua existência singular, a liberdade se manifesta. De acordo com Descartes (Apud JAPIASSÚ E MARCONDES, 1991, p.163): A liberdade consiste unicamente em que, ao afirmar ou negar, realizar ou enviar o que o entendimento nos prescreve, agimos de modo a sentir que, em nenhum momento, qualquer outra força exterior nos constrange. A formulação do conceito de liberdade despertou em alguns filósofos o questionamento e a reflexão sobre ela. Procuram, então, esclarecê-la e aprofundar-se nesta área, pois o desejo de liberdade é um sentimento profundamente arraigado no ser humano. Teorias filosóficas e políticas, de todos os tempos, tentaram definir liberdade quanto às determinações de tipo biológico, psicológico, econômico, social dentre outras.

Com o surgimento da imprensa e a multiplicação de impressos, ocorrido a partir do século XV, buscou-se aproximar a liberdade com o ato de livre manifestação e difusão da comunicação entre as relações humanas. O ato foi um acontecimento de grande expressão e a partir da consolidação da chamada ‘civilização’ pós medieval, seu papel social e cultural se localizou neste contexto, pois era uma das principais formas de transmissão de informações e notícias, em que pese o acesso restrito inicial da população aos bens impressos. O papel da imprensa periódica, na emergência da esfera pública, revestiu-se de importância especial. O aparecimento dos jornais no final do século XVII e princípios do século XVIII fomentaram um novo espaço público para o debate. De início, esses jornais eram dedicados a assuntos literários e culturais, mas a temática foi se alargando para questões de interesse social e político.

Gerou-se então uma ampla demanda por essas informações, pois o público queria entender e participar do processo decisório das instâncias de poder. Nesse novo espaço público, a sociedade começou a obrigar o poder a justificar-se perante a opinião pública, ou seja, iniciou um processo de transparência dos atos públicos. O surgimento da imprensa foi segundo Sousa (2003), um passo importante para a democratização da cultura, mesmo tendo desencadeado a estandardização e a simplificação das mensagens. Sendo assim surge uma imprensa opinativa ou ideológica, oriunda das ambições populares, contribuindo diretamente para o desenvolvimento do jornalismo. Sendo o jornalismo uma atividade de divulgar informações voltadas para o público, de forma mediada, periódica e organizada. À luz da democracia, o jornalismo tem como missão vigiar e controlar o Estado e as organizações privadas de interesse público. Por te sua atuação delegada pela sociedade – que transferiu para a imprensa o papel de “dialogar” com o poder -, o jornalismo tem que se legitimar continuamente a partir de suas práticas. Ou seja, para que sua existência tenha sentido, precisa fortalecer o suporte de apoio social que o justifica. O jornalismo impresso foi à primeira forma de expressão organizada da comunicação social.

O jornalismo moderno começou a tomar forma no século seguinte à Declaração dos Direitos do Homem e à morte de Voltaire. No século XIX, houve um grande aumento na quantidade de jornais, que trocaram a propaganda política por notícias com mais fatos e menos opiniões. Segundo Jean Chalaby (1996: 304) o jornalismo apareceu “como campo de produção discursiva  especializado e cada vez mais autônomo, primeiramente na Inglaterra e nos Estados Unidos”. Mas era o jornalismo francês, que ficou mais tempo atrelado aos antigos padrões, o que influenciava a imprensa brasileira. O modelo americano, marcado pela objetividade, passou a influenciar os jornais brasileiros somente a partir da década de 1950.

Com o passar do tempo a imprensa alcançou um lugar cativo na sociedade brasileira, com o papel fundamental de informar a população e denunciar ações que possam ser prejudiciais ao público. Ao assumir esta posição, a imprensa concede a este mesmo público uma chance de defesa e de expressão de opinião de forma que esta seja levada em consideração pelas entidades competentes a fim de que a opinião pública e o desejo da maioria possam prevalecer, como de direito deve ser em uma sociedade democrática como a brasileira, como estabelece a Constituição.

A Constituição de 1988 garante, em seu art. 5°, inciso X, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem dos indivíduos que vivem no Brasil. O não cumprimento desse direito pode acarretar em indenização pelo dano material e/ou moral causado em decorrência da violação do artigo. Para os leigos, que interpretam a lei tal e qual ela se apresenta no papel, não há a necessidade de correção alguma, pois os artigos representam estar em total acordo com a liberdade de expressão. Isso pode ser visto já no primeiro artigo que diz “É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou ideias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer”. A liberdade de imprensa implica em responsabilidade. Quando atua dentro do limite da legalidade e de princípios éticos a participação da imprensa na construção da democracia é fundamental e nesse contexto, a liberdade de imprensa passa a ter um caráter preferencial entre os demais direitos constitucionais. A Constituição assegura à plena, “liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social” (BRASIL, 2005, p. 154, art. 220, §1°). Trata-se de um direito de conteúdo mais abrangente que o tradicional conceito de liberdade de imprensa, que assegura o direito de veiculação de impressos sem qualquer restrição do Estado. Uma imprensa livre e responsável, consciente da importante função social que tem é indispensável para a sustentação dos ideais democráticos.

A sociedade brasileira tem assegurada a liberdade de manifestação do pensamento – em que todos pretendem dizer o que querem e do modo que querem, desde que não anonimamente; bem como, a garantia estatal do direito de acesso à informação, do direito de receber dos órgãos públicos informações de interesse público ou geral – como direitos de livre pesquisa –, o direito de divulgar as informações obtidas, e o direito da coletividade de ser informada das realidades fáticas, independentemente de subsunção aos órgãos estatais, como forma de se impedir a censura. Resumidamente, são os direitos sociais de se informar, de informar e de ser informado.

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A preocupação do constituinte brasileiro de 1988, com a liberdade de informação jornalística, se mostra tão constante, no texto constitucional, que após limitar o poder do legislador ordinário e da administração pública, cuidou de limitar, neste campo, a atuação do Poder Judiciário, conforme se pode constatar pelo disposto no artigo 93. “Lei Complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões, podendo a lei limitar a presença em determinados atos às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”.

Pode-se, enfim, assegurar que nos dispositivos constitucionais sobre a Comunicação Social são encontrados os seguintes princípios: (a) proibição de restrição, desde que observado o disposto na Constituição; (b) proibição de dispositivo legal que embarace a plena liberdade de informação jornalística; (c) proibição de toda e qualquer forma de censura de natureza política, ideológica e artística; (d) proibição de licença de autoridade para publicação de veículo impresso de comunicação; (e) proibição de constituição empresarial (dos meios de comunicação social), sob a forma, direta ou indiretamente, de monopólio ou oligopólio; (f) princípio do interesse público à informação.


Conclusão

Deste modo, resta evidente que o constituinte de 1988 deu feição nova e novas garantias à liberdade de informação jornalística, ao inscrevê-la em Capítulo apartado dos direitos fundamentais individuais e coletivos, blindando esta liberdade com a proibição de restrição legal, de censura e de autorização de licença para as publicações impressas. Esta garantia não se firma apenas contra os Poderes Públicos, mas, também, contra todo e qualquer cidadão. Em síntese, pode-se dizer que a Constituição de 1988 impede, durante sua vigência, que o ordenamento jurídico brasileiro institua qualquer regra que possa embaraçar ou censurar a liberdade de informação jornalística, que deve ser plena e que nenhum processo judicial poderá correr em segredo de justiça quando as informações nele registradas forem de interesse público. Neste último caso, cabendo ao magistrado, em decisão fundamentada, ponderar sobre as razões do afastamento da preservação do direito à intimidade da parte, contraposto ao direito da sociedade à informação que se delineia como de interesse público. O conceito de liberdade de imprensa só pode ser amplamente entendido se compreendido enquanto realização da democracia. Funciona como complemento indispensável da organização do Estado fundado sob o sufrágio. Ressalta-se que de todas as liberdades sem a imprensa livre para divulgar opinião e informação, os meios de comunicação perdem parte de sua função. É através da divulgação livre de ideias que a democracia pode ser exercida em sua plenitude. Há que se estabelecer o equilíbrio entre estes direitos e, em cada caso, a resolução do conflito existente entre eles deverá ser proporcional e razoável, levando-se em consideração os direitos de personalidade e presunção de inocência do indivíduo, bem como a liberdade de imprensa, para que nenhum destes sejam suprimidos, mas sim, possam ser plenamente exercidos, sem o cometimento de abusos que possam gerar ofensa. Dessa forma, o papel da imprensa torna-se fundamental e o direito à liberdade de informação constitui passo importante para construção democrática. Especialmente no caso brasileiro, em que a censura esteve presente, isso se torna importante de se ver resguardado, para que a liberdade de manifestação do pensamento possa se exteriorizar de maneira livre e ampla. Contudo, o próprio texto constitucional traça balizas a garantir também à pessoa, direitos individuais importantes, tais como os direitos de privacidade e o princípio da presunção de inocência. Ainda mais no processo penal, em que, muitas vezes, a liberdade de locomoção está em jogo, e as emoções e fragilidades do ser humano se mostram à tona, o papel da mídia deve ser respaldado pela liberdade e também pela responsabilidade e um instrumento de preservação também dos direitos fundamentais.  


Bibliografia:

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FARIAS, Edilsom Pereira de. Liberdade de Expressão e Comunicação. Teoria e Proteção Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.

CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de. Liberdade de Informação e o Direito Difuso à Informação Verdadeira. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003

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Sobre o autor
Alexis Gabriel Madrigal

Pós-graduado em Administração Pública e Gerência de Cidades e articulista de assuntos jurídicos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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