Serial killers

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O Manual de Classificação de Crimes do FBI (1992) define o assassinato serial como “três ou mais eventos separados em três ou mais locais separados com um período de resfriamento emocional entre os homicídios”. Vejamos algumas características desses indivíduos.

1. CONCEITO DE SERIAL KILLER E DIVERGÊNCIA DOUTRINÁRIA QUANTO AO NÚMERO DE VÍTIMAS

Durante muito tempo, o serial killer foi considerado uma espécie de assassinato em massa. Só no final da década de 1950 que os criminologistas passaram a tratar de outros conceitos envolvendo assassinatos múltiplos.

A expressão serial killer foi empregada pela primeira vez nos anos 70 pelo agente aposentado do FBI, Robert Ressler.

As críticas em relação à correta definição de serial killer divergem quanto ao número de vítimas, uns entendem serem necessárias apenas duas, outros afirmam serem necessárias, no mínimo, quatro.

Para efeito didático, trataremos o fato criminoso em questão como assassinato serial. O Manual de Classificação de Crimes do FBI (1992) define o assassinato serial como “três ou mais eventos separados em três ou mais locais separados com um período de resfriamento emocional entre os homicídios”. (NEWTON, 2005, p. 49).

Segundo Newton (2005, p. 49-50), o FBI dá causa a três entraves em seu conceito:

“Primeiro, temos o requisito de ‘três ou mais’ assassinatos para compor uma série bona fide. Infelizmente, as outras categorias ‘oficiais’ do FBI de assassinato - único, duplo, triplo, massa, e atividade de assassinato – não fazem nenhuma referência ao fato de o assassinato de apenas duas vítimas no requisitado período de ‘resfriamento’ entre os crimes e que é, então, preso antes de atingir o número três. O assassinato duplo, no linguajar do FBI, descreve duas vítimas assassinadas no mesmo tempo e lugar; atividade de assassinato, enquanto isso, pode ter apenas duas vítimas, mas é definido como ‘um evento único com... nenhum período de resfriamento emocional entre os assassinatos’. Assim, o assassino que aguarda meses ou mesmo anos entre seu primeiro e segundo assassinato e encontra-se na prisão não se encaixa no esquema do FBI.” (grifos e correções nossas)

Na verdade, o aspecto mais importante para definir se o crime foi praticado por um serial killer ou não, não é a quantidade, mas sim as causas ou, mesmo, a ausência de causa ao cometer os crimes.

O segundo problema é em relação ao requisito de que os assassinatos devem acontecer em “três ou mais lugares diferentes”. Desse modo, muitos serial killers não se qualificariam como tais, pois assassinaram a maioria ou a totalidade de suas vítimas num mesmo local.

E, por fim, o terceiro problema é quanto ao período de “resfriamento”, sendo que o FBI ainda não foi capaz de delimitar esse período. Na verdade, o Manual de Classificação de Crimes aduz que o “período de resfriamento pode durar dias, semanas, ou meses – e, presume-se, mesmo anos”. Há quem tente sugerir um período limite, mas ainda não se estabeleceu um padrão (lógico-consistente) (Newton, 2005, p. 50).

A definição mais atual de serial killer foi dada em 1998 e pertence ao Professor de Justiça Criminal da Universidade de Illinois, Egger, de Sprinfield, que diminuiu o número de assassinatos de 3 (três) para 2 (dois):

“Um assassinato em série ocorre quando um ou mais indivíduos (em muitos casos homens) cometem um segundo e/ou posterior assassinato; não existe em geral relação anterior entre a vítima e o agressor (se aquela existe coloca sempre a vítima em uma posição de inferioridade frente ao assassino); os assassinatos posteriores ocorrem em diferentes momentos e não têm relação aparente com o assassinato inicial e costumam ser cometidos em uma localização geográfica distinta. Ademais, o motivo do crime não é o lucro, mas, sim, o desejo do assassino de exercer controle ou dominação sobre suas vítimas. Estas últimas podem ter valor simbólico para o assassino e/ou ser carentes de valor e, na maioria dos casos, não podem defender-se e avisar a terceiros de sua situação de impossibilidade de defesa; ou são vistas como impotentes, dada sua situação nesse momento, o local e a posição social que detenham dentro de seu entorno, como, por exemplo, no caso de vagabundos, prostitutas, trabalhadores imigrantes, homossexuais, crianças desaparecidas, mulheres que saíram desacompanhadas de casa, velhas, universitárias e paciente de hospital.” (grifos nossos)

Ante o exposto neste tópico, podemos concluir que serial killer é aquele assassino que comete dois ou mais assassinatos em série, num intervalo de tempo que separa cada um dos eventos criminosos, podendo ser meses ou anos, até que seja preso ou morto. Suas vítimas possuem sempre o mesmo perfil e mesma faixa etária, sexo, raça etc, sendo escolhidas ao acaso dentro deste perfil e mortas sem razão aparente; constituem, portanto, objeto da fantasia do serial killer.

PERFIL DO ASSASSINO EM SÉRIE

Traçar o perfil psicológico de um serial killer requer precisão na determinação de assinatura e modos operandi. Para tanto, várias unidades policiais de investigação se utilizam de critérios próprios ou gerais, a fim de melhor atingir seu objetivo. A exemplo, a Unidade de Ciências Comportamentais do FBI desenvolveu, nos anos 70, um processo capaz de identificar não só possíveis autores, mas determinar padrões para incidências de delitos.

Tal estudo se baseia em análise psiquiátrica e psicológica e na análise de informações, tais quais, detalhamento da cena do crime e depoimento de testemunhas.

Um dos primeiros perfis traçados por esse método foi o de Ted Bundy. Segundo o detetive do caso, o perfil era tão perfeito que chegava ao ponto de prever que o assassino tinha um meio irmão e, de fato, ele tinha.

Assassinos em série, independente de suas características, desejam que seus crimes sejam inter-relacionados. Isso quer dizer que todos os homicídios são assinados. A assinatura funciona como uma digital: é única.

Ela pode aparecer de diversas formas. Por exemplo, uma ordem específica de execução, uma forma de amordaçar ou amarrar a vítima, determinados ferimentos, um modo peculiar de dispor do corpo da vítima ou mesmo a realização de rituais.

De modo diferente, o modus operandi não precisa ser padrão. Na verdade, a depender das características do delinquente, ele tende a se adaptar às circunstâncias.

Quando o perfil é finalizado, os investigadores têm à sua frente uma lista de suspeitos. Dentro dela determinam quais os possíveis autores e como capturá-los. Vale lembrar que nem todos os serial killers são pegos ou, quando são, sua captura se dá por crimes menores. O próprio Ted Bundy foi detido em uma operação de trânsito. Ed Kempler foi pego apenas porque se entregou à polícia, após cometer o homicídio de sua própria mãe.


2. CLASSIFICAÇÃO

Serial killers podem ser classificados de duas formas: uma baseada no motivo e outra baseada nos padrões organizacionais e sociais. Nenhuma destas classificações explica o que na realidade pode levar uma pessoa a se tornar um serial killer. Também não há dados científicos suficientes sobre os quais basear estas classificações - são baseadas em dados de observação casual ou em entrevistas. O método do motivo é chamado de tipologia de Holmes, por causa de Ronald M. e Stephen T. Holmes.

Segundo a tipologia de Holmes, os serial killers podem se concentrar no ato (aqueles que matam rápido), ou no processo (aqueles que matam vagarosamente). Para os assassinos que se concentram no ato, matar nada mais é do que o ato em si. Neste grupo há dois tipos diferentes: os visionários e os missionários. O visionário mata porque escuta vozes ou tem visões que o levam a fazer isso. O missionário mata porque acredita que deve acabar com um determinado grupo de pessoas.

Os assassinos seriais que se concentram no processo sentem prazer na tortura e morte lenta de suas vítimas. Neste grupo há três tipos diferentes. Assassinos sexuais obtêm prazer sexual ao matar. Assassinos que buscam emoção se excitam com isso. Assassinos que tiram proveito matam porque acreditam que vão lucrar de alguma maneira. Assassinos que buscam o poder querem "brincar de Deus" ou ter controle da vida e da morte.

Os serial killers também podem ser classificados por suas habilidades organizacionais e sociais. Podem ser organizados ou desorganizados (dependendo do tipo de cena do crime) e não-sociais ou anti-sociais (dependendo de são excluídos pela sociedade ou se excluem dela).

A maior parte dos assassinos seriais são identificados são organizados e não-sociais. Muitos deles também seguem alguns outros padrões básicos. Serial killers são geralmente inteligentes e matam com frequência mulheres brancas.


3. A IMPUTABILIDADE DO ASSASSINO EM SÉRIE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Não encontramos no Código Penal um conceito para a imputabilidade ficando, portanto, à cargo da doutrina fazê-lo. Em linhas gerais, é a capacidade de uma pessoa ser responsabilizada pelo fato típico e antijurídico que cometera.

De acordo com os ensinamentos de Regis Prado, trata-se da “plena capacidade (estado ou condição) de culpabilidade, entendida como capacidade de entender e de querer e, por conseguinte, de responsabilidade criminal (o imputável responde por seus atos)”[1].

Outrossim, Fernando Capez a conceitua como “a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento”, um dos conceitos mais clássicos que temos[2].

Apresenta-se sob 2 (dois) aspectos: o cognoscivo e o volitivo. Pelo primeiro, também chamado intelectual, temos a capacidade de compreender a antijuridicidade do fato. Quanto ao aspecto volitivo, ou da vontade, é a determinação desta vontade, atuando conforme sua compreensão[3].

Os sistemas conhecidos na doutrina para fixar a inimputabilidade de um indivíduo, auferindo sua possibilidade de compreender e controlar seus atos, são o biológico, o psicológico e o biopsicológico. O Ministro Francisco Campos, na Exposição de Motivos do Código Penal de 1940, conceituou esses sistemas[4]:

Na fixação do pressuposto da responsabilidade penal (baseada na capacidade de culpa moral), apresentam-se três sistemas: o biológico ou etiológico (sistema francês), o psicológico e o biopsicológico. O sistema biológico condiciona a responsabilidade à saúde mental, à normalidade da mente. Se o agente é portador de uma enfermidade ou grave deficiência mental, deve ser declarado irresponsável, sem necessidade de ulterior indagação psicológica. O método psicológico não indaga se há uma perturbação mental ou mórbida: declara a irresponsabilidade se, ao tempo do crime, estava abolida no agente, seja qual for a causa, a faculdade de apreciar a criminalidade do fato (momento intelectual) e de determinar-se de acordo com essa apreciação (momento volitivo). Finalmente, o método biopsicológico é a reunião dos dois primeiros: a responsabilidade só é excluída se o agente, em razão de enfermidade ou retardamento mental, era, no momento da ação, incapaz de entendimento ético-jurídico e autodeterminação.

Em regra, o ordenamento jurídico pátrio adotou o sistema biopsicológico, salvo em se tratando de menor de 18 (dezoito) anos, quando utiliza-se o critério biológico. Como o objeto de nosso estudo se relaciona à regra, cabe, portanto, a sua análise[5].

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O direito penal brasileiro considera os serial killers, em regra, semi-imputáveis. Entretanto, temos casos na jurisprudência em que foram enquadrados como imputáveis, distinguindo-se, portanto, apenas o quantum da pena aplicada – os primeiros a tem reduzida por determinação legal.

Os assassinos em série (serial killers) são um capítulo à parte na criminologia e uma dificuldade para a psiquiatria, uma vez que não se encaixam em nenhuma linha específica do pensamento. E, sabe-se que a imputabilidade do agente dependerá essencialmente das condições psíquicas do mesmo.

Deve-se analisar a distinção dada pelo Código Penal às situações de inimputabilidade e semi-imputabilidade, para que se proceda à identificação delas em cada caso[6]:

Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

O parágrafo único do artigo supracitado, prevê a condição de semi-imputabilidade, situação em que o agente que sofra de perturbação de saúde mental ou tenha desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era, ao tempo do crime, inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Nesta hipótese, o agente poderá ter a pena reduzida de um a dois terços.

Se reconhecida a semi-imputabilidade do serial killer, lhe será aplicada uma pena reduzida, afastando-o do tratamento dado pela lei ao criminoso comum. A pena não será excluída, mas não será aplicada em sua integridade. Se considerarmos tal julgamento, o qual vem ocorrendo sistematicamente no nosso Poder Judiciário, estamos não só aplicando uma penalização ineficiente, como desprotegendo a nossa sociedade, após um reduzido período de reclusão desse perigoso agente.

É importante ressaltar que, para um indivíduo de difícil recuperação, o sistema penitenciário brasileiro não guarda a necessária eficiência, considerando que nem os especialistas em psiquiatria e psicologia encontraram para estes um tratamento apropriado.

Partindo dessa premissa, optamos por inserir o psicopata no conceito de imputabilidade sim, por entender que, tratando-se de um conceito médico-psiquiátrico, é partindo dos estudos realizados por especialistas desta área, quanto à condição mental deste indivíduo, que se deve elaborar uma política criminal diferenciada.

Se optar-se somente pela aplicação de pena privativa de liberdade ao assassino serial, estaríamos apenas restringindo os direitos do mesmo, sem contribuir de nenhuma forma para que este se restabeleça socialmente. E, respeitados os limites legais de pena (e considerado inclusive o fato de que ele teria assegurado direito à progressão de regime), este agente estaria algum tempo depois em liberdade, oferecendo perigo ainda maior à coletividade, pois diversos estudos apontam que a prisão causa a intensificação das compulsões dos criminosos com distúrbios mentais ou de personalidade.

Alguns autores definem que o serial killer como um inimigo irremediável para as pessoas, e a separação permanente da comunidade pela via da prisão parece ser a única alternativa prudente.

No entanto, esse tipo de argumentação não satisfaz o anseio de justiça que deve reger o Direito Penal. Por mais que seja extremamente conveniente a retirada desses indivíduos do meio social, devem ser considerados também os direitos e interesses do mesmo. De outro modo, o Estado passa a tratar alguns de seus tutelados, como inimigos permanentes.

Entendemos por ideal possibilitar que o condenado imputável, diagnosticado com personalidade psicopática, pudesse, desde sua condenação, receber tratamento adequado em instituição própria para estes. Embora saibamos que inexista tratamento totalmente eficaz para a recuperação – se é possível – não há dúvida de que se trata de um indivíduo que merece um tratamento penal diferenciado. Mas, por outro lado, não deve ser tratado apenas como um indivíduo perigoso a ser eliminado, posto ser também ele um cidadão titular de direitos fundamentais, o qual possui uma condição psíquica anormal que o induz ao cometimento de delitos.


4. BIBLIOGRAFIA

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, 1 – 18. ed. rev., ampl. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2012.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal – Parte Geral, vol. I. 15ª ed., rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2011.

CASOY, Ilana. Serial killer: louco ou cruel? 6ª ed. São Paulo: Madras, 2004

MORANA, Hilda C. P et al. Transtornos de personalidade, psicopatia e serial killers. Rev. Bras. Psiquiatria. 2006. v. 28. p. 74-79. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462006000600005&lang=pt>. Acesso em 23 jun. 2013.

NEWTON, Michael. A enciclopédia de serial killers. São Paulo: Madras, 2005.

PRADO, Luiz Regis.  Curso de direito penal brasileiro, volume 1: parte geral, arts. 1º a 120 – 10. ed. rev. atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

VELLASQUES, Camila Tersariol. O perfil criminal dos serial killers. Presidente Prudente, 2008. 81 f. Monografia (Graduação) - Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo, 2008.

http://jus.com.br/artigos/22638/pls-n-140-2010-o-tratamento-penal-ao-serial-killer/2

BRASIL. Decreto-Lei nª 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso: nov 2014

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