A tutela jurisdicional específica das obrigações de dar, de fazer e de não fazer e a possibilidade de conversão destas em perdas e danos

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02/08/2015 às 15:18
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Este artigo estuda a tutela jurisdicional das obrigações de dar, de fazer e de não fazer. O objetivo principal consiste em analisar o procedimento de efetivação jurisdicional da tutela específica das referidas obrigações do direito material.

Resumo: Este artigo apresenta estudo sobre a tutela jurisdicional das obrigações de dar, de fazer e de não fazer. O objetivo principal consiste em analisar o procedimento de efetivação jurisdicional da tutela específica das referidas obrigações do direito material e a possibilidade de conversão destas em perdas e danos. Para consecução dos objetivos propostos, adotou-se o método científico de interpretação sistemática. No tocante ao procedimento técnico, optou-se pela pesquisa teórica dogmática, com compilação e revisão de material doutrinário. Adotou-se, ainda, a pesquisa documental, com análise da legislação e da jurisprudência pertinentes. Verificou-se que hodiernamente o ordenamento jurídico pátrio consagra a primazia da tutela específica das obrigações de dar, de fazer e de não fazer sobre outros meios de efetivação, dispondo o juiz de instrumentos para conferir ao credor exatamente o que lhe é devido, de forma que a conversão de obrigação específica em perdas e danos consiste em atributo de último expediente a ser empregado, se o credor não a desejar. Concluiu-se que, na hipótese de conversão de obrigação específica em perdas e danos, não há propriamente um procedimento para liquidação do valor da indenização. Não obstante, o ato de liquidação deve ocorrer imediatamente após o deferimento da conversão, nos próprios autos, sem a necessidade de novo contraditório amplo e típico da fase de conhecimento. Apurado o valor da indenização por perdas e danos, o feito deverá prosseguir como execução de quantia certa.

Palavras-chave: Tutela jurisdicional específica. Obrigação de dar. Obrigação de fazer. Obrigação de não fazer. Conversão em perdas e danos.

Sumário: 1. Introdução. 2. A tutela específica das obrigações de dar, de fazer e de não fazer. 3. As hipóteses de conversão de obrigação específica do direito material em perdas e danos. 4. A conversão de obrigação específica em perdas e danos. 4.1. Ato de liquidação do valor da indenização na hipótese de conversão de obrigação específica em perdas e danos. 4.2. A conversão de obrigação específica em perdas e danos no microssistema processual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais. 4.3. O produto da incidência de eventual multa pecuniária vencida pelo descumprimento de obrigação específica. 4.4. O prosseguimento do feito após a conversão da obrigação específica em perdas e danos. 5. Conclusão. Referências.


1. INTRODUÇÃO

Este artigo possui como tema a eficácia da tutela específica das obrigações de dar (coisa), de fazer e de não fazer. O tema pode ser delimitado adotando-se como objeto principal de pesquisa a tutela jurisdicional das referidas obrigações específicas do direito material.

Nesse contexto, o objetivo geral ou mediato do presente trabalho é estudar a tutela jurisdicional das obrigações de dar, de fazer e de não fazer e a possibilidade de conversão destas em perdas e danos.

Os objetivos específicos ou imediatos do artigo são:

  • a) analisar a eficácia da tutela específica das obrigações de dar, de fazer e de não fazer, no atual ordenamento jurídico pátrio, evidenciando as modificações processuais ocorridas nos últimos anos;

  • b) examinar as hipóteses de conversão de obrigação específica do direito material em perdas e danos;

  • c) estudar o procedimento de efetivação jurisdicional da tutela específica das obrigações de dar, de fazer e de não fazer, mostrando os atuais posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais sobre o tema; e

  • d) pesquisar sobre o procedimento de conversão de obrigação específica em perdas e danos e a forma como o feito irá prosseguir, visando à satisfação da pretensão do credor.

Para consecução dos objetivos propostos, adotou-se o método científico de interpretação sistemática, por meio do qual se busca estabelecer o alcance do conteúdo das normas estudadas, de forma a compreender-lhes o sentido, o objetivo e a razão de existir.

No tocante ao procedimento técnico, optou-se pela pesquisa teórica dogmática, com compilação e revisão rigorosa de material doutrinário acerca dos temas propostos. Paralelamente, adotou-se a pesquisa documental, com análise da legislação e da jurisprudência pertinentes.


2. A TUTELA ESPECÍFICA DAS OBRIGAÇÕES DE DAR, DE FAZER E DE NÃO FAZER

Historicamente, no ordenamento jurídico brasileiro não existiam instrumentos destinados a garantir a eficácia da tutela específica das obrigações de dar (coisa certa ou incerta), de fazer e de não fazer.

Contudo, isso mudou consideravelmente com as reformas do Código de Processo Civil (CPC) operadas pela Lei n.º 8.952, de 13 de dezembro de 1994, e pela Lei n.º 10.444, de 7 de maio de 2002.

Hoje, a tutela das obrigações de dar, de fazer e de não fazer ganhou força, havendo previsão legal de medida com função de direito material (multa pecuniária prevista no art. 461, §§4º e 5º, do CPC) e medidas de cunho processual, tais como busca e apreensão, imissão na posse, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, etc. (arts. 461, §5º, e 461-A, §2º, ambos do CPC).

Sobre o histórico em análise, veja elucidativo posicionamento da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por ocasião do julgamento do REsp 1006473/PR1:

[...]

2. Considerações acerca da tutela material específica da mora: o ordenamento jurídico brasileiro, desde o regramento inaugurado no Código Civil de 1916, no que foi substancialmente seguido pelo texto do Diploma Civil de 2002, somente contempla disciplina genérica e eficaz quando se cuida da repreensão da mora verificada no cumprimento de obrigações ao pagamento de quantia certa. Para estas, além da natural faculdade de as partes, no âmbito da autonomia da vontade, estabelecerem penalidades convencionais (multa moratória), o ordenamento material civil fixou sanções legais pré-determinadas, com a potencialidade de incidir até mesmo sem pedido do credor para a hipótese de retardamento injustificado (juros moratórios).

Vislumbra-se, portanto, no sistema pertinente às obrigações de pagar, normas jurídicas perfeitas, com preceitos primário e secundário, haja vista restar estabelecido um mandamento claro direcionado ao devedor, no sentido de que deve efetuar o adimplemento no prazo, sob pena da incidência de uma sanção material em caso de persistência no estado de mora.

Idêntica tutela mostrava-se inexistente no tocante às obrigações de fazer e não fazer, pois, para elas, o sistema legal apenas permitia a conversão da obrigação em perdas e danos, deixando de contemplar instrumentos específicos de tutela material voltados a sancionar o devedor em mora.

Justamente para conferir eficácia aos preceitos de direito obrigacional, que determinam ao devedor o cumprimento da obrigação, o legislador contemplou nova redação ao art. 461. do CPC.

No dispositivo mencionado, aglutinaram-se medidas suficientes a servir como tutela material da mora (multa pecuniária), além de outras, nitidamente de cunho processual, que buscam servir e garantir o pronto adimplemento da obrigação (busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, cessação de atividades etc).

Nesse contexto, a tutela material da mora pertinente às obrigações de fazer e não fazer, tímida e insipidamente tratada no Código Civil, ganha força e autoridade a partir da disciplina fixada no Código de Processo Civil, dada a possibilidade de o magistrado agir, inclusive ex officio, cominando uma multa, uma sanção, para a hipótese de o devedor manter-se injustificadamente no estado de letargia. [...]. (BRASIL, 2012, grifo nosso).

Como se vê, no atual sistema processual pátrio, a busca pela eficácia da tutela específica das obrigações de dar, de fazer e de não fazer é a regra, dispondo o juiz de instrumentos para impor ao devedor o cumprimento da obrigação ou determinar as providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

É de consignar que, em conformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “é permitido ao julgador, à vista das circunstâncias do caso apreciado, buscar o modo mais adequado para tornar efetiva a tutela almejada, tendo em vista o fim da norma e a ausência de previsão legal de todas as hipóteses fáticas.” (BRASIL, 2006)2.

Barroso (2007, p. 230) enfatiza o poder-dever que o juiz possui, a fim de garantir a eficácia da tutela específica:

O juiz tem o dever institucional de emitir uma tutela específica, com medidas que obriguem o devedor a seu cumprimento e que confira ao detentor do direito a percepção de efeitos práticos equivalentes àqueles experimentados se a obrigação tivesse sido cumprida espontaneamente.

A partir das considerações já expostas, conclui-se que os artigos 461 e 461-A do CPC consagram a primazia da tutela específica das obrigações de dar coisa distinta de dinheiro, de fazer e de não fazer sobre outros meios de efetivação, de forma a conferir ao credor exatamente o que lhe é devido.

De fato, “o atual sistema processual dá preferência à satisfação da obrigação in natura – como se estivesse sendo cumprida espontaneamente pelo devedor – em detrimento de sua substituição por ato de terceiro ou pela conversão em indenização.” (BARROSO, 2007, p. 230).

Quanto à eficácia da tutela específica, lecionam Didier Júnior et al. (2013, p. 437-438, grifo do autor), ao tratar do art. 461. do CPC:

[...] Esse dispositivo, [...], trazido pela Reforma Legislativa de 1994, veio deixar clara a opção do legislador de privilegiar a tutela específica da obrigação de fazer ou de não fazer, seja ela legal ou contratual, fungível ou infungível.

É o que, repita-se, passou a ser chamado de princípio da primazia da tutela específica das obrigações de fazer e de não fazer, segundo o qual se deve buscar dar ao credor tudo aquilo e eatamente aquilo que ele obteria se o devedor tivesse cumprido espontaneamente a obrigação que lhe cabia, isto é, tudo aquilo e exatamente aquilo que o credor obteria se não fosse necessário provocar a atividade jurisdicional para imposição da ordem.

Os conceituados autores Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero apresentam os seguintes comentários, a respeito da tutela específica do direito material:

A tutela específica do direito material encontra acentuada prioridade dentro do direito brasileiro contemporâneo. [...] A prestação da tutela pelo equivalente monetário há de ser a última solução de tutela jurisdicional do direito a ser oferecida ao demandante – deve ser prestada apenas se 'impossível' a obtenção da 'tutela específica' ou do 'resultado prático correspondente'. (MARINONI; MITIDIERO, 2008, p. 433-434, grifo nosso).

Desse modo, atualmente o ordenamento jurídico brasileiro dá preferência à satisfação da própria obrigação específica, dispondo o julgador de instrumentos para conferir ao credor exatamente o que lhe é devido.


3. AS HIPÓTESES DE CONVERSÃO DE OBRIGAÇÃO ESPECÍFICA DO DIREITO MATERIAL EM PERDAS E DANOS

A pretensão de executar obrigação de dar (coisa), de fazer ou de não fazer pode fundar-se em título executivo judicial (art. 475-N, inciso I, c/c os arts. 644, 461, §§3º e 5º, e 461-A, §§2º e 3º, todos do CPC) e em título executivo extrajudicial (art. 585, inciso II, c/c os arts. 621. e 645, todos também do CPC).

Quando pleiteado pelo demandante (autor ou exequente) ou impossível a obtenção da tutela específica ou do resultado prático correspondente3, é possível a conversão da tutela específica pleiteada pela correspondente indenização a título de perdas e danos.

Sobre o tema, assim dispõe o CPC:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 1º A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.

[...]

Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

[...]

§ 2º Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel.

§ 3º Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1º a 6º do art. 461. (BRASIL, 1973, grifo nosso).

Portanto, em conformidade com o CPC, somente é possível a conversão da obrigação específica em perdas e danos, em duas hipóteses, a saber: i) se o próprio demandante requerer; ou ii) se for impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.

Em verdade, o demandante somente poderá optar pela conversão em perdas e danos, excepcionalmente, quando o devedor não se prontificar a cumprir a obrigação de dar, de fazer ou de não fazer ou na hipótese de não ser mais possível o cumprimento da obrigação na forma específica.

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Sobre o tema em análise, veja o ensinamento de Marcus Vinicius Rios Gonçalves:

A conversão em perdas e danos deve ficar para último caso. [...].

Há casos em que, se o devedor não cumpre voluntariamente a obrigação, ela se inviabiliza. É o que ocorre nas obrigações infungíveis, que só podem ser executadas pelo próprio devedor, jamais por terceiro [...]. A lei ainda menciona a conversão a requerimento do credor. Mas não em qualquer caso: ele não pode preferir a conversão, quando o devedor estiver disposto a cumprir a obrigação específica. Caso se prontifique a realizá-la, a conversão não se operará. Da mesma forma que o credor não é obrigado a aceitar prestação diferente da que foi avençada, o devedor não pode ser compelido, para desonerar-se, a cumpri-la diferentemente do contratado. (GONÇALVES, 2008, p. 118, grifo nosso).

Gonçalves (2008, p. 121, grifo nosso) ainda acrescenta:

São duas as hipóteses [de conversão de obrigação específica em perdas e danos]: o requerimento do autor e a inviabilidade da tutela específica ou equivalente. A conversão só se fará a requerimento do autor se tiver havido recusa do réu em cumprir a obrigação específica. O credor não poderá preferir as perdas e danos ao cumprimento da obrigação específica quando o devedor está disposto a cumpri-la. Se ele, intimado, resistir ao cumprimento, o credor poderá em vez de requerer medidas de coerção ou sub-rogação, requerer a conversão. Em suma: não é preciso que o credor esgote as medidas possíveis para o cumprimento da tutela específica, mas sim que tenha havido resistência do devedor. Só então o juiz deferirá a conversão.

Lado outro, em relação aos limites da opção do credor pela conversão em perdas e danos, veja o entendimento de Didier Júnior et al. (2013, p. 443, grifo nosso):

Questão interessante a ser enfrentada é a de saber se o credor pode optar pela conversão da obrigação em perdas e danos ainda quando seja possível o seu cumprimento na forma específica. Haveria nisso uma novação objetiva unilateral? Vale aqui o princípio segundo o qual o devedor tem o direito a que a execução se dê da forma que lhe for menos gravosa?

Entendemos que o credor pode optar pela conversão da obrigação em prestação pecuniária mesmo que ainda seja possível o cumprimento na forma especifica. Não ha nisso qualquer ofensa ao principio da menor onerosidade possível, tampouco se pode dizer que isso representaria, nos casos em que a obrigação decorre de convenção das partes, uma novação objetiva unilateral.

Com efeito, embora o credor não possa, em regra, exigir do devedor prestação diversa daquela que fora pactuada (interpretação a contrario sensu do art. 313. do CC), pode-se dizer que, ocorrido o inadimplemento, surge para esse credor o direito potestativo de optar entre o seu cumprimento na forma especifica ou a sua conversão em pecúnia – e o entendimento que se pode extrair da leitura dos arts. 247, 251 e 389, todos do CC, e do art. 461, §1°, do CPC.

O que lhe e vedado e exigir a prestação pecuniária antes de haver o inadimplemento – seja porque inexigível a prestação, seja porque a outra parte não e obrigada a prestar coisa diversa – ou exigir um outro fazer ou não fazer, distintos daquele originariamente pactuado ou imposto por lei. Considerando, porém, que a tutela especifica é um direito subjetivo do credor, sobrevindo o inadimplemento ele pode perfeitamente abrir mão desse direito, optando pela conversão do fazer ou não fazer em prestação pecuniária.

Obviamente que, conquanto lhe surja essa possibilidade de escolha, a opção há de ser feita dentro dos limites do exercício regular de um direito, revelando-se abusivo esse exercício nos casos em que a conversão se fizer apenas com espírito emulativo (art. 187, CC).

No tocante aos limites da opção do credor pela conversão da obrigação de dar, de fazer ou de não fazer em perdas e danos, Didier Júnior et al. (2013, p. 443) possuem entendimento demasiadamente amplo, no sentido de que, ocorrido o inadimplemento, independentemente de ser possível o cumprimento da obrigação na forma específica e, inclusive, de o devedor em mora se dispor a cumpri-la, surge para o credor o direito potestativo de optar pelo cumprimento da obrigação na forma específica ou pela sua conversão em perdas e danos.

Em que pese o brilhantismo dos autores em comento, não é minimamente razoável deixar o credor optar por uma prestação diversa da que de fato tem direito, se, por exemplo, na espécie, a obrigação específica se mostrar possível e o próprio devedor se dispor a cumpri-la.

Seja como for, a conversão em perdas e danos consiste em atributo de último expediente a ser empregado, se o credor não a desejar. Com efeito, não se prontificando o devedor a cumprir a obrigação específica (de dar coisa, de fazer ou de não fazer), esta somente se converterá em perdas e danos se o credor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.


4. A CONVERSÃO DE OBRIGAÇÃO ESPECÍFICA EM PERDAS E DANOS

Em primeiro lugar, é importante anotar que, do ponto de vista processual, a conversão em perdas e danos das obrigações de dar, de fazer e de não fazer é regida pelos arts. 461, §1º, e 461-A, §3º, do Código de Processo Civil (que integram as disposições sobre o procedimento para efetivação de sentença mandamental ou de decisão que concede medida liminar antecipatória), bem como pelo art. 633. também do CPC (que trata do processo de execução de obrigação específica constante de título executivo extrajudicial). Por sua vez, do ponto de vista material, a conversão de obrigação específica em perdas e danos é regida pelos arts. 234, 245, 247 a 249, 251, 389 e 402 a 405 do Código Civil (CC).

Processualmente, havendo requerimento da parte demandante ou restando incontroversa a impossibilidade de cumprimento da obrigação específica, impõe-se a conversão desta em perdas e danos, com a execução seguindo por quantia certa.

De fato, não cumprida a obrigação de dar, de fazer ou de não fazer, converter-se-á a obrigação em perdas e danos se o credor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente (arts. 461, §1º, 461-A, §3º, e 633 do Código de Processo Civil).

4.1. Ato de liquidação do valor da indenização na hipótese de conversão de obrigação específica em perdas e danos

Sendo convertida a obrigação específica em perdas e danos, o valor da indenização deverá ser apurado em ato de liquidação.

Nesse sentido, Barroso (2007, p. 231) esclarece: “convertida a obrigação de fazer, não fazer ou entrega de coisa em perdas e danos, o credor exequente, nos mesmos autos, nos termos do art. 475-A, poderá promover a liquidação para apurar o quantum a obrigação corresponde em dinheiro.”

Veja a lição de Machado (2008, p. 818-819), em comentários sobre o parágrafo único do art. 633. do CPC:

Dada a excepcional autorização conferida pelo caput ao credor de requer a conversão da execução específica em perdas e danos, nada mais lógico, em caso de deferimento, que ocorra a imediata instauração do procedimento liquidatório – por força de aplicação analógica, já que não existe sentença a liquidar – que poderá ter a forma de liquidação por artigos, se houver necessidade de se provar fato novo (arts. 475-E e 475-F) ou por arbitramento (arts. 475-C e 475-D). Por outro lado, não haverá liquidação, mas instauração imediata da execução, observado o disposto no art. 614, II, se as perdas e danos já estiverem prefixadas como cláusula penal (CC, art. 409). Concluída a liquidação, como diz o texto, segue-se a execução por quantia certa.

Segundo Didier Júnior et al. (2013, p. 447, grifo nosso):

A conversão da obrigação de fazer ou não fazer em perdas e danos exigirá, necessariamente, a instauração de um incidente cognitivo durante a fase de execução do julgado. É nesse incidente cognitivo que deverão ser apuradas as questões relativas à superveniência e relatividade da impossibilidade de realização do objeto obrigacional, bem como será aferida, a partir das circunstancias concretas, a existência de culpa (lato sensu) do devedor. É também nesse incidente que deverá ser apurado o valor relativo à conversão da prestação em perdas e danos.

Naturalmente, poderão ser produzidos todos os meios de prova necessários à resolução dessas questões. A discussão sobre o valor pecuniário do objeto obrigacional é incidente que se aproximará bastante da liquidação de sentença, podendo o juiz valer-se do seu procedimento como parâmetro, inclusive com a possibilidade de nomeação de perito para apuração desse valor ou a analise de fatos novos, acaso necessário.

Interessante destacar o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema em estudo, segundo o qual, a partir da reforma do CPC instituída pela Lei n.º 10.444/2002, o sistema processual deve ser relido e interpretado à luz da efetividade da tutela jurisdicional. Nesse quadro, independentemente de pedido explícito e mesmo em fase de cumprimento de sentença, havendo impossibilidade prática do cumprimento da obrigação específica objeto da ação, é possível a conversão em perdas e danos, com fulcro no art. 461, §1º, do CPC. Para isso, bastaria somente observar o contraditório quanto a possíveis causas excludentes de responsabilidade que poderão ser objeto de impugnação pelo devedor. (BRASIL, 2014b, 2014c).

A propósito, veja a seguinte ementa de julgado da Terceira Turma do STJ4:

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO DA TUTELA ESPECÍFICA. ARTS. ANALISADOS: 461, 461-A E 931 DO CPC.

[...]

3. Após a reforma operada pela Lei nº 10.444/2002, o sistema processual deve ser relido e interpretado à luz da efetividade da tutela jurisdicional.

4. Nos termos do art. 461, § 1º, do CPC, verificada a impossibilidade de cumprimento da obrigação específica, objeto da ação, é possível a conversão em perdas e danos, independentemente de pedido explícito e mesmo em fase de cumprimento de sentença.

5. Na hipótese dos autos, a alegação de perda do bem, suscitada em contestação, abre o contraditório, de forma que deve o juiz apreciar a real impossibilidade prática de cumprimento da tutela específica, bem como as eventuais excludentes de responsabilidade quanto às perdas e danos.

6. Negado provimento ao recurso especial. (BRASIL, 2014b, grifo nosso).

Vale, ainda, transcrever ensinamentos da ministra Nancy Andrighi, por ocasião de seu voto no julgado cuja ementa encontra-se acima colacionada (STJ; REsp 1358726/RJ):

17. [...] as inovações advindas das reformas processuais demandam que todos os dispositivos do Código sejam interpretados em conformidade com a nova realidade existente. [...].

[...]

19. Com a reforma, tendência de agilizar e desburocratizar a execução se espraia por todo o Código, inclusive no que se refere ao artifício utilizado pelo legislador de expandir os poderes inerentes ao juiz. Nesse contexto, inseriu-se na fase de cumprimento de sentença de ação para entrega de coisa certa, nos termos do art. 461-A, §3º, combinado com o art. 460, §1º, do CPC, a possibilidade de conversão da tutela específica pleiteada pela correspondente indenização a título de perdas e danos.

20. Note-se que a redação do §1º do art. 460. estabelece expressamente, ao lado do requerimento do autor, que essa conversão poderá decorrer da mera impossibilidade fática de prestação da tutela específica. E essa previsão vem justamente no bojo do procedimento de cumprimento de sentença, portanto, após o desenvolvimento do contraditório amplo e típico da fase de conhecimento, mesmo em processo em que se pleiteou única exclusivamente a tutela específica.

21. Deve-se ainda ter em consideração que o princípio da adstrição, bem como a limitação temporal para alteração de pedidos, tem por trás de si justamente a proteção do contraditório. Entretanto, o legislador, na incessante busca por dar efetividade aos provimentos jurisdicionais, flexibilizou a rega justamente por verificar a desnecessidade de exercício de contraditório quanto à conversão.

22. Ora acertada a obrigação do devedor pela prestação da tutela específica – seja ela obrigação de fazer, não fazer ou dar coisa certa – a responsabilidade pelo consequente, indenização por perdas e danos – se seguirá de forma praticamente automática. Não há necessidade de novo contraditório amplo, com nova petição inicial, citação, contestação, dilação probatória e sentença. A repetição de todos esses procedimentos revela-se enfim um atentado aos princípios da economia processual, celeridade e efetividade da justiça.

23. Noutros termos, ainda que concluída a fase de conhecimento, verificando o juiz a impossibilidade prática do cumprimento da obrigação, converterá a prestação em perdas e danos e prosseguirá a execução, devendo apenas observa o contraditório quanto a possíveis causas excludentes de responsabilidade que poderão ser objeto de impugnação pelo devedor.

[...]

25. A partir dessas considerações, conclui-se que, no atual sistema processual, em que se busca a efetividade da tutela jurisdicional, deve-se admitir a possibilidade de conversão das obrigações, ainda que sem pedido, desde que resultante da impossibilidade prática de cumprimento da tutela específica. Aliás, esse foi entendimento desta 3ª Turma também no REsp 1.043.813/SC, de minha relatoria, DJe 27/09/2011. (BRASIL, 2014c, grifo nosso).

De acordo com o STJ, na fase de cumprimento de sentença, para conversão da obrigação específica em perdas e danos, não há necessidade de novo contraditório amplo e típico da fase de conhecimento (nova petição inicial, citação, contestação, dilação probatória e sentença). Isso porque os princípios da adstrição e do contraditório devem ser ponderados com os princípios da economia processual, celeridade e efetividade da justiça. (BRASIL, 2014c).

Portanto, no caso de conversão das obrigações de dar, de fazer e de não fazer em perdas e danos, não há propriamente um procedimento para liquidação do valor da indenização. Não obstante, o ato de liquidação deve ocorrer imediatamente após o deferimento da conversão, nos próprios autos, sem a necessidade de novo contraditório amplo. O contraditório somente deverá ser observado em relação à eventual impugnação oposta pelo devedor, quanto a possíveis causas excludentes de responsabilidade.

4.2. A conversão de obrigação específica em perdas e danos no microssistema processual dos juizados especiais cíveis estaduais

No microssistema normativo dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, o procedimento de conversão da execução de obrigação de dar, de fazer e de não fazer em perdas e danos encontra guarida no inciso V do caput do art. 52. da Lei n.º 9.099/95, que assim dispõe:

Art. 52. A execução da sentença processar-se-á no próprio Juizado, aplicando-se, no que couber, o disposto no Código de Processo Civil, com as seguintes alterações:

[...]

V – nos casos de obrigação de entregar, de fazer, ou de não fazer, o Juiz, na sentença ou na fase de execução, cominará multa diária, arbitrada de acordo com as condições econômicas do devedor, para a hipótese de inadimplemento. Não cumprida a obrigação, o credor poderá requerer a elevação da multa ou a transformação da condenação em perdas e danos, que o Juiz de imediato arbitrará, seguindo-se a execução por quantia certa, incluída a multa vencida de obrigação de dar, quando evidenciada a malícia do devedor na execução do julgado. (BRASIL, 1995, grifo nosso).

Por conseguinte, não cumprida a obrigação, a regra geral é a elevação do valor da multa diária (astreintes) ou a transformação da condenação em perdas e danos, que o juiz de imediato arbitrará, uma vez provocado ou de ofício se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente (art. 52. da Lei n.º 9.099/95 c/c os arts. 461, §1º, e 461-A, §3º, do Código de Processo Civil).

Nos Juizados Especiais, em conformidade com o disposto no art. 52, inciso V, da Lei n.º 9.099/1995, o procedimento de conversão da obrigação específica em perdas e danos é bastante sucinto. Havendo requerimento do credor ou restando incontroversa a impossibilidade de cumprimento da tutela específica, o juiz de imediato arbitrará o valor da indenização por perdas e danos.

Nesse diapasão, em consonância com os princípios reitores do microssistema processual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais (art. 2º da Lei n.º 9.099/95), e observando os critérios norteadores da razoabilidade e da proporcionalidade, verificada uma hipótese de conversão da obrigação específica em perdas e danos, o juiz de imediato arbitrará o valor da indenização, mediante, em conformidade com o art. 6º da Lei n.º 9.099/95, a adoção de “decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum” (BRASIL, 1995).

4.3. O produto da incidência de eventual multa pecuniária vencida pelo descumprimento de obrigação específica

O produto da incidência de eventual multa pecuniária (astreintes) vencida pelo descumprimento de obrigação específica sancionada caberá ao credor prejudicado pela mora do devedor.

De fato, “o valor [da multa pecuniária] deve ser entregue sempre ao credor, que foi quem suportou as consequências da demora do devedor.” (GONÇALVES, 2008, p. 125).

Nesse sentido, o posicionamento do STJ5: “vislumbrada uma função também de direito material a ser exercida pela multa pecuniária do art. 461, §§ 4º e 5º, do CPC, queda induvidosa a titularidade do credor prejudicado pela mora sobre o produto resultante da aplicação da penalidade.” (BRASIL, 2012).

A multa pecuniária não tem caráter reparatório, trata-se de meio coercitivo, de natureza inibitória. Logo, o produto decorrente das astreintes é acumulável com a indenização por perdas e danos. Com efeito, o art. 461, §2º, do CPC estabelece que “a indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).” (BRASIL, 1973).

Em comentários sobre o §2º do art. 461. do CPC, leciona Costa Machado:

[...] em razão do presente dispositivo é possível ao credor de obrigação de fazer, ou de não fazer, pedir: a) a tutela específica do caput (isto é a cominação do preceito); b) a pena cominatória do presente §2º; c) providência que assegure o resultado prático equivalente; d) as perdas e danos do §1º para o caso das três medidas anteriores se revelarem ineficientes. Observe-se que a tutela específica (a) e a multa cominatória (b) tanto podem ser concedidas em conjunto sob a forma de liminar, como sob a forma de provimento final de mérito, de acordo com os §§3º e 4º abaixo. Observe-se, por fim, que ao credor também é lícito requerer as perdas e os danos do §1º, isoladamente, caso não deseje tentar ver cumprida especificamente a obrigação [...]. (MACHADO, 2008, p. 472-473).

Portanto, a eventual multa pecuniária prevista no art. 461, §§ 4º e 5º, do CPC e o valor da indenização decorrente da conversão da obrigação específica em perdas e danos serão executados cumulativamente.

Por outro lado, nos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, a incidência de eventual multa diária vencida pelo descumprimento de obrigação específica sancionada somente ocorrerá se, na espécie, ficar caracterizada a “malícia do devedor na execução do julgado”, em conformidade ao que dispõe o art. 52, caput, inciso V, parte final, da Lei n.º 9.099/1995. (BRASIL, 1995).

Sem dúvida, a Lei Instituidora dos Juizados Especiais estabelece que não consiste em regra a cumulação das perdas e danos (decorrentes da transformação da condenação) com a multa cominada (astreintes). Na verdade, a cumulação sob enfoque trata-se de exceção cabível apenas na hipótese de restar comprovada a má-fé do executado, que geralmente ocorre quando o devedor cria a impossibilidade intencionalmente ou se esta ocorrer por causa do retardamento.

Seja como for, apesar de nos Juizados Especiais não ser direta a cumulação das perdas e danos (decorrentes da transformação da condenação) com as astreintes, na prática, o produto da incidência de eventual multa pecuniária vencida pelo descumprimento de obrigação específica sancionada também caberá ao credor prejudicado pela mora do devedor.

Isso porque na grande maioria dos casos o inadimplemento da obrigação específica é decorrente da intenção ou da morosidade do devedor, o que já é suficiente para evidenciar a “malícia” deste, restando, assim, caracterizada a hipótese prevista no art. 52, caput, inciso V, parte final, da Lei n.º 9.099/1995.

Ademais, havendo inadimplemento da obrigação específica, somente não restaria caracterizada a malícia do devedor quando a obrigação for tecnicamente impossível de ser cumprida, situação em que se mostra impossível a cominação (ou a incidência) de astreintes, seja no processo dos Juizados Especiais, seja no processo cível comum (CPC).

Não é outro o posicionamento do STJ6, segundo o qual se mostra “teratológica a imposição de multa cominatória para obrigação de fazer [ou qualquer outra obrigação específica] que se afigura impossível de ser cumprida.” (BRASIL, 2013a).

É preciso ainda consignar que não há modificação na competência dos Juizados Especiais se ultrapassar quarenta salários mínimos a quantia executada em decorrência da acumulação do valor das astreintes e do valor da obrigação principal, ou do valor da indenização por perdas e danos.

A propósito, veja a seguinte ementa de julgado da Segunda Seção do STJ7:

RECLAMAÇÃO. JUIZADOS ESPECIAIS. COMPETÊNCIA PARA EXECUTAR SEUS PRÓPRIOS JULGADOS. VALOR SUPERIOR A 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. ASTREINTES. DESCUMPRIMENTO DE LIMINAR. REDUÇÃO DO QUANTUM DA MULTA DIÁRIA. RECLAMAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.

1. Nos termos do artigo 3º, § 1º, I, da Lei n. 9099/2005 (sic), compete ao Juizado Especial a execução de seus julgados, inexistindo, no preceito legal, restrições ao valor executado, desde que, por ocasião da propositura da ação, tenha sido observado o valor de alçada (RMS 33.155/MA, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 29/08/2011).

2. O fato de o valor executado ter atingido patamar superior a 40 (quarenta) salários mínimos, em razão de encargos inerentes à condenação, não descaracteriza a competência do Juizado Especial para a execução de seus julgados.

3. A multa cominatória prevista no art. 461, §§ 4º e 5º, do Código de Processo Civil não se revela como mais um bem jurídico em si mesmo perseguido pelo autor, ao lado da tutela específica a que faz jus. Sua fixação em caso de descumprimento de determinada obrigação de fazer tem por objetivo servir como meio coativo para o cumprimento da obrigação.

4. Dessa forma, deve o juiz aplicar, no âmbito dos juizados especiais, na análise do caso concreto, os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além de não se distanciar dos critérios da celeridade, simplicidade e equidade que norteiam os juizados especiais, mas não há limite ou teto para a cobrança do débito acrescido da multa e outros consectários.

[...]

7. Reclamação parcialmente procedente. (BRASIL, 2013b).

Nos Juizados Especiais não há teto para execução de quantia correspondente à soma do valor da obrigação principal, ou do valor da indenização por perdas e danos (decorrente da transformação da condenação), e do valor do produto da incidência de eventual multa pecuniária vencida pelo descumprimento de obrigação específica sancionada.

No entanto, é claro que o juiz deverá limitar o montante das astreintes, em conformidade com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a fim de não gerar enriquecimento sem causa.

4.4. O prosseguimento do feito após a conversão da obrigação específica em perdas e danos

Com a conversão da obrigação específica em perdas e danos, segue-se a execução por quantia certa contra devedor solvente, com a intimação da parte executada para efetuar o pagamento do quantum devido relativamente ao valor da indenização por perdas e danos, no prazo de quinze dias, sob pena de multa de 10% (dez por cento), nos termos do art. 475-J, caput, 1ª parte, do Código de Processo Civil.

Para melhor elucidar o procedimento a ser adotado após a conversão sob enfoque, vale transcrever a lição de Humberto Theodoro Júnior:

Liquidado o valor da indenização pela não entrega da coisa, e não ocorrendo depósito no prazo do art. 475-J, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação, com que se dará início à execução por quantia certa.

[…]

Convertidas estas [prestações de fazer ou de entregar coisa] em seu equivalente econômico, não cabe então aplicar a multa diária [astreintes] por atraso no adimplemento. Caberá, todavia, a multa única de 10% própria da execução por quantia certa (art. 475-J). (THEODORO JÚNIOR, 2011, p. 46, grifo nosso).

De acordo com Didier Júnior et al. (2013, p. 447):

Concluindo-se pela responsabilidade do devedor/executado e apurado o valor da indenização a ser paga, seguir-se-á o procedimento de efetivação das decisões que impõem obrigação de pagar quantia (art. 475-J e seguintes, CPC).

Aqui, merece ainda destaque o ensinamento de Darlan Barroso:

Apurado o valor, prosseguirá o feito com execução de quantia certa. Nesse ponto, surge a indagação: será utilizado o procedimento do art. 475-J relativo ao cumprimento de sentenças ou se aplicará o processo comum de execução de quantia certa contra devedor solvente do art. 646?

Como sabemos, o procedimento do art. 475-J é mais célere e relativo ao cumprimento de sentenças, sem a instauração de novo processo de execução. Já o processo do art. 646. representa verdadeira ação autônoma.

A jurisprudência e a doutrina, dada a atualidade do tema, ainda não se manifestaram a respeito. Mas entendemos que, sendo realizada a liquidação do valor devido pelo executado, estaremos diante de um título judicial; exequível, portanto, nos moldes do art. 475-J. (BARROSO, 2007, p. 231-232, grifo nosso).

Dessa forma, sendo o caso de conversão das obrigações de dar, de fazer ou de não fazer em perdas e danos, o valor indenizatório deverá ser apurado, prosseguindo o feito como execução de quantia certa. Por conseguinte, o executado deverá ser intimado para efetuar o pagamento do quantum devido relativo à indenização por perdas e danos, no prazo de quinze dias, sob pena de multa de 10% (dez por cento), prevista no art. 475-J, caput, 1ª parte, do Código de Processo Civil.

É preciso registrar que, mesmo executado cumulativamente com a indenização por perdas e danos, sobre o produto da incidência de eventual multa pecuniária vencida pelo descumprimento de obrigação específica sancionada não incide a multa prevista no art. 475-J do CPC. Realmente, “a natureza jurídica das astreintes é coercitiva e não condenatória, razão pela qual não se aplica a multa do artigo 475-J, do Código de Processo Civil.” (BRASIL, 2014a, grifo nosso)8.

A multa prevista no art. 475-J do CPC trata-se de penalidade imposta ao devedor “condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação”. (BRASIL, 1973). Com se vê, a multa pecuniária prevista no art. 461, §§4º e 5º, do CPC (astreintes) não se enquadra nas hipóteses estabelecidas pelo art. 475-J, não podendo ser considerada quantia certa nem fixada em liquidação, porque traduz simples consequência do descumprimento de ordem judicial.

Destarte, sendo executados cumulativamente o produto de eventual multa pecuniária (astreintes) prevista no art. 461, §§ 4º e 5º, do CPC e o valor da indenização decorrente da conversão da obrigação específica em perdas e danos, somente sobre este poderá incidir a multa prevista no art. 475-J do Código de Processo Civil.

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Sobre o autor
Clayton Moreira de Castro

Possui GRADUAÇÃO em DIREITO pela Universidade Presidente Antônio Carlos de Araguari (UNIPAC/Araguari), graduação em ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e graduação em ENGENHARIA CIVIL pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). MESTRE em Engenharia Civil (Engenharia de Estruturas) pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da Universidade de São Paulo (USP). ESPECIALISTA em Direito Processual Civil e Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes (UCAM). SERVIDOR PÚBLICO do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo publicado inicialmente no seguinte periódico: O Patriarca: revista do curso de Direito – IMEPAC Araguari, Araguari, MG, v. 9, n.9, p. 1-20, 2015. ISSN 2237-8863.

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