Questões polêmicas sobre a redução da maioridade penal:avaliando o tema de forma crítica

Resumo:


  • A redução da maioridade penal no Brasil de 18 para 16 anos é frequentemente discutida como solução para a violência, apesar de haver grande apoio popular, muitos desconhecem os mecanismos de recuperação de jovens infratores.

  • A legislação brasileira, incluindo o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Constituição, considera inimputáveis os menores de 18 anos, e essa condição é uma cláusula pétrea que não pode ser alterada mesmo por emenda constitucional.

  • Reduzir a maioridade penal é visto como ineficaz, pois não aborda as causas sociais e econômicas da criminalidade entre jovens, e pode apenas aumentar a população carcerária sem reduzir a criminalidade.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O presente texto tem por enfoque principal trazer uma análise crítica sobre a questão da redução da menoridade penal. Não pretendemos esgotar a matéria, mas sim demonstrar alguns pontos para enriquecer a discussão.

É de fundamental relevância apresentar alguns fatores para que haja uma compreensão do que de fato é a Redução da Maioridade Penal, sem olvidarmos do que nos foi proposto. 

O Brasil vive uma onda de violência como nunca antes vista. Sequestros-relâmpagos, estupros e homicídios são assuntos diários da mídia nacional. Na tentativa de conquistar a simpatia do eleitorado, deputados e senadores reacendem a discussão sobre a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos como sendo a solução para o problema da violência no nosso país. 

Infelizmente, a ideia de redução da maioridade penal conta com o apoio de grande parte da sociedade, seja por desconhecimento da lei e dos mecanismos de recuperação dos jovens infratores, seja pelo fato da mídia divulgar sempre a prática da infração e quase nunca divulgar os índices de recuperação dos adolescentes infratores submetidos às medidas sócioeducativas de meio aberto. Noticiar que um adulto cometeu um crime não cria uma magnitude tal qual do que publicar que um adolescente de 15 anos praticou um ato infracional. 

Em 2010, o Conselho Federal da OAB se manifestou absolutamente contra a redução da maioridade penal, em decisão unânime de seu colegiado conforme transcrito no trabalho de COSTA (2000) que considerou “Uma proposta para evitar a idade da imputação penal”. 

É conciso lembrar que, historicamente, o Brasil adota a imputação penal apenas para os maiores de 18 anos após o Código Penal de 1940. O Código Penal de 1890 considerava os limites de 9 a 14 anos. Até os nove anos, o infrator era considerado inimputável. Contanto, entre 9 e 14, o juiz verificava se o infrator havia agido com discernimento, podendo ser considerado criminoso. 

O Código de Menores de 1927 consignava três limites de idade: Com 14 anos de idade o infrator era inimputável; De 14 até 16 anos de idade ainda era considerado irresponsável, mas instaurava-se um processo para apurar o fato com possibilidade de cerceamento de liberdade; Finalmente entre 16 e 18 anos de idade, o menor poderia ser considerado responsável, sofrendo pena. 

A Lei Federal 6.691 de 1979, o chamado Novo Código de Menores, reafirmou o teor do C.P.B quando classificou o menor de 18 anos como absolutamente inimputável. A Magna Carta, por sua vez, estabeleceu a idade de 18 anos para a maioridade penal, o que foi seguido pela Lei 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente. 

Nestes termos a Constituição de República Federativa do Brasil, em seu artigo 228, diz que: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos sujeitos, as normas da legislação especial”, redação que se repete no artigo 27 do Código Penal Brasileiro. 

A inimputabilidade dos menores de 18 anos constitui verdadeira garantia individual fundamental da Constituição que, como tal, não pode ser objeto de deliberação por proposta de emenda constitucional, consoante prescreve o artigo 60, §4º, inciso IV do mesmo documento constitucional. 

Nesse sentido, alterar a maioridade penal, a meu ver, nem mesmo mediante um Poder Constituinte Originário, haja vista a incidência do princípio da vedação do retrocesso. Ademais, sobre a questão das cláusulas pétreas é sempre bom se reportar aos ensinamentos de mestres constitucionalistas como DANTAS (1999), DENZEL (2000), MORAES (2002) e FERREIRA (1991).

Além disso, é preciso deixar nítida a idéia de que a inimputabilidade não é sinônimo de irresponsabilidade, sendo necessário que não se caia na armadilha denunciada por MENDEZ (1998), do retribucionismo hipócrita versus paternalismo ingênuo. 

Convém ponderar que o sistema vigente responsabiliza o adolescente autor de ato infracional prevendo diversas medidas capazes de assegurar sua ressocialização. O que está em jogo é assegurar a boa qualidade na execução dessas medidas. Afinal de contas, o sistema jurídico direcionado aos jovens deve sempre visar efeitos pedagógicos e garantir que eles não tornem a delinquir, não fazendo sentido a simples punição pela punição. 

Desta forma, se a análise for feita no sentido de se saber o que o legislador objetiva com a mudança na lei, chega-se à conclusão de nada adiantará reduzir a idade de imputação para 16 anos ou para qualquer idade. Compromissos com os resultados implicam em implantação dos programas sócioeducativos para os que já infringiram a lei, programas preventivos para aqueles que ainda não infracionaram e, obviamente, políticas sociais básicas e políticas compensatórias para corrigir as desigualdades sociais. 

Tentar transferir o adolescente de um sistema que recupera a maioria dos infratores para colocá-los nos presídios apenas vai agravar o problema, confirmando o que foi dito no início deste trabalho. O que precisa ser pensado é na elaboração de políticas públicas eficientes e capazes de fazer como que haja a aplicação concreta e eficaz das disposições do ECA.

Por esta razão, entendo que o rebaixamento da maioridade penal não trará quaisquer mudanças no comportamento daqueles que praticam os atos infracionais, porém, em contrapartida, apenas estaríamos aumentando o número de indivíduos nos complexos penais. Assim sendo, o que devemos fazer é tão somente uma política prevencionista, oferecendo ao menor, e a sua família, condições mínimas e dignas de sobrevivência, evitando assim o ingresso ao crime. 

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Não podemos compactuar com esse pensamento errôneo de que, rebaixando a idade limite para o processo e julgamento pelos delitos praticados, também se rebaixará o índice de criminalidade, ou ainda pensar na escolha de determinadas condutas, como sendo as mais graves, para que estes adolescentes possam ser processados criminalmente.

Não é um limite de idade que determina se um adolescente irá ou não cometer ilícitos penais, mas sim questões de ordem econômicas e sociais, que refletem diretamente na aplicabilidade dos institutos legais. 

Portanto, dizer que rebaixar a menoridade penal é a solução que a sociedade espera para a queda do índice de criminalidade não faz qualquer sentido. É mister que saibamos que minorando a idade limite apenas teremos que construir mais presídios, tendo em vista que os que hoje existem não comportam mais os presos que para lá são encaminhados. 

Por fim, apenas para uma leve reflexão, deixo uma pergunta para cada um de vocês: “Queremos um País com mais educação, emprego, moradia e efetividade dos direitos assegurados na Magna Carta ou devemos construir mais unidades penais para comportar os seus ‘novos membros’?” Não se engane, é certo que um País onde o nível de desigualdade seja mínimo o índice de criminalidade assim também o será.

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Sobre o autor
Adalberto Fraga Veríssimo Junior

Advogado Criminalista. Graduado em Direito pelo Centro Universitário Filadélfia – UniFil Londrina e pós-graduando em “Direito Penal”, “Processo Penal”, “Criminologia e Execução Criminal” e “Medicina Legal e Perícias Forenses” pela Faculdade Arthur Thomas Londrina. E-mail: [email protected].

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Parecer elaborado em 16/10/2010, a pedido do Portal Konvênios.

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