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Fundamentos do financiamento sindical brasileiro

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16/10/2015 às 11:11
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4 - DA CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA

A contribuição confederativa foi instituída na Constituição Federal de 1988 e tem como objetivo o custeio do sistema confederativo de representação sindical, do qual fazem parte os sindicatos, as federações e as confederações, tanto da categoria profissional como da econômica. A contribuição confederativa deve ser fixada por meio de Assembleia Geral e seu fundamento legal está no art. 8º, IV, da Constituição Federal:

Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

IV - a assembleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei.

É oportuno destacar a contradição diante do aspecto democrático presente na Constituição de 1988, ao passo que foi mantida a contribuição sindical compulsória que é oriunda da CLT e, mesmo assim, foi instituída uma nova contribuição com vistas ao financiamento do sistema confederativo. A contribuição confederativa é baseada no período corporativista, visto que a tendência daquele momento era que o Estado pudesse impor contribuições a todos os integrantes da categoria a fim de fortalecer as entidades sindicais.

A implantação da contribuição confederativa pela Constituição de 1988 trouxe à tona diversos conflitos. Dentre eles se destacam a configuração da natureza jurídica da contribuição confederativa, bem como sua obrigatoriedade diante de todos os membros da categoria, profissional ou econômica, independentemente de associação sindical.

Renomados estudiosos do direito contrastam pelo caráter tributário da contribuição confederativa, equiparando-a a contribuição social prevista no art. 149 da Constituição Federal, ou a considerando como contribuição sui generis. Apesar das características inerentes aos tributos, a contribuição confederativa independe de Lei ordinária para ser fixada. Dessa forma, possui natureza autônoma, dependendo apenas de ato jurídico intermediário para sua constituição, qual seja a Assembleia geral. (PASSOS, Edésio; SALVADOR, Luiz, 1993, p.125).

De tal modo, afastada a natureza tributária da contribuição confederativa, o único pressuposto essencial para sua instituição seria sua aprovação em Assembleia Geral realizada no âmbito do sindicato[3]. Mesmo que as federações ou confederações sejam beneficiadas por esta contribuição, por serem formadas por sindicatos ou federações, não poderão implantar essa cobrança, já que sua aprovação depende dos trabalhadores ou empregadores.

A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho está assente ao definir que a contribuição confederativa não poderá ser fixada por meio de negociações ou dissídios coletivos, conforme podemos extrair:

RECURSO DE REVISTA. DEVOLUÇÃO DE DESCONTOS. CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA. Esta Corte pacificou o entendimento de que é nula a instituição, por meio de norma coletiva, de cobrança de contribuições sindicais a qualquer título, obrigando trabalhadores não sindicalizados, independentemente da existência ou não de oposição ao desconto, visto que tal prática ofende o direito de livre associação e sindicalização. Assim, o Tribunal Regional, ao entender indevida a devolução dos descontos a título de contribuição confederativa, ao fundamento de que há previsão em norma coletiva e de que não houve oposição por parte do Reclamante, ofendeu o disposto no art. 8º, V, da Constituição Federal. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista: 64420115150142. 7ª Turma, Relator: Ministro Douglas Alencar Rodrigues - DEJT 24/04/2015).

Cumpre ressaltar que a contribuição confederativa pode se destinar a todas as entidades que compõem o sistema confederativo. Quanto às Centrais Sindicais, apesar de seu recente reconhecimento formal, entende-se não integrarem o sistema confederativo, já que são entidades formadas livremente pelos seus interessados, e que, portanto não devem se favorecer da referida contribuição. Nessa acepção, também não podem ser beneficiários da contribuição confederativa os conselhos federais e regionais fiscalizadores do exercício de profissionais liberais, por constituírem pessoas jurídicas de direito público que não pertencem ao sistema confederativo.

Assim como ocorre na contribuição assistencial, a jurisprudência se consolidou no sentido de que a contribuição confederativa não deve ser imposta aos trabalhadores não filiados ao sindicato. Para uma pequena parte da doutrina, a contribuição confederativa vincula todos os integrantes da categoria, associados ou não ao sindicato respectivo, e seu desconto em folha independe de autorização expressa do trabalhador.

Realmente a Constituição Federal em seu art. 8º IV não menciona que as contribuições que se propõem ao custeio do regime confederativo sejam efetivadas pelos trabalhadores associados ao sindicato, mas cumpre ressaltar que a contribuição confederativa se difere da contribuição sindical no que concerne à compulsoriedade, visto que se fossem semelhantes, a própria Constituição haveria oferecido tratamento igualitário às contribuições, o que efetivamente não ocorreu. A contribuição confederativa independe de Lei, isto é, pode ser instituída pela própria Assembleia de empregados ou empregadores, vinculando, portanto, somente aos filiados do sindicato de classe.

A Constituição Federal de 1988 assegura a livre associação profissional ou sindical, bem como a garante que ninguém poderá ser compelido a se filiar em entidade sindical, seguindo esse entendimento, os não associados não podem ser obrigados a pagar a contribuição confederativa, pois isso iria de encontro aos fundamentos da liberdade sindical. O desconto efetuado em folha de pagamento só pode ser realizado perante aos sindicalizados que participaram ou poderiam ter participado da Assembleia que institui a cobrança, sob pena de configurar violação à liberdade sindical e autoritarismo da entidade sindical.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal – STF editou a Súmula 666, que dispõe sobre a obrigatoriedade do pagamento da contribuição confederativa pelos filiados ao respectivo sindicato:

Súm. 666, STF – CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA – EXIGIBILIDADE DOS FILIADOS AO SINDICATO. A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo. CF, art. 8º, IV.

Assim, diante do posicionamento do STF, órgão máximo do Poder Judiciário nacional, entende-se que a contribuição confederativa só poderá ser estabelecida aos membros associados ao sindicato respectivo, e desde que instituída mediante assembleia Geral, instrumento adequado para fixar tal obrigatoriedade. Quanto ao direito de se opor ao desconto como acontece na contribuição assistencial, compreendemos possível a oposição ao pagamento da contribuição confederativa pelos empregados não filiados ao sindicato profissional.


5 – DA CONTRIBUIÇÃO ASSOCIATIVA

Todas as associações são criadas e funcionam de acordo com as deliberações de seus membros por meio dos estatutos aprovados em Assembleia Geral. O estatuto é o orientador dos atos das associações e contempla dentre outros elementos, os objetivos, o formato de organização e as formas de receita, que na maioria das vezes consiste na contribuição dos próprios associados. Essa receita periódica fixada entre os membros da associação visa à manutenção das atividades rotineiras e dos serviços prestados exclusivamente aos associados.

Nas entidades sindicais, que também são associações acontece o mesmo, ou seja, a contribuição associativa advém da ideia de mensalidade imposta aos membros do sindicato a fim de manter suas atividades essenciais. A contribuição associativa é devida apenas pelos associados do sindicato, nos valores estabelecidos pela Assembleia Geral. Nesse sentido, oportuno demonstrar a lição de Batalha sobre o tema:

É livre a associação sindical no sentido de que cada trabalhador ou empresa pode associar-se, ou não, a sindicato. Se a filiação à entidade sindical decorre da circunstância de pertencer à categoria profissional ou econômica, a qualidade de associado depende de manifestação individual. A contribuição associativa é cobrada dos associados ao sindicato na forma explicitada nos estatutos. (BATALHA, 1994, p. 134).

Portanto, existem dois requisitos exigidos para a implantação da cobrança da contribuição associativa: a associação sindical e a previsão estatutária. Assim, quando uma empresa se filia a algum sindicato, adere automaticamente às normas estatutárias, devendo contribuir com a mensalidade se assim estiver estipulado. O mesmo ocorre com os associados do sindicato profissional, que mesmo se não estiverem presentes na Assembleia que institui a contribuição, ficam obrigados ao pagamento correspondente.

O embasamento legal da contribuição associativa está previsto na alínea b do art. 548 da CLT, onde se extrai que constituem o patrimônio das associações sindicais   as contribuições dos associados, na forma estabelecida nos estatutos ou pelas Assembleias Gerais. O desconto em folha de pagamento pelo empregador depende de prévia anuência do empregado e qualquer tipo de conduta do empregador que tenha por objetivo dificultar o repasse ao sindicato configura ofensa à liberdade sindical em seu aspecto coletivo. Quanto à natureza jurídica da contribuição associativa, não há dúvida que seja de natureza privada, já que é instituída em Assembleia Geral e vincula somente aos associados do sindicato. (OLIVEIRA NETO, 2010, p. 107).

Cumpre ressaltar a importância da contribuição associativa, pois ao imaginarmos um sistema sindical ideal, esta seria a única fonte de renda das entidades sindicais, que seriam custeadas apenas pelos trabalhadores e empregadores verdadeiramente comprometidos com o sindicalismo. O sindicato se mostra forte pelo número de associados, mas em nosso país, a sindicalização não é estimulada, visto que as receitas oriundas das contribuições compulsórias serão arrecadadas, independente do número de associados.


6 – CONCLUSÃO

A contribuição sindical compulsória atribuída a todos os integrantes da categoria, seja profissional ou econômica, vincula a todos, independente de filiação. A contribuição compulsória pode ser considerada um dos grandes obstáculos à efetivação da liberdade sindical em nosso país, visto que não propicia ao contribuinte o poder de escolher para qual associação sindical contribuir. A imposição de contribuição a um determinado sindicato, previamente definido por meio da unicidade, revela grave ofensa ao instituto da liberdade sindical.

A filiação compulsória ao sindicato atenta contra a liberdade sindical negativa, ou seja, o direito dos trabalhadores ou empregadores de não se filiarem a nenhuma entidade sindical. Se a liberdade sindical se desse de forma plena em nosso ordenamento, os sindicatos teriam que “angariar a clientela”, isto é, mostrarem-se representativos a fim de conseguirem cada vez mais associados.

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No que concerne às contribuições assistencial e confederativa, fica evidente que são cabíveis somente se impostas aos associados do sindicato, uma vez que é nula a instituição, por meio de norma coletiva, de cobrança de contribuições sindicais a qualquer título, obrigando trabalhadores não sindicalizados, independentemente da existência ou não de oposição ao desconto, visto que tal prática ofende o direito de livre associação e sindicalização.

Em um modelo ideal de sindicalismo, as contribuições em favor das entidades sindicais devem ser impostas somente aos membros sindicalizados. A contribuição deve ser estimulada por boas práticas que remetam à captação de associados. A mensalidade sindical proposta aos associados e a contribuição de solidariedade destinada aos não associados que forem beneficiados pelas negociações coletivas aparecem como as únicas modalidades de financiamento sindical em consonância com os fundamentos da liberdade sindical.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BATALHA, Wilson de Souza Campos; BATALHA, Silva Marina Labate. “Sindicatos – Sindicalismo”, 2a ed., São Paulo, LTr Edit., 1994.

DELGADO, Maurício Godinho, Curso de Direito do Trabalho. 3 ed. São Paulo: LTr, 2004.

GOMES, Orlando; GOTTTCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984.

MARTINS, Sérgio Pinto. Contribuições sindicais: direito comparado e internacional: Contribuições assistencial, confederativa e sindical. 2 ed., São Paulo: Atlas, 1998.

OLIVEIRA NETO, Alberto Emiliano de Oliveira. Contribuições sindicais. 1. ed, São Paulo: LTr, 2010.

PASSOS, Edésio; SALVADOR, Luiz. Fonntes de custeio das entidades sindicais. Da contribuição confederativa e da exteinção da contribuição sindical. LTr, Suplemento Trabalhista, São Paulo, n. 49, 1993.

PEGO, Rafael Foresti. Fundamentos do Direito Coletivo do Trabalho. 1. Ed, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.

ROMITA, Arion Sayão, A septuagenária consolidação das leis do trabalho. Disponível em: <http://www.trt1.jus.br/documents/10157/f1210e45-c175-492a-a5be-c3e57b9a8ecf>

VIANNA, Segadas, Direito Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, 1972.


Notas

[1] ROMITA, Arion Sayão, A septuagenária consolidação das leis do trabalho. Disponível em: <http://www.trt1.jus.br/documents/10157/f1210e45-c175-492a-a5be-c3e57b9a8ecf>.

[2] PRECEDENTE NORMATIVO nº 119 do TST - CONTRIBUIÇÕES SINDICAIS - INOBSERVÂNCIA DE PRECEITOS CONSTITUCIONAIS – (mantido) - DEJT divulgado em 25.08.2014 "A Constituição da República, em seus arts. 5º, XX e 8º, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados”.

[3] Interessante observar, também, que o dispositivo constitucional faz menção à fixação da contribuição confederativa em assembleia do sindicato. Não custa lembrar que o significado de assembleia remete à reunião de pessoas destinada a deliberar assunto de interesse comum aos participantes. No caso em questão, tanto trabalhadores quanto empregadores reúnem-se em assembleia para estabelecer a fixação de contribuição destinada a custear o sistema confederativo. (OLIVEIRA NETO, 2010, p. 106).

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Sobre o autor
Ricardo Aparecido de Araújo

Possui graduação de Bacharelado em Direito pela Faculdade de Direito de Conselheiro Lafaiete (2009), Extensão Universitária em Educação Ambiental pela UFMG (2011), Pós-graduação em Direito Contratual pela Universidade Gama Filho (2013). Mestrado em Direito, Hermenêutica e Direitos Fundamentais na linha de pesquisa "Pessoa, Direito e Efetivação dos Direitos Humanos no Contexto Social e Político Contemporâneo" na Universidade Presidente Antônio Carlos em Juiz de Fora MG (2015), onde sua dissertação que versava sobre Direito Sindical foi indicada para ser publicada pelo seu orientador, o Ministro do TST Alexandre Agra Belmonte. Lecionou na Faculdade de Direito de Conselheiro Lafaite (FDCL). Coordenador de curso transitório em 2017. Foi Coordenador da Comissão de Avaliação Permanente da Doctum Carangola (CPA) e Coordenador do Projeto Doctum na Trilha (ENADE). Atualmente é advogado no Escritório Modelo de Assistência Jurídica (Núcleo de Prática Jurídica) da Doctum Carangola. Coordenador de Estágio, Membro do Núcleo Docente Estruturante (NDE). Coordenador Geral do Núcleo de Prática Jurídica da Doctum Carangola (NPJ - EMAJ). . Professor de Direito e Processo do Trabalho, Prática Trabalhista, Direito Civil e Projeto Integrador na Doctum Carangola. Orientador de projetos acadêmicos e de extensão universitária. Palestrante e autor da obra Sindicalismo e Reforma Trabalhista. Especializado em Comunicação e Compliance Trabalhista.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Ricardo Aparecido. Fundamentos do financiamento sindical brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4489, 16 out. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/41512. Acesso em: 17 abr. 2024.

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