De tanto ouvir que a os direitos trabalhistas são indisponíveis, temos a tendência em aceitar como se fosse uma pedra fundamental, de forma a montar o nosso conhecimento a partir deste dado, não mais questionando se este dado é verdadeiro. Alguns desinformados, outros, sofistas, constroem teorias sobre base falsa, induzindo os menos avisados ao erro.
A indisponibilidade dos direitos trabalhistas é relativa em função do tempo e da abrangência. A indisponibilidade advém da irrenunciabilidade dos direitos. Mas quais são estes direitos?, e quando ocorre?
Quanto ao tempo a renuncia pode ocorrer: a) na celebração do contrato; b) durante a vigência do contrato; c) na rescisão do contrato ou posterior. A renuncia é um ato, e como tal está condicionada com o momento que isto ocorre.
Se a indisponibilidade advém da irrenunciabilidade, esta por sua vez, é protegida por força de lei, dado a hipossuficiência de alguma parte, atribuída geralmente ao empregado. É aqui que devemos diferenciar o momento, pois o ato de renunciar só é viciado quando uma das partes está em desvantagem, impedindo-o de manifestar sua vontade livremente.
Na contratação é perfeitamente aceitável que a vontade do empregado esteja sujeita à contaminação pela vulnerabilidade que lhe é característico, em função do estado de "desempregado" que ocorre na maioria das vezes. Mas aqui, já há de se observar que esta vulnerabilidade não ocorre com todo empregado, e principalmente quando este troca de emprego por outro que oferece mais vantagens.
Durante a vigência do contrato também pode ocorrer esta vulnerabilidade, principalmente se a oferta de mão de obra é maior que a demanda, provocando o medo da perda do emprego.
Já na rescisão do contrato de trabalho não há de se falar em vulnerabilidade, hipossuficiência, irrenunciabilidade ou então indisponibilidade, pois o empregado não mais está dependente do empregador.
Para o eminente Professor Amauri Mascaro Nascimento, a irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas se limitam aos de natureza salarial:
"Quando parte da doutrina sustenta que o crédito trabalhista não pode ser cedido, não refere-se a todos os créditos trabalhistas, mas, apenas, aos créditos de natureza salarial e no curso do contrato individual de trabalho."
NASCIMENTO continua,
"O direito do trabalho admite, com restrições, a renuncia dos créditos trabalhistas, que é mais do que a cessão, desde que se verifique no momento ou após a rescisão do contrato individual de trabalho."
Por sua vez, o notável doutrinador Arnaldo Lopes Sussekind, afirma:
"Tais renuncias – no momento ou depois da cessação do contrato de trabalho – tem sido apreciadas pela jurisprudência brasileira com menos restrição do que as ocorridas nas demais fases da relação de emprego."
SUSSEKIND diz mais:
"Neste caso, satisfeitas que sejam certas condições de liberdade de vontade, é licito ao empregado renunciar, desde que se tratem de direitos já adquiridos, isto é, já incorporados ao patrimônio em conseqüência ou por força de lei".
SUSSEKIND ainda cita o entendimento do Saudoso Oliveira Viana:
"... as nulidades referentes às renuncias por ocasião da celebração do contrato de trabalho e durante a execução dele, nem sempre ocorrem quando a renuncia é feita por ocasião ou depois da dissolução do contrato."
Portanto, a chave que nos permite identificar a validade da renuncia, é momento de sua ocorrência e não de forma genérica como tem sido defendida por parte da doutrina, ainda que minoritária.
Contudo, não são todos os direitos trabalhistas passiveis de renuncia pelo critério do tempo, pois ainda dependem da sua abrangência, que podem ser: a) Direitos da sociedade; b) Direitos mínimos previstos em lei; c) Direitos livres.
Os direitos da sociedade são aqueles obtidos pelos encargos recolhidos aos cofres públicos. (Ex: INSS), e portanto não sendo o empregado o seu titular, não poderá renuncia-los.
Os direitos mínimos previstos em lei são aqueles garantidos pela norma que os estabelece no seu valor mínimo. (Ex: salário mínimo), todavia, é valido renunciar no final do contrato, como nos lembra o Professor Amauri Mascaro Nascimento.
Já os direitos livres são todos aqueles acima do seu valor mínimo e são também os elementos que compõem a relação de trabalho, tais como: período de vigência do contrato, quantidade de horas extras, pagamentos efetuados, férias gozadas, etc..., Além de todos os direitos acima do seu valor mínimo, como é o caso do salário do empregado.
Sendo assim, analisando os dois critérios, concluímos que é valida a renuncia ocorrida na ocasião ou posterior à rescisão do contrato individual de trabalho, ainda que os direitos do empregado atinjam à valor abaixo do mínimo, respeitados apenas os direitos sociais.
Isto superado, devemos verificar a forma com que é feita a renuncia, pois esta devera estar livre de vícios que possam impedir a livre manifestação da vontade das partes. O brilhante Professor Bismark Duarte Diniz, nos ensina:
"A transação supõe uma relação jurídica onde há incerteza quanto aos direitos e obrigações e a eliminação desta perplexidade mediante concessões recíprocas. Difere da Conciliação (Art. 764, 831 e 846 da CLT), porque desta se incumbe o Juiz, visando uma composição justa, aceita pelas partes."
A diferenciação entre Mediação e Transação é vital, pois enquanto esta não pressupõe a presença de Juiz, podendo ser realizada em qualquer momento do contrato e entre as partes somente, a Mediação ocorre diante de um Juiz e proposta por este. O que há de se atentar é que a Transação quando realizada sem a presença de um Juiz, está sujeita à vícios, podendo ser objeto de nulidade. Por outro lado a Conciliação, por razões obvias, não está sujeita a qualquer tipo vicio.
A CLT elegeu a Conciliação, como forma preferencial na solução de controvérsias, somente cabendo o arbitramento, se esta for inexitosa. (Art. 764, §1º; §2º e 3º, Art. 831caput e parágrafo único e Art. 846 CLT) Sabiamente o legislador deu atenção especial neste sentido, pois a conciliação é resultado da vontade das partes, e como tal deve ser preservada, tanto naquele momento como posteriormente. Nesta mesma direção o Art. 836 da CLT, veda conhecer de questões já decididas, e entre elas estão as homologações de acordos.
Por fim, ficando demonstrado a disponibilidade dos direitos trabalhistas, com exceção dos diretos sociais, assim como que as decisões (homologação de acordos conciliatórios e arbitramento) não podem ser mais objeto de nova demanda, resta lembrar o disposto nos Art. 1º e 18 da Lei 9.307/96, que assim dispõe:
Art. 1º - "As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis."
Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.
Portanto, uma vez eleito um Juiz Arbitral para Homologação de acordo trabalhista, é vedado ao Poder Judiciário reapreciar a mesma matéria, fundado nos dispositivos legais do Art. 836, CLT e Art. 267, VI, CPC e principalmente no dispositivo Constitucional do Art. 5º, XXXVI, CF-88.
NOTAS
01. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho, p.356.
02. SUSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANA, Segadas, VOL.1, p.209.
03. DINIZ, Bismark Duarte. Direito do Trabalho em Sala de Aula, p.35.
BIBLIOGRAFIA
1.DINIZ, Bismark Duarte. Direito do Trabalho em Sala de Aula. Cuiabá, Univag/Unicen 2000, p.35.
2.NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 17ª ed. São Paulo, Saraiva, 2001. p.356.
3.SUSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANA, Segadas. Instituições de direito do trabalho. Rio de Janeiro-São Paulo, Freitas Bastos. 1993, VOL.1, p.209.