Da alienação do estabelecimento empresarial: efeitos

13/08/2015 às 23:46
Leia nesta página:

Da Alienação do Estabelecimento Empresarial.

1.      ALIENAÇÃO DE ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL OU TRESPASSE

1.1   Conceito de Estabelecimento Comercial

Estabelecimento empresarial/comercial é o complexo de bens organizados ou reunidos para a exploração da atividade empresarial. Representa um conjunto patrimonial formado pela vontade do empresário, podendo ser imateriais a exemplo das patentes, registros de marca, ponto comercial e título do estabelecimento ou materiais como os automóveis, imóveis e máquinas.

Erroneamente no âmbito empresarial, tem-se entendido que estabelecimento comercial é apenas a sede, o local aonde se desenvolvem as atividades empresárias. Contudo a dicção do artigo 1.142 do Código Civil é outra, acentuando-se que todos os bens que estão diretamente ligados a atividade empresária são partes conjulgantes do estabelecimento empresarial, formando o estabelecimento.

Cumpre acentuar que o fundo de empresa também conhecido pelas nomenclaturas “good will of trade”, aviamento, “founds of commerce” e fundo de comércio, não se confundem com o conceito de estabelecimento empresarial, pois o fundo de comércio é o potencial de lucratividade que é gerado a partir da organização dos bens da empresa, ou seja é a sobrevalorização que o estabelecimento empresarial pode gerar.

Ressaltamos que, como o estabelecimento comercial é a reunião de todos os bens para realização da atividade empresarial, estes bens podem ser objetos de direitos, como contratos de compra e venda (trespasse), dação em pagamento, contrato de permuta, arrendamento mercantil, doação etc.

2.     Contrato de Trespasse ou Alienação de Estabelecimento Comercial

O trespasse é o contrato de compra e venda de estabelecimento comercial, aonde o trespassante transfere ao trespassatário a propriedade do bem alienado (vendido). Por se tratar de bens pertencentes ao patrimônio do empresário ou sociedade empresária este contrato merece alguns cuidados exigidos pela lei.

Em primeiro lugar o contrato de trespasse deve ser celebrado por escrito para que possa ser arquivado na Junta Comercial e publicado na imprensa oficial para que surta todos os efeitos em relação aos terceiros estranhos ao contrato (credores, devedores e terceiros interessados).

Outro importante aspecto é no caso do empresário ou a sociedade empresária possuir débitos com terceiros, devendo na hipótese separar ou reservar patrimônio suficiente para o pagamento desses débitos, e se não houver patrimônio suficiente para o pagamento desses débitos o trespassante deverá notificar todos os credores para que se manifestem em sentido favorável a alienação do estabelecimento comercial, no prazo de 30 dias, sendo que não se manifestando nesse período, presumir-se-à que se manifestaram em sentido favorável.

Descumprida a regra supramencionada, poderão os credores não notificados e desde que não haja reserva de patrimônio suficiente para quitar seus referidos créditos, requerer a decretação de falência da empresa com fundamento no artigo 94, inciso III, alínea “c” da Lei 11.101/05 por se tratar de atos de falência, ou seja que autorizam a decretação da falência por inobservância dos direitos relativos aos credores.

Do Valor do Estabelecimento Comercial

Impotante frisar que o cálculo do valor do estabelecimento empresarial/comercial não leva em conta somente os bens corpóreos/materiais pertencentes no momento do trespasse, deve-se incluir no valor do estabelecimento todos os créditos futuros decorrentes de títulos de créditos como Duplicatas, Letras de Câmbio, Notas Promissórias, Cheques ainda não compensados, Cédulas de Crédito Bancário e outros; bem como o potencial que tal complexo de bens adquiriu com o passar do tempo em decorrência da atividade empresarial, o potencial de clientela que aquele empreendimento gerou com o passar do tempo, também chamado de freguesia e valores em discussão judicial.

Após a observância desses aspectos deve-se descontar ou abater no preço alcançado todos os débitos relativos ao estabelecimento empresarial, como multas ambientais, débitos de natureza tributária ainda que com a exigibilidade suspensa, débitos de natureza mercantil e cível, valores em discussão judicial que gerará débito etc.

Da Responsabilidade Comercial pela Alienação do Estabelecimento Comercial

A alienação do estabelecimento comercial torna o adquirente solidariamente responsável (junto com o alienante) por todos os débitos relativos ao bem adquirido, desde que estas dívidas estejam regularmente contabilizadas. Lembramos que a sucessão empresarial é uma das hipóteses que autoriza a exibição total dos livros contábeis, desde que autorizados judicialmente, conforme disposto no artigo 1.191 do Código Civil.

A reponsabilidade do alienante (quem está vendendo o estabelecimento) pelos débitos já vencidos permanece pelo período de 01 ano, contados da publicação do trespasse. Já no caso de débitos vincendos ou a vencer, pelo período de 01 ano, contados da data do vencimento efetivo da dívida.

Na hipótese de transferência do estabelecimento, portanto, o adquirente será sucessor do alienante, podendo os credores deste demandar aquele para cobrança de seus débitos, por isso a necessidade da contabilização de todos os direitos para a imposição de um valor de venda.

2.3 Da Responsabilidade Tributária no caso de Aquisição de Estabelecimento Empresarial

Preleciona o artigo 133 do Código Tributário Nacional que o ADQUIRENTE a qualquer título (mesmo se for doação) de estabelecimento comercial ou fundo de comércio que continua a mesma exploração comercial que o alienante/cedente, ou seja continua a explorar o mesmo objeto social/ramo de atividade que o alienante/cedente torna-se responsável tributário pelos débitos relativos ao empreendimento.

A forma de responsabilidade tributária dar-se-à pela conduta do alienante/cedente, qual seja:

1-     Se o alienante/cedente continua a explorar qualquer atividade econômica dentro do prazo de 06 (seis) meses, o adquirente só responderá pelos débitos tributários se o alienante/cedente não suprir completamente os débitos com o Fisco;

-    Se o alienante/cedente não continuar a explorar atividade empresarial dentro de 06 (seis) meses da aquisição do estabelecimento ou fundo de comércio, responderá o adquirente de forma integral pelos débitos tributários do estabelecimento comercial.

Nota-se que só haverá tal responsabilidade se o adquirente continuar explorando a mesma atividade que o antecessor, se caso ele venha a alterar o objeto social de sua atividade empresaria antes da aquisição e ou alterar o objeto social do empreendimento adquirido, não haverá a responsabilização tributária, salvo se constatado a fraude por parte do adquirente. (JBB Gasolina S.A adquire AA confeitaria Ltda e a transforma em depósito de lubrificantes, não haverá responsabilidade pelas dívidas tributárias da AA confeitaria Ltda)

Por cautela, aconselhamos a emissão de certidões negativas junto a Secretaria da Receita Federal, Estadual e Municipal, antes da realização do trespasse, bem como a análise dos últimos 5 (cinco) anos das escriturações contábeis e fiscais.

Da Cláusula de Não Passivo ou Não Transferência de Passivo

Hodiernamente os contratos de trespasse vem prevendo uma cláusula que visa afastar as responsabilidades supramencionadas. Ocorre que tal cláusula não afasta a responsabilidade de nenhuma das partes, pois as normas inseridas tanto no Código Civil como no Código Tributário Nacional quanto as responsabilidades são de caráter cogente, ou seja a vontade das partes não tem o condão de suprimí-las.

A cláusula de não transferência de passivo, por certo, não libera o adquirente das responsabilidades mencionadas, podendo os credores demandarem o adquirente sem qualquer ressalva, contudo cabendo ao adquirente posteriormente reaver todos os valores pagos  contra o alienante, desde que esta cláusula esteja expressamente prevista.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

A validade desta cláusula surte apenas efeitos inter-partes, ou seja somente existe em relação ao adquirente e alienante, não podendo credores serem afetados por esta imposição contratual que nem fizeram parte.

2.4 Da Cláusula de Não-Restabelecimento

Em regra, o alienante do estabelecimento comercial não poderá concorrer com este na exploração do mesmo ramo empresarial, pelo período mínimo de 05 (cinco) anos a contar da alienação do estabelecimento.

Frisa-se que tal regra comercial é implícita, existe mesmo que não haja qualquer previsão contratual a proibindo. Porém é possível por meio de cláusula contratual reduzir, aumentar ou até mesmo permitir o restabelecimento, conforme vontades das partes.

Cabe salientar que, a vedação é quanto a uma atividade que implique diretamente na atividade do estabelecimento alienado, repercutindo negativamente em seu potencial de lucro e a análise da praça deve se levar em conta a repercussão direta na atividade empresarial realizada por esse estabelecimento, independentemente de sua localização geográfica.

Em tese é possível o restabelecimento de empreendimento com o mesmo ramo empresarial que a do estabelecimento alienado, na mesma Rua, Bairro ou somente em outras cidades, países etc.

É completamente proibido, sendo inconstitucional, a cláusula de não-restabelecimento eterno ou por tempo extremamente excessivo, que inviabilize a exploração de atividade comercial. (não-restabelecimento por 60 anos, 100 anos são inconstitucionais por violarem o artigo 170 da Constituição Federal)

3.  Da Sub-rogação nos Contratos do Alienante

Assevera o artigo 1.148 do Código Civil, que a alienação do estabelecimento comercial importa na sub-rogação (transferência) em todos os contratos estipulados, ou seja, vinculados a exploração comercial pelo estabelecimento, desde que não sejam personalíssimos, ou tenham caráter pessoal. (J contrata A por que A tem qualidades específicas que outros não teriam, A tem prerrogativas especiais e essenciais àquela atividade).

A segunda parte do dispositivo mencionado autoriza a rescisão contratual por uma das partes presente o justo motivo, desde que no prazo de 90 dias a contar da publicação do trespasse devendo a outra parte ser notificada sobre a rescisão, cabendo a responsabilização por danos morais ou materiais contra o alienante, caso não haja justo motivo.

Alertamos que os contratos de locação comercial não são automaticantes subrrogados, dependendo de autorização expressa do locador para que o sucessor possa continuar a explorar a atividade comercial em estabelecimentos que tenha o imóvel locado.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Raphael Cavalcante Rezek

Aprovado nos concursos públicos para Delegado de Registros e Notas dos Estados MS, MT, MG, PR e SP<br>Consultor e parecerista<br>Advogado Tributário <br>Aprovado no VIII Exame da Ordem cursando o 9 semestre<br>Estagiário Ministério Público do Estado do Mato Grosso do Sul - Promotoria da Infância e Juventude<br>Estagiário Ministério Público do Estado do Mato Grosso do Sul - Promotoria Ambiental<br>Estagiário da Procuradoria Geral de Justiça<br><br>

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos